-Eu sabia.
Sempre desconfiei dessa amizade que existia entre vocês dois. Eu podia ter
evitado isso, impedido vocês dois de saírem juntos, mas preferi ficar calada.
-Mãe, isso é
um engano.
-Você está
proibida de falar, Isabela! Proibida! Minha conversa é com esse rapaz.
-Conversa? A
senhora me amarra numa cadeira de plástico, pede ajuda da vizinha e põe um pen drive
maligno pra cantar e ainda diz que quer conversar?
-Você amarrou
o Caio?
-Pelo menos
não amordacei. Se bem que era divertido ouvir os gritos dele.
-Mãe, eu quero
que a senhora me escute. Não...
-Não precisa
se preocupar. Eu vou arcar com o prejuízo.
-Caio, para de
falar como se eu não estivesse aqui.
-Bom, é que
você não está em condições de falar.
-Eu posso
responder pela minha vida, sim, senhor. Desculpe, mas esse assunto eu preciso resolver
só com a minha mãe- vira-se para dona Cris- A senhora está completamente
enganada. Caio é uma boa pessoa.
-Acredito que
seja realmente bom. Pra grelhar, pra assar, pra fritar, pra levar uma surra de
rolo!
-Chega disso!
Ele já confessou que é o pai. Agora vocês têm que resolver essa situação, pro
bem da criança que vai nascer.
-Thaís!-
Isabela fica perplexa pela amiga que também mente.
-O que é que vocês
vão resolver disso?
-Esse palerma
vai pagar pelo que fez com a minha filha. Você só entra aqui em casa com uma
caixa da Aliança Joias pra falar com a minha filha, e sendo supervisionado por
mim.
-Feito-
garante Caio.
-Deixa de
embarcar nessa viagem. Todo mundo está usando tóxico aqui em casa, é? Eu vou
cuidar do meu filho sozinha. O Caio não é...
-O cara
perfeito, eu sei- interrompe o musicista padeiro- Mas eu quero consertar o que
eu fiz. Não vou te deixar numa hora dessa. A gente tem que ficar junto pra
cuidar do... Do nosso bebê.
-Se você não
sumir da minha frente em cinco segundos, eu vou te matar.
-Sei o que
estou fazendo, Isabela. Te acalma- cochicha.
-Você só está
me deixando mais nervosa. Não é o pai do meu filho.
-O pai do seu
filho morreu na minha frente, no meio de um protesto. Como é que você vai
cuidar de uma criança se você não tem maturidade pra cuidar dos seus
personagens? Deixa comigo, que eu seguro a bomba!- volta a falar alto- Agora,
será que a senhora pode desatar esses nós?
-Claro, meu
querido genro- a megera muda da água pro vinho- Seja bem-vindo à nossa família.
-Eu não vou
compactuar com essa palhaçada! Vou pro meu quarto escrever um novo romance: “O
suicídio da iburense”.
-Vá. Depois eu
te levo umas revistas que vêm uns modelos de vestido de noiva.
-Pra mim deu!-
vai ao quarto e bate a porta.
-Olha, eu
também tenho que ir, porque meu curso de enfermagem é uma loucura. Só não é
pior que a vida sentimental da Isabela. Até mais, gente.
-Tchau, Thaís-
dizem dona Cris e Caio.
-Bom, agora
que todos foram embora, você já pode ir pra casa.
-Posso mesmo?
Então, tchau!
-Mas olha
aqui, garoto. Você nem pense em escapar das suas responsabilidades, porque eu
te acho onde você estiver e algemo você com a Isabela, entendeu?
-Entendi-
engole seco- Com licença.
Caio volta pra
casa e encontra a chave do quarto do pai na porta que ele tentou derrubar.
Parece que está fechada e a destranca.
-Boa noite,
pai. Se estiver aí...
Estava era
desmaiado ainda, isso sim!
XXXXX
No dia
seguinte, houve um café da manhã feito por Caio. Arrumou a mesa e esperou seu
pai acordar.
-Bom dia.
-Bom dia. Todo
doído.
-O que foi que
houve.
-Tentei forçar
a porta e acabei me estrepando. Que cara é essa, meu filho?
-Pai, eu vou
casar.
-O quê?
-Quero dizer,
ficar noivo. Da Isabela. Ela está grávida, então...
-Grávida de
quem? De você que não é.
-Não, o filho
não é meu.
-E o pai dessa
criança, por onde anda?
-Neste
momento, no IML. O pai do bebê morreu numa explosão.
-Calma, me
explica essa história direito. Se o pai do filho de Isabela morreu,o que você
tem a ver com isso? Por que precisa casar?
-Porque eu não
posso deixar a Bella sozinha numa hora dessas. E eu disse a mãe dela que era o
pai.
-Sabe que você
não tem maturidade pra assumir um compromisso desse?
-A Bella
também não. E é nela que estou pensando.
-Cada vez mais
eu me convenço de que você está perdidamente apaixonado por essa moça e não seu
conta.
-Por que é tão
difícil de acreditar que existe amizade entre homem e mulher?
-Talvez porque
assumir o filho dos outros seja passar dos limites! Caio, raciocina! Você está
se metendo num jogo muito perigoso. Está se deixando acuar por uma moça que
você sequer sabia que tinha um namorado, muito menos que estava grávida. Ela
não te contou nada, não é? Fui eu quem teve que revelar a verdade! E sou eu
mesmo que vou desmascarar essa mulher, na frente da mãe dela.
-O senhor não
vai fazer nada!
-Não me
impeça, Caio.
-Não, pai!
-Por favor, você
não vai quer enfrentar um homem que tomou três comprimidos de Dorflex pra se
levantar, não é?
