Voltando ao apartamento minúsculo dos barracos...
-Vai,
Juliane. Fala que história é essa de filho.
-Peter,
eu... Eu quero falar... Que... Sobre... Olha, em relação ao... Ao Inácio...
Quer dizer, à presença do Inácio... É... Ah, gente... Como é que eu vou falar
isso?
-Eu
tô sabendo que você trabalha na área de saúde. Talvez eu te leve ainda hoje pra
um papo com o fonoaudiólogo... Ô, Juliane, que foi isso que eu ouvi, hein?
-Pior
do que o que você ouviu é aquilo que eu ainda tô vendo...- espanta-se Inácio
com a situação.
-Ô,
meu irmão, não se mete. Na boa.
-Irmão,
não: cunhado. É estranho, mas que jeito, né verdade?
-Olha,
Peter...
-Não,
é sério. Porque é estranho pra caramba eu ir tomar um banho e voltar com um
enteado.
-Cala
a boca! Deixa eu falar! Que saco!- revolta nossa sensual mocinha- Eu... Tive um
filho, sim. Só que por causa do trabalho na clínica, eu pedi pra que o meu
irmão cuidasse dele. O Inácio, ele é meu único parente por aqui.
-E
eu vim aqui... Seu nome é Peter, né? Então, eu vim aqui pra perguntar se ela
podia, por gentileza, tomar conta do Bernardo. O filho dela, sabe?
-Ai,
por favor, Inácio! Criança num instante se acostuma com quem tá criando ela.
Não pode realmente quebrar esse galho pra mim?
-O
problema é que você acredita nessa ideia desde o dia em que saiu da
maternidade. E se por acaso não lembra nem da idade do seu filho, isso já tem
mais de seis meses!
-Eu
prestei vestibular pra saúde, e não pra ciências exatas.
-Vem
cá, por que você não falou nada?
-Eu
não era obrigada.
-Não?
Poxa... A pessoa começa a namorar bem, hein? Troquei uma assassina que levava
uma peixeira por uma mãe de família e um cunhado na pochete.
-Eu
não acabei ainda de contar.
-Mas
eu parei de ouvir. Eu parei contigo. De vez! Que palhaçada é essa? Você... Você
namora comigo e não me conta esse tipo de coisa?
-Agora
a culpada sou eu? Qual é a próxima? Me cobrar uma pensão alimentícia pelo tempo
que a gente tá namorando? Pelas duas horas que já acabaram?
-Pior!
As duas horas e o namoro também.
-Peraí...
Que ideia é essa?
-Não,
depois dessa vou esperar o quê? Tá de sacanagem com a minha cara.
-Espera,
Peter, deixa eu te explicar o que aconteceu.
-Não!
E vai ser bom não saber de mais nada. Nada!
-Ô,
cara! Te liga! Você tá de toalha- alerta Inácio quando Peter já está do lado de
fora.
-Relaxa,
eu troco de roupa no banheiro lá da entrada da pensão. Fui nele antes de vir
pra cá.
-Pra
onde você vai. Peter?- chora Juliane?
-Trocar
de roupa. Isso não é novela de Carlos Lombardi, não. Depois eu aproveito pra
dar uma mijada- bate a porta na cara da... Dona da porta, eu suponho.
*****
Bom, agora Peter está num ônibus que vai em direção à PE-15 (inventamos a
localidade agora, não nos interessava). Dentro do ônibus, ele pensa na vida.
Putz grila! Qual? A gente nem contou nada, essa relação dele com Juliane
esfriou desde o capítulo passado, está pior do que um suco de goiaba
recentemente congelado para picolé.
Voltando a dar fundamentos para a nossa história, a questão é que Juliane
liga diversas vezes para o celular do cara. Só que ele retira a bateria e a
joga pela janela do veículo. A ex-fisioterapeuta começa a ficar preocupada com
o sumiço do rapaz. Um engarrafamento na rodovia faz com que ele demore ainda
mais pra chegar à sua casa (desconsiderando o fato de que nem pra lá ele estava
indo). Só que em casa, a moça tem uma ideia.
-Para
de insistir, Juliane. Tá se vendo que ele não quer te atender.
-Não
tô ligando pra ele, Inácio. Tô ligando pra Carol.
-A
moça que trabalha na clínica? Pra quê?
-Eu
quero que ela me dê o endereço da casa do Peter. Obviamente, ele deve ter ido
pra lá. E como eu não sei onde é, ele não vai esperar eu aparecer na porta
dele. Mas eu vou. Vou de todo jeito. Alô? Carol? É Juliane, tudo bem? Como é
que tão as coisas aí? Sei... Carol, eu preciso de um favor. Mas eu não quero
que ninguém escute que sou eu quem tá ligando. É o seguinte: eu preciso do endereço
de Peter. Certo... Certo, eu vou pegar um papel aqui pra anotar... Me consegue
um papel, Inácio- ele procura nas gavetas, além de tentar encontrar uma caneta-
Pode dizer... Sei...- já anotando tudo- Não, fica tranquila, não tem problema
nenhum. Sossega. Eu sei onde é que fica. Vai demorar pra eu chegar lá, agora
que eu tô sem carro. Depois eu passo aí pra te explicar tudo, ok? Um beijo.
