03/02/2013

AINDA É CEDO/ CAPÍTULO 8: E POR ISSO SE AGARRAVA EM MIM TAMBÉM




Cora mal consegue crer que se encontrou com Ricardo novamente.
-O que você veio fazer aqui?
-Eu vim ver o meu filho. Você lembra que eu falei dele. E você?
-Vim trazer um ex-aluno aqui. Eu o encontrei no caminho e ofereci uma carona.
-Cora, sobre aquele dia...
-Eu não quero mais falar no assunto, Ricardo. Por favor, é muito constrangedor.
-Não acho. Simplesmente estava me abrindo, contando meus problemas pra uma pessoa que me pareceu ser de confiança.
-Confiança você tem que ter na sua mulher. Não em mim, pra me beijar.
-Eu quero apagar essa má impressão que eu te deixei.
-Não sei se vai conseguir.
-É que eu estou tão estressado com a situação do meu filho que... Olha, vamos marcar de sair, nos encontrar em algum lugar.
-Pra quê? Pra você me assediar?
-Eu juro que vou tratar você com todo o respeito que você merece. Você me dá seu endereço, e eu passo na sua casa.
-Não. Minha casa, não. Ela tá em reforma, eu não tô dormindo lá.
-Onde, então?
-Me empresta teu celular. Eu vou salvar meu celular aqui. Se eu quiser, ligo pra você e a gente marca de se ver- Cora digita e entrega o aparelho.
-Por que você salvou só o seu sobrenome aqui?
-Vai que a sua esposa vê? Agora, me dá licença- desce do carro- Eu tenho que ir até o posto pegar combustível pro meu carro.
-Se quiser...
-Não precisa me levar. Posso ir sozinha. Com licença.
Pedro sai do hospital e vê o pai olhando para Cora, mas decide não perguntar nada.
-O senhor aqui?
-É... É, a sua mãe ligou. Como o Fabrício está?
-Você não vai acreditar: a minha mãe transferiu o Fabrício daqui.
-Soube, ela me ligou avisando.
-Jura que no hospital particular vão tratar ele bem, como se aqui os médicos maltratassem alguém.
-O que foi que houve?- chega Viviana.
-Fabrício foi pro Hospital Melina Dubeux, um particular.
-E como é que vou entrar? Só gente rica pisa lá.
-Isso é o de menos, eu descolo isso pra você. Eu só não entendo essa transferência do nada.
-Eu sei o que aconteceu. Eu discuti com seu irmão por causa da cadeira. Fiz ele sentar.
-Mas isso é bom, não é?- estranha Ricardo.
-Não é bem assim. Ele estilou comigo, eu falei desaforo na cara dele também e... Aí vocês já viram.
-É melhor você explicar isso tudo no caminho. O senhor sabe onde é o hospital, pai?
-Sei, mas não vou entrar lá, não.
-Pai!
-Não insiste, Pedro. Vamos, entrem no carro.

*****

Pedro passa pelo corredor, furioso, e vai procurar Cristina, que sai para fazer um lanche na cantina do hospital.
-Até que enfim você chegou. Vou comer um pouco, estou muito cansada. Não dormi, não fiz minha limpeza de pele, não me cuidei hoje, só passando por hospital.
-Que história de essa de proibição pra Milena?
-Ah, você já está sabendo?
-Quando é que a senhora pretende tirar a Milena da sua lista de desafetos, hein?
-Olha aqui, sob hipótese alguma você deve deixá-la entrar aqui!
-Claro que vou deixar, ela faz bem pro meu irmão.
-Obrigando a sentar numa cadeira, arrastando um jovem pela cama, se debatendo com ele?
-Por conta própria o Fabrício não quer fazer; então, alguém precisa dar um choque de realidade, já que a senhora não faz nada pra isso.
-Eu tirei ele daquela pocilga.
-Não, seu problema não é o hospital. Por algum motivo que a gente não tem noção, ele só escuta o que a Milena diz. Ele tampou os ouvidos pra gente há muito tempo.
-Só que apesar da boa intenção dessa menina, eu não a quero aqui. E não acredito que ela tenha boa intenção com o Fabrício.
-Eu vou agora pra recepção me apresentar como irmão do Fabrício e retirar a proibição.
-Pedro, não ouse me desobedecer! Se você tem dezenove anos, isso não me interessa. Eu continuo sendo a sua mãe e mando em você, controlo tudo o que você faz, queira ou não! Eu não vou permitir...
-Olha aqui, a senhora não vai com a cara de metade do planeta. Eu não sou dono do meu nariz mesmo, a senhora é que me controla. Só que com o Fabrício, não. Se a senhora manda na minha vida, não vai mandar na dele porque eu não vou deixar. Já não chega bancar o médico, eu ainda tenho que aguentar sua implicância com a Milena? Pra mim, já deu. E a senhora devia se preocupar em trazer o papai aqui, fazer ele lembrar do filho mais novo.

