09/06/2017

VIDA LOUCA/ CAPÍTULO 6: VOCÊ ME OBRIGA A GRITAR

O telefone da casa de Ariane toca insistentemente, e Eduardo corre para atendê-lo. A mãe, que está no quarto, vem ate a sala para saber de quem se trata.
-Alô?
-Boa noite. Eu queria saber se é alguém da residência de Gabriela.
-Aqui é o irmão dela. Quem é?
-Sou um paramédico. A equipe do Samu está levando a sua irmã para o hospital.
-O que foi que aconteceu com ela?
-Houve uma colisão na Avenida Sul entre um táxi e outro veículo. A sua irmã, o motorista e outro ocupante estavam no carro.
-O Fábio... – conclui Eduardo.
-Filho, o que houve com a Gabriela?
-Peraí, Mãe, fica calma! Pra que hospital você estão levando eles?
-Hospital? Meu Deus do céu, o que é que está acontecendo?
-Sei, eu sei onde fica. Já estamos indo pra lá. Obrigado- desliga o telefone.
-Eduardo, fala pra mim o que foi que houve com a sua irmã.
-Teve uma batida, Mãe. Parece que ela tava com o Fábio.
-Como é que ela está? Me fala!
-Eu não sei, eu só sei que o Samu tá levando os dois pro hospital agora...
-Que hospital? Fala!
-Pro HR, Mãe.
-Você vai me fazer um favor: vai até a casa do Fábio e avisa o que aconteceu.
-Tá maluca? Não vou te deixar sozinha nessa situação!
-Gabriela contou uma vez que Fábio costuma andar sem celular e identidade. Se eles estiverem inconscientes, os médicos não vão avisar à família dele. Por favor, meu filho! Vai avisar aos pais dele que os dois foram pro HR, e depois me encontra lá.
-Tá bom, mas não fica mais nervosa. Melhor você pegar um táxi, não tem condição de sair desse jeito.
-Pega o dinheiro da passagem do ônibus no meu quarto.
-Não tem ônibus agora à noite, Mãe, tá tendo paralisação...
-Então, toma um táxi pra chegar até lá. Vem comigo, e eu peço pra te deixarem na casa do Caio e Alice. Vai lá em cima e pega o dinheiro, mas vai rápido, que a gente não pode perder tempo.
-Tudo bem, eu já vou.

Diego está procurando alimentos na geladeira do sobrado de Bete, enquanto está vê televisão na sala. O celular toca e ela vê que se trata de Nonato, outro usuário de drogas.
-Fala, Nonato.
-Tô precisando que você venha aqui e traga pra mim três cigarros.
-A essa hora? Tem certeza de que não vai dar problema pra mim?
-Já deixei teu nome na recepção, disse que você é minha paciente antiga. Você entra na minha sala e espera eu voltar pra lá, que eu te pago.
-Vê se não me dá calote, hein?
-Pode vir pra cá, mesmo a essa hora?
-É lógico que eu posso...
-Doutor- uma enfermeira se aproxima do médico- Levamos pra sala de medicação três pacientes que sofreram um acidente na Avenida Sul.
-Espera aí um minuto, tá?- Nonato abaixa o celular- Têm identificação?
-Um taxista, de nome Zenóbio Lacerda, e um casal de adolescentes. A moça se chama Gabriela Acioly Silveira, e o rapaz é um adolescente de aproximadamente dezoito anos.
-Fábio... – Bete constata ao ouvir a conversa entre Nonato e a enfermeira.
-Quem é, Bete?
-Fica quieto, Diego; não atrapalha!
-Tudo bem, eu já vou atender os três- volta para a ligação- Bete, já sabe onde me encontrar. Só toma cuidado pra não te verem sozinha na minha sala.
-Pode deixar, que eu me viro.
-Falou- encerra a ligação- Vamos, então- avisa à enfermeira.
-Que cara é essa, Bete? Quem era?
-Negócios, meu amor. Negócios- veste uma blusa de botão jogada no sofá.
-Onde é que você vai?
-Nós vamos. Você, pra sua casa; eu, resolver um assunto.
-Tá me tirando, é? Que tanto mistério é esse? Fala logo quem tava no celular contigo.
-A você eu não devo satisfação. Vai pra tua casa que é o melhor que você faz. Se eu precisar, te chamo. Agora vaza daqui.
Contrariado, Diego deixa o velho sobrado, acendendo um cigarro fornecido pela namorada. Bete vai ao seu quarto e pega os produtos pedidos pelo médico. Dentro do guarda-roupa, busca uma câmera digital. Verifica se ela está totalmente carregada e depois a desliga. Coloca o objeto numa bolsa e esconde as drogas no sutiã, saindo em seguida, atenta sobre a hipótese de ser observada.

