31/10/2014

MENTES/ CAPÍTULO 15: EXAUSTOS DE AMAR

Levada para a emergência de um hospital, Giovanna sofreu um corte na cabeça. Está deitada numa maca, queixando-se de dor. Bruno, nervoso, acompanha a moça, o médico e os enfermeiros.
-Me diz o que você “tá” sentindo!
-Bruno... Bruno...- derrama lágrimas.
-Eu vou cuidar de você e do nosso filho.
-Você quis atirar em mim. Você quis me matar!
-O que essa moça está dizendo?- questiona o médico.
-Delírio, doutor!
-Eu não vou perdoar você nunca pelo que me fez, Bruno! Você vai pagar por isso, eu juro- entra numa sala. Bruno tenta entrar, mas é impedido.
-Por favor, é minha mulher e meu filho!- grita.
-Assim que ela for atendida, nós vamos dar notícias. Mas eu peço que o senhor mantenha a calma e aguarde aqui fora- pede uma enfermeira.
-Manter a calma? Minha mulher quase sofrendo um aborto, correndo risco de morte e você me pede calma?
-Vai ser o único jeito pro senhor se manter aqui dentro! Com licença!
Bruno leva a mão direita à cabeça quando o celular toca.
-Alô?
-Bruno, é Noêmia. Aconteceu alguma coisa?- a frase é suficiente para fazer o rapaz chorar- Bruno?
-O apartamento sofreu um assalto, Noêmia. Eu tentei me defender do ladrão, mas a Giovanna...
-O que houve com a menina?
-Ela caiu da escada, até agora não voltou a si.
-Sabia que estava acontecendo alguma coisa, eu estava sentindo... – o desespero da governanta chama a atenção de Plínio, que se levanta da mesa e vai ao telefone- E onde vocês estão?
-No Hospital da Solenidade, aqui no centro.
-Eu vou pegar um táxi e daqui a pouco chego aí. Não se preocupe, ela vai sair dessa. Prometo que vou rezar pra ficar tudo bem, meu querido- desliga o telefone.
-Quem era, Noêmia?
-Liguei pro Bruno, doutor.
-Havia acontecido alguma coisa mesmo?
-A casa deles foi assaltada, e a Giovanna acabou caindo da escada.
-Não é possível. Como foi que isso aconteceu?
-Não sei, eu estou indo pro hospital ficar com o Bruno.
-Espera, eu vou com você.
-Então, vamos, senhor.

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Marisa, a mãe de Giovanna, chega ao Hospital da Solenidade para ver a filha.
-Marisa? Como você soube?
-Um médico ligou pra mim. Disse que a minha filha chamou por mim.
-Desculpe não ter ligado, mas eu estava sem cabeça.
-O que aconteceu?
-Foi um acidente, eu juro.
-Bruno, sem rodeios. Daqui dá pra ouvir que ela não para de falar o seu nome. O que foi que você fez?
-Eu... Quase atirei nela.
-Mas... Por que você fez isso? Ficou maluco de vez?
-Eu queria acertar um ladrão! Um homem mandou que eu transferisse dinheiro pra conta dele, me ameaçou, assim como à Giovanna.
-Será que isso não é conversa sua? Muitas vezes, a minha filha tem ido à minha casa pra reclamar dos escândalos que você tem se metido ultimamente!
-Escuta, Marisa! Não foi minha intenção machucá-la, ainda mais no estado em que ela está.
-Tomara que não aconteça nada com ela, nem com o bebê. Porque se acontecer, eu não sei o que vou ser capaz de fazer contra você.
-Ah, não torra, Marisa!
-Me respeite, seu irresponsável. Independente do que aconteça, é por sua causa que a minha filha veio parar aqui. E espero que saia com vida!

ALGUMAS HORAS DEPOIS...