*****

Viviana sai do hospital, muito irritada de ter ser proibida por Cristina de ver Fabrício.
-Quem aquela velha pensa que é pra ficar mandando na vida de um homem feito daqueles? Quando eu voltar lá e esculhambar, ela vai achar ruim...
A alguns metros de uma parada de ônibus, desce um senhor no mesmo bairro que ocorreu o acidente de Fabrício (e para onde Viviana voltava). Ela se assusta ao reconhecê-lo.
-Pai? Não pode ser... Não, não pode ser... Eu tenho que sair daqui, não posso mais voltar...
A moça sai correndo, entrando num beco sem que o homem perceba. E ele parece um tanto desesperado, procurando pela filha. Ele encontra uma das garotas que acompanhavam Viviana e procura informações sobre o paradeiro da moça.
-Com licença.
-Hum. E então? Tá de carro? Quem vai escolher o lugar? Eu ou o senhor?
-Não é isso, não. Eu tô procurando uma moça.
-Eu faço um preço baixo, a gente combina.
-Me escuta: não é programa o que eu quero. Você conhece uma moça chamada Milena?
-Milena? Não, colega, eu tô aqui no ponto faz uns três anos, e nunca ouvi falar de Milena nenhuma. É sua filha?
-É.
-Pode ficar certo: aqui tu não vai achar.

*****

Werner termina de examinar Fabrício, na frente de Pedro e Cristina, que estão apreensivos com o que o especialista vai falar.
-Bom, depois dessa avaliação, acho que já posso fazer um prognóstico.
-Pra quê? Vai chamar aqui uma equipe médica pra fazer um coro e todo mundo dizer que eu não posso mais andar?
-Muito pelo contrário, Fabrício. A sua situação é favorável.
-Só se for pra você.
-Calma, meu filho. Deixa o médico falar.
-Ele tem chances, Werner?
-A fisioterapia é um caminho, mas só vai funcionar de fato quando o Fabrício se submeter a uma intervenção cirúrgica.
-Quando eu digo que tem gente perdendo tempo...
-E quais são as chances, Werner?
-Olha, numa escala de zero a dez, eu diria oito.
-Vou pegar nos dois que estão faltando.
-Mãe, será que dá pra senhora levar o doutor lá pra fora? Eu tenho que falar com ele.
-Olha só, ninguém vai deixar com esse menino aqui.
-Te esperamos lá fora. Vamos, doutor?
-Claro, com licença.
-O que você quer?
-Pra quando você quer que eu marque a cirurgia?
-Pra nunca.
-Fabrício, até quando você vai ficar desse jeito?
-Sabendo que você vai acompanhar o médico, eu não me opero é nunca.
-Sinto muito, cara, mas eu não vou desistir. Se quiser andar, vai ter que contar com a minha ajuda.
-Eu não quero nada seu.
-Nem da Milena?
-Não fala dela.
-Ah, me erra, Fabrício. Se você gostasse tanto dela, você não tinha feito a cabeça da dona Cristina pra não deixar ela entrar.
-Como assim? Eu não tô sabendo de nada disso.
-Sabe agora.
-Eu não mandei proibir nada.
-Melhor pra você. A Milena é muito legal e não merece o que você faz com ela.
-Casal perfeito, né? Um defende o outro. Ela fala maravilhas de você.
-Como o resto da humanidade.
-O que você quer, Pedro?
-Eu quero que você acorde e veja o que essa moça tá tentando fazer junto comigo.
-Se é junto contigo, é porque não vai prestar.
-Eu vou trazer a Milena de volta e você vai tratar ela como gente.
-Porque você quer?
-Porque eu quero, sim. Eu fui obrigado a ter limites, você vai ter também. A gente é irmão.
-Eu não sou nada seu.
-É o que você pensa- sai do quarto.

