-Tinha, Dr. Dalton.
Tinha. Ao que parece, o relacionamento entre ele e a tal Rosane terminou por
conta da indiferença dele.
-Claro. Pra quê
manter uma amante quando o lucro com a Ana Maria é maior? O que ele mais quer é
contrair matrimônio, mas ele não sabe o que lhe espera.
-O senhor vai querer
as cartas pra entregá-las à sua filha?
-Não. Elas vão ficar
comigo. Se ela procurar pistas, é capaz do Otaviano forjar alguma coisa para
continuá-la enganando.
-Qual o seu plano,
então?
-Penso em fazer novamente
uma proposta para o Otaviano. Só que agora, eu vou dizer que sei bem o que
aconteceu entre ele e a tal de Rosane. Posso fazer a Ana Maria pensar que eles
ainda mantêm um caso.
-Se eu fosse o
senhor, eu tomaria cuidado com ele. Afinal, é um golpista. Pode ser capaz das
piores atrocidades pra roubar parte da sua fortuna.
-Detetive, se eu
fosse esse calhorda... Eu passaria a tomar muito cuidado... Comigo!
XXXXX
Sônia e Ana Maria
estão no ginecologista, à espera da notícia sobre a gravidez.
-E então, doutor?-
pergunta a moça, ansiosa.
-Pelos exames, a
senhorita está em boas condições de saúde. E se tudo correr tranquilamente nos
próximos nove meses, o seu bebê vai nascer forte e saudável.
-Quer dizer que...
-Eu não disse,
menina? Você está esperando um filho!
-Ai, Sônia... –
abraça-se com a empregada- Obrigada, doutor. Muito obrigada por essa notícia.
-O prazer é meu de
dar essa notícia. Que você seja muito feliz com esse filho.
-Um filho com o
Otaviano. É muita felicidade, Sônia. Ele não vai acreditar quando eu disser.
-Faça uma surpresa
pra ele, Ana Maria. Deixe pra contar num momento especial de vocês dois.
-Tem razão. Eu vou
preparar um jantar pra nós dois e contar essa novidade. Ou melhor... Nós três-
as duas riem e se abraçam novamente.
XXXXX
Rosane também está
em dúvida sobre sua gestação, e decide ir à farmácia para comprar um teste que
lhe dê a certeza do filho que espera.
-Bom dia. Moço, tem
teste de gravidez?
-Tem, sim. De qual
marca você quer?
-Não sei. Qual é a
melhor marca?
-Olha, é essa daqui-
o farmacêutico vai buscar um pacote para Rosane- Sabe como usar?
-Sei... Quer
dizer... Acho que sei. Quando muda de cor, é porque a gente está...
-Grávida?- Otaviano
surpreende a moça- Quem está grávida? Você?
Rosane fica em
completo silêncio, e o rapaz nada entende da reação. Tudo fica ainda mais sem
sentido para ele a partir do momento em que Otaviano puxa Rosane pelo braço.
-Pra onde você está
me levando? Me larga!
-Fica quieta, senão
vai ser pior.
Os dois entram na
casa de Otaviano quando o carro de Dalton entra naquela rua, encostando na
calçada do ambicioso rapaz.
-Não quer que eu
entre com o senhor?- pergunta o motorista.
-Não precisa. Eu vou
resolver esse problema de uma vez por todas, e vai ser hoje!- alega, segurando
um envelope com as cartas amorosas.
-Que história é essa
de gravidez?- grita Otaviano.
-O Otaviano está
gritando lá dentro.
-Calado! Eu não
quero que ele me veja.
-Perdeu a língua,
desgraçada? Você não disse que tomava pílula?- joga-lhe sobre o sofá.
-Parei de tomar!
-E você não me avisa
nada? Continua dormindo comigo sem me dizer isso? Por que você acha que está
grávida?
-Eu passei mal há
uns dias, senti tontura, vontade de vomitar... Pensei que era por causa de uma
gravidez...
-Ah, você pensou?
Por quê? Deixou de pensar de repente, se é que você já pensou algum dia na sua
vida?
-O que você tem a
ver com isso? Por acaso, eu bati na porta da sua casa e te pedi dinheiro
emprestado pra fazer um teste ou ir pro médico?
-Você sabe que eu
não estou preocupado se o dinheiro é da aposentadoria da aleijada da tua mãe ou
meu! O que me irrita é que em vez de você se cuidar pra isso não acontecer,
você simplesmente me enrola!
-Para de gritar
comigo! Eu não comprei o teste, não fiz o teste, nem sei se eu estou esperando
um filho seu!
-Ou do mecânico, não
é?
-Como é?
-Você pensa que eu
não sei da sua vida? Que faz uns dias que você está dormindo com ele? Ele, que
vive te cercando, e faz muito bem, pra ver se você larga do meu pé!
-Se ele pode ser o
pai, por que você está preocupado comigo?
-Porque você não vai
botar tudo a perder. Não agora!
-O filho pode ser do
Jandir, se é que estou grávida mesmo...
-Não, não pode, meu
anjo. Sabe por quê? Porque óvulos não são fecundados tão rápido assim. Como é
que você dorme com esse cara e uma semana depois, sente os sintomas de
gravidez?
-Eu dormi com ele no
mesmo dia em que você fez aquilo comigo.
-O que é? Quer
arrancar culpa de mim agora?
-Você me bateu e me
forçou.
-Forcei você a fazer
o que já estava bem acostumada. Ou você acha que eu tenho muito trabalho pra
levar vagabunda pra cama?
Rosane revida a
provocação com uma bofetada no rosto de Otaviano.