Marisa, Bruno, Noêmia e Plínio estão esperando notícias de Giovanna. A enfermeira vem da sala de emergência.
-A Sra. Marisa, mãe de Giovanna, está aqui?
-Sou eu. Como é que está a minha filha?
-Felizmente está fora de perigo, mas o quadro dela ainda inspira cuidados.
-Vocês vão me deixar entrar pra vê-la?- pergunta Bruno.
-Desculpe, senhor, mas só é permitido uma pessoa de cada vez, e ela chamou pela mãe.
-Mas que absurdo é esse? Eu a trouxe até aqui, e “tô” há mais tempo esperando!
-Só estamos atendendo a um pedido da sua esposa, senhor. Peço que fique mais calmo.
-Da próxima vez que você disser pra me acalmar, eu vou te fazer engolir uma cartela de Rivotril! Incompetente!
-Chega da sua imaturidade, Bruno!- Plínio toma a palavra, com autoridade- É um direito dela não querer te ver! Deixa de ser infantil e acaba com esse escândalo todo.
-Pelo menos, você pode me dizer se o bebê “tá” bem?
-O doutor ainda está examinando a paciente pra saber como vai a gestação. Daqui a pouco, ele trará notícias. Senhora... – abre a porta para Marisa passar.
-Obrigada.
-Quanto tempo mais eu vou ter que esperar por notícias?
-Bruno, o médico logo virá pra trazer alguma novidade sobre o caso da Giovanna. Tenha um pouco mais de paciência, meu querido.
-Noêmia, eu não sei quanto tempo vou aguentar. E se a enfermeira “tiver” mentindo? Se a coisa foi mais grave e eu não sei?
-Bruno?
-Iago? O que é que você quer agora?
-Seus vizinhos escutaram um disparo no seu apartamento, e avisaram à polícia. Quase não acreditei quando cheguei lá e vi um porta-retratos seu. Eu sei que eu já andei fazendo bastante essa pergunta, mas você está me obrigando a isso: o que você tem a dizer sobre isso?

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-Filha? Filha, eu estou aqui... Como você está?
-Sentindo muita dor.
-O médico deu algum medicamento pra você?
-Deu, mas o remédio demora pra fazer efeito.
-E o bebê?
-O médico disse que eu não tenho nem dois meses de gravidez, e que os primeiros três são de risco de aborto. Ele pediu que não fizesse nenhum esforço, já que eu sofri duas quedas em pouco tempo.
-Quer dizer que o seu filho está bem?
-“Tá”, sim, mãe. Quanto a isso, eu já posso ficar aliviada.
-Ainda bem... Filha, eu vou chamar o Bruno pra ele entrar.
-Ele “tá” aí?
-Sim, está esperando por você há horas. Ficou decepcionado porque a enfermeira não o deixou entrar.
-Mãe... – começa a chorar- Você vai ter que fazer dois favores pra mim.
-Peça o que quiser, Giovanna.
-Eu quero que você peça ao médico que não diga a ninguém sobre o estado de saúde do meu filho.
-Mas por que isso, Giovanna?
-Faz isso pra mim, mãe. E confia em mim.
-Tudo bem. Pedirei descrição ao doutor. E o outro favor?
-Chama o Bruno aqui, só ele. E não diz a ninguém que o meu filho “tá” bem.
-Mas por que esse mistério todo, minha filha?
-Só tem um jeito de eu seguir adiante com essa gravidez, sem sofrer perigo nenhum. Não me pergunte nada agora, só faça o que eu “tô” te pedindo, por favor.
-Como você quiser, minha querida. Quando o Bruno sair, eu volto pra ficar com você- beija a testa da filha, bastante fragilizada.

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-Espera... Você “tá” me dizendo que entrou um ladrão na sua casa, você se defendeu usando uma arma que encontrou no sofá e quase matou a sua esposa por engano?
-Por mais absurdo que possa parecer, essa é a verdade.
-Realmente, não dá pra engolir essa. Ainda mais você sendo reincidente.
-Olha aqui, pare de me tratar como um bandido! Eu não vou admitir isso, entendeu?
-Ah, não? Então, você vai me dizer que passou por toda aquela burocracia chata de comprar um revólver, ter porte de arma e tudo?
-Iago, eu nunca atirei em ninguém, nem matei! Você tem que acreditar em mim, porque a maior vítima dessa história foi a minha mulher!- Plínio continua incrédulo diante das declarações do filho.
-Bruno? A Giovanna quer te ver.
-Como ela “tá”, Marisa?
-Disse que quer falar sobre isso pessoalmente.
-Tudo bem. Com licença.
-Dona Marisa, ela está bem mesmo?
-Está, Noêmia. Só precisa repousar mais um pouco.
-E o bebê?
-Não sei. Ela não quis me dizer nada a respeito- desconversa.

