30/04/2025

TRÊS ESTAÇÕES | QUARTO EPISÓDIO | PRIMAVERA



 Cena 1 (quarto de Leandro)

Com a roupa do dia anterior, Leandro checa a caixa de entrada do seu e-mail, e lê em voz alta a mensagem mais recente, enviada pelo catarinense que lhe propôs uma entrevista de emprego (fato citado no episódio anterior).

RICARDO (NARRADO POR LEANDRO): Bom dia, Leandro. Aqui é Ricardo Teodósio, gerente da HidroSC Ltda., sediada em Florianópolis. Conversamos há alguns dias através do WhatsApp, e ficamos de realizar uma entrevista por intermédio do Google Meet, em data a ser discutida.

Devido ao Congresso Internacional de Hidrotécnicos Sul-americanos, que será realizado nos próximos dias no Recife Plaza Hotel, estarei em sua cidade ainda hoje para representar a empresa. Uma vez que eu serei o palestrante da apresentação agendada às 20h, estarei com tempo livre por volta das 14h. Se for conveniente para você, podemos realizar a entrevista pessoalmente no saguão do hotel neste horário. O que você acha?

Já deixei o seu nome na recepção para que você tenha acesso ao saguão. Por favor, confirme sua presença ainda nesta manhã.

Atenciosamente,

Ricardo Teodósio

HIDROSC LTDA.

Em dúvida sobre ir à entrevista presencial ou a apresentar o trabalho na escola, Leandro gesticula para si mesmo.

LEANDRO: Hoje?

(fundo musical: “Uma carta (DJ Maya remix)” – segundos finais)

O engenheiro fecha a tampa do notebook, desabotoa a camisa e levanta-se da cama.


Cena 2 (estacionamento)

(fundo musical: “Sopra em nós (Remix)” – “sopra em nós, sopra em nós/ somos Teus filhos, ó Pai! Estamos reunidos em Teu nome”)

Arthur está com a cabeça baixa, e quando a levanta demonstra cansaço. Ele olha para um outdoor, onde está escrito “EM BREVE, UMA NOVA UNIDADE  PERTO DE VOCÊ – MAYRA MODA INFANTIL”. Depois de lê-lo, o ex-amante de Karla coça o cabelo e vira o rosto.

(música incidental: “Psychic mistery, disturbing air, wind, cold: L (1036484)”)

Mas ele é surpreendido quando a inscrição dá lugar a uma pergunta, escrita com a datilologia:

DEUS: Você me ama?

Arthur coça os olhos, descrente com o que lê.

DEUS: É com você mesmo que eu estou falando, Arthur. Perguntei se você me ama.

ARTHUR: Quem é você?

DEUS: Quem te amou primeiro.

ARTHUR: Claro... Claro que eu Te amo.

DEUS: Mesmo sem saber como eu sou?

ARTHUR: Eu não preciso Te ver pra Te amar.

DEUS: Mas parece não amar quem está vendo.

ARTHUR: Sendo sincero, não acho que eles gostem de mim.

DEUS: Por quê?

ARTHUR: Hanniery e Leandro não querem me entender.

DEUS: Entender não é aceitar o que te destrói por dentro.

ARTHUR: Não é assim...

DEUS: A caminhada é difícil. Você já pisou onde não deveria. Mas eles estão esperando por você.

ARTHUR: Não fala comigo como se eu precisasse ser resgatado...

DEUS: Todo mundo é resgatado, Arthur. Sobretudo do perigo que não vê.

ARTHUR: Verdade? E qual é o meu perigo?

DEUS: O amor que você tem dentro de si.

ARTHUR: Amar é perigoso?

DEUS: Frio desse jeito, que não consegue Me reconhecer, é.

ARTHUR: Como é que eu faço pra amar do jeito certo?

DEUS: Abra os olhos, para Me ver. Nós somos muito diferentes, Arthur. Mas as Minhas mãos sempre tocaram as suas, mesmo quando você não sentia nada. Nada do que você fez impediu que Eu te amasse. Vai se impedir de amar quem também te ama?

Arthur levanta, assustado, e afasta-se do outdoor. Ele, porém, aproxima-se acidentalmente de outra placa, que diz:

(fundo musical: “Só Jesus me guia (Amor perfeito)” – “o meu amor por Deus não é perfeito/ perfeito é o amor Dele por mim”)

(obs.: os versos tocam em loop até o fim da cena)

DEUS: Não se esqueça, Arthur: um amor igual ao Meu você não encontra. Nem consegue fugir dele.

Arthur fica ainda mais chocado, com a câmera girando em seu entorno, e sai do estacionamento correndo. A mensagem devolve à propaganda do outdoor o seu lugar quando o trigêmeo deixa o local. Volta a ser escrito: “Matrículas abertas para o segundo semestre de 2024. Curso de Libras Fernanda Santos”.


Cena 3 (quarto de Leandro)


Cena 4 (estação metroviária)

Um metrô abre suas portas e pessoas desembarcam numa estação.

(música incidental: “A sad melody of electric piano, boss and guitar (1393894)”)

Do alto de uma plataforma que exibe o céu, Leandro vê a chegada do metrô e com seu olhar acompanha o meio de transporte passando debaixo da plataforma e indo a outra estação. O rapaz demonstra dúvida sobre para onde ir, pondo as mãos no pescoço e olhando para o alto.


Cena 5 (terraço)

Hanniery está saindo de casa e destranca o portão.

(fundo musical: “No sangue e no fogo” – introdução em baixa velocidade)

Ao girar a chave, o estudante lamenta pelo fato de ir à escola sozinho, chegando a olhar para o interior da casa. Visivelmente decepcionado, o rapaz prossegue rumo à avaliação de Jonathan.


Cena 6 (biblioteca da escola)

Triste, Hanniery está olhando para baixo, levantando a cabeça quando Jonathan inicia um diálogo.

JONATHAN: E aí? Tudo certo, Hanniery? 

HANNIERY: É. Fiz o melhor que pude.

JONATHAN: Leandro e Arthur, estão onde?

HANNIERY: Professor, tudo indica que o trabalho não vai ser em grupo.

JONATHAN: Entendi. O desentendimento entre vocês continua? 

HANNIERY: (balança a cabeça afirmativamente)

JONATHAN: De qualquer maneira, se eles vierem, eu deixei o recado na portaria. 

HANNIERY: Recado? De quê?

JONATHAN: O ar-condicionado da sala 04 quebrou. Como as outras salas estão ocupadas e no auditório tem reunião da Gerência Regional, os alunos vão ter que fazer a apresentação no corredor. Fiz um sorteio pra definir a ordem de entrada e, por sorte, você é o último da fila.

HANNIERY: Quando a gente acredita em Deus, a sorte dá lugar à razão.

JONATHAN: Como assim, Hanniery?

HANNIERY: Tem uma razão pra que eu seja o último. Só Deus explica o motivo.

JONATHAN: Tudo bem. Assim que a sua vez chegar, eu venho te avisar.

HANNIERY: Obrigado, Professor.


Cena 8 (pátio da escola)

Hanniery vai até o pátio para fazer a sua apresentação.

JONATHAN: Acho que já podemos começar.

Surpreendendo Hanniery, à sua direita vem Leandro.

LEANDRO: Perdão pelo atraso, Jonathan.

Arthur também chega, vindo do lado oposto ao de Leandro.

ARTHUR: Boa tarde, Jonathan. O grupo está completo agora.

Hanniery volta a olhar para Jonathan, levemente aliviado.

JONATHAN: Tudo certo? O pátio é de vocês.

(fundo musical: “Momentos com o Senhor”)

(Obs.: o diálogo entre Waguinho e Thalles Roberto é legendado da mesma forma que os demais diálogos do roteiro. As imagens dos irmãos dividem a tela cada vez que interpretam juntos o mesmo verso)

ARTHUR: Vou chamar pra cantar esse samba abençoado comigo Thalles Roberto.

LEANDRO: É isso aí, Waguinho: na pressão do Espírito Santo!

LEANDRO: “Meu coração sente saudade

ARTHUR: Dos bons momentos com o Senhor:

HANNIERY: Passava às noites acordado

ARTHUR: Cantando louvor,

LEANDRO: Só louvor!

ARTHUR: Canta, Thalles!

HANNIERY: Era tão bom quando eu sentia

ARTHUR: Sua presença me encher.

LEANDRO: Era feliz e não sabia

HANNIERY: Que o Seu amor

ARTHUR: Era o melhor pra mim,

LEANDRO: Era o melhor pra mim,

HANNIERY: Era o melhor pra mim. 

ARTHUR: Eu quero é mais andar Contigo,

LEANDRO: Voltar a ser Seu melhor amigo!

HANNIERY: Viver assim não posso mais!

ARTHUR: Sei que errei. Olhei pra trás;

LEANDRO: Mas hoje me arrependo, meu Senhor.

HANNIERY: Pai, me perdoa! Por favor!

ARTHUR: Arrependido eu estou,

LEANDRO: Preciso do Seu amor!

HANNIERY E LEANDRO: Jesus! Jesus! Jesus! Jesus!

ARTHUR: É o nome!

HANNIERY E LEANDRO: Jesus! Jesus! Jesus! Jesus!

ARTHUR: Thalles Roberto, agora é contigo mesmo! Vem comigo!

LEANDRO: Vamo que vamo, Waguinho! Vamo que vamo cheio do Espírito Santo! 