Eduardo vai à casa de Alice e Caio, desembarcando do táxi em que também está Ariane, e corre até a porta da residência, tocando a campainha até que o pai de Fábio abra a porta.
-Eduardo? O que está fazendo aqui a essa hora?
-Cadê a Dona Alice? Eu preciso falar com ela. Aliás, com vocês dois.
-Eu estou aqui, Eduardo- Alice chega à porta da própria casa- Onde é que está o Fábio? Ele tinha dito que jantaria com a sua irmã.
-Fala, Eduardo. Cadê o Fábio?
-Gabriela e Fábio sofreram um acidente.
-O quê?- Caio não acredita na informação.
-Ligaram lá pra casa e avisaram que eles vinham num táxi pela Avenida Sul, mas sofreram um acidente. Um carro bateu.
-Tem certeza de que é o Fábio?
-O paramédico só conseguiu identificar Gabriela, e disse que estava junto com ela um rapaz de quase dezoito anos. Só pode ser o Fábio.
-Mas o que eles estavam fazendo na Avenida Sul?- Caio indaga o jovem- A casa de vocês nem perto fica desse lugar!
-Olha, Fábio teve que sair de lá. Gabriela foi procurar ele e na volta devem ter sofrido o acidente, já que ele saiu antes dela.
-Depois a gente fala sobre isso. O melhor a fazer é ir agora pro hospital. Onde ele está?- Caio se mostra preocupado.
-No HR.
-Então, vamos pra lá o quanto antes. Vem, Alice.
-Vamos; vamos, sim.
Caio tira o automóvel da garagem e, junto com a esposa e Eduardo, vai para o hospital.

Bete chega ao hospital, alegando que precisa falar com Nonato, e recebe autorização para entrar em seu consultório, uma vez que ele já havia deixado os recepcionistas de sobreaviso. Cada vez mais a hora avança, e mais a traficante fica tensa com o seu plano. Entrando na sala, tem o cuidado de fechar a porta. A jovem observa bem e vê uma pilha de livros mal alinhados sobre a mesa de Nonato e, do outro lado, uma maca desforrada. Abaixo dela, uma escada de dois degraus.
A namorada de Diego tira a câmera do bolso e coloca sobre o degrau mais alto da escada, empurrando-a para debaixo da maca, para em seguida puxar o lençol branco, a fim de deixá-lo pendurado sobre o colchão preto. Alegando naturalidade, toma para si a cadeira dos pacientes e fica em frente à mesa, aguardando a chegada do médico, que aparece em cinco minutos, tenso com a situação enfrentada pelo taxista, por Gabriela e por Fábio.
-Ainda bem que você já chegou. Estava pensando em te ligar de novo...
-Te falei que ia aparecer, não disse?
-Cadê a encomenda?
-Aqui- Bete desabotoa a blusa e mostra os cigarros dentro de seu sutiã.
-O que é isso, Bete?
-Tem dinheiro pra me pagar?
-Claro que eu tenho, não ia te chamar pra ficar de brincadeira.
-Ótimo. Só que... – Bete se aproxima do médico- Eu vim aqui pra que você me pagasse de forma diferente.
-O que é que você tá fazendo, garota? Você namora o Diego...
-Disso eu sei. Mas hoje eu não acho que só ele seja o suficiente pra mim- a traficante tira o sutiã, enrola os entorpecentes na vestimenta e os joga sobre chão- Quer o que eu te pedi? Então, vai ter que me dar o que eu quero.
-Para de brincar com fogo, menina... Podem pegar a gente aqui...
-Se você não gostasse do perigo, não tinha pedido pra eu vir até aqui, Nonato. É um preço razoável o que eu tô te cobrando.
-Por que isso agora?
-Eu sei o que você tá pensando, que eu sempre fui louca pelo Diego e, de repente, me ofereço pra você. Sabe o que é? Tem hora que a gente não se segura. Mesmo que eu nunca tenha falado, eu sempre quis ficar com você... Mas toda vez que você vinha me procurar, era só pra comprar cigarro, “pedra”, seringa... E então, Nonato? Vai negar fogo?
O médico tranca a porta do consultório e logo agarra a traficante, tentando levá-la para a maca, mas ela o arrasta para a mesa, derrubando todos os objetos que estão sobre o cômodo. Nonato joga o jaleco no chão e abre o zíper na calça, abaixando-a e ficando sobre Bete. A meliante puxa algumas vezes, durante o ato sexual, a cabeça do profissional médico para que ele não perceba a câmera que os registra naquele momento.