*****

Ricardo está voltando para a agência de publicidade quando seu celular toca. Ele encosta-se a uma calçada, pega o telefone e se surpreende com o nome “Lauveríssimo” no visor.
-Cora?
-Você está ocupado?
-Eu estou no trânsito.
-Eu pensei melhor e decidi conversar com você. Será que a gente pode se ver no fim da tarde? Eu também estou trabalhando agora.
-Claro. Onde? Deixa eu anotar, um minutinho- pega um papel na carteira e uma caneta- Sim, sei onde fica. Às seis, eu passo lá. Até mais.
Nervoso como um adolescente, Ricardo acredita que um envolvimento com Cora representa a fuga dos problemas que tem em casa.

*****

Ludmila está na recepção do Melina Dubeux, quando nota Viviana bastante nervosa.
-O que houve?
-Nada. Tá tudo bem.
-Claro que não. Você ficou pálida, de repente. Parece até que viu alguém na rua e entrou aqui pra se esconder.
-Impressão sua.
-Você conseguiu dobrar a família Faria, não é? Soube que tinham proibido a sua entrada e agora já pode ver o Fabrício.
-Vai ver a turma vai com a minha cara.
-Ou vai ver que você sabe de alguma coisa e eles querem que você esconda. O que será? Lavagem de dinheiro? Corrupção? Segredos familiares? Melhor: uma adoção!
-Não sei do que você tá falando. Você anda vendo novela demais. Isso tudo é agonia pra conseguir vender jornal. Agora que vão me deixar passar, com licença.

*****

Ricardo estaciona seu carro na calçada de uma pousada que fica na mesma rua do conservatório. Ao entrar, pergunta onde fica o quarto de Cora Lauveríssimo. O recepcionista avisa à professora e o leva até a porta de número 04. Cora abre a porta e fica sem reação ao ver o publicitário mais uma vez.
-Você não vai me convidar pra entrar?

*****

Viviana finalmente consegue rever Fabrício. O jovem está menos arredio, e disposto a conversar sem brigas ou discussões.
-Que bom você ter vindo.
-Que bom te ver sorrindo.
-O que foi? Parece que tá nervosa.
-Foi um lance que aconteceu lá fora, mas depois passa.
-Chega mais perto.
-Eu?
-Tem mais alguém aqui? Pode vir, eu não vou discutir, jogar bandeja pro alto, falar alto. Relaxa.
Viviana atende seu pedido.
-O que é? Vai me pedir desculpa de novo?
-Acho que tô ficando expert nisso.
-Não devia.
-Só acho que não é errado eu pedir desculpas.
-Quando isso acontece quase todo dia, eu fico sem saber.
-Pela primeira vez eu pensei sobre uma coisa que o Pedro me falou. E também, depois da minha mãe ter proibido a sua entrada.
-Dá pra superar. O Pedro reclamou na recepção.
-Só que eu quero te dizer que não mandei ela fazer isso.
-Disso eu sei.
-É, mas eu precisava dizer. Nunca teria coragem pra isso. Ainda mais contigo.
-Por quê?
-Mentira que você não sabe.
-Não, o que é?
-Tem noção de que em poucos dias, você é a pessoa mais importante pra mim?
-Sei. Também tenho uma coisa que não sei te explicar. É como se eu não pudesse me afastar, fugir desse quarto.
-Não precisa. Você pode até fugir desse quarto. O difícil vai ser conseguir fugir da minha vida.
E Viviana é surpreendida pelo beijo que Fabrício dá. Longo, faz com que os dois se esqueçam dos graves problemas que ainda enfrentarão.

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