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Bruno se aproxima da cama em que a esposa está deitada.
-Meu amor? Como é que você “tá”?
-Como você queria: parada, sem poder me mexer, morrendo de dor.
-Mas isso vai passar. O importante é que você “tá” fora de perigo.
-O perigo só me ronda quando você fica do meu lado.
-Não fala isso, por favor.
-Depois de tudo que eu passei hoje por sua causa, você vem me pedir pena de você? Compaixão pra que a gente fique juntos? Como você é patético, Bruno... Patético, não! Um psicopata que quer me manipular! Me enlouquecer!
-Escuta... Um ladrão entrou em casa, pediu que eu fizesse a transferência da minha conta pessoal pra dele e ameaçou a nós três.
-Nós três...
-Quando ele “tava” saindo, eu encontrei uma arma, e tentei me defender, querendo fazer que ele cancelasse a transferência e...
-Chega! A quem você pensa que engana? Eu me lembro perfeitamente do que aconteceu! Ninguém, além de mim e você, “tava” na casa! Você fez isso porque eu “tava” decidida a não ter mais a vida de casada com você, que eu só “tava” lá por conta do bebê, porque eu queria dar tranquilidade a ele. Não seja hipócrita!
-É por ele, Giovanna... Meu amor, é por ele mesmo que nós devemos ficar juntos.
-Não perca seu tempo. Esse pretexto já não convence mais.
-Giovanna, você não pode jogar aquilo que construímos juntos pro alto. Pensa no nosso filho!
-Qual? O que você matou quando me derrubou da escada?
-“Matei”? Você “tá” me dizendo que...
-Que o nosso filho não existe mais, Bruno. Eu sofri um aborto depois da queda.
-Não pode ser- afasta-se da cama, e leva a mão à cabeça novamente.
-E sabe de quem é a culpa disso? Somente sua! Foi você que matou o nosso filho, Bruno!

30/10/2014

MENTES/ CAPÍTULO 14: EU DARIA A MINHA VIDA PRA NÃO MAIS TE VER



-O que foi, Seu Bruno?
-Silvia, você lembra se essa moça... Enfim, se ela veio com alguma coisa na mão? Uma bolsa, uma sacola, algo do tipo?
-Se eu não me engano, ela apareceu aqui com uma mochila.
-E você não deu pela falta de nada?
-Só da caixa que eu organizei, com os pertences da Virna. Mais nada, senhor.
-Pelo menos, você a viu saindo com isso?
-Bom, quando eu trouxe o copo d’água pra ela, eu voltei e ela não estava mais aqui.
-Isso explica muita coisa.
-Continuo sem entender.
-Funcionário não entende, Silvia, executa o que a gente manda fazer. Mas tudo bem. Eu acho que já soube o suficiente.
-Espero não ter feito nada de errado.
-Pode ficar certa de que não fez. Eu só preciso saber como isso interferiu na... Deixa pra lá. Guarde esse levantamento que amanhã eu vou analisá-lo.
-Tenha uma boa tarde, doutor.
-Pra você também.

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O bandido contratado por Valentina já está no apartamento de Bruno e Giovanna. Ele escuta quando a jovem chega ao local.
-Bruno? Bruno, você chegou?
A bailarina encontra um buquê com muitas rosas em sua casa. Lê o cartão que o acompanha.
-Que elas simbolizem um casamento regado a um amor que nunca se acaba, e que se multiplica através dessa criança. Bruno.
-Se eu conseguisse acreditar em você, a minha agonia acabava... – amassa-o, ressentida.
Giovanna suspira e joga o buquê sobre o sofá, subindo para tomar banho. O delinquente vê que a moça está prestes a entrar no quarto e se esconde atrás do guarda-roupa, afastando-o vagarosamente para que não seja percebido.
Ao entrar, Giovanna não sente o quão perto o móvel está de si e da entrada do quarto. Tira a roupa e vai para debaixo do chuveiro. O meliante sai do esconderijo ao ouvir Bruno chegar. Coloca o capuz e tranca a porta de maneira a não fazer a bailarina escutar.
-Giovanna?- pergunta Bruno, após ver o buquê jogado e o cartão amassado. É surpreendido com o ladrão descendo às escadas, vestido de preto, com a arma em punho.
-Quem é você?
-O que foi, irmão? Quer que eu mostre minha identidade também?
-Cadê a minha mulher? O que você fez com ela?
-O que eu vou fazer, “né”? Mas vai depender de você. Se fizer direitinho o que eu mandar, ninguém se machuca. Apaga a luz.
-Como é que é?
-Apaga a luz agora!- grita, fazendo Bruno obedecê-lo.