ARTHUR: Meu coração sente saudade

LEANDRO: Dos meus momentos com o Senhor:

HANNIERY: Passava às noites acordado

ARTHUR: Cantando louvor,

LEANDRO: Só louvor!

HANNIERY: Era tão bom quando eu sentia

ARTHUR: Sua presença me encher.

LEANDRO: Era feliz e não sabia

HANNIERY: Que o Seu amor

ARTHUR: Era o melhor pra mim,

LEANDRO: Era o melhor pra mim,

HANNIERY: Era o melhor pra mim. 

ARTHUR: Eu quero mais andar Contigo,

LEANDRO: Voltar a ser Seu melhor amigo!

HANNIERY: Viver assim não posso mais!

ARTHUR: Sei que errei. Olhei pra trás;

LEANDRO: Mas hoje me arrependo, meu Senhor.

HANNIERY: Pai, me perdoa! Por favor!

ARTHUR: Arrependido eu estou,

LEANDRO: Preciso do Seu amor!

HANNIERY E LEANDRO: Jesus!

ARTHUR: Demorei demais pra voltar,

HANNIERY E LEANDRO: Jesus!

ARTHUR: Mas agora eu só vou Te adorar!

HANNIERY E LEANDRO: Jesus! Jesus!

ARTHUR: Manda brasa!

HANNIERY E ARTHUR: Jesus! Jesus! Jesus! Jesus! Jesus!

LEANDRO: Quero mais viver Contigo toda hora e sempre!

HANNIERY E ARTHUR: Jesus!

LEANDRO: Ao lado Dele, meu amigo sempre!

HANNIERY E ARTHUR: Jesus!

LEANDRO: Ao lado Dele, meu amigo Deus!

HANNIERY E ARTHUR: Jesus!”

ARTHUR: Muito obrigado, Thalles Roberto.

LEANDRO: É “nois”! Aleluia! 

ARTHUR: Que Deus continue te abençoando, meu querido.

LEANDRO: Sejam cheios do Espírito Santo.

ARTHUR: Valeu!


Cena 9 (calçadas)

(fundo musical: “Eu te amo tanto (Frank Nuckless remix)” – “filho, Eu quero tanto/ enxugar teu pranto/ te fazer só meu/ filho, Eu quero ser teu Deus)

Três ramos de flores, plantados em diferentes calçadas, balançam com o vento diante de um clima ensolarado)


Cena 10 (muro)

Os trigêmeos estão sentados juntos ao pôr do sol, novamente na sequência Leandro – Arthur – Hanniery.

HANNIERY: Quem vai falar primeiro?

ARTHUR: Melhor você começar.

LEANDRO: Eu?

HANNIERY: É, achei que o cara de Santa Catarina tinha marcado contigo hoje.

LEANDRO: E ele marcou. No mesmo horário da prova do Jonathan.

ARTHUR: Por que você não foi?

LEANDRO: O Hanniery precisava de mim.

HANNIERY: Imagino como deve ter sido difícil. 

ARTHUR: A chance da tua vida poderia ser essa. 

LEANDRO: “Tudo” é a chance da minha vida, pra quem me conhece. Quase que eu pego o metrô.

HANNIERY: O que rolou?

LEANDRO: Vocês se lembram do Kaio?

ARTHUR: Qual? O crente ou o lutador de jiu-jitsu?

LEANDRO: Os dois. Uma vez ele me aconselhou: “corra atrás do ‘sim’ porque o ‘não’ você já tem”. O jeito é continuar correndo.

HANNIERY: E você, não quer dizer nada?

ARTHUR: Quero. (tira a jaqueta) Finalmente um pouco de vento nesse forno! (joga a jaqueta contra a câmera)

LEANDRO: Sobre o trabalho do Jonathan.

ARTHUR: Ainda não é a hora de dizer. Mas o que aconteceu lá fora foi muito forte. Resumindo: você precisava da gente.

HANNIERY: Será que a nota que a gente vai receber é vermelha?

LEANDRO: Duvido. Jonathan, a julgar pela cara, gostou muito.

ARTHUR: Mais do que as alunas que viram a apresentação no pátio? Elas não tiravam o olho de você!

HANNIERY: Teu bigode anda fazendo sucesso, hein? Daqui a pouco alguém te pede em casamento!

LEANDRO: Tomara! Porque ultimamente só aparece doida episcopal no meu caminho!

(Arthur e Hanniery começam a rir)

ARTHUR: Doida episcopal? O que é isso?

LEANDRO: Aquela que não pode ver um crente que quer dar em cima.

ARTHUR: Por motivos óbvios, vou ficar solteiro por um bom tempo.

HANNIERY: Ótimo. É o tempo pra ensaiar uma nova apresentação.

LEANDRO: Nem terminamos uma e você já quer outra? Me ajude!

HANNIERY: Depois de hoje, tô inspirado!

ARTHUR: Qual é a ideia?

HANNIERY: Interpretar “Procure por mim na glória”, com base no clipe original.

ARTHUR: Nós três vamos usar peruca? Ah, eu não vou pagar esse mico!

HANNIERY: (sorridente) Arthur, você corta o cabelo pra disfarçar a calvície. Peruca pra você é lucro!

(Leandro põe a mão na boca e começa a rir)

ARTHUR: Você também não pode falar nada. Teu nome, além de ser incomum, está escrito com H, dois N e Y no final.

HANNIERY: (irritado) Culpa da tua mãe!

(após alguns segundos em silêncio, Arthur e Leandro riem. Hanniery demora a entender a tolice que disse e, ao se dar conta, começa a rir a ponto de chorar)

LETREIRO: “Se não tivéssemos inverno, a primavera não seria tão agradável; se não experimentássemos às vezes o sabor da adversidade, a prosperidade não seria tão bem-vinda.” (Anne Bradstreet)


CRÉDITOS FINAIS

(fundo musical: “Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)” – últimos quinze segundos da música)


Músicas executadas neste episódio

“Uma carta (DJ Maya remix)”

Compositor e intérprete: IZAAC SANTOS


“Sopra em nós (Remix)”

Compositora: IRMÃ ANA PAULA, CMES

Intérpretes: DJ JP DA IMACULADA E IRMÃ ANA PAULA, CMES


“Só Jesus me guia (Amor perfeito)”

Compositores: AGENIR PARREIRA E MARQUINHOS CARDOSO

Intérprete: LEONARDO SULLIVAN


“No sangue e no fogo”

Compositores: FERNANDA BRUM E LIVINGSTHON FARIAS

Intérprete: FERNANDA BRUM


“Te busco”

Compositor: ALEXIS VELEZ

Intérprete: ALEX ZURDO


“Regue fé, esperança, amor”

Compositor: PAULO CESAR BARUK

Intérpretes: IBAB CELEBRAÇÃO, LITO ATALAIA E PAULO CESAR BARUK


“Momentos com o Senhor”

Compositor: THALLES ROBERTO

Intérpretes: WAGUINHO BASTOS E THALLES ROBERTO


“Eu te amo tanto (Frank Nuckless remix)”

Compositor e intérprete: Antônio Lázaro Silva (Irmão Lázaro)


“Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)”

Compositores: GUSTAVO DANIEL ALVES GOMES, ISAAC MEDEIROS CABRAL, HIAGO RAMALHO VIANA E AZMAVETH CARNEIRO DA SILVA

Intérpretes: BIG ASHER, 2METRO, TRINDADE RECORDS, SHISO E LOVE FUNK 


Locações

BIBLIOTECA POPULAR DE AFOGADOS JORNALISTA RONILDO MAIA LEITE

EREM AMAURY DE MEDEIROS

SÃO MIGUEL CENTER – SHOPPING DE AFOGADOS


Agradecimento especial

GERALDA REIS


Este produto audiovisual é independente e baseado nas ementas dos cursos de Libras Básico I (Erem Amaury de Medeiros – Gre Recife Sul) e Intermediário (Instituto Federal do Mato Grosso do Sul).

Os sinais descritos nesta obra de ficção estão sujeitos a alterações devido às variações geográficas.


© 2024


23/04/2025

TRÊS ESTAÇÕES | TERCEIRO EPISÓDIO | INVERNO



 Cena 1 (sala de estar)

HANNIERY: Isso é jeito de falar comigo?

LEANDRO: Eu não aguento mais você me pressionando. Toda vez que eu volto pra casa é uma pergunta...

HANNIERY: Você está se pressionando. Ou eu não tenho mais o direito de me preocupar contigo?

LEANDRO: Hanniery...

HANNIERY: Olha como você tá. Não é por pouca coisa.

LEANDRO: Certo... (anda em círculos) Eu tive um problema pessoal com o dono da empresa. E eu percebi que ele falou mal de mim depois que eu saí de lá. 

HANNIERY: Foi assédio moral, Leandro?

LEANDRO: O Vitor tem muita influência no meio. A empresa dele é a maior do país. Toda vez que alguém lê meu currículo e descobre que eu trabalhei lá, eu sou descartado. Não importa o quão maravilhoso eu seja.

HANNIERY: Você tinha que processar esse cara! Ele não pode te prejudicar profissionalmente!

LEANDRO: Essa batalha já tá perdida, Hanniery. O que eu posso fazer é sobreviver à guerra. Por isso que eu prefiro esconder.

HANNIERY: Quanto tempo você pretendia ficar sem me revelar a verdade?

LEANDRO: Não sei. Mas acredita, não é por falta de confiança. Mas é porque tem coisas que só Deus poderia me entender. Você não.