Com Luciano na delegacia, Vinicius está sozinho em casa, com as luzes apagadas e na sala, fazendo uso de substâncias ilícitas fornecidas por Bete. Alguém toca a campainha. Receoso de que seja o pai e que tenha novamente outra discussão com ele, o colega de classe de Fábio apaga o cigarro que consome e o esconde atrás do aparelho televisivo.
-Aposto que o senhor esqueceu a chave, né, Pai?- pergunta, antes de destrancar a porta e dar de cara com Victória.
-Você não esperava mesmo que eu viesse, não é, Vinícius?

Encerrada a transa no consultório, Nonato deixa a mesa de trabalho e, ainda desnudo, abaixa-se para pegar o sutiã de Bete, chegando a sentar-se no chão para fumar um dos cigarros que a moça trouxe. Plena, a jovem veste sua roupa, sorridente e em silêncio, olha para o médico, também satisfeito.
-Nunca imaginei que isso fosse acontecer um dia.
-Pois é, Nonato- abaixa-se até a escada, interrompendo a gravação e causando estranhamento no médico- Mas tinha que acontecer.
-O que é isso, Bete?- pergunta, já um pouco inebriado pelo efeito da droga.
-Achei que fosse bom a gente tem uma lembrança desse momento tão especial. Isso aqui, Nonato, é a prova do quanto a noite foi interessante pra nós dois. Muito mais pra mim do que pra você. Dá uma olhada- Bete mostra o conteúdo da filmagem para o médico.
-Vai fazer o quê com isso? Apaga essa gravação agora, Bete!
-E me livrar do meu trunfo contra você? Nem pensar, Nonato. Tá com medo de que Diego veja, né? Mas não se preocupe, que ele não vai chegar nem perto dessa câmera. Já o diretor do hospital vai ficar muito interessado em saber que um funcionário faz sexo com uma moça desconhecida bem no local de trabalho.
-Por que você fez isso comigo?
-Porque isso vai garantir que você faça o que eu quero, Nonato. Pra esse vídeo não parar na mão do diretor do hospital, você vai ter que mentir.
-Quê? Que história é essa? Me dá essa câmera agora, senão eu juro que eu vou... – Nonato tenta tomar a câmera de Bete, mas acaba com a visão turva, caindo no chão do consultório.
-Você nem se aguenta em pé e vai querer me ameaçar? Se toca, imbecil!
-O que é que você quer pra ninguém ver essa gravação? Dinheiro? Se for isso, eu te dou...
-Dinheiro eu consigo com qualquer viciado idiota feito você. Não é nada demais. Você só vai ter que contar uma mentira pra um dos seus pacientes.
-Que paciente, Bete?

-Fábio Prado Vasconcelos. Só precisa mentir pra ele e eu destruo essa gravação.

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