O
telefone da casa de Ariane toca insistentemente, e Eduardo corre para
atendê-lo. A mãe, que está no quarto, vem ate a sala para saber de quem se
trata.
-Alô?
-Boa
noite. Eu queria saber se é alguém da residência de Gabriela.
-Aqui
é o irmão dela. Quem é?
-Sou
um paramédico. A equipe do Samu está levando a sua irmã para o hospital.
-O
que foi que aconteceu com ela?
-Houve
uma colisão na Avenida Sul entre um táxi e outro veículo. A sua irmã, o
motorista e outro ocupante estavam no carro.
-O
Fábio... – conclui Eduardo.
-Filho,
o que houve com a Gabriela?
-Peraí,
Mãe, fica calma! Pra que hospital você estão levando eles?
-Hospital?
Meu Deus do céu, o que é que está acontecendo?
-Sei,
eu sei onde fica. Já estamos indo pra lá. Obrigado- desliga o telefone.
-Eduardo,
fala pra mim o que foi que houve com a sua irmã.
-Teve
uma batida, Mãe. Parece que ela tava com o Fábio.
-Como
é que ela está? Me fala!
-Eu
não sei, eu só sei que o Samu tá levando os dois pro hospital agora...
-Que
hospital? Fala!
-Pro
HR, Mãe.
-Você
vai me fazer um favor: vai até a casa do Fábio e avisa o que aconteceu.
-Tá
maluca? Não vou te deixar sozinha nessa situação!
-Gabriela
contou uma vez que Fábio costuma andar sem celular e identidade. Se eles
estiverem inconscientes, os médicos não vão avisar à família dele. Por favor,
meu filho! Vai avisar aos pais dele que os dois foram pro HR, e depois me
encontra lá.
-Tá
bom, mas não fica mais nervosa. Melhor você pegar um táxi, não tem condição de
sair desse jeito.
-Pega
o dinheiro da passagem do ônibus no meu quarto.
-Não
tem ônibus agora à noite, Mãe, tá tendo paralisação...
-Então,
toma um táxi pra chegar até lá. Vem comigo, e eu peço pra te deixarem na casa
do Caio e Alice. Vai lá em cima e pega o dinheiro, mas vai rápido, que a gente
não pode perder tempo.
-Tudo
bem, eu já vou.
Diego
está procurando alimentos na geladeira do sobrado de Bete, enquanto está vê
televisão na sala. O celular toca e ela vê que se trata de Nonato, outro
usuário de drogas.
-Fala,
Nonato.
-Tô
precisando que você venha aqui e traga pra mim três cigarros.
-A
essa hora? Tem certeza de que não vai dar problema pra mim?
-Já
deixei teu nome na recepção, disse que você é minha paciente antiga. Você entra
na minha sala e espera eu voltar pra lá, que eu te pago.
-Vê
se não me dá calote, hein?
-Pode
vir pra cá, mesmo a essa hora?
-É
lógico que eu posso...
-Doutor-
uma enfermeira se aproxima do médico- Levamos pra sala de medicação três
pacientes que sofreram um acidente na Avenida Sul.
-Espera
aí um minuto, tá?- Nonato abaixa o celular- Têm identificação?
-Um
taxista, de nome Zenóbio Lacerda, e um casal de adolescentes. A moça se chama
Gabriela Acioly Silveira, e o rapaz é um adolescente de aproximadamente dezoito
anos.
-Fábio...
– Bete constata ao ouvir a conversa entre Nonato e a enfermeira.
-Quem
é, Bete?
-Fica
quieto, Diego; não atrapalha!
-Tudo
bem, eu já vou atender os três- volta para a ligação- Bete, já sabe onde me
encontrar. Só toma cuidado pra não te verem sozinha na minha sala.
-Pode
deixar, que eu me viro.
-Falou-
encerra a ligação- Vamos, então- avisa à enfermeira.
-Que
cara é essa, Bete? Quem era?
-Negócios,
meu amor. Negócios- veste uma blusa de botão jogada no sofá.
-Onde
é que você vai?
-Nós
vamos. Você, pra sua casa; eu, resolver um assunto.