HANNIERY: Do que você tem medo, Leandro?

LEANDRO: Se eu abrisse meu coração, o meu medo seria de machucar você. Mas você é o cara que eu mais admiro no mundo, e eu não quero perder teu respeito. É melhor parar por aqui. (deixa a sala de estar)

Arthur observa Hanniery lamentando pela falta de confiança de Leandro.


Cena 2 (cozinha)

(fundo musical: “Regue fé, esperança, amor” – “tratar e conversar no mesmo patamar; ouvir e respeitar, já que diz que se importa; ter sensibilidade no olhar. O amor é a chave que abre a porta”)

Hanniery picota algumas verduras no tabuleiro, e depois as mistura num pote. 

(obs.: não é obrigatório aparecer o rosto do personagem)

Após acender uma das bocas do fogão, faz-se uma transição, com o intuito de mostrar que anoitece.


Cena 3 (sala de jantar)

Hanniery e Leandro estão sentados, diante da mesa.

LEANDRO: A gente não pode servir o jantar?

HANNIERY: Vão jantar os três.

LEANDRO: Onde ele está?

HANNIERY: A nova identidade ficou pronta. Ele foi buscar.

LEANDRO: Esse arroz que você fez parece uma delícia.

HANNIERY: Você que me ensinou a receita.

LEANDRO: (ri discretamente) O representante de uma empresa sediada em Santa Catarina entrou em contato comigo.

HANNIERY: Que ótimo! Mas a conversa vai ser à distância?

LEANDRO: Não, ele vem a Recife por conta de um congresso na próxima quinta-feira. Ora por mim, tá bem?

HANNIERY: Vai dar certo. Se você for, eu vou sentir saudades... E inveja, porque Santa Catarina não pode ser mais quente do que aqui!

LEANDRO: A gente nunca vai se separar, Hanniery. Você nunca vai estar sozinho. 

ARTHUR: (chega sem que os rapazes percebam) Não vai ficar mesmo. Chegou quem faltava.

Hanniery olha para Arthur com um sorriso leve, enquanto Leandro muda a expressão facial.


(Abertura)


Cena 4 (sala de jantar)

Os três irmãos estão jantando, cada um com um prato de arroz e um copo d’água ao lado direito de cada rapaz. Arthur alimenta-se normalmente, enquanto Hanniery usa o garfo para levar o alimento à boca e percebe que Leandro não está comendo nada.

HANNIERY: Você não tocou na comida, Leandro...

LEANDRO: Sem fome. Tô com dor de cabeça. Você tem algum remédio?

HANNIERY: Sim, na quarta gaveta da estante. Pode pegar.

LEANDRO: (levanta-se) Obrigado, Hanniery. (anda devagar)

HANNIERY: Gostou do arroz?

ARTHUR: Uma delícia! Só faltou um limão.

HANNIERY: Não sabia que você usava limão na comida. 

ARTHUR: E não uso. Mas mais ácido que o Leandro não dá pra ser.

LEANDRO: Falando mal de mim, Arthur? E nas minhas costas?

ARTHUR: Se quiser, eu falo na frente também. Quer?

HANNIERY: Esqueceram que é a hora do jantar?

LEANDRO: Calma, Hanniery; é que eu fiquei curioso. Qual é a tua queixa, Arthur?

ARTHUR: Você não percebeu que todo jantar é igual, com você fazendo a expressão de quem não quer estar aqui?

LEANDRO: O jantar é maravilhoso, talvez eu somente não queira estar com você.

HANNIERY: Leandro!

ARTHUR: Tudo bem, Hanniery. A gente sabe que ele é recalcado mesmo.

LEANDRO: Ah, você tem propriedade pra falar do assunto, não é?

ARTHUR: Não, eu não culpo a minha família pelos meus problemas. Nem problemas eu tenho.

LEANDRO: Você cria.

ARTHUR: Sério? Agora eu sou o culpado de você não ter dado certo na vida? Teu diploma é só um quadro pendurado na parede aberto a visitações, mas a culpa é minha?

HANNIERY: Arthur, chega!

ARTHUR: Engenharia não é a sua área. Você deveria ser ator dramático!

LEANDRO: Também pensei nisso. Quem sabe você não me ajuda a conseguir um emprego na Fox?

(Arthur fica apavorado)

HANNIERY: Do que vocês estão falando?

LEANDRO: Conta pra ele, Arthur. O nome “Fox” não significa alguma coisa pra você?

HANNIERY: Estúdio de cinema? “Raposa” em inglês?

ARTHUR: Você não vai colocar o Hanniery contra mim!

(Hanniery puxa o braço de Arthur)

HANNIERY: Tem mais alguma coisa que você não me contou, Arthur?

LEANDRO: Ele traiu a Karla com uma garota de programa.

HANNIERY: Isso é mentira, Leandro. O Arthur... Ele nunca faria isso.

LEANDRO: Fez. Eles se conheceram num site, onde ela vende os “serviços".

ARTHUR: Não cai nessa, Hanniery, por favor!

LEANDRO: Tá duvidando? Eu encaminhei pro meu celular as conversas dos dois.

(música incidental: “Strictly sadness stringed instrument orchestra (1092497)”)

Um flashback, em sépia, revela a conversa que Fox e Arthur tiveram, reexibindo o momento em que o diálogo foi lido por Leandro.

LEANDRO: Até o site está aqui, olha. (entrega o celular a Hanniery)

(Arthur vira o rosto para Leandro, com ódio por ser exposto. Hanniery começa a ler)

HANNIERY: Www.topotudotodotempo.com.br?

ARTHUR: Você não tinha o direito de mexer no meu celular!

LEANDRO: Por que não? Eu perdi meu emprego por sua causa, qual o problema de eu ler suas conversas no WhatsApp?

HANNIERY: Espera! O Arthur não pode ser culpado disso, nem ele nem eu conhecemos o seu ex-patrão. 

LEANDRO: Mas ele conhece a ex-esposa do Vitor. Por que você acha que nós nunca vimos a Karla?


Cena 5 (sala de jantar)

(música incidental: “A 60-second dark cinematic sue designed for horror/ suspense trailers and promos (1317535)”)

A câmera percorre os olhares dos trigêmeos: Hanniery assustado, Leandro enfurecido e Arthur calmo.

(obs.: os pratos e copos já não mais aparecem, como se os trigêmeos tivessem levantado da mesa)

HANNIERY: Essas coisas que você tá dizendo... São porque você tá com raiva do Arthur.

LEANDRO: O Vitor descobriu o caso que a Karla tinha com esse imbecil e me demitiu, porque achou que eu sabia de tudo.

ARTHUR: A Karla era a esposa do Vitor? Mundo pequeno esse, hein?

LEANDRO: Arthur não saiu de casa porque estava apaixonado. Foi porque no divórcio a Karla ficou com um apartamento em Casa Amarela. Sabe quanto custa? Um milhão de reais! Era lá onde ele morava.

HANNIERY: Por que você não me contou nada?

LEANDRO: Porque quando ele voltou pra casa, eu achei que ele estava arrependido. Mas não. Ele traiu a Karla com outra mulher, e continuou com ela depois de ter voltado pra nossa casa.

ARTHUR: Agora entendi: a estratégia é de colocar a culpa do que te aconteceu em mim.

LEANDRO: É sua culpa!

ARTHUR: Isso já tem mais de um ano, Leandro; por que você não conseguiu um emprego?

LEANDRO: Ninguém quer me contratar depois que o Vitor me prejudicou!

ARTHUR: A verdade é que você não arranja emprego porque não quer! Ou melhor: porque você é incompetente!

HANNIERY: Arthur, para com isso, pelo amor de Deus!

ARTHUR: (vira-se para Hanniery) Já tô cansado desse cara querer ser a régua moral do mundo e não cuidar da própria vida! (volta o rosto para Leandro) Quer que eu soletre o que você é? I-N-C-O-M-P...

Leandro interrompe a provocação esbofeteando Arthur. Ele bate com o rosto na parede, deixando Hanniery em choque. O ex-amante de Karla desencosta da parede, tempo no qual Hanniery fica à frente de Leandro. O engenheiro arrepende-se instantes depois.

(música incidental: “Switch, surprise, explosion and other sound effects”)

LEANDRO: Não era pra eu ter feito isso... Desculpa, eu...

ARTHUR: Tudo bem. Você tá no seu direito. Mas eu não vou sentir dor sozinho, não...

(Hanniery coloca a mão esquerda sobre o peitoral de Arthur, impedindo que ele avance)

HANNIERY: Você não vai tocar no Leandro!

ARTHUR: Hanniery, você vai concordar com ele?

HANNIERY: E o que você quer? Que eu fique ao seu lado depois de tudo que soube?

ARTHUR: Claro... Os dois unidos, como sempre... Eu não vou te perdoar por isso, Leandro. (olha para Hanniery) A você também não.

(Arthur retira-se da mesa, mas pega o seu copo já vazio e joga contra a parede, visando atingir Leandro)

(música incidental: “Quiet fear/ japanese horror atmosphere 8-piano”)

ARTHUR: Imbecil!

HANNIERY: Meu Deus, pra onde ele vai?

