30/08/2025

ATRAÍDOS PELO SILÊNCIO | CENAS 16 E 17

 Cena 16 (ruas de Afogados)

(fundo musical original: “O que é” – “é o que é, né, Zé? É o que é! É o que é!”)

Três propagandas da banda Raiz de Vento surgem num outdoor, numa placa e num painel em Led do bairro de Afogados.

• No outdoor da Rua São Miguel (Edifício Nossa Senhora de Belém), aparece a capa do álbum “Canto de tudo que clareia”, com a inscrição “disponível nas plataformas de música”;

• Em uma placa próxima ao prédio, indicando o cruzamento da Rua São Miguel com a Rua Bezerra da Palma, lê-se “Raiz de Vento / O que é”;

• No painel em Led da Estrada dos Remédios (próximo ao Novo Atacarejo), Pedro Lemos aparece traduzindo para a Libras o trecho executado da canção (extraído do videoclipe original).

A transição termina mostrando a antena da TV Leão do Norte.


Cena 17 (corredor da emissora/ estúdio da emissora)

Bel está largando do trabalho, sendo seguida por suas colegas repórteres (à exceção de Márcia), até ser surpreendida pela aparição de Alex.

ALEX: Espera.

BEL: Você aqui?

ALEX: Eu preciso conversar com você.

BEL: É sério? Você falando Língua de Sinais?

ALEX: Aprendi por sua causa. Foram os dois anos mais difíceis da minha vida.

BEL: Porque a Libras é difícil?

ALEX: (olha para cima) Também. O pior foi ficar longe de você.

BEL: (bota as mãos sobre a boca, incrédula) Aprendeu mesmo! Até a expressão facial de nervosismo!

ALEX: Pode ser pressão alta.

BEL: (ri) Mas você veio aqui só pra mostrar a Libras?

ALEX: Não. Também vim pra te perguntar: a gente pode começar de novo?

Num primeiro momento, Bel olha comovida para o rapaz. Mas muda a feição ao dizer:

BEL: Você sabe que isso que você fez é Português Sinalizado, né?

Impaciente, Alex volta à sua língua materna e declara:

ALEX: Me abraça logo, Bel! A única coisa que eu sei é aquilo que Reginaldo Rossi cantava: “eu não presto, mas eu te amo” (faz concomitantemente o sinal de “eu te amo” na Língua de Sinais)!

As jornalistas acompanham apreensivas o desenrolar da situação.

(fundo musical original: “Tanto faz” – “mas o inverno vai passar/ e esse dia vai chegar/ e você vai voltar pra mim/ eu sei, eu sei/ eu sei”)

Rendida, Bel retoma o namoro com o abraço solicitado. Laura, Zélia, Carolina e Vera aplaudem a cena.

(obs.: enquanto a música é executada, as imagens são exibidos em câmera lenta. A câmera perpassa os rostos felizes do casal, e faz alguns giros pelo cenário – mas de maneira que não fique evidente que as atrizes gravaram em dias diferentes de Fernanda e Rafael)

Helena sorri, filma a reconciliação de Alex e Bel e envia o vídeo para Matheus. Ele vê por alguns segundos e coloca o celular sobre a bancada do jornalístico, para depois falar consigo mesmo.

MATHEUS: Sério mesmo que ela ficou com esse cara, que nem bonito é? O amor é cego mesmo, hein?

Márcia simula ser cega e volta ao estúdio do “Jornal Sensorial” usando óculos escuros e chegando perto de Matheus.

MÁRCIA: Ótimo! Se o amor é cego, a solução é tocar subitamente ela puxa o apresentador e beija sua bochecha direita)!

Créditos finais

Dirigido, escrito e interpretado por

ANA PAULA SANTOS

(“Laura”)

ANA TEREZA GUEDES

(“Helena”)

CELIA BISPO

(“Zélia”)

CLAUDIA TIANY

(“Márcia”)

FERNANDA SANTOS

(“Bel”)

HILBER GONÇALVES

(“Natália”)

RAFAEL PATRÍCIO

(“Alex”)

TACIANA KARINE

(“Carolina”)

THIAGO BARROS

(“Matheus”)

THIAGO SALES

(“Pedro”)

e

VERÔNICA ALICE

(“Vera”)

Participações

CAUÃ ARAUJO

(“Dinho”)

e

RAIZ DE VENTO

professores

FABIO HENRIQUE MOTA

LUIZ HENRIQUE COSME

edição

INSHOT

KINE MASTER

efeitos visuais

PAINT

efeitos sonoros

CAPCUT

KINE MASTER

MOISES

XRECORDER LITE

Fontes de pesquisa

DIÁRIO DE PERNAMBUCO

(“Censo: Pernambuco tem a 3ª maior proporção de pessoas com deficiência do Brasil” – Milena Galvão)

