-Eu me recuso a acreditar que você
me propôs isso. Mas também, não é, o que esperar de um cafajeste como você?
-Meritíssima, me escute... Se a
senhorita pensa que eu não cumpro com as minhas promessas, está enganada. Eu
sou um canalha de palavra.
-Não quero ouvir mais nada- abre
a porta do carro novamente, mas é impedida por Coelho.
-Espera! Eu ainda não acabei de
falar.
-Mas eu já! Aliás, eu não falo
com protozoários como você. Me deixa passar.
-Não! Você pode até não
acreditar, mas eu vou provar que posso desembolsar esse valor e te dar.
-Eu não estou à venda!
-Ah, por favor! Todo mundo tem
seu preço, Meritíssima...
-Aí é que você se engana. Você,
por exemplo, não vale o chão que pisa.
-Dara, Dara, Dara... Se você
soubesse o que você é capaz de despertar nos homens, não perderia tanto tempo
sendo exemplo de dignidade. Se você for boazinha comigo, eu posso até aumentar
o valor da recompensa...
-Mais uma palavra, Coelho, e você
vai ter que subornar o diretor do presídio. Por enquanto, trate de contar os
trocados pra pagar a gorda indenização que Michele vai cobrar.
-Isso é antiético, sabia? Você
está praticamente me dizendo que vai dar ganho de causa àquela golpista.
-Como se fosse difícil algum ser
humano normal perceber que você não presta. Se você vier atrás de mim, eu
processo você por assédio também. E ainda posso jogar você na cadeia por peita!
-Peito? Mas eu quero o corpo
todo!
-Peita, imbecil!- puxa a porta do
carro e volta pra casa.
-Conseguiu sentir ódio por mim...
Isso deixa a brincadeira ainda mais divertida!
/////
Numa bela noite, Dara volta pra
casa e encontra uma mesa preparada pelo seu hóspede.
-Antonio? Quem te ajudou a fazer
a mesa?
-Pra ser bem sincero, o Corpo de
Bombeiros.
-Como assim, Antonio?
-Tentei assar um hambúrguer.
Incendiei a cozinha.
-Não tem problema, meu querido. A
gente pede uma pizza. O importante é que você fez esse jantar lindo pra gente-
só tem o pão e a salada- E ainda mais à luz de velas.
-Dara, é sobre isso que eu queria
falar.
-O que você tem pra me dizer?-
fica com a voz trêmula pensando que virá uma declaração.
-Acendi essas velas... Quer
dizer, pedi pros bombeiros acenderem porque você se esqueceu de pagar a conta.
-Ah, é verdade, eu tava tão
mergulhada nesses casos que eu esqueci.
-Mas não se preocupe, eu dei meu
jeito de salvar a noite- tira do bolso um chocolate.
-Sonho de Valsa! Eu quero! Ai!-
exprimindo um grito desses, a gente até entende por que Coelho quer tanto essa
mulher.
-É todo seu. Mas não só ele. O
meu reconhecimento, por tudo que você tem feito por mim.
-Vamos dividir? É muito chato
comer sozinha.
-Pode ser- diz Antonio,
encabulado.
Lentamente, Dara vai desembrulhando
o chocolate e fazendo o engenheiro mastigar lentamente. Depois, põe a outra
metade em seus próprios lábios quando "Careless Whisper" começa a
tocar na rua.
-É o rapaz que vende macaxeira
numa carroça toda noite. O marketing dele é bom, não acha?
-Sublime!- responde Antonio, se
referindo a outra coisa...
-A gente poderia aproveitar a
oportunidade, Antonio.
-Pra quê?- o tarado cego está com
rojões na mão.
Dara puxa-o para uma dança ao som
da canção oitentista. Inicialmente, Antonio sequer põe a mão na juíza, mas logo
ela o toma e faz com que ele coloque cuidadosa e respeitosamente as mãos em sua
cintura, enquanto ela leva as suas ao pescoço do rapaz. Tudo se encaminha para
um beijo quando Dara diz...
-Vou limpar a cozinha pra fazer
um bolo.
É, Antonio, não foi dessa vez.
Acho que ela quer fazer um jogo contigo, garoto!
/////
Dr. Wilson é convocado para uma
reunião emergencial na sala de Coelho.
-Vim o mais rápido que pude. O
que houve de tão grave?
-Sente-se, Dr. Wilson. Eu preciso
de um favor.
-O senhor me pedindo um favor?
-Tem razão. Eu mando nessa
bagaça! Quero que você descubra o número da conta que Dara Lira tem no banco.
-A juíza responsável pelo seu
processo? Mas por quê?
-Pretendo comprá-la, é claro. Mas
não por conta do processo. É que eu quero ver se ela vai se manter íntegra
diante de tanto dinheiro que eu pretendo dar.
-Dr. Coelho, eu não posso
concordar com isso. É um ultraje!
-Ultraje, pra mim, é aquele que
canta "pelado, pelado, nu com a mão no bolso". Dr. Wilson, eu não
estou pedindo sua opinião profissional.