LEANDRO: Por mim, Hanniery, que vá pro inferno! (deixa Hanniery sozinho na sala de jantar)


Cena 6 (quarto de Hanniery/ quarto de Leandro)

(fundo musical: “Sopra em nós (Remix)” – parte final)

Subitamente, o fornecimento de energia elétrica é suspenso: primeiro, as luzes começam a piscar; depois, apagam-se as luzes do roteador e do quarto de Hanniery para, por fim, as hélices do ventilador pararem de girar. O gêmeo logo exclama, diante da escuridão: 

HANNIERY: Não acredito... Que sacanagem! (sinaliza olhando para a lâmpada)

Leandro está sentado sobre a própria cama, irritado e olhando para baixo. Ele repara quando o irmão entra em seus aposentos.

HANNIERY: Eu vim pegar uma vela.

LEANDRO: (volta a olhar para baixo enquanto comenta) Tudo bem.

Hanniery encontra a vela, mas coloca o objeto debaixo de um dos braços para perguntar:

HANNIERY: Sério mesmo que você não tá nem um pouco preocupado?

LEANDRO: Eu preciso estar preocupado?

Hanniery irrita-se e deixa o quarto de Leandro, que demonstra descontentamento.


Cena 7 (rua/ estacionamento/ quarto de Hanniery/ quarto de Leandro)

(fundo musical: “Livre” – introdução)

A rua está sob baixa iluminação, e nela passa um ônibus da linha Vila Dois Carneiros. A cena passa a ser num estacionamento, no qual Arthur abrigou-se após sair da casa dos irmãos.

ARTHUR: “Um dia, você vai achar que a vida é muito mais que o aconchego do lar. Sem mágoas, sem rancor, sem despedida, sem hesitar se o rumo vais tomar. À sua frente, um vasto horizonte já traz o lar ficando mais distante. E então você dirá: ‘livre! Enfim, senhor de mim; sem destino, sem lei, sem Deus. Livre! Enfim, senhor de mim; sem limite, sem norte. O mundo é meu, o mundo é meu, o mundo é meu!’.

Hanniery surge chorando em frente à vela que acendeu.

ARTHUR: Você vai desfrutar cada segundo, provar das mil delícias desse mundo tão como se o amanhã não existisse; tão como se a sorte, enfim, sorrisse. Suas noites serão longas e repletas de amigos e amores de ocasião. E então você dirá: ‘livre! Enfim, senhor de mim; sem destino, sem lei, sem Deus. Livre! Enfim, senhor de mim; sem limite, sem norte. O mundo é meu, o mundo é meu, o mundo é meu!’.

Leandro também chora, sozinho em seu quarto.

ARTHUR: Porém, de vez em quando, você vai lembrar dos bons conselhos de seu Pai que, sob chuva, sol ou tempestade; nas vilas, nas montanhas, nas cidades, nos becos, nas esquinas, nas tavernas teu nome irá chamar com voz tão terna. E quando te encontrar vai te abraçar, e sorrir de um jeito tão amável que você não vai mais resistir! E então você dirá: ‘livre, enfim! Agora, sim, no calor do abraço de (amanhece rapidamente e Arthur assusta-se, olhando para o alto) Deus! Livre, enfim! Agora, sim! Livre, enfim, do mundo! O amor venceu! Livre, enfim! Agora, sim, no calor do abraço de Deus! Livre, enfim! Agora, sim! Livre, enfim, do mundo! O amor venceu! O amor venceu! O amor venceu! O amor venceu!’”.

A câmera mostra Arthur de frente a um outdoor, sentado na calçada do estacionamento. 


Cena 8 (quarto de Hanniery)

(fundo musical: “Livre” – parte final)

A vela apaga-se ao amanhecer e aos últimos segundos de “Livre”. Hanniery é visto sobre a cama, deitado com a barriga para cima, com o seu celular encostado à cabeceira do móvel. Vê-se o aparelho auditivo em sua orelha direita. Por meio deste, ele ouve o telefone móvel. Ele muda o olhar, acreditando que irá receber notícias do irmão desaparecido.

HANNIERY: Arthur!

Apressadamente, o rapaz pega o celular e o desbloqueia, mas vê que há uma mensagem de áudio enviada por Jonathan. O estudante aciona o play.

JONATHAN: Bom dia, Hanniery. Tudo bem? Eu queria te pedir desculpas. A correria foi tanta nos últimos dias que eu nem me lembrei de mandar mensagem pra te perguntar: seus irmãos e você estão precisando de alguma ajuda? Assim que você acessar esse áudio, me responde, por favor. Abraços, meu querido.

O rapaz solta o celular e olha para cima, desesperado por não ter notícias do irmão e não saber o que responder a Jonathan.


Créditos finais

(fundo musical: “Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’) – “nasci pra isso, eu quero Te adorar/ minha vida eu coloco em Teu altar/ menos de mim/ mais de Ti”)


Músicas executadas neste episódio

“Regue fé, esperança, amor”

Compositor: PAULO CESAR BARUK

Intérpretes: IBAB CELEBRAÇÃO, LITO ATALAIA E PAULO CESAR BARUK


“No sangue e no fogo”

Compositores: FERNANDA BRUM E LIVINGSTHON FARIAS

Intérprete: FERNANDA BRUM


“Te busco”

Compositor: ALEXIS VELEZ

Intérprete: ALEX ZURDO


“Sopra em nós (Remix)”

Compositora: IRMÃ ANA PAULA, CMES

Intérpretes: DJ JP DA IMACULADA E IRMÃ ANA PAULA, CMES


“Livre”

Compositor: CLÊNIO ABREU

Intérpretes: CORAL UNIVERSITÁRIO DO UNASP – EC, VITRINE UNASP E BRUNNO RAMON


“Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)”

Compositores: GUSTAVO DANIEL ALVES GOMES, ISAAC MEDEIROS CABRAL, HIAGO RAMALHO VIANA E AZMAVETH CARNEIRO DA SILVA

Intérpretes: BIG ASHER, 2METRO, TRINDADE RECORDS, SHISO E LOVE FUNK 


locação

SÃO MIGUEL CENTER – SHOPPING DE AFOGADOS


Agradecimento especial

GERALDA REIS


Este produto audiovisual é independente e baseado nas ementas dos cursos de Libras Básico I (Erem Amaury de Medeiros – Gre Recife Sul) e Intermediário (Instituto Federal do Mato Grosso do Sul).

Os sinais descritos nesta obra de ficção estão sujeitos a alterações devido às variações geográficas.


© 2024


16/04/2025

TRÊS ESTAÇÕES | SEGUNDO EPISÓDIO | OUTONO


 Cena 1 (terraço)

LEANDRO: (levanta-se) Sinceramente, eu prefiro não tocar neste assunto.

HANNIERY: Mas eu quero que você me incomode com seus problemas. Se eu não puder te ajudar, compartilha comigo.

LEANDRO: O meu estresse é o de sempre. Não tenho novidades.

HANNIERY: E como o Arthur entra nessa história?

LEANDRO: As coisas estão difíceis. Bem que ele poderia procurar um emprego, pra ajudar nas despesas.

HANNIERY: O Arthur vai procurar, quando ele resolver o problema da documentação...

LEANDRO: Ah, Hanniery! Desde que ele morava aqui a gente já discutia esse assunto. A posição dele é muito confortável: você ganha dinheiro dos serviços de edição que você faz pra casa de festas. Eu recebo do meu seguro-desemprego, e por tempo limitado... Procurar emprego pra quê?

HANNIERY: Leandro, eu entendo você. Mas não vai te custar nada dar um voto de confiança ao Arthur.

LEANDRO: Pode ser... Não tem razão pra negar: eu sou uma pessoa difícil. Mas OK. Prometo que eu vou fazer um esforço pelo teu irmão.

HANNIERY: Nosso irmão.

LEANDRO: Que seja. (volta ao interior da casa)


Cena 2 (sala)

(fundo musical: “Regue fé, esperança, amor” – “quem ama não julga, quem ama não condena, quem ama não desiste, quem ama se empenha”)

O tempo está fechando, mas o vento agita as folhas pertencentes a árvores plantadas em frente a um muro. Hanniery reúne os irmãos na sala.

HANNIERY: Eu vou trocar de roupa, irei à biblioteca; mas antes a gente tem que fazer a estratégia.

ARTHUR: Estratégia de quê?

HANNIERY: Da apresentação do trabalho de Jonathan.

LEANDRO: Ah, o trabalho da música. Como é que vai ser?

HANNIERY: Eu pensei naquela música de Diante do Trono.

LEANDRO: “Preciso de Ti”?

HANNIERY: Não, “Relance”. Aquela música que gravaram no ano retrasado.

LEANDRO: Como é que era mesmo?

HANNIERY E LEANDRO: “Dia e noite, sem cessar; nossa voz subirá. Digno é o Cordeiro, digno é o Cordeiro”.

Enquanto o editor e o engenheiro sinalizam o refrão da canção, Arthur observa tudo sem se mexer.

LEANDRO: Mas eu estava com outra na cabeça: “Caminhando estou”.

HANNIERY: (empolgado) Essa também é boa!

HANNIERY E LEANDRO: “Eu vou viver restituição, eu vou viver restituição na terra que mana leite e mel. Eu vou pra Canaã”.

Arthur continua imóvel, como se não entendesse a alegria de Leandro e Hanniery. 

HANNIERY: E você, Arthur? Que sugestão você dá?

ARTHUR: Ah, toca o pagode do Waguinho e tá tudo certo.

HANNIERY: Perfeito! Vai ser essa!

LEANDRO: Mas... Hanniery, essa música é muito...