DISCOGS

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ

(“Direitos e saúde sexual das pessoas com deficiência” – Laís S. Costa e colaboradores)

INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SANTA CATARINA

(“O que é capacitismo e como podemos combatê-lo” – Giovana Perine, com colaboração de Sabrina D'Aquino e Liane Dani)

G1 PERNAMBUCO

(“Em Pernambuco, 74,5% das pessoas com deficiência estão fora do mercado de trabalho” – Nathalia Dielú)

GOVERNO FEDERAL

(“Confira o panorama dos surdos na educação brasileira” – Assessoria de Comunicação Social do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira)

JORNAL DO COMMERCIO

(“Pernambuco tem 10,3% da sua população com deficiência e o desafio de prover acessibilidade e inclusão” – Adriana Guarda)

RÁDIO NACIONAL

(“Brasil tem mais de 10 milhões de pessoas surdas, segundo o IBGE” – Sayonara Moreno)

TERRA

(“3 tipos de surdez e suas formas de tratamento” – Cidiana Pellegrin)

YOUTUBE MUSIC

músicas adicionais

“SONHOS”

Compositor e intérprete: Peninha

“SÓ VALE COM VOCÊ”

Compositor: Lupa Mabuze

Intérprete: Luciana Mello

“LEMBRANÇAS”

Compositores: Erasmo Carlos e Roberto Carlos

Intérprete: Kátia

“CONTRA O TEMPO”

Compositor: Vander Lee

Intérprete: Rita Benneditto

“ESCALADA”

Compositores: Carlos Sergio e Jorge Silva

Intérprete: Augusto César

“CHEIA DE MANIAS"

Compositor: Luiz Carlos

Intérprete: Raça Negra

“NA PAZ DO SEU SORRISO”

Compositores: Erasmo Carlos e Roberto Carlos

Intérprete: Roberto Carlos

“MEU COFRINHO DE AMOR”

Compositores: Elias Soares e João Martins

Intérprete: Elino Julião

“MEU HOMEM (NOBODY DOES IT BETTER)”

Compositores: Carole Bayer Sager e Marvin Hamlisch

Versionista e intérprete: Fafá de Belém

“MR. FUNKY SAMBA”

Compositor: Jamil Joanes

Intérprete: Leo Gandelman

“O QUE É”

Compositor: Franklin Silva

Intérprete: Raiz de Vento

“TANTO FAZ”

Compositores: Anayle Lima e Michael Sullivan

Intérprete: Raimundo Fagner

Agradecimentos

BRUNA PIRES

CAUÃ ARAUJO

GERALDA REIS

LUIZ HENRIQUE COSME

PEDRO LEMOS

Esta é uma obra independente de ficção, produzida para a Semana Estadual da Pessoa com Deficiência, baseada na livre criação artística e sem compromisso com a realidade.

© 2025 Secretaria de Educação e Esportes / Gerência Regional de Educação Recife – Sul / Escola de Referência em Ensino Médio Amaury de Medeiros


29/08/2025

ATRAÍDOS PELO SILÊNCIO | CENAS 13, 14 E 15

 Cena 13 (estúdio da emissora – painel da pomba)

MATHEUS: Você sabia que as pessoas com deficiência têm o direito de trabalhar na legislação brasileira?

A tela é dividida ao meio mais uma vez.

MATHEUS: Desde quando, Zélia? Conta pra gente.

ZÉLIA: No ano de 1991, foi estabelecido que até 5% dos funcionários das empresas brasileiras sejam pessoas com deficiência.

MATHEUS: Essa lei é respeitada na prática, Zélia?

ZÉLIA: Não, Matheus. Os dados são mais preocupantes: 71% das pessoas com deficiência que estão aptas a trabalhar estão fora do mercado.

MATHEUS: E se a deficiência for cognitiva?

ZÉLIA: A porcentagem sobe para 80%!

MATHEUS: Quais são as ações do Governo para esse público?

ZÉLIA: Em 2023, o Ministério dos Direitos Humanos criou o plano Novo Viver Sem Limites. O objetivo é combater a violência e a discriminação contra estas pessoas, além de promover a inclusão e a acessibilidade.

MATHEUS: Vamos torcer pra dar certo. Zélia, obrigado pela participação.


Cena 14 (estúdio da emissora)

MATHEUS: Tire as crianças da sala! Vamos receber agora a Márcia Annenberg, que escreveu uma tese de doutorado sobre os desejos das pessoas com deficiência... (olha para os lados e não encontra a escritora) Cadê ela?

(fundo musical original: “Meu homem (Nobody does it better)” – “não tinha notado você se chegando”)

Márcia surge de costas para a câmera, soltando os cabelos em câmera lenta e depois olhando para o âncora.

MÁRCIA