-Vagabunda é aquela
que você dorme toda noite aqui, pra arrancar dinheiro do pai dela.
-Se é meu ou do
mecânico, não me interessa. Eu só sei que eu vou levar você numa clínica pra você
matar essa criança antes dela nascer.
-Você está louco?
-Não me testa,
Rosane.
-Eu não vou abortar
bebê nenhum. Se eu estiver grávida, eu quero o meu filho comigo. Eu vou criar
essa criança. Nem pense em me afastar do meu filho por causa desse plano de
roubar a fortuna do velho da gravadora. Eu não tenho nada a ver com isso, não
quero um centavo do seu bolso.
-Centavo? Que
centavo, sua desgraçada? Conheço bem gente da sua laia. Hoje você não quer
dinheiro porque eu não tenho nada, mas quando eu botar as mãos na grana do
calhorda do Dalton, é capaz de exigir que eu reconheça essa peste que você
chama de filho!
-Isso se a filha do
calhorda não souber a verdade- Dalton entra na casa de Otaviano e o deixa sem
palavras- Tanto dinheiro gasto na contratação de um detetive particular, e a
melhor prova eu consegui sem gastar absolutamente nada.
-Dr. Dalton, eu
posso explicar o que aconteceu. Essa moça, a Rosane, ela é obcecada por mim
desde que ela se mudou pra cá. Ela não consegue entender que Ana Maria e eu...
-Pode me poupar do
seu latim, Otaviano. Sua carreira como golpista foi até promissora no início. Você
soube bem convencer a Ana Maria, se bem que até uma criança conseguiria
extorquir dinheiro dela. Deve ter sido um trabalho de difícil composição ter
que me aturar durante todos esses anos. E pensar que eu cheguei a te incluir
como principal herdeiro no meu testamento... - sente uma dor no peito,
percebida por Otaviano- Eu ouvi tudo. E vou fazer justiça.
-Tudo é um erro, um
engano da sua parte. O senhor me entendeu errado.
-Uma pena eu não ter
trazido comigo um gravador para registrar a sua voz trêmula depois da sua
derrocada. Também lamento por não ter gravado os melhores momentos da revelação
do seu caráter, seria uma prova e tanto pra minha filha. Mas do jeito que ela é
vulnerável, dará crédito ao pai. Adeus, Otaviano. Foi um prazer ter destruído
você- abre a porta e entra no seu carro. Otaviano vai atrás.
-Otaviano... –
Rosane o chama.
-Torce pra dar tudo
certo. Senão, eu te mato. Fecha a porta quando sair- corre para pegar um táxi-
Segue aquele carro preto, rápido!
XXXXX
As empregadas da
mansão de Dalton colocam a mais cara louça sobre a mesa de jantar. Sônia e Ana
Maria observam as serviçais, animadas.
-Será que ele vai
gostar da decoração que eu mandei preparar pra ele?
-O Otaviano, eu não
sei, minha filha. Mas o teu pai não está disposto a negociar com esse moço,
não. Ele vai fazer frente a esse romance.
-Mesmo meu pai não
concordando, eu sei que um neto vai ser capaz de amolecer o coração dele. Quem
sabe o meu filho pode ser o sucessor que ele tanto quer?
-Cuide bem dele. Eu
tenho medo.
-Medo de quê?
-De que o seu filho
seja tão falho de caráter quanto o seu pai. E como era o Otaviano antes de
namorar você.
-Que estória é essa,
Sônia?
-Menina, eu sempre
vou rezar e torcer por você, pra que você encontre a felicidade, mas tome
cuidado com esse rapaz. Antes, você só via defeito nele. Agora, só vê o que ele
tem de bom. Não fique cega por causa de um amor. Ele pode passar.
XXXXX
O carro de Dalton
estaciona em frente ao portão da mansão.
-Desce e chama o
porteiro para abrir isso logo.
O motorista obedece
ao patrão e fala ao interfone. É o tempo em que Otaviano paga a corrida do táxi
e corre para alcançar a janela do carro, que está aberta.
-Não fale nada, Dr.
Dalton. O senhor está enganado ao meu respeito.
-Antes, eu estava,
Otaviano. Mas agora não. Se você quiser entrar pra contar os pormenores, fique
à vontade. Vai ser a última vez que você vai desfrutar do luxo da minha casa-
abre a porta do carro e se levanta, mas passa mal novamente.
-Dalton?- Otaviano o
segura.
-Chama uma
ambulância. Rápido... Um aperto no meu peito.
-Alguém me ajuda?
Socorro!- o motorista corre até os dois.
-O que é que ele
tem?
-Um infarto, chama
um médico.
-Eu vou avisar à Ana
Maria- corre para a mansão.
-Você... Não vai
conseguir... Otaviano...
Otaviano vê que Ana
Maria e Sônia vêm com o motorista e simula desespero.
-Leva ele pro
hospital, por favor!- ele chora, abaixa a cabeça e encosta no ouvido de Dalton-
Quem não conseguiu foi você, velho idiota!
-Pai! Pai! O que
está acontecendo, Otaviano? O que ele tem?
-Filha... Filha... –
morre quando Ana Maria o toma em seus braços.
-Descanse em paz,
Seu Dalton... – deseja Sônia.
-Meu pai, não. Não,
meu pai, não! Volta, por favor! Você não pode morrer. Não me deixa agora,
pai... Não, não, não, não! Volta, pai!
Todos ficam
comovidos com a cena, menos Otaviano, que repara um rapaz vestido de preto.
-Vamos ver até
quando, Otaviano. Por enquanto, parabéns. É a primeira morte das suas costas-
envolto por sombras, o rapaz desaparece.
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