-O senhor não
vai abrir a boca. Eu vou ajudar a Bella e o senhor vai ficar calado, na sua. E
tem mais uma coisa: hoje à noite, eu vou tornar o namoro com a Isabela oficial.
-Desista de
pensar que eu vou compactuar com essa palhaçada!
-A mãe dela
disse que vai oferecer um jantar. Toda a comida é da Socorro Festas. Mandou
chamar o senhor.
-Comida de
graça? E aquela coroa enxuta? Estou mais do que dentro.
XXXXX
Thaís tenta
convencer a amiga a participar da farsa, mas esta é irredutível. Ambas estão no
quarto.
-Por que é que
você confirmou que o Caio era pai do meu bebê? Você ficou maluca?
-Bella, pensa!
O pai do seu filho é o Nicholas. Ou melhor, era o Nicholas. Só que ele foi
pelos ares. É melhor que outra pessoa te ajude a cuidar da criança.
-Eu não posso
fazer isso com o Caio.
-Mas vai
fazer. Até porque ele quer isso. Ele tomou essa atitude porque te ama.
-Será que você
não entende que existe amizade entre homem e mulher?
-Existe. Mas
sinceramente, não acredito que seja esse o caso. Agora se arruma que seu noivo
está vindo pra cá.
-Você não me
testa, Thaís! Não me testa!
-Eu vou ver a
quantas anda a comida. Te ajeita!
XXXXX
Leoni e Caio
chegam à casa de Cristina e Isabela. Os dois estão vestidos com traje de gala. Ótimo,
porque essa comemoração será inesquecível.
-Bem-vindos- Mas
vocês estão muito arrumados- admira-os Cristina.
-É. A ocasião
pede- fala Caio, com um certo desconforto.
-Que foi? Parece
que está sentindo dores.
-Fiquei muito
tempo amarrado.
-Amarrado? Que
história é essa?
-Nada, pai. Deleta.
-Mas eu acho que
está faltando alguma coisa... – repara dona Cris.
-Chegou o que
faltava: a Sidra Cereser!- brada Taciana, com a peruca da Britney!
-Mas que visual
é esse, minha filha?- estranha Leoni.
-Tem que
caprichar porque hoje é dia de comer de graça. Cadê a namorada do Caio?
Isabela vem
vestida de mendiga, mesmo que Thaís a puxe para dentro do quarto. O que ela faz
vestida assim? Por que guarda o figurino inusitado? Hoje, no Globo Repórter.
-Minha filha,
o que significa isso?
-Eu disse que
não ia compactuar com esse circo. Eu falei, não foi? Então pronto. Agora me
deixa voltar pro quarto.
-Espera-
segura, obrigando a ficar na sala- O Caio tem uma coisa pra falar.
-Eu também. Cara,
desiste, você não precisa se prestar a isso.
-Nem você. Parece
até a bilheteira da “Maria Esperança”. Que roupa é essa?
-Caio, estou
falando sério. Eu consigo criar meu filho. Não vou envolver uma criança nessa
sujeira.
-Eu não vou
deixar você sozinha. Se é de um pai que seu filho precisa, eu vou dar-
aproxima-se dela e fala em voz baixa.
-Vocês não têm
o direito de mandar em mim.
-O Nicholas
morreu. E vai te fazer falta. Mais ainda pro bebê.
-Que falta?
Ele seria capaz de usar Barla em vez de talco comum.
-Bom, sei que
os pombinhos querem ter seus minutos a sós, mas... Caio, acho que você veio
pedir a mão da minha Bella.
-Claro. Dona
Cris, queria saber se...
-Está
concedido!
-Mãe!
-Sua honra
está em jogo, e você ainda acha que eu vou fazer doce pro filho do padeiro?
Isabela decide
estourar a Sidra e bebe desenfreadamente.
-Vou precisar,
que a noite vai ser longa.
-Bella, eu
trouxe isso daqui pra você- um anel da Rommanel.
-Sim, o que
tem?
-Eu quero
saber se você quer ser... A minha... Gente, como isso é difícil!- Leoni dá um
murro nas costas do filho, pra ver se “desentala”!- Bella, quer ser minha
noiva?
-Que jeito,
não?
-Confia em
mim. Eu vou cuidar de você. A gente vai ensinar à essa criança músicas boas,
receitas de café, pontos de paçocas... O mundo vai ser lindo pra ele porque nós
vamos torná-lo bonito.
As lágrimas de
Bella vêm aos olhos. Como a de todos.
-Gente, isso
foi lindo. Só não é mais do que eu...
-E então,
Bella? Quer ser minha noiva?
-Aceito, sim.
Quero ser sua noiva, Caio. Ainda bem que eu não me pintei, senão minha cara ia
ficar uma tragédia.
-Mas que
bexiga de casal é esse que não se beija?- observa Taciana, que pressiona os
dois a trocarem um beijo. Quando Caio e Bella se aproximam, apreensivos, a
cigarra toca. Não vou chamar de “campainha”: é cigarra!
-Eu não chamei
mais ninguém além da família, juro!- promete dona Cris.
-Bella!-
esfumaçado ainda, chama pela moça Nicholas. Rasgado pela explosão da viatura.
-Cafachorro, é
você?- Bella fica besta com essa nova agora.
-Eu vim pra te
avisar que eu vou assumir o nosso filho!
-É o quê?- Leoni
fica atonto com a aparição do “fantasma”.
Isabela e
Cristina não têm saída, a não ser desmaiar de susto. A primeira cai nos braços
de Caio e a segunda no chão.
-Vendo gente
morta todo o tempo- Taciana lembra a fala de Haley Joel Osment.
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