-Peter, eu tô só conversando com ela. Não precisa
ficar com a pulga atrás da orelha.
-Eu tava atrás da porta e escutei tudo. Deixa a
menina em paz.
-Meu irmão...
-Solta o braço dela agora. Ou quer que vá aí soltar?
Lívio larga Juliane e Peter abre a porta para que
ele saia. Ele segue atrás pra comprovar se ele não tenta mais nada. Ainda
dentro do banheiro, nossa heroína suspira e chora baixo, com medo de que Peter
tenha reconhecido sua voz.
-Eu preciso sair daqui. Preciso sair desse emprego
de uma vez.
*****
-O que deu em você, hein?
-Posso perguntar a mesma coisa. Entrar no banheiro e
dar em cima da menina? Você já imaginou se ela grita mesmo e chama a polícia?
-Peter, quem vai acreditar nessa fulana?
-Não dá pra acreditar em tu.
-Olha só, nem todo mundo trata bem as mulheres que
nem você.
-Lívio, não é questão de quem você encontra. É de
saber tratar um ser humano.
-Só que ninguém mais me empata. Eu não vou desistir.
Não descanso enquanto essa tal de Nuelle dançar o pole dance dela em cima da minha cama. Mas, por enquanto, muito
obrigado por nada.
-Disponha- ironiza. E ambos saem da casa.
Juliane se recompõe do susto causado por Lívio e tem
a coragem de encarar o namorado pela primeira vez desde que passou a dançar,
mas ainda não diz nada.
-Tá tudo bem contigo?- pergunta Peter, e ela
responde com a cabeça que está- Tem certeza? Porque o Lívio pode ter te
machucado.
-Não... – solta um pigarro e começa a disfarçar a
voz- Não precisa se preocupar. Eu já tava saindo daqui quando esse homem me
encontrou. Acho que por hoje, ele não tenta mais nada. Mesmo assim...
-O quê?
-Obrigada por ter me defendido.
-Imagina. O meu amigo exagerou mesmo dessa vez.
-Pra você ver como dois caras podem ser diferentes e
amigos ao mesmo tempo.
-Como assim? Tá querendo dizer que eu não devia
querer conversa? Tem alguma coisa dele que eu não sei?
-Isso, eu não sei. Mas a mentira pode não durar
tanto tempo assim.
-Credo, parece até minha namorada falando.
-De vez em quando, a gente tem que cruzar com gente
sensata por aí. Eu cruzei contigo, você com a sua namorada. Valeu... – entra no
Camaro amarelo... Digo, no camarim.
Nosso protagonista fica pensando se Lívio é de
péssima índole para deixar as mulheres com pé atrás. Como estava de saída
mesmo, decide ligar para a namorada e perguntar como está seu enteado. É o
tempo de a dançarina chegar ao camarim, onde deixou o celular em modo normal. O
problema é que quando ele liga, toca bem alto o refrão de uma música com
coreografia coqueluche, conhecida como “Gangnam
Style”.
Psy causando frisson e suspense nos personagens,
quem diria?
Pois bem,
acontece que Peter ouviu lá de fora (como é possível?) o ringtone. Ela, logicamente, ficou atônita, mas esperou que a
ligação caísse por si mesma. Quando isto ocorreu, pôs o aparelho no vibracall. O cara achou aquilo
estranhíssimo, mas tentou fazer a ligação.
-Oi, amor.
-Juliane, você
tá onde?
-Em casa, ué.
-Ué? Por que
“ué”?
-É que hoje eu
fiquei cansada demais e vim da escola direto pra casa.
-Olha, eu te
liguei agorinha e tu não atendeu. Onde é que você foi?
-Tava botando o
Bernardo pra dormir. Hoje, mais inquieto do que nunca.
-Certo, eu
liguei pra te dizer que eu já tô indo pra casa.
-Você não tinha
uma... Uma reunião com o tal Lívio?
-Cansei do Lívio
por hoje. Beijo, amor.
-Beijo, te amo.
Explicaremos agora como Juliane
chegará mais rápido à sua casa do que Peter. Novamente, tem o celular em mãos.
-Carolina?
-Oi, Juliane. Tudo bem?
-Eu preciso que você me faça um
favor.
-O que houve, Ju? Que voz de
assustada é essa? Aconteceu alguma coisa?
-Depois eu te explico. Você pode
me buscar com a sua moto?
-Claro.
-Tudo bem, mas vem logo, por
favor. Anota aí, eu vou te dar o endereço.
Não dissemos que um dia a
recepcionista prosperaria? Agora Carolina esbanja uma Shineray!
*****
Passados alguns dias, a saga de Juliane para
esconder o novo emprego de Peter continua. Quando sai da Upa, para em uma
lanchonete que fica na mesma rua.
-Quanto é um pastel de carne?
-É R$ 1,70- responde o vendedor.
-Me dá um, por favor- ela dá o dinheiro e o rapaz
embrulha- Obrigada.
Carolina passa com sua moto ao largar do emprego e
encontra a amiga e ex-colega de trabalho, quando esta está a caminho do ponto
de ônibus.
-Juliane?- estaciona.
-Oi, Carol- as duas se beijam- Tá
indo pra onde?
-Pra casa, e você?
-Pra casa. De shows.
-Juliane, você não acha que é
muita pretensão achar que pode sustentar três pessoas dançando pole dance? No hospital, dá muito bem
pra ganhar mais.
