17/07/2016

ROMANCES DE ESTAÇÃO/ CAPÍTULO 17: EU TENHO UMA FACA NO BRILHO DOS OLHOS



-O Max não abusou de você como alega, não é?
-Não. Tudo que ele fez comigo foi porque ele quis, e eu quis também, mas o que ele fez depois... Isso eu não perdoo.
-Está falando do aborto que ele te incitou a fazer?
-Eu tive medo de perder o Max. Ao mesmo tempo, eu vi ele indo embora, sem me dizer se ia voltar. Como é que eu ia criar um bebê sozinha? Meu pai não ia deixar. Foi aí que ele descobriu e me ameaçou, dizendo que eu ia sair de casa se não fizesse o que ele mandou.
-Adiantou de alguma coisa? Você perdeu o Max e certamente vai perder o respeito do seu pai, porque ele não vai tolerar ver você se expondo dessa maneira.
-Prefiro o ódio dos dois do que a indiferença que eles me fizeram sentir.
-Só me diz uma coisa, Marina: você queria mesmo esse filho? Responde.
-Queria, sim- chora- Eu sei que não ia ser fácil cuidar dele, mas eu queria.
-Bom, eu sou pai, Marina. Mesmo meu filho não sendo a melhor pessoa do mundo, eu vou lutar pra livrá-lo da cadeia. Você não pode ir contra um amor de pai. Afinal, é o que você sente por uma vida que nem chegou ao mundo. Pode gastar toda a sua munição de tramoias. Não vai ser uma punição ao Max, nem ao seu pai, que vai trazer aquilo que você perdeu. De coração, minha filha, eu sinto muito.
Breno abre a porta e sai da diretoria, deixando Thales entrar e levantar a cabeça de Marina, que não se contém.
-Como é que você conseguiu esconder isso tudo, Marina?
-Eu não queria nada disso, Thales, mas eu não aguento mais. Eu não aguento mais- abraça o colega de turma, e Thales não consegue condená-la por seus atos.

Mais uma manhã. Laura acorda para tomar um banho e se arrumar antes de ir à clínica pegar o resultado do teste de HIV. Ao se levantar da cama, vê que há um bilhete escrito pelo marido, que não está mais no apartamento onde mora a família.
-Finalmente me dei conta de que não sou nada nessa família. Nem minha mulher nem minhas filhas me respeitam mais. Tudo que eu fiz pra sobrevivência da minha família deu lugar às mais abjetas lembranças. Mas sei dos riscos que meu casamento correria se o resultado do exame admitisse que eu era mesmo soropositivo. Preferi não ver seu rosto de decepção quando soubesse, Laura. A agonia de vocês acabou, enquanto a minha continuará comigo, mas não por muito tempo. Dê um beijo nas minhas filhas por mim e diga a elas que não se preocupem. Afinal, quem vai sentir falta de uma lembrança triste? Na gaveta, a última decepção: o meu teste.
Laura corre para ler o resultado, ficando sem reação diante do resultado positivo que o bilhete anteviu.

Em meio à escuridão de uma manhã nublada, Olga abre a porta do seu consultório e se assusta ao ver Jorge de costas, olhando para a janela.
-O que você faz aqui?
-Te contar uma coisa: você acabou com a minha vida.
-Eu não quero mais falar com você, nem te ver. Por favor, saia daqui...
Olga abre novamente a porta para que Jorge saia, mas vê que a estrutura de madeira está molhada, o piso da sala encharcado e o corpo do marido de Laura úmido, como se estivesse suado.
-Não está sentindo um cheiro estranho aqui dentro, Olga?- pergunta Jorge, que vai revelando seu rosto em meio à pouca luminosidade. A médica olha um galão de álcool sobre a sua mesa, enquanto Jorge tira um isqueiro do bolso.
-É assim que você quer acabar com a nossa história? Virando um assassino?
-Eu não vou ter nunca mais na vida a chance de ser feliz. Mas você também não vai.
-Calma, Jorge... Vamos conversar...
-Agora é tarde demais. Pra você e pra mim.
-Não faz isso comigo, Jorge, por favor!
-Com você eu não me importo mais. Nem com você e muito menos comigo- acende o isqueiro, jogando-o contra o chão em seguida. Seu corpo é o primeiro a ser incendiado, espalhando o fogo para a porta a qual Olga está encostada. As chamas a impedem de sair do local.

Nenhum comentário:

Postar um comentário