Obrigada.
-Peraí,
Juliane: e se esse menino não tiver em casa?
-Aí
eu falo com o pai dele. Os dois são mais chegados, seu Arnaldo vai tentar dar
um jeito de convencer Peter. Eu só espero que ele não fique contra mim também,
senão eu me ferro de vez.
-Então,
boa sorte. Vamos ficar na torcida pra que o sogrão seja bem diferente do teu
novo namorado.
*****
O plano
de nossa musa era encaminhado perfeitamente. Quer dizer, nem tanto. O chato do
Inácio estava atrás dela quando esta chegou ao apartamento do namorado ou
ex-namorado, como queiram. Tudo isso era pra tentar convencê-la de que,
independentemente de onde ela possa morar, precisava levar Bernardo.
-Escuta só: eu sei
que você tá num problema sério com seu namorado, mas eu não posso deixar de
falar com você.
-O que é? Pedir pra
eu cuidar de Bernardo, de novo? Não entendeu nada do que está acontecendo,
Inácio? Meu filho não pode ser uma prioridade agora. Entende isso de uma vez.
-O que eu entendo é
que esse problema não é de agora, não. Você vai dar um jeito de adiar sempre.
Juliane bate na
porta de Peter.
-Pronto. Pode sair
agora?
-Tudo bem. Faz o
que você quiser. Eu vou embora.
-Desistiu rápido,
hein?
-Olha, Juliane: eu
vou buscar o Bernardo e levar o menino pra sua casa. Eu não quero saber a que
horas você vai chegar, mas vou ficar esperando.
-Inácio...
-Chega! Por
favor... Não tenta ser mais imatura do que esse tal de Peter.
Seu Arnaldo abre a
porta, sem ver que Inácio vai embora.
-Juliane? O que
houve? Você aqui?
-Eu preciso falar
com Peter- invade o recinto.
-Ele não foi atrás
de você... No capítulo 10?
-Foi, foi, mas a
gente teve uma briga, se desentendeu e agora eu não sei onde ele foi parar.
-Vou ligar pro
celular dele...
-Não adianta, nem
tenta. Passei o caminho todinho tentando ligar, e ele não atende. Ele não quer
falar comigo.
-Muito difícil. Meu
filho é doido por você.
-Ele era doido por
uma mulher sem filhos.
-Você é mãe?
-É... Sou...
Ninguém diz, né?
-Ninguém mesmo...
Que pecado.
-O quê?
-Tanta mulher se
mata na academia pra voltar ao corpo que tinha, e tu simplesmente... Tá nos
trinques!
-O senhor sabe onde
ele pode ter ido?
-Pra casa do Santiago,
aquele amigo dele, sabe?
-Gente boa.
-Pois é. Só que eu
acho difícil ele tá lá essa hora. O menino tem pegar o ônibus da PE-15 pra
chegar em casa.
-Mas ele tava
nervoso. Era pra ele ter procurado o senhor primeiro.
-Eu estava... Trabalhando.
-Certo. Já vi que
ele nem deve chegar cedo- senta no sofá e cruza as pernas (ela trajava uma
saia)- Posso esperar?
-Pode, sim. Quer
uma água? Acabei de gelar...
-Não, não. Eu tô
bem. Vou ficar melhor quando falar com ele.
-Agora que eu tô
notando. Com aquela agonia do acidente, eu nem vi. Mas o Peter me contou que
você era bem gostosa. Achava que era mentira dele, mas pelo visto...
-Eu- solta um
pigarro- acho melhor esperar lá fora.
-Não, pode ficar
aí- pede com a mão segurando o braço de Juliane- Se você tiver com vergonha, eu
peço desculpas.
-Seu... Arnaldo, né
isso? Vê só: a última vez que eu fiquei constrangida por causa de homem, foi
quando eu fui ao ginecologista pela primeira vez.
-Aposto que você
também deu em cima dele, como de Peter.
-Ele mentiu pro
senhor?
-Não, ele te
defendeu. Mas eu não acredito. Agora que te vi, menos ainda.
-O senhor quer
fazer o favor de parar com isso?
-E se faz de
ofendida, é mole? Parar com quê, Juliane? Eu ainda nem comecei.
-Tá se vendo que tu
tá bêbado!
-E daí? Qual o problema?
Eu ainda posso ver muito bem você e te querer.
-Chega, seu
Arnaldo- vira o rosto.
-Pensa que é
direito de família- segura-a violentamente- Meu filho pode, por que eu não
posso? Hein? Qual o problema de levar você pra minha cama e descobrir o que tanto
escondia naquele jaleco? Não é uma boa ideia, meu docinho?
Ela se defende
dando um tapa nele. Nesse momento, chega Peter e se espanta com o rosto do pai,
marcado pelos dedos da moça.
-O que é isso? Pai,
por que ela te bateu?
Os
dois ficam apreensivos e mudos. Enquanto procuram resposta, vamos elaborando o
próximo capítulo e deixamos nosso herói com uma cara de quem acabou de perceber
o dia às avessas que teve.
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