-Tá
me tirando, é? Que tanto mistério é esse? Fala logo quem tava no celular
contigo.
-A
você eu não devo satisfação. Vai pra tua casa que é o melhor que você faz. Se
eu precisar, te chamo. Agora vaza daqui.
Contrariado,
Diego deixa o velho sobrado, acendendo um cigarro fornecido pela namorada. Bete
vai ao seu quarto e pega os produtos pedidos pelo médico. Dentro do guarda-roupa,
busca uma câmera digital. Verifica se ela está totalmente carregada e depois a
desliga. Coloca o objeto numa bolsa e esconde as drogas no sutiã, saindo em
seguida, atenta sobre a hipótese de ser observada.
Eduardo
vai à casa de Alice e Caio, desembarcando do táxi em que também está Ariane, e
corre até a porta da residência, tocando a campainha até que o pai de Fábio
abra a porta.
-Eduardo?
O que está fazendo aqui a essa hora?
-Cadê
a Dona Alice? Eu preciso falar com ela. Aliás, com vocês dois.
-Eu
estou aqui, Eduardo- Alice chega à porta da própria casa- Onde é que está o
Fábio? Ele tinha dito que jantaria com a sua irmã.
-Fala,
Eduardo. Cadê o Fábio?
-Gabriela
e Fábio sofreram um acidente.
-O
quê?- Caio não acredita na informação.
-Ligaram
lá pra casa e avisaram que eles vinham num táxi pela Avenida Sul, mas sofreram
um acidente. Um carro bateu.
-Tem
certeza de que é o Fábio?
-O
paramédico só conseguiu identificar Gabriela, e disse que estava junto com ela
um rapaz de quase dezoito anos. Só pode ser o Fábio.
-Mas
o que eles estavam fazendo na Avenida Sul?- Caio indaga o jovem- A casa de
vocês nem perto fica desse lugar!
-Olha,
Fábio teve que sair de lá. Gabriela foi procurar ele e na volta devem ter
sofrido o acidente, já que ele saiu antes dela.
-Depois
a gente fala sobre isso. O melhor a fazer é ir agora pro hospital. Onde ele
está?- Caio se mostra preocupado.
-No
HR.
-Então,
vamos pra lá o quanto antes. Vem, Alice.
-Vamos;
vamos, sim.
Caio
tira o automóvel da garagem e, junto com a esposa e Eduardo, vai para o
hospital.
Bete
chega ao hospital, alegando que precisa falar com Nonato, e recebe autorização
para entrar em seu consultório, uma vez que ele já havia deixado os
recepcionistas de sobreaviso. Cada vez mais a hora avança, e mais a traficante
fica tensa com o seu plano. Entrando na sala, tem o cuidado de fechar a porta.
A jovem observa bem e vê uma pilha de livros mal alinhados sobre a mesa de
Nonato e, do outro lado, uma maca desforrada. Abaixo dela, uma escada de dois
degraus.
A
namorada de Diego tira a câmera do bolso e coloca sobre o degrau mais alto da
escada, empurrando-a para debaixo da maca, para em seguida puxar o lençol
branco, a fim de deixá-lo pendurado sobre o colchão preto. Alegando
naturalidade, toma para si a cadeira dos pacientes e fica em frente à mesa,
aguardando a chegada do médico, que aparece em cinco minutos, tenso com a
situação enfrentada pelo taxista, por Gabriela e por Fábio.
-Ainda
bem que você já chegou. Estava pensando em te ligar de novo...
-Te
falei que ia aparecer, não disse?
-Cadê
a encomenda?
-Aqui-
Bete desabotoa a blusa e mostra os cigarros dentro de seu sutiã.
-O
que é isso, Bete?
-Tem
dinheiro pra me pagar?
-Claro
que eu tenho, não ia te chamar pra ficar de brincadeira.
-Ótimo.
Só que... – Bete se aproxima do médico- Eu vim aqui pra que você me pagasse de
forma diferente.
-O
que é que você tá fazendo, garota? Você namora o Diego...
