(Téo olha para Jesus, demonstrando por um breve momento
constrangimento de estar sozinho com Ele.)
TÉO: Anoiteceu de novo. Melhor eu ir pra casa.
JESUS: Ficou com vontade de voltar pra faculdade?
TÉO: Fiquei. Mas tenho tanta coisa atrasada por lá, não
sei se eu vou dar conta.
JESUS: Quanto a isso, não se preocupe. Tem uns lugares
que estão mesmo esperando você voltar.
TÉO: Como assim?
JESUS: Téo, Eu sei que se dependesse de você, já teria
ido embora, mas tem uma história que quero te contar.
TÉO: Outra parábola? E vai falar sobre quem agora?
JESUS: Sobre você.
(Otávio entra no templo seguido por Ícaro, um dos seus
filhos. O pai coça a cabeça.)
ÍCARO: Vi na televisão que o inverno desse ano vai ser
mais frio que os outros... Pai? Pai, o senhor tá me ouvindo?
OTÁVIO: O quê? Você estava falando de quê?
ÍCARO: Ih, a cabeça tá longe... Pensando em quem?
OTÁVIO: Deixa pra lá, filho. Você vai sair?
ÍCARO: É, eu tenho que passar no terreno de Ingazeira
pra tocar a colheita. Deixa eu ir-me embora porque daqui pra lá é longe e eu
chego amanhã cedo. A bênção, Pai. (beija a mão direita de Otávio)
OTÁVIO: Deus te abençoe, filho. Vê se não corre pela
BR, nem esquece a habilitação em casa.
ÍCARO: Relaxa... (Ícaro sai de perto de Otávio porém,
em vez de entrar no corredor, vai até a porta de entrada do templo e fica em
silêncio)
(Otávio olha para a cruz que fica na parede atrás do
púlpito e ajoelha-se para orar, com a cabeça curvada.)
TÉO: Calma aí, a história não é sobre mim? Onde é que
eu entro nisso?
JESUS: Está preocupado com o tempo?
TÉO: Exatamente. Já virou o dia, ficou de noite... Meu
tempo é precioso.
JESUS: Tudo que me pertence é precioso. Por isso mesmo
você tem que se acalmar... O tempo é meu!
(Luan entra no local, olhando apenas para Otávio.)
LUAN: O triste estado em que eu me encontro agora
Sem cama, sem comida, meu corpo de fora
E ninguém me deseja
É grande o meu sofrimento
Pois o meu alimento
É o que dos porcos sobeja
(Otávio levanta o seu rosto e olha para Luan.)
LUAN: Estou colhendo aquilo que plantei
Pois quem amava muito abandonei
Tornei-me diferente
E o dinheiro que eu tinha
A herança que era minha
Gastei dissolutamente
(Otávio levanta-se do chão e começa a sorrir.)
LUAN: Mas levantar-me-ei do meu pecado
Meu Deus me dará forças pra sair
Irei e falarei abertamente
E direi sinceramente: “ó Pai,
Pequei contra os céus e perante Ti
Não sou digno de ser chamado filho Teu
Me recebe ao menos como empregado Teu
Me recebe, ó Pai”
(Luan abraça Otávio, que agradece a Jesus sem olhar
para a direção em que Ele está.)
OTÁVIO: O Senhor escutou a minha oração! Obrigado,
Jesus! Muito obrigado, Senhor!
ELTON: (entra no templo correndo) Seu Otávio... Me
desculpa, mas é que ele passou pelos seguranças. Vou chamar a polícia...
LUAN: Não tá me reconhecendo mais, Elton?
ELTON: (aproxima-se do filho pródigo) Luan? Cara, você
tá muito diferente! Sério, eu pensei que era um daqueles mendigos que ficam lá
fora esperando uma esmola.
(Jesus afasta-se de Téo e aproxima-se de Luan e
Otávio.)
OTÁVIO: Pois isso vai se resolver agora. Vá até o quarto
dele e traz a roupa, o anel e os sapatos que eu comprei pra quando ele voltasse.
A volta dele não vai passar em brancas nuvens. Prepare uma festa para hoje à
noite.
ELTON: Sim, senhor. Com licença.
(Ouve-se Jesus cantando em tom baixo “Tua glória”.)
JESUS: Meu coração e esperança estão em Ti
Meu viver é Seu, pois me fez ser filho e santo
Santo, santo
(Elton caminha pelo lado esquerdo do templo, como quem
vai cruzar a porta principal. Ícaro vai pelo lado oposto e ouve Jesus cantando,
mas não olha para a área central do templo – onde estão também Otávio, Luan e
Téo. O irmão do filho pródigo avista Elton e chama pelo funcionário.)
ÍCARO: Elton, vem aqui, por favor.
ELTON: (corre até Ícaro) Fala, Ícaro. O que foi?
ÍCARO: Que música é essa que tá tocando? O som vem lá
de casa?
ELTON: Foi tudo de repente, seu pai deve ter se
esquecido de te avisar.
ÍCARO: Avisar o quê? O que é que tá acontecendo?
ELTON: Luan voltou pra casa hoje. Quer motivo melhor pra
teu pai fazer uma festa? Dá licença, que eu vou pra porta receber o pessoal.
(Elton sai pela porta principal e Ícaro, irritado,
caminha vagarosamente olhando para seu pai e seu irmão. Há alguns segundos de
silêncio, até que Otávio perceba a presença do filho mais velho. Jesus para de
cantar assim que o jovem entra novamente no local.)
OTÁVIO: Filho, já viu quem está aqui? Seu irmão voltou
pra casa! (Ícaro vai à porta do corredor em silêncio, até que o pai impede a
sua saída). Aonde você vai, Ícaro? Não
vai comemorar a volta do seu irmão?
ÍCARO: (volta a olhar para o pai e o irmão) Uma cena
muito bonita, mas eu não tenho o menor interesse em participar.
LUAN: Não ficou feliz em me ver de novo?
ÍCARO: Foi bom você ter aparecido porque eu quero tirar
uma dúvida: contou pra ele o que fez mundo afora?
LUAN: Você não sabe tudo o que eu passei...
ÍCARO: Quem é que não sabe? Gastou tudo que tinha com quem
não prestava, e depois passou fome quando não tinha sobrado mais nada. Por isso
o seu interesse de voltar. E é fácil quando você sabe que toda vez ele vai
abrir a porta pra te receber!
OTÁVIO: Não acredito que você se irritou tanto porque a
gente está junto de novo.
ÍCARO: Sabe qual é o problema? Parece que desobedecer
gera recompensa. Tô com mais raiva do senhor do que dele.
OTÁVIO: De mim?
ÍCARO: Quantas vezes o senhor ficou triste porque eu deixei
de te obedecer? Nenhuma! E quando foi que o senhor deixou que eu trouxesse meus
amigos pra comemorar alguma coisa?
OTÁVIO: Meu filho, você nunca precisou me pedir nada
porque tudo sempre foi seu, sempre esteve comigo. Você sabe quantas noites eu
pedi ao Senhor pra proteger Luan sem saber se ele estava vivo ou morto. E por
isso eu sei que vai entender a necessidade de comemorar. Assim como eu agradeço
pela vida dele, agradeço pela sua. Porque todos os motivos são razões pra
engrandecer o nome do Senhor.
(Luan estende a mão para Ícaro segurar. O rapaz olha
para baixo, evitando ver novamente o rosto do filho pródigo. Então, Jesus une
os irmãos, que se abraçam. Otávio coloca suas mãos sobre os ombros dos filhos,
e os três vão embora pela porta do corredor.)
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