ARTHUR: Melhor. Chama a atenção do professor e desbanca os outros grupos.

HANNIERY: Depois você decide qual é o sinal que você vai usar pra se apresentar. Até hoje eu não sei se o teu sinal é... Esse... Ou esse! (Hanniery faz três diferentes configurações para a palavra “irmão” – que, unida à letra A, forma o sinal de “Arthur”)

ARTHUR: Sim, eu sou um pouco instável. Mudo de ideia a todo instante.

Leandro olha para Arthur com insegurança em relação às atitudes do irmão.


Cena 3 (quarto de Arthur) 

Arthur abre a cortina do seu quarto e vê o celular acendendo sobre a cama. Ele pega o aparelho e, sorridente, começa a digitar. Sem perceber, Leandro abre uma brecha da cortina e o observa por alguns segundos, fechando o tecido depois.

Quando Arthur termina de digitar, ele deixa o quarto abrindo a cortina novamente, mas sai pelo lado contrário ao que ele entrou. Declama uma música, animado com o que leu.

ARTHUR: “Você me dá sorte, meu amor. Você me dá sorte, meu amor. Você me dá sorte na vida”...

(música incidental: “Quiet tension/ fear suspense with a sense of tempo (1083431)”

Passados alguns segundos de sua saída, Leandro entra no quarto e pega o celular do irmão. Olha para trás, temendo ser visto, mas desbloqueia a tela deslizando o indicador em formato de L. Ele começa a ler a última mensagem de texto, que diz:

FOX: Te espero hoje, às 22h, pra você fazer o que mais entende. Vou até fechar o chat pra ninguém me chamar. Se faltar, vai ter que marcar hora. O link você já sabe. Beijos.

(obs.: a mensagem aparece na tela em formato de legenda, mas com as letras totalmente invertidas, com a finalidade de manter mistério sobre o teor da mensagem – que deixa Leandro furioso)

LEANDRO: Safado!

Leandro seleciona as mensagens e as encaminha para o seu próprio celular. Em seguida, ele apaga as suas próprias conversas recentes com Arthur.

(obs.: em nenhum momento o aparelho celular precisa aparecer, os personagens manuseiam-no no ar, fazendo os habituais movimentos de digitação)

O engenheiro também sai do quarto, devolvendo o celular à cama.


Cena 4 (biblioteca)

(fundo musical: “Eu te amo tanto (Frank Nuckless remix)” – introdução)

Enciclopédias da Língua Brasileira de Sinais são folheadas por Hanniery, que passa a treinar para a apresentação de Jonathan)


Cena 5 (shopping)

Leandro submete-se a uma nova entrevista, desta vez conduzida por uma moça chamada Flávia.

FLÁVIA: Obrigada por ter aceitado me encontrar aqui no shopping.

LEANDRO: Imagina, quem tem que agradecer sou eu.

FLÁVIA: A empreiteira ainda não acabou a reforma, por isso eu tive que vir. Mas você poderia ter enviado o currículo por e-mail, nós daríamos um feedback...

LEANDRO: Preferi arriscar presencialmente. Tudo bem que hoje em dia é tudo digital, mas nem tudo precisa ser impessoal.

FLÁVIA: Claro que não. Deixa eu ler aqui. Deixa eu ler aqui... Nossa! Que incrível! Pós-graduação na área de Geotecnia?

LEANDRO: Aham.

FLÁVIA: Maravilha... E nas experiências profissionais... Você exerceu a função de engenheiro responsável pelo anexo do Cais do Sertão.

LEANDRO: Até os turistas comentam daquela estrutura quando passam na frente do museu.

FLÁVIA: Aqui diz também... V Engenharia... Ai, meu Deus...

LEANDRO: Algum problema, Flávia?

FLÁVIA: Bom, Leandro... Seu currículo é invejável. Acontece que o nosso quadro de funcionários está completo. Em todo caso, nós já temos o seu e-mail e vamos te contactar se algum cargo ficar vago.

LEANDRO: Ninguém vai me ligar.

FLÁVIA: Claro que vamos. Por que eu mentiria?

LEANDRO: Flávia, se tem uma coisa que surdo entende é de expressão facial. E a sua mudou quando falou da empresa.

FLÁVIA: Leandro, por favor...

LEANDRO: Alguém daquele lugar falou mal de mim. E eu quero que você me diga o porquê.


(abertura)


Cena 6 (shopping)

Dá-se prosseguimento à cena anterior.

FLÁVIA: Melhor a gente não tocar neste assunto, Leandro...

LEANDRO: Pelo amor de Deus, Flávia, você quer evitar o quê? Tá na cara que você está constrangida.

FLÁVIA: Desculpa, eu deveria ter sido mais discreta.

LEANDRO: Não precisa se desculpar. Só me conta qual é o problema comigo. Toda vez que descobrem que eu trabalhei na V Engenharia me evitam. Parece que meu currículo é excelente, mas...

FLÁVIA: Quando descobrem que você trabalhou na maior empresa do ramo no país, te vetam.

LEANDRO: É... Você sabe a razão disso?

FLÁVIA: Não é ético dizer o que eu vou contar aqui, mas... Leandro, você quer um conselho?

LEANDRO: Conselho? Sobre o quê?

FLÁVIA: Tira essa experiência do seu currículo. Enquanto você se vincular à V Engenharia, você vai ser boicotado.

LEANDRO: Então eu tenho razão? O Vitor falou mal de mim?

FLÁVIA: Muito. Olha, eu não sei qual é o problema que ele tem com você, mas ele sugeriu que você não fosse contratado por nenhuma concorrente.

LEANDRO: Vocês aceitaram isso? Sem questionar?

FLÁVIA: A nossa empresa é relativamente nova, Leandro. Eu mesma cheguei há menos de seis meses. Por mais que sejamos competitivos, ninguém quer se comprometer com a líder do segmento.

LEANDRO: Flávia... (leva a mão à boca) Será que, se eu te contar o que aconteceu, qual a razão da minha briga com o Vitor...

FLÁVIA: A causa não importa, o que não queremos é enfrentar a consequência. Sei que vai parecer que você está muito aquém da sua capacidade, mas o melhor é você fingir que nunca pôs os pés lá.

(música incidental: “A somewhat creepy and sad atmosphere music box”)

LEANDRO: Ele me deu escolha?

FLÁVIA: Leandro, eu sinto muito.

LEANDRO: De qualquer jeito, Flávia, obrigado pela sua sinceridade. E não precisa ficar preocupada, o que a gente conversou fica aqui.


Cena 7 (área de serviço)

(fundo musical: “No sangue e no fogo” – “ziguezagueando, levado pelo vento, envolto em Shekinah eu vou. Eu vou”)

Aparecem árvores cujas folhas estão ventiladas e iluminadas pelo sol. Hanniery e Arthur estendem lençóis nos varais.

ARTHUR: Acabamos.

HANNIERY: Quando é que a nova identidade vai ficar pronta?

ARTHUR: Daqui a dez dias.

HANNIERY: A gente pode bater um papo?

ARTHUR: Sobre o trabalho que o professor mandou que a gente fizesse? Já tô treinando um pouquinho.

HANNIERY: Esse assunto também é urgente, mas eu queria conversar sobre você.

ARTHUR: O que foi que eu fiz?

HANNIERY: Nada. Precisava ter feito alguma coisa?

ARTHUR: Não, é que eu... Esquece.

HANNIERY: Arthur, eu tava me lembrando da história da tua ex. Você teve notícias?

ARTHUR: Graças a Deus, não. 

HANNIERY: Como é que você a conheceu?

ARTHUR: A Karla?

HANNIERY: É.

ARTHUR: Aonde você quer chegar com esse assunto?

HANNIERY: Arthur, querendo ou não, ela foi uma pessoa importante na sua vida. Vocês até dividiam o mesmo teto.

ARTHUR: Pior decisão da minha vida.

HANNIERY: E eu sinto que depois dela você se afastou.

ARTHUR: Pronto, tava demorando pra dizer que eu me afastei da igreja.

HANNIERY: Da igreja, do curso, da família e da noção.

ARTHUR: Tudo bem, eu vou te contar. Você sempre foi muito sincero comigo. Era bom que ninguém soubesse de nada.

HANNIERY: Por que vocês se escondiam?

ARTHUR: A nossa relação começou quando ela tava... Como é que eu posso dizer? Quando ela tava “presa”.

HANNIERY: Karla esteve na cadeia?

ARTHUR: Acho que eu não expliquei bem. Ela tava num relacionamento.

HANNIERY: Me dá um tempo pra entender... Você era amante de mulher casada?

ARTHUR: Era.

HANNIERY: E você me diz isso assim, com essa calma toda?

ARTHUR: Cara, eu não acordei um dia dizendo “ia ser bom eu ser o ‘urso’ de uma mulher”. Aconteceu.

HANNIERY: Agora entendi por que tanto mistério. Quem mais sabe disso?

ARTHUR: Ninguém, Hanniery.

HANNIERY: A essa altura, o ex-marido dela descobriu a verdade. Por isso que eles terminaram o casamento.

ARTHUR: Duvido que ele saiba.

HANNIERY: Claro que ele sabe, ele não iria acabar com o casamento se não desconfiasse de alguma coisa. 

ARTHUR: De que jeito? Quem tem romance em segredo procura ser discreto. Se amante não tem lar, pra que eu vou dar meu endereço?

