07/10/2013

SOBRE PRÓDIGOS E PRODÍGIOS/ CAPÍTULO 7



-O que você pretende contando essa estória? Me irritar como, aliás, sempre tem feito?
-Sônia, coloca a sua mala lá dentro. Você não vai mais sair dessa casa.
-Como se atreve a contrariar minhas ordens, Ana Maria?
-Entra, Sônia. Eu preciso ter uma conversa com o meu pai.
-Com licença... – Sônia abre a porta e vai para o seu quarto.
-O que de tão grave a Sônia não pode escutar?
-A nossa conversa vai ser civilizada.
-Não há maneira de ser civilizado com você: uma mulher que me peita, que me provoca, que faz de tudo pra passar por cima do que eu mando fazer.
-Acontece que o senhor está acostumado a ver todos fazendo o que o senhor exige. E eu estou cansada de ter que abrir mão das minhas opiniões para satisfazer a sua vontade. Não só eu, mas o Otaviano também.
-Você acha mesmo que ele está tão apaixonado, a ponto de arriscar um emprego na minha gravadora? Seja racional, Ana Maria. Está nítido que o Otaviano é um golpista. E você não só sabe disso, como quer ser enganada para se dar ao desfrute de ouvir que alguém te ama.
-Não é nada disso. Ele gosta de mim.
-E você descobriu isso numa única noite? Por que será que ele se omitiu todo o tempo em que trabalhava ao seu lado?
-Por timidez, por achar que sendo eu sua filha, nunca conseguiria se aproximar de mim.
-Ingênua, você foi procurá-lo. Com certeza ele deve ter dito algo que fez você se chocar mais do que todos que estavam na sala de reunião. É um golpista que usa de um truque velho.
-Tão velho que você usou pra casar com a minha mãe, não foi?
-O que está dizendo?
-No leito de morte, ela me revelou que se casou com o senhor porque realmente o amava. Mas nunca foi a mesma coisa com o senhor... Aos poucos, ela percebeu que o casamento de vocês continuava porque o senhor teve que assumir a gravadora.
-Foi por minha causa que essa empresa prosperou. Ou você acredita que sua mãe, debilitada do jeito que estava, tinha condições de presidi-la? Nem mesmo quando ela tinha saúde foi capaz de fazê-la prosperar.
-Será que não foi muito proveitoso pro senhor a morte dela? O senhor pôde representá-la legalmente quando ela não podia mais sair de casa. Convenhamos que a morte foi fundamental para o seu sucesso?
-O que você quer? Morrer para passar o controle absoluto de tudo o que é seu para ele?
-O Otaviano vai me representar, e se o senhor não vai precisar me suportar na empresa, fique sabendo que eu vou deixar um inimigo à altura.
-Está muito equivocada se pensa que eu vou permitir esse casamento.
-Já não tem mais que permitir nada. A vida é minha.
-Mas a empresa é minha. A casa é minha! Então, se eu quiser tirá-lo de lá e você daqui...
-Não vai poder. Imaginou o escândalo se os advogados revelam à imprensa o que o senhor está tentando fazer conosco? São os meus direitos e eu vou usufruir deles, que o senhor queira, quer não!- entra na mansão, deixando Dalton irritado. Mas ainda haverá tempo de planejar alguma coisa...

XXXXX

Jandir está trabalhando na oficina com o mecânico que presenciou o ataque de fúria de Rosane.
-Pronto. Liga pro cara e diz pra ele que já pode vir pegar o carro.
-Vou pegar o telefone agora- repara que Jandir olha a rua- O que foi, Jandir?
-A Rosane, todo dia ela passa por essa rua, vai comprar o remédio da mãe... Hoje não deu nem notícia.
-Era até dela que eu queria falar.
-O que foi?
-Quando eu estava vindo pra cá, eu vi ela quebrando um carro. Não sei de quem era, mas estava na porta da casa de Otaviano.
-Aquele que trabalha na empresa que faz disco?
-Esse mesmo, que mora no fim da rua. O carro não era dele, não. Tinha uma bolsa de mulher lá dentro, só pode ser da dona. Só sei que Rosane pegou o martelo e acabou com o carro.
-Por que isso?
-Deve ser ciúme dele.
-Que é isso? A Rosane não tem namorado nenhum.
-Ter, ela não tem. Mas pra uma mulher fazer isso, só pode ser por causa de homem. E se eu fosse você, não chegava perto dela.
-Eu vou saber direito dessa história. Assim que eu largar daqui, eu passo na casa dela pra saber por que ela fez isso.
-Não se mete nisso, cara. A mulher não quer nada contigo.
-Mas se ela estiver precisando da minha ajuda, eu vou me encontrar com ela.