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Na cozinha da mansão, Plínio se dirige à Noêmia.
-A que horas posso mandar servir o jantar, doutor?
-Acredito que umas sete e meia.
-Mas tão tarde?
-William foi fazer um trabalho da escola na casa de um amigo dele.
-Eu notei que ele estava um tanto triste hoje, quando saiu. Era impressão minha?
-Conversamos sobre a mãe dele. Contei como a conheci, como nos envolvemos.
-Mas por que o senhor resolver falar disso?
-Ele não me deu escolha, acabou fazendo muitas perguntas. Uma hora, a gente cansa de tanta mentira, de tanto segredo... Era direito dele de saber.
-Só que a verdade é muito dolorosa.
-O que na minha vida não é, Noêmia? A começar pelo meu primogênito.

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No pequeno escritório do apartamento, estão Bruno e o bandido armado. O primeiro está diante do computador, na mira da arma do segundo.
-O que é que você quer? Por que me trouxe pra cá?
-Grana, imbecil! Pensou que era o quê? Uma visita? Você vai passar todo o dinheiro da sua conta pra essa daqui- entrega-lhe os números em um papel.
-Eu não posso fazer isso! Não todo o dinheiro!
-Quer que eu dê um fim na cadela que “tá” lá em cima? Ou quer que eu me livre do filho dela?
-Você não vai tocar no meu filho!- levanta-se.
-Não vou se tu “colaborar”- empurra-lhe, fazendo-o cair novamente na cadeira. Agora manda o dinheiro pra essa conta, rápido!
Bruno realiza a transferência após digitar os números.
-E agora? Vai embora daqui?
-Não, ainda não. Agora, apaga o histórico de senha.
-Pra que isso?
-Não banque o esperto comigo. Pensa que eu não sei que vai tentar descobrir a minha conta? Anda logo, apaga o histórico do dia.
O procedimento é realizado.
-Sai daqui! Deixa a minha mulher e a mim em paz- diz, em tom frio.
-Tudo bem. Mas vai me acompanhar pra ninguém desconfiar de nada. Até a porta da frente.
-“Tá”. Mas some daqui de uma vez.
O bandido põe a arma na calça, e sai lentamente do escritório, ao lado de Bruno. Quando ambos chegam à sala, o arqueólogo encontra uma arma ao lado do buquê e do cartão. Sem pensar, o rapaz segura o revólver e aponta para o meliante, de costas.
-Você vai sumir, sim... Mas antes... Vai devolver o meu dinheiro.
Buscando se defender da ameaça, o ladrão se vira e bate na arma, jogando-a longe. Começa, então, uma luta entre Bruno e o marginal, que consegue empurrá-lo contra um vaso da sala, correndo pelas escadas. Em determinado segundo, o arqueólogo perde a consciência, mas segue procurando a arma.
-Bruno?- indaga Giovanna em voz baixa, ao ouvir o barulho do vaso quebrando na sala, devido ao baque sofrido por Bruno. Neste momento, ela se enrola na toalha, ao passo que o ladrão destranca a porta do quarto sem que ela perceba. Ele entra em outro quarto do apartamento e foge pela janela do primeiro andar, entrando em outra casa.
Ao levantar-se, Bruno procura o revólver que encontrara há pouco tempo. A sala está escura, mas ele não se lembra de ativar o interruptor.


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Noêmia sente uma palpitação.
-Noêmia? “Tá” tudo bem?
-Não, doutor. O Bruno!
-O que tem ele?
-Ele está correndo perigo. A gente tem que ajudar ele.
-Ajudar? Ajudar como, Noêmia? Do que você “tá” falando?
-Eu não sei, doutor, não sei! Mas alguma coisa diz no meu coração que ele está correndo um perigo muito grande!