-Mas eu vou dar mesmo assim! Se
essa história vai parar nos jornais, a sua carreira estará destruída. Eu tenho
o direito de abrir seus olhos, Coelho!
-Nessa vida, você só tem
dois direitos: o direito de não ter direito e o direito de não reclamar do
dinheiro que tem. Você, além da minha mulher, sabe as minhas senhas de banco.
Quero que você se certifique de qual é a conta de Dara e transfira um milhão de
cruzeiros do meu dinheiro.
-Bom, eu posso demorar
um tempo pra fazer a operação.
-Quando fizer, não avise
nada a ela. E nada de comentar isso com Thaynara.
-O que pretende com essa
armação?
-Forrar a cama da
Meritíssima com um milhão de cruzeiros. E como diria... Não faço a menor ideia
de quem... "Quem boa cama faz, nela dorme"!
/////
-Seu cartão foi recusado-
a vendedora do Atacado Dos presentes avisa à Thaynara.
-Como assim?
-Parece que seu marido
não pagou a fatura.
-Aposto que deve ter
comprado algum presente caro pra uma das amantes. Mas não se preocupe, que vai
ser hoje!
-É hoje o quê?
-Que eu vou rodar a
baiana, a nordestina, a brasileira, o que for! Não aguento mais essas cenas em
que estou fazendo compras e sinto o cheiro da gaia! Sem falar que "Careless
Whisper" está tocando há dois capítulos seguidos. Vou reclamar com o autor
da novela e exigir que ele aumente meu papel, porque senão eu vou revelar para
todo o Brasil que ele já teve um caso tórrido com uma tal de Ariela!- sai da
loja, enfurecida.
Não tive caso com Ariela
nenhuma. Isso é fruto da imaginação dos espectadores de "Tempo Perdido",
outra trama que escrevi. Não é porque "Mentiras Escancaradas" é
baseada em pessoas reais que todas são. Vou chamar meu advogado, se bem que...
/////
...Eu poderia contatar Dr. Wilson, já que é o
único advogado que conheço. Só não sei onde fica o escritório dele, mas vamos seguir
Thaynara, que apareceu por lá com um vestido preto curto (até para os padrões
dos anos 90) com umas ombreiras toscas e botas. Qualquer hora dessas, ela
aparece cantando lambada no "Globo de Ouro"!
Mas vamos partir do pressuposto
de que você não faz a menor ideia do que estou falando por não saber o que se
passava na década de ambientação, atendo-se somente à estória. Muito bem:
Thaynara vem com esse figurino provocante e entra na sala do Dr. Wilson.
-Será que o senhor tem um tempinho?
-Claro, senhora. Fique à vontade.
-Hum, tirou as palavras da minha
boca- e desabotoa alguns botões. Começa a tocar qualquer coisa do Kenny G na
hora porque não vamos repetir canções novamente.
-O que... – Dr. Wilson solta um
pigarro- O que a senhora deseja de mim, Dona Thaynara?
-Coisa simples: seu corpo em
pelo- abraça o advogado.
-Contenha-se, Dona Thaynara! Seu
marido é meu cliente!
-Seu excesso de ética é bem
instigante. Por isso que eu vim te procurar.
-O que a senhora quer de mim?
-Sabe que se essa ombreira bater
no seu olho, eu te cego, não sabe? Então, desembucha! Fala de uma vez por que
meu cartão de crédito foi recusado!
-As máquinas da Cielo ainda não
existem, como quer que a tecnologia atue a seu favor?
-Dr. Wilson, Dr. Wilson... Você
convive mais com o Felipe do que eu, que sou a esposa. Por que não pagou as
contas? Meu marido estampou a capa da Forbes do mês passado, por causa dos
lucros exorbitantes que a Play Pause vem tendo no primeiro semestre de
1990. O que aconteceu? O que Felipe está fazendo com o dinheiro? Se você me
contar, vai ganhar uma bela recompensa: eu, embrulhada pra presente. Ou melhor:
sem embrulho nenhum!
-Não vou compactuar com essa
baixaria! Trate de se conter, porque eu ajo com precisa honestidade. Não
preciso que a senhora tente me comprar com favores íntimos...
-Então, é melhor abrir a boca
pelo bem da sua integridade moral! E física também!- segura o pescoço do
advogado- Fala de uma vez o que é que Felipe anda aprontando!
-O Dr. Coelho quer comprar a
juíza! Me pediu pra colocar um milhão de cruzeiros na conta dela!
-Felipe pediu isso pro senhor?-
Thaynara se mostra incrédula.
-Na verdade,exigiu por ser meu
cliente.
-Mas... – solta o pescoço do
advogado- Felipe está pagando muito pela mudança de veredicto da juíza.
-Dara não é mais inimiga
declarada do seu marido, e sim objeto de desejo dele.
-E de quem ela não é, não é
mesmo? Mas espera aí... Você tá me dizendo que... A filha da mãe tá tendo um
caso com Felipe?
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