HANNIERY: Cara, olha o livramento que você recebeu. Esse homem poderia ter te matado!

ARTHUR: Menos, Hanniery. Corno só anda armado com os dois chifres.

HANNIERY: Quando foi que você se transformou nesse homem sem responsabilidade? 

ARTHUR: Eu me apaixonei. E a gente não raciocina quando está apaixonado; começa a fazer o que o coração manda, mesmo ele sendo...

HANNIERY: Enganoso. Porque ele só vai te falar o que você quer que ele sinalize.

ARTHUR: Já aprendi a lição. Ela não era pra mim... Deixa eu ir agora, eu preciso tomar um banho. 

(fundo musical: “Eu vou vencer” – introdução)

Hanniery vê o irmão sair da área de serviço sem acreditar na revelação que Arthur acaba de fazer. A imagem vai escurecendo até dar lugar a um pôr-do-sol.


Cena 8 (banco da praça de alimentação)

(fundo musical: “Eu vou vencer”)

Leandro está sobre um banco, triste diante do resultado da entrevista. 

LEANDRO: “Sei que a vida não é fácil, é difícil o dia a dia... Muitas pedras e espinhos espalhados no caminho, intensas agonias! Mas eu sei que desse jeito é a vida de quem sonha; tem os altos e os baixos, tem as vaias e os aplausos; você perde, você ganha. Só se vale o que se tem nesse mundo de aparências: se você tiver sucesso tem amigos ao seu lado, tem nome em evidência. Mas se algo der errado – e é coisa que acontece – os amigos vão embora, e quem mais te admirava hoje já nem te conhece. Eu vou vencer, essa porta um dia vai ter que se abrir! Eu vou vencer, qualquer hora essa muralha vai cair! Eu vou vencer, nem que o mundo se levante eu vou lutar até o fim! Eu vou vencer, pela fé a sorte vai sorrir pra mim! Eu vou vencer, os meus inimigos vão ter que engolir! Eu vou vencer, Deus não fez a minha vida pra perder! Em ‘o’ nome de Jesus eu vou vencer!

Rapidamente, a praça de alimentação sai de cena e vê-se um fim de tarde, com o céu formando nuvens laranjas, e com fios de poste próximos à câmera. Volta-se, então, a Leandro.

LEANDRO: Só se vale o que se tem nesse mundo de aparência: se você tiver sucesso tem amigos ao seu lado, tem um nome em evidência. Mas se algo der errado – que é coisa que acontece – os amigos vão embora, e quem mais te admirava hoje já nem te conhece. Eu vou vencer, essa porta um dia vai ter que se abrir! Eu vou vencer, qualquer hora essa muralha vai cair! Eu vou vencer, nem que o mundo se levante eu vou lutar até o fim! Eu vou vencer, pela fé a sorte vai sorrir pra mim! Eu vou vencer, os meus inimigos vão ter que engolir! Eu vou vencer, Deus não fez a minha vida pra perder! Em ‘o’ nome de Jesus eu vou vencer! Eu vou vencer!”

Leandro abaixa a cabeça, e a câmera mostra que o banco no qual ele está fica em frente a um mural, cuja área tem grafitada as asas de um anjo.


Cena 9 (rua)

(fundo musical: “Só Jesus me guia (Amor perfeito)” – “e pensava estar sozinho, em solidão, Sua força emanava das alturas me estendendo a Sua mão”)

Apenas uma transição de cenas – sem a necessidade de legenda – que mostra nuvens carregadas movendo-se lentamente sobre um imóvel. 


Cena 10 (sala de estar)

Hanniery está vasculhando alguns papeis na gaveta do rack, em busca da fatura de energia elétrica.

HANNIERY: Onde eu coloquei essa conta, meu Deus? Ainda mais que a bandeira é verde!

No momento em que está mexendo os papeis, o estudante que um envelope debaixo das contas.

HANNIERY: Será que o Leandro pagou quando foi à última entrevista? Deve ter guardado aqui. (abre o envelope e encontra o currículo, que passa a ser lido)

Leandro volta pra casa e vê o irmão lendo o conteúdo do documento.

LEANDRO: O que você tá fazendo?

HANNIERY: (põe o papel debaixo do braço para comunicar-se em Libras) Procurando a conta da luz.

LEANDRO: (toma o currículo de Hanniery e também põe o papel debaixo do braço) Esqueceu? Eu paguei na sexta-feira. Guardei a fatura no meu quarto.

HANNIERY: Leandro, o que é isso?

Arthur passa ao lado da varanda, mas fica às escondidas para saber o que Leandro e Hanniery conversam.

LEANDRO: Meu currículo.

HANNIERY: Tô falando do que tá escrito. Ou melhor, do que você não escreveu.

LEANDRO: Hanniery, eu faço muitos cursos pra ampliar meu nível de conhecimento. Normal que eu esqueça um ou outro na hora de digitar.

HANNIERY: Muito diferente de omitir o teu último local de trabalho.

LEANDRO: A V Engenharia? Nem reparei.

HANNIERY: A última vez que você entregou uma cópia do currículo foi há quinze dias. Tempo suficiente pra retirar a empresa da lista de experiências profissionais.

LEANDRO: Por que eu faria isso? Eu seria o único prejudicado.

HANNIERY: Você fez, é uma certeza. Me explica o motivo.

LEANDRO: Você passou no concurso público da polícia? Não! Tá me interrogando por quê?

(fundo musical: “Muito obrigado (Júlio César Michueri remix)” – parte final)

Hanniery encara o engenheiro civil em silêncio. Arthur continua espiando os dois, sem nada entender.


CRÉDITOS FINAIS

(fundo musical: “Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)” – “Deus, já procurei isso em tantos lugares/ e vi que são falsas felicidades/ eu me perdi, mas eu sei que faz parte/ hoje eu só quero esse amor de verdade”)


Músicas executadas neste episódio

“Regue fé, esperança, amor”

Compositor: PAULO CESAR BARUK

Intérpretes: IBAB CELEBRAÇÃO, LITO ATALAIA E PAULO CESAR BARUK


“Eu te amo tanto (Frank Nuckless remix)”

Compositor e intérprete: ANTÔNIO LÁZARO SILVA (IRMÃO LÁZARO)


“Te busco”

Compositor: ALEXIS VELEZ

Intérprete: ALEX ZURDO


“No sangue e no fogo”

Compositores: FERNANDA BRUM E LIVINGSTHON FARIAS

Intérprete: FERNANDA BRUM


“Eu vou vencer”

Compositor: SÉRGIO MENDES DE SOUZA JÚNIOR

Intérprete: GERSON RUFINO


“Só Jesus me guia (Amor perfeito)”

Compositores: AGENIR PARREIRA E MARQUINHOS CARDOSO

Intérprete: LEONARDO SULLIVAN


“Muito obrigado (Júlio César Michueri remix)”

Compositor e intérprete: KIM 


“Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)”

Compositores: GUSTAVO DANIEL ALVES GOMES, ISAAC MEDEIROS CABRAL, HIAGO RAMALHO VIANA E AZMAVETH CARNEIRO DA SILVA

Intérpretes: BIG ASHER, 2METRO, TRINDADE RECORDS, SHISO E LOVE FUNK 


Citações musicais

“Relance (Digno é o Cordeiro)”

Compositores: ANA PAULA VALADÃO, ETHAN Parker E PAZ AGUAYO PARKER


“Caminhando estou”

Compositores: DAVI SACER E LUIZ ARCANJO 


“Sorte”

Compositores: CELSO FONSECA E RONALDO BASTOS


locações

BIBLIOTECA POPULAR DE AFOGADOS JORNALISTA RONILDO MAIA LEITE

SÃO MIGUEL CENTER – SHOPPING DE AFOGADOS


Agradecimento especial

GERALDA REIS


Este produto audiovisual é independente e baseado nas ementas dos cursos de Libras Básico I (Erem Amaury de Medeiros – Gre Recife Sul) e Intermediário (Instituto Federal do Mato Grosso do Sul).

Os sinais descritos nesta obra de ficção estão sujeitos a alterações devido às variações geográficas.


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09/04/2025

TRÊS ESTAÇÕES | PRIMEIRO EPISÓDIO | VERÃO

 Cena 1 (quarto de Hanniery/ banheiro/ rua)

Em silêncio, o vento balança as folhas das árvores pela manhã. Na sequência, Hanniery está dormindo virado para a parede. Ele gira o corpo na direção contrária e abre os olhos lentamente, vendo que o relógio indica que faltam quinze minutos para as sete da manhã. Desatento, o rapaz volta a dormir na posição em que estava. Subitamente, ao perceber que atrasar-se-ia para a aula, ele levanta-se desesperado, a ponto de mal conseguir livrar-se do lençol que o cobre.

(fundo musical: “Conclusões (Soul)”)

Com a introdução da música tocando, os primeiros sete segundos mostram uma sequência de imagens indicando a rotina de Hanniery a caminho do curso:

a água do chuveiro caindo;

Hanniery ensaboando o cabelo, puxando os fios para cima;

os dentes do estudante sendo escovados, com a câmera bastante próxima ao rosto do jovem;

a implantação, em sua orelha direita, de um aparelho;

a mão de Hanniery, sinalizando que deseja que um ônibus para o embarque do estudante.

Antes que Hanniery passe seu trajeto a pé fazendo a tradução da música para o português sinalizado, mais duas imagens completam a introdução: o ônibus da linha “Cavaleiro" passando em frente à Escola Municipal Santa Luzia, e os veículos passando em frente a um posto de gasolina.