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Em silêncio, Giovanna desce às escadas. A vista de Bruno ainda está turva com a pancada que recebeu devido ao empurrão dado pelo ladrão. O que ele vê é apenas a sombra da moça, descendo lentamente por estar com medo do que se aproxima.
O jovem encontra o revólver, e aponta para a parede que exibe a sombra. Giovanna vê que o marido segura um revólver e abre a boca pra chamá-lo, mas ele dispara contra a parede. O susto faz a bailarina rolar às escadas, gritando. Ao chegar ao chão, está desacordada. Bruno, enfim, reconhece a voz da esposa.
-Giovanna? Giovanna, fala comigo! Meu amor, acorda! Acorda, Giovanna!- bate no rosto dela repetidas vezes- Giovanna, me responde! Por favor, Giovanna! Socorro! Socorro! Alguém ajuda a minha mulher, Socorro!

29/10/2014

MENTES/ CAPÍTULO 13: JÁ NÃO SEI VIVER NESSE CLIMA DE SUSPENSE



-William, eu não quero mais falar desse assunto.
-Eu quero saber, pai! Por que vai me esconder? Não ficou quieto durante esse tempo todo? Eu quero saber mais da minha mãe. Me fala!
-É muito difícil pra mim ter que tocar nesse assunto, meu filho. Peço que você me entenda...
-Por favor, pai.
Plínio não vê outra alternativa a não ser falar o que consegue sobre Letícia.
-Nós iniciamos um caso, sim. Ficamos juntos durante um ano, até que a mãe do Bruno nos flagrou juntos.
-Você gostava mesmo da minha mãe?
-Filho, a sua mãe é a mulher da minha vida. Eu a amo até hoje, mesmo ela não estando conosco.
-Então, por que você não se separou da mãe do Bruno? Por que ficou com as duas?
-Sabia que mesmo com o nosso casamento morno, ela ainda gostava de mim, e ela tinha esperanças de que, um dia, nós voltaríamos a ser como éramos no começo.
-O senhor mentiu pra mim. Uma vez, eu perguntei isso aí e o senhor disse que conheceu a minha mãe depois que a mãe do Bruno morreu. “Tô” entendendo por que o senhor ficou tão nervoso. Porque, no fundo, a minha mãe é culpada pelo acidente dela...
-Não, William. Ela não teve culpa, foi um acidente. Uma fatalidade. Olha pra mim, meu filho- segura o rosto do adolescente- Eu amava a sua mãe, e eu não podia ser privado desse amor que eu sentia.
-Mentindo pra outra pessoa? O senhor fez o Bruno não gostar de mim.
-Pode ser cedo ainda, mas eu sei que você vai acabar me entendendo. Afinal, você sempre me entende. É o único que reconhece o que faço de bom. O que eu sei, filho, é que você representa a minha felicidade com a Letícia, e eu não posso magoar você também, como um dia eu fiz com o Bruno.
Sensibilizado com as palavras ditas pelo pai, o garoto o abraça, aos prantos pela verdade descoberta. Plínio fica preocupado em como a revelação ainda pode afetar seu relacionamento com o filho.

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-Há quanto tempo você... Que nós estamos esperando esse bebê?
-O médico disse que já tenho sete semanas.
-E como foi que desconfiou?
-Hoje, eu senti uma tontura na escola de dança e acabei caindo, desmaiada. Uma aluna minha me levou ao posto de saúde. Lá, eu recebi a notícia.
-Eu não posso acreditar.
-No quê? Na minha gravidez?
-Não é isso. Não acredito que eu não “tava” junto de você quando essa notícia chegou. Por que você não me avisou? Mesmo por telefone…
-Uma hora teria que saber. Eu queria tomar coragem.
-Pra quê? Pra ser feliz? Já não é o suficiente comigo?
-Se fôssemos, você teria recebido essa notícia de maneira mais animada.
-Acontece que você acabou de dar a melhor notícia da minha vida. E, no entanto, nós estamos construindo uma família como dois estranhos.
-Depois de tudo que “tá” acontecendo, eu tenho até medo do que vou descobrir quando te conhecer realmente. Se é que isso pode acontecer algum dia, já acho essa possibilidade remota.
-Não tem mais nada pra saber sobre mim.
-Bruno... Vamos fazer o seguinte? Que tal, pro bem desse bebê, uma espécie de... “Política da boa vizinhança”?
-Continuo sem acreditar que você pode ter coragem de me propor isso.
-Antes isso do que o divórcio. Pelo bem do meu filho, eu estou disposta a passar por cima de tudo o que soube sobre você. Mas eu acho melhor que você não toque em mim, nem no meu filho. Eu não suportaria ter de me voltar contra o homem com quem me casei.
-Nosso filho!- corrige-lhe- Eu ainda vou mostrar que tudo que disseram de mim foi uma mentira. Não sei se foi pra me separar de você, ou se foi pra...
-Pouco me interessa as razões, Bruno. Se você é vítima, aja com tal. Só que eu vou avisar: se acontecer mais alguma coisa, nunca mais... Ouviu bem? Nunca mais você vai ver a mim e ao nosso filho.
-Giovanna... Pensa no que você “tá” fazendo com a gente.
-Eu não tenho o que pensar, nem do que me arrepender. Sinceramente, Bruno, eu espero que você também não tenha. Aproveite o jantar. Vou tomar meu banho e dormir. Se quiser, durma lá depois.
Bruno vê sua esposa subir as escadas e senta à mesa de jantar. Pega a faca e lembra da agressão que cometeu contra Abílio.
-Não vai me custar nada fazer você voltar pra mim, meu amor. E finalmente vamos ter a família que eu idealizei.