-Não é questão de dinheiro e sim
de tempo. O Peter tá envolvido com esse negócio de música. Pensa em largar o
emprego de cobrador e quando tem um tempo livre, tá lá. Enfiado naquele lugar,
conversando sobre música com aquele cafajeste do Lívio.
-Por que você não diz de uma vez
que esse Lívio tá tentando enganar o Peter?
-Falei assim por falar, entende?
Também não posso ser tão clara assim. Senão ele desconfia. Se bem que ele já
soltou duas indiretas.
-Acha que ele
sabe e tá escondendo o jogo?
-Não faço ideia. Mas prefiro nem
fazer, sabe? Isso só vai me deixar mais nervosa do que eu já estou.
-Que é que você tem?
-Além de falar do Lívio, que é o
cara que embrulha o meu estômago, tem ainda o pastel que eu comi. Devia estar
estragado. Vou descer antes e parar na farmácia pra comprar um laxante.
-Deixa que eu te levo. Lá mesmo,
na farmácia, toma o remédio.
-Nem em sonho. Vai que eu passo
mal em cima do cano. Eu aguento até o fim da apresentação. O problema é que
hoje a Nieta me mandou esperar os boleros dela terminarem.
-É demais, hein? Sobe, que te
levo pra farmácia. De lá, a gente passa na casa.
*****
Quando chegam à casa de shows, as
meninas se despedem.
-Juízo, Juliane.
-Manda lembranças pro Santiago,
Carol- e a gata entra.
O celular de Carolina toca. Só
mesmo nessa web novela, o homem é mais grudento que a mulher.
-Oi, Santiago.
-Carolina, ligou uma moça da
clínica dizendo que você esqueceu a bolsa lá.
-Não é possível, eu vou ter que
voltar.
-Onde você foi? Não chegou até
agora.
-Encontrei Juliane no meio do
caminho. Ela tava passando mal e eu fui à farmácia com ela pra comprar um
remédio.
Já que Carolina estava em frente
a uma casa de shows, impossível quem está do outro lado da linha não escutar o
barulho provocado por Nieta ao microfone.
-Bem-vindos ao “Bolero da
Bodega”. Vamos começar com o clássico “Onde estará?”.
-Que lugar é esse, Carolina?
-Ah... - gagueja- Do... Do
caminho da farmácia. Tchau!- desliga abruptamente.
Segundos suficientes para
Santiago ficar com a pulga atrás da orelha.
*****
Lívio continua com os seus planos
de destronar Peter do cargo de compositor dos Homens-incógnita. Mas sua nova
preocupação é como obter um show particular de Nuelle em seu apartamento. Pra
isso, ele tem uma ideia bastante clichê. Espera as apresentações de Juliane e
Nieta terminarem.
Jujuba está arrumando sua bolsa
no camarim, quando o vilão bate a porta.
-Quem é?
-Sou eu, Lívio.
Ela põe a máscara rapidamente e
vai atendê-lo.
-O que você quer?
-Falar com você.
-Você quis dizer: ʺme embebedarʺ?- afirma ao
vê-lo com dois copos de cerveja.
-Olha, Nuelle, você tem que me
ouvir. Eu vim aqui te pedir desculpas pelo que aconteceu outro dia.
-Isso já passou, não tem mais
importância.
-Sério?
-Sério. Sai!
-Espera... Eu queria te pedir uma
coisa, já que não existe mais nenhuma desavença entre a gente.
-O quê?
-Queria que a gente fizesse um
brinde, pra esquecer essa confusão e começar uma amizade. A gente pode ser
amigo, não pode?
-Não sei...
-Por favor, Nuelle. É de coração.
-Tudo bem. É bonito mesmo o que
você tá pensando em fazer. Mas só tem uma coisa: eu não bebo. Será que dá pra
pegar uma Coca-cola pra mim?
-Tudo bem, eu já volto- sai
Lívio, todo empolgado.
Como não é boba desde os tempos
em que Leilah era a vilã do folhetim, Juliane imita o Pedro Bial e dá aquela
espiadinha pela fechadura. Vê Lívio no bar, comprando a tal Coca-cola. Só que
ele tira a alça de alumínio e põe um sonífero.
-Desgraçado!- sussurra enquanto
espera ele entrar.
-Pronto, cheguei. Tim-Tim.
-Tim-Tim, Lívio.
Tim-Tim mesmo, pois um dos dois
está prestes a cair, como o sinal da Tim.
Juliane bebe a Coca-cola inteira.
-Nossa, que sede, hein?
-Deu pra perceber que sou quente,
tenho que matar a sede de todas as formas. Inclusive, daquelas que ninguém
imagina.
-Uau!
-Olha, eu preciso ir ao banheiro.
Você pode me esperar lá fora?
-Por mim, tudo bem.
-Já volto, querido- entra nele
com a bolsa. Tranca a porta e bebe o laxante que foi comprado na farmácia.
Logo, provoca o próprio vômito e dá a descarga.
Ao sair de lá, sem a bolsa,
simula um mal-estar.
-Nuelle, o que é você tem?
-Me sentindo tonta. Vendo tudo
escuro de repente. O que tá rolando comigo?
-Calma, procura descansar...
Juliane finge um desmaio.
-Nuelle! Nuelle, acorda! É, vamos
ver se agora você me recusa.
Mal sabe ele que está em uma
farsa que pode abalar a sua relação profissional com o Peter. Mas como a
Juliane vai escapar do apartamento do cara?
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