HANNIERY: “Eu tenho a vida em minhas mãos, posso fazer dela o que quiser, posso brincar de amar alguém. Quem sabe até posso me enganar? Posso tirar minhas conclusões e resolver tudo que quiser; mas, se eu não tenho Jesus, num segundo o que eu tenho eu posso perder. ‘Jesus’: jamais esqueça esse nome! ‘Jesus’, nome mais doce que o mel. ‘Jesus’: somente por esse nome (‘Jesus’) se pode chegar ao céu. ‘Jesus’: jamais esqueça esse nome! ‘Jesus’, nome mais doce que o mel. ‘Jesus’: somente por esse nome (‘Jesus’) se pode chegar ao céu. Não importa que venham me censurar e dizer o que a vida tem pra me dar: são frases de efeito pra me enganar. O certo e o errado eu sei separar. Me interessa falar que Deus é amor, e dizer ‘aleluia, glória ao Senhor’. Jesus é meu rei, meu amigo e meu salvador. Jamais esqueça esse nome, nome mais doce que o mel! Somente por esse nome se pode chegar ao céu.

Ouve-se um piano tocando enquanto veículos passam em frente ao Terminal Integrado de Largo da Paz.

HANNIERY: Não importa que venham me censurar e dizer o que a vida tem pra me dar: são frases de efeito pra me enganar. O certo e o errado eu sei separar. Me interessa falar que Deus é amor, e dizer ‘aleluia, glória ao Senhor’. Jesus é meu rei, meu amigo e meu salvador. Jamais esqueça esse nome! ‘Jesus’, nome mais doce que o mel. ‘Jesus’: somente por esse nome (‘Jesus’) se pode chegar ao céu. ‘Jesus’: jamais esqueça esse nome! ‘Jesus’, nome mais doce que o mel. ‘Jesus’: somente por esse nome (‘Jesus’) se pode chegar ao céu.”

A câmera gira acompanhando o rosto de Hanniery, que tenta vocalizar a música que ouve pelo implante. Por fim, a Avenida Sul é vista do alto.


Cena 2 (empreiteira)

Leandro tem o seu rosto focalizado, olhando para baixo, e levanta-se assim que a secretária avisa:

SECRETÁRIA: Leandro Tavares, a Dra. Saldanha autorizou a sua entrada. 

Leandro agradece à secretária sorrindo discretamente, e sai da poltrona.

(Obs.: a câmera deve estar estática)

O engenheiro civil já aparece no escritório de Saldanha, submetendo-se a uma entrevista de emprego.

SALDANHA: Doutorado em Hidrotecnia na Universidade de Oxford? Leandro, eu confesso que não cheguei a ler o seu currículo na íntegra, a minha equipe que teve acesso a ele. Mas ela ficou muito impressionada.

LEANDRO: Obrigado.

SALDANHA: Aqui diz que, além do Inglês, você entende um pouco da Língua Brasileira de Sinais. Se for melhor pra você, podemos conversar neste idioma.

LEANDRO: Fique à vontade. Consigo entender o português porque leio os lábios dos meus interlocutores. Sou surdo oralizado.

SALDANHA: Sei lá, não acho que eu ia conseguir viver sem um dos sentidos.

LEANDRO: Tudo bem, a gente apura os outros. Meus irmãos também não sabiam como lidar com a surdez, principalmente porque estamos inseridos num mundo ouvinte.

SALDANHA: Você mora com eles?

LEANDRO: Com um deles, o Hanniery. Já o outro, Arthur... Tomou outro rumo na vida.


Cena 3 (apartamento de Karla)

(música incidental: “Horror suspense dark atmosphere (856618)”)

Vê-se um gaveteiro rosa ao fundo de um balde preto (a câmera vai descendo até mostrar o balde). Karla (sem mostrar o rosto) começa a jogar no interior do utensílio doméstico algumas peças de roupa pertencentes a Arthur. Ela usa uma garrafa de álcool 70° e derrama o líquido sobre os tecidos. Por último, ela risca o fósforo e joga o palito sobre as peças úmidas.


Cena 4 (empreiteira)

Saldanha e Leandro dão prosseguimento à conversa.

SALDANHA: Então, Leandro, aproveitando que você está aqui, eu queria que você me dissesse: qual é o seu objetivo em associar-se à nossa marca?

LEANDRO: Meu objetivo? (sorri)

(música incidental: “Cartoon sound that causes funny laughter (877048)”)

(obs.: nesse momento, Leandro deve abrir mão da língua oral para comunicar-se em Libras)

LETREIRO: Os verdadeiros objetivos de Leandro:

LEANDRO: (olhando para a câmera) Primeiro: comer. Segundo: pagar as contas. Terceiro: comer. Quarto: sair do aluguel. Quinto: comer. Sexto: comprar roupas novas. Sétimo: comer. Oitavo: deixar a fila do desemprego. Nono... Eu falei em comer?

A trama volta para a realidade.

LEANDRO: O setor, felizmente, não para de crescer. Acontece que expandir uma empresa mantendo-a aliada à contemporaneidade é, muitas vezes, entendido como um sinônimo de desfazer-se do passado.

SALDANHA: Você não acha que seja realmente isso?

LEANDRO: Não precisa ser. O passado precisa ser aprimorado, para mostrar que aprendemos alguma coisa com ele. E tudo que uma marca quer é criar tradições.

SALDANHA: Tem toda razão. Agora, a minha equipe levantou uma dúvida e eu gostaria de saná-la.

LEANDRO: Pode dizer, Saldanha.

SALDANHA: Por que desassociar-se da V Engenharia pra trabalhar na principal concorrente?

LEANDRO: (passa a sorrir menos, de maneira gradual) É... A necessidade de respirar novos ares, me lançar ao que desafia a minha capacidade profissional.

SALDANHA: Isto explica você ter tido uma posição de destaque na empresa, mas ficado apenas dezoito meses nela?

LEANDRO: (reticente) Sim, explica.

SALDANHA: Desculpe estranhar, é que normalmente funcionários de lá costumam ter uma experiência longa. Isso é tudo, Leandro. Como esta é a primeira fase da nossa seletiva, te ligaremos caso você seja um dos que se encaixam no nosso perfil. Boa tarde.

LEANDRO: Pra você também, Saldanha.


Cena 5 (escola)

Hanniery está prestes a deixar a sala após o término da aula, quando Jonathan surpreende-lhe.

JONATHAN: (o professor comunica-se oralmente) Hanniery, será que a gente pode conversar um minutinho?

HANNIERY: (consente com a cabeça)

A cena migra de posição para mostrar Hanniery sentando-se diante da presença de Jonathan na biblioteca.

JONATHAN: É o seguinte: daqui a três semanas vocês têm que apresentar o trabalho da disciplina, aquele em que vocês interpretarão uma música.

HANNIERY: Sim, eu sei. Os meus irmãos estão ensaiando comigo.

JONATHAN: O problema é esse: seus irmãos. O que está acontecendo pra eles faltarem tanto? 

HANNIERY: Leandro não veio porque foi a uma entrevista.

JONATHAN: Mas e o Arthur?

HANNIERY: Professor, eu não sei explicar. Arthur começou a namorar uma mulher e saiu de casa há um tempo. Você acredita que até hoje eu não conheço a moça?

JONATHAN: Bom, eu confesso que estou preocupado. O semestre vai ser encerrado no próximo dia 30, e eles não vêm justificando as ausências.

HANNIERY: Relaxe. Na hora que eu chegar em casa, conversar com o Leandro. E ajudo o Arthur, às vezes ele tem dificuldade de compreensão.

JONATHAN: Faz isso o quanto antes. Qualquer dúvida que vocês precisem tirar, a gente conversa pelo WhatsApp. Deixa eu ir agora, que daqui a pouco começa uma daquelas formações que a secretaria de educação oferece: palestra com o Professor Paulo Portela.

HANNIERY: Boa aula. (aperta a mão de Jonathan)

Assim que o professor sai, a expressão de satisfação dá lugar a de apreensão.


(Abertura)


Cena 6 (sala de estar)

(fundo musical: “Muito obrigado (Júlio César Michueri remix)” – “de repente tudo teve um sentido com Tua chegada ao meu coração”)

Uma transição de cenas mostra as plantas sendo iluminadas pelo sol. Em seguida, Hanniery está lendo um livro no sofá da sala de estar quando vê Leandro pendurar seu molho no chaveiro. 

HANNIERY: Leandro, como foi a entrevista de emprego?

LEANDRO: Igual às outras. Não me deram esperança de nada.

HANNIERY: Você não perde nada se tiver fé. Uma hora você vai ter a resposta que tanto quer receber.

LEANDRO: (senta-se no sofá) O problema não é a resposta, é o silêncio antes de recebê-la. (a campainha da casa é acionada e Hanniery levanta-se) O que foi?

HANNIERY: Tem alguém nos chamando lá fora. (Leandro segue Hanniery até a entrada do terraço)


Cena 7 (terraço)

Os dois que estavam na sala encontram Arthur do outro lado da grade.

HANNIERY: Arthur?

Leandro observa a ação da janela, ficando longe de Hanniery. 

ARTHUR: (com expressão chorosa) Hanniery, eu não tenho mais um lugar pra ficar. Posso voltar pra casa?