UMA SEMANA DEPOIS...

Valentina entra em um supermercado. Pergunta a um dos vendedores:
-Com licença, onde é que eu encontro detergente em pó?
-Terceiro corredor à direita.
-Obrigada.
A moça se abaixa para pegar uma cesta e coloca dois detergentes, quando um homem armado se aproxima.
-Valentina?
-Como é que você...
-Sou o cara que você pediu ao chefe.
-Até que enfim. Já não aguentava mais esperar.
-O chefe me explicou como vai funcionar o esquema.
-Mas olha, é só um susto, viu? Não é pra machucar ninguém.
-Só tem que me dar o endereço. A que horas eu passo lá?
-Espera até as cinco horas. É quando ela chega da escola. Tranca ela no quarto, e coloca bala de festim no revólver. Não deixa a Giovanna te ver.
-Mas e o tal de Bruno?
-Ele vai querer defender a esposa e o filhinho. Mas vai se dar muito mal. Estimule o ódio dele. Ele tem que sentir vontade de matar você.

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Bruno está arrumando a pasta pessoal. Silvia entra na sala do arqueólogo.
-Desculpe, Dr. Bruno.
-Ah, não. Mais trabalho?
-O ultimo dos levantamentos de hoje. O senhor esqueceu de analisar.
-Não esqueci. Protelei pra amanhã. Simples assim.
-Nesse caso, eu guardo na minha gaveta e entrego amanhã.
-Silvia, me permite fazer uma pergunta?
-Claro.
-A Virna... Ela era cleptomaníaca?
-Clepto o quê?
-Santa ignorância... Ela já roubou alguma coisa, que você tenha percebido? Sentido falta aqui dentro do escritório?
-Seu Bruno, a Virna era minha amiga. Não tinha como ela fazer esse tipo de coisa sem que eu percebesse. O senhor vai me desculpar, mas... Por que a pergunta?
-Tinha um objeto que eu consegui numa viagem. Eu guardava aqui dentro da minha sala. De repente, sumiu.
-Vai ver o senhor guardou em outro lugar.
-Amnésias instantâneas não são diagnosticadas em mim há pelo menos duas décadas, Silvia- olha para a estante- O cunhado dela esteve aqui?
-O Leandro? Não. Ele nunca veio aqui.
-Pensei que como era da polícia, talvez tivesse vindo aqui.
-Não, veio outro rapaz procurando o senhor.
-O Iago...
-Esse mesmo.
-Quando a Virna saiu daqui, ela deve ter deixado os pertences pessoais, não foi?
-Sim, eu coloquei tudo numa caixa pra deixar aqui na sala e...
-E o quê?
-A irmã dela veio buscar.
-No dia seguinte à demissão? No dia do meu casamento.
-Não, senhor, depois que a Virna tinha falecido.
-A tal de Valentina esteve na minha sala?
-Sim, ela veio buscar as coisas e eu deixei ela sozinha por um momento, pra pegar um copo d’água.
-Quer dizer que foi ela... Ela roubou a bomba!- pensa.