-Disso
eu sei. Mas hoje eu não acho que só ele seja o suficiente pra mim- a traficante
tira o sutiã, enrola os entorpecentes na vestimenta e os joga sobre chão- Quer
o que eu te pedi? Então, vai ter que me dar o que eu quero.
-Para
de brincar com fogo, menina... Podem pegar a gente aqui...
-Se
você não gostasse do perigo, não tinha pedido pra eu vir até aqui, Nonato. É um
preço razoável o que eu tô te cobrando.
-Por
que isso agora?
-Eu
sei o que você tá pensando, que eu sempre fui louca pelo Diego e, de repente,
me ofereço pra você. Sabe o que é? Tem hora que a gente não se segura. Mesmo
que eu nunca tenha falado, eu sempre quis ficar com você... Mas toda vez que
você vinha me procurar, era só pra comprar cigarro, “pedra”, seringa... E
então, Nonato? Vai negar fogo?
O
médico tranca a porta do consultório e logo agarra a traficante, tentando
levá-la para a maca, mas ela o arrasta para a mesa, derrubando todos os objetos
que estão sobre o cômodo. Nonato joga o jaleco no chão e abre o zíper na calça,
abaixando-a e ficando sobre Bete. A meliante puxa algumas vezes, durante o ato
sexual, a cabeça do profissional médico para que ele não perceba a câmera que
os registra naquele momento.
Com
Luciano na delegacia, Vinicius está sozinho em casa, com as luzes apagadas e na
sala, fazendo uso de substâncias ilícitas fornecidas por Bete. Alguém toca a
campainha. Receoso de que seja o pai e que tenha novamente outra discussão com
ele, o colega de classe de Fábio apaga o cigarro que consome e o esconde atrás
do aparelho televisivo.
-Aposto
que o senhor esqueceu a chave, né, Pai?- pergunta, antes de destrancar a porta
e dar de cara com Victória.
-Você
não esperava mesmo que eu viesse, não é, Vinícius?
Encerrada
a transa no consultório, Nonato deixa a mesa de trabalho e, ainda desnudo,
abaixa-se para pegar o sutiã de Bete, chegando a sentar-se no chão para fumar
um dos cigarros que a moça trouxe. Plena, a jovem veste sua roupa, sorridente e
em silêncio, olha para o médico, também satisfeito.
-Nunca
imaginei que isso fosse acontecer um dia.
-Pois
é, Nonato- abaixa-se até a escada, interrompendo a gravação e causando
estranhamento no médico- Mas tinha que acontecer.
-O
que é isso, Bete?- pergunta, já um pouco inebriado pelo efeito da droga.
-Achei
que fosse bom a gente tem uma lembrança desse momento tão especial. Isso aqui,
Nonato, é a prova do quanto a noite foi interessante pra nós dois. Muito mais
pra mim do que pra você. Dá uma olhada- Bete mostra o conteúdo da filmagem para
o médico.
-Vai
fazer o quê com isso? Apaga essa gravação agora, Bete!
-E
me livrar do meu trunfo contra você? Nem pensar, Nonato. Tá com medo de que
Diego veja, né? Mas não se preocupe, que ele não vai chegar nem perto dessa
câmera. Já o diretor do hospital vai ficar muito interessado em saber que um
funcionário faz sexo com uma moça desconhecida bem no local de trabalho.
-Por
que você fez isso comigo?
-Porque
isso vai garantir que você faça o que eu quero, Nonato. Pra esse vídeo não
parar na mão do diretor do hospital, você vai ter que mentir.
-Quê?
Que história é essa? Me dá essa câmera agora, senão eu juro que eu vou... –
Nonato tenta tomar a câmera de Bete, mas acaba com a visão turva, caindo no
chão do consultório.
-Você
nem se aguenta em pé e vai querer me ameaçar? Se toca, imbecil!
-O
que é que você quer pra ninguém ver essa gravação? Dinheiro? Se for isso, eu te
dou...
-Dinheiro
eu consigo com qualquer viciado idiota feito você. Não é nada demais. Você só
vai ter que contar uma mentira pra um dos seus pacientes.
-Que
paciente, Bete?
-Fábio
Prado Vasconcelos. Só precisa mentir pra ele e eu destruo essa gravação.
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