(fundo musical: “Uma carta (DJ Maya remix)” – “pode viajar o mundo, mas sei que vai voltar pro mesmo lugar”)

Hanniery consente com um leve sorriso, mas Leandro fecha a janela, visivelmente incomodado.


Cena 8 (sala de estar)

Agora os trigêmeos estão sentados no sofá,  com Arthur ao meio, Leandro à esquerda e Hanniery à direita. O recém-chegado bebe um copo d’água transparente.

ARTHUR: Obrigado. (entrega o copo a Leandro, que segura o objeto sem nada dizer)

HANNIERY: Tá mais calmo?

ARTHUR: Acho que sim.

HANNIERY: Agora conta: o que aconteceu?

ARTHUR: Minha namorada... Quer dizer, minha ex-namorada, surtou!

LEANDRO: Vocês terminaram? Por quê?

ARTHUR: Ela cismou que eu tô de caso com outra mulher.

LEANDRO: E não está?

ARTHUR: Lógico que não, Leandro; que absurdo!

HANNIERY: Mas por que ela achou que você fosse infiel?

ARTHUR: Um dia, a gente tinha ido à praia e eu encontrei a Cynthia, aquela menina da época do curso. Dei um beijo no rosto e pronto, de lá pra cá a Karla fez da minha vida um inferno! Sabem o que ela fez? Queimou meus documentos e minhas roupas!

HANNIERY: Meu Deus... Mas você desistiu dela?

ARTHUR: Hanniery, ela que desistiu de mim. Também não volto pra ela nem morto!

LEANDRO: O mistério continua. O namoro de vocês terminou e a gente não conheceu essa Karla.

HANNIERY: Talvez seja temporário. Ela vai pensar melhor. Só que você vai ter que se esforçar.

ARTHUR: Quem tá errada é ela, não sou eu! Imagina se eu vou rastejar por quem não me quer, ela não me achou no lixo!

HANNIERY: Já tentou fazer uma apresentação musical pra ela?

LEANDRO: Hanniery, eu não sei se você percebeu, mas ele não sabe cantar... Nenhum dos três.

HANNIERY: Faz em Libras. Funcionou com a minha ex.

ARTHUR: Se ex fosse uma coisa boa, não seria ex. Seria atual.

HANNIERY: Cara, tem que ter um jeito. Imagina vocês reconciliados, abraçados depois que você declamar a letra de “Lado a lado” da Cristina Mel.

(música incidental: “Funny lazy donkey (Hilarious song) (937200)”)

Leandro olha para o irmão absolutamente incrédulo.

HANNIERY: Apresenta Fernanda Brum pra ela, mostra que você é intenso...

Arthur olha para Leandro, também sem acreditar nas palavras de Hanniery. 

LEANDRO: Não olhem pra mim. A única coisa que eu sei de Romantismo é que ela é uma escola literária.

ARTHUR: Mas, se eu estiver incomodando, eu posso dormir na casa de um amigo.

HANNIERY: Teu amigo é Jesus, e depois a gente. Você pode ficar aqui o tempo que quiser.

LEANDRO: E os teus documentos, que a louca queimou?

ARTHUR: Vou agendar pra tirar a segunda via da identidade. Leandro, você pode me levar?

LEANDRO: Vendi o carro.

ARTHUR: O quê? Por que você fez isso?

LEANDRO: Nunca vi desempregado pagar IPVA. (levanta-se e sai segurando o copo)

HANNIERY: Fica tranquilo. Você pode usar meu cartão de passagem depois que fizer o agendamento. 

ARTHUR: Obrigado, Hanniery. Ah, eu também vou precisar das tuas roupas emprestadas.

HANNIERY: Meu guarda-roupa tá aberto, pode pegar as camisas que você quiser.

ARTHUR: Camisetas. Você acha que eu vou cobrir meus braços dentro desse forno que é Pernambuco? Deus me defenda!

Hanniery ri da piada feita por Arthur.


Cena 9 (externa)

(fundo musical: “Sopra em nós (Remix)” – “ó vento impetuoso, vem neste lugar, fortalece o que é fraco com teu poder”)

Nenhum personagem aparece nesta cena, apenas é mostrado o vento veranil sobre as folhas das árvores.

LETREIRO: Dias depois...


Cena 10 (terraço)

Hanniery está sentado numa das cadeiras do terraço, sentindo um pouco de vento com os olhos fechados. Leandro também sai para o terraço, e Hanniery abre os olhos.

LEANDRO: Quatro horas e esse calor não passa...

HANNIERY: Tá quente demais. Daqui a pouco eu vou parar de usar margarina.

LEANDRO: Muito cara?

HANNIERY: Porque pode fritar o ovo no asfalto!

LEANDRO: Pensei que você estivesse estudando lá dentro. 

HANNIERY: Eu tava, mas desliguei o ventilador por causa da conta de luz. Fiquei na entrada.

LEANDRO: Cadê o Arthur?

HANNIERY: Conseguiu agendar pra hoje de tarde. Vai ser atendido às cinco horas.

LEANDRO: Que bom pra ele. Hoje ele teve um pretexto pra levantar mais tarde.

HANNIERY: (o semblante fica sério) Por que esse comentário?

LEANDRO: Por nada, é que eu já me acostumei. Arthur nunca gostou de acordar cedo.

HANNIERY: Não tô me referindo a isso. Você acha que eu não reparei?

(passa a mão na parte de trás da cabeça) LEANDRO: Hanniery, eu não estou entendendo.

HANNIERY: Alguma coisa tem incomodado você desde que o Arthur voltou pra casa. Quer me contar o que tá acontecendo?

(fundo musical: “Regue fé, esperança, amor” – parte final)

Leandro encara Hanniery com seriedade, sentindo-se tenso.


Créditos finais

(fundo musical: “Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)” – “Espírito, espírito que desce como fogo/ como em Pentecostes, Deus, faça algo novo/ presença poderosa eu sinto dentro do meu corpo/ ó majestade santa, eu me prostro, cubro meu rosto”)


Músicas executadas neste episódio

“Conclusões (Soul)”

Compositor e intérprete: Sergio Lopes


“Te busco”

Compositor: Alexis Velez

Intérprete: Alex Zurdo


“Muito obrigado (Júlio César Michueri remix)”

Compositor e intérprete: Kim


“Uma carta (DJ Maya remix)”

Compositor e intérprete: Izaac Santos


“Sopra em nós (Remix)”

Compositora: Irmã Ana Paula, CMES

Intérpretes: DJ JP da Imaculada e Irmã Ana Paula, CMES


“Regue fé, esperança, amor”

Compositor: Paulo Cesar Baruk

Intérpretes: Ibab Celebração, Lito Atalaia e Paulo Cesar Baruk


“Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)”

Compositores: Gustavo Daniel Alves Gomes, Isaac Medeiros Cabral, Hiago Ramalho Viana e Azmaveth Carneiro da Silva

Intérpretes: Big Asher, 2Metro, Trindade Records, Shiso e Love Funk


Locações

Biblioteca Popular de Afogados Jornalista Ronildo Maia Leite

Erem Amaury de Medeiros


Este produto audiovisual é independente e baseado nas ementas dos cursos de Libras Básico I (Erem Amaury de Medeiros – Gre Recife Sul) e Intermediário (Instituto Federal do Mato Grosso do Sul).

Os sinais descritos nesta obra de ficção estão sujeitos a alterações devido às variações geográficas.


©2024


02/04/2025

TRÊS ESTAÇÕES | TEASER



 (fundo musical: “Só Jesus me guia (Amor perfeito)” – introdução)

ARTHUR: Eu sempre vejo o melhor em tudo. As pessoas reclamam, desistem no primeiro problema que aparece; mas eu não. Onde os outros veem espinhos, eu enxergo flores.

LETREIRO: ARTHUR (escrito de rosa na parte inferior direita da tela)


(fundo musical: “Muito obrigado (Júlio César Michueri remix)” – introdução)

HANNIERY: A vida é boa demais pra gente perder tempo reclamando. A maioria acha que o milagre só existe quando algo muito extraordinário acontece, mas ele está ao nosso redor, naquilo que a gente acha banal.

LETREIRO: HANNIERY (escrito de amarelo na parte inferior central da tela)


(fundo musical: “No sangue e no fogo” – introdução)

LEANDRO: As pessoas que convivem comigo são muito otimistas, mas eu lido com a realidade e sei que ela não é tão fácil. Pelo contrário: quando ela quer ser cruel, não tem pena de ninguém. De mim principalmente.

LETREIRO: LEANDRO (escrito de marrom na parte inferior esquerda da tela)


LEGENDA (ACOMPANHADA DE NARRAÇÃO): (escrita de branco) Não importa se você gosta das luzes do verão, das cores da primavera ou dos ventos do outono. Cedo ou tarde, você vai ter que enfrentar o inverno. 


(fundo musical: “Regue fé, esperança, amor” – “Então regue fé, esperança, amor; mais gentileza, por favor. Que em meio às guerras se levante a poderosa voz do amor”)

Leandro, Hanniery e Arthur aparecem juntos, nesta mesma ordem. O primeiro aparece feliz, sem sorrir; o segundo mostra o seu sorriso; o terceiro mantém-se sério e aparentemente irritado.

LETREIRO: DIA 26... “TRÊS ESTAÇÕES” (a data fica na parte central da tela, escrita em azul; o título da série fica também ao centro, cobrindo a imagem dos rapazes que fica embaçada)