XXXXX

-Casar, menina? Mas ainda é muito cedo pra isso, você nem conhece o rapaz.
-Sei dele tudo o que eu quero saber, Sônia. Esperar pra quê? O Otaviano já conseguiu me convencer que é totalmente apaixonado por mim.
-Posso ser sincera?
-E quando você não é?
-Além dessa paixão que você descobriu ter por esse rapaz, essa ideia de se casar... É para afrontar seu pai, não é?
-Eu não posso negar que seja mesmo por isso também. Mas o Otaviano... Ele me tratou de um jeito que eu...
-Não se esqueça de que ele é o seu primeiro homem, seu primeiro amor. Você é jovem ainda, Ana Maria. Pense bem no que está fazendo. Você vai dividir a sua vida com um homem que é quase um desconhecido?
-Mas eu gosto dele, Sônia. E gosto também da vida maravilhosa que nós vamos ter.
-Não se iluda. Esse homem pode não ser o certo pra você.
-Chegou a hora de tomar as rédeas da minha vida. E que melhor situação eu teria se não fosse ao lado de um grande amor?

XXXXX

Rosane está sozinha no quarto, chorando, sobre a cama. A cortina é aberta com cuidado: Jandir vai visitá-la.
-O que houve? Que feridas são essas no seu rosto?
-O que você está fazendo aqui?
-Eu sei que você não está bem.
-Bem na cara que eu não estou. Pode ir embora, eu vou ficar melhor daqui a pouco.
-Quem fez isso com você? Foi ele? O tal de Otaviano?
-Por favor, Jandir! Eu não quero falar dele.
-Vou na casa desse miserável arrebentar a cara dele.
-Pra quê? Por acaso isso vai resolver o vazio que eu tenho dentro de mim? Não adianta nada, melhor é esquecer que ele existe.
-Rosane, eu não vou te dizer mais. Se você se sente sozinha, eu quero te ajudar. Eu sou louco por você, e sou capaz de tudo pra que você seja feliz do meu lado.
-Tudo mesmo? Então, me faz esquecer. Agora. Aqui.
-Se você quiser mesmo, me pede de novo.
-Me faz esquecer, Jandir... Sem nem pensar em mais nada. Eu sou somente sua agora.
Os dois trocam um beijo, e enquanto ele a trata com carinho, o rosto do seu ex-amante vem à mente de Rosane, o que a faz sentir ainda mais prazer, apesar dos maus tratos por ela sofridos.

XXXXX

Otaviano volta de um bar e se depara com o carro de Dalton em frente à sua casa. Aproxima-se e somente vê o motorista, estranhando o motivo da visita.
-Não pense que é mera visita de cortesia, Otaviano- Dalton caminha atrás do ex-funcionário.
-O que o senhor veio fazer aqui?
-Depois de minha filha ter passado a noite com você, acho que tenho um milhão de justificativas que me motivem a estar nesse pardieiro. Não acha?
-Dr. Dalton, o que aconteceu entre mim e a Ana Maria...
-Vai ficar no passado. Ou você acreditou que eu toleraria a ideia de vocês se casarem?
-Casar? Ela falou em casamento?
-Cala essa boca, cínico maldito! Foi, como dizem, comendo pelas beiradas até conseguir enganar alguém. Mas saiba que da minha família, só Ana Maria é uma verdadeira idiota.
-Eu não quero que o senhor fale assim dela.
-Tudo bem. Vamos falar em termos mais brandos, sutis. Uma música para os seus ouvidos... – sacode um talão de cheques.
-Eu não quero seu dinheiro.
-Nem um milhãozinho? Que pensa, estou disposto a colaborar para que você suma desse buraco que você chama de bairro. Pago um milhão de dólares pra te ver afastado da Ana Maria. Posso ou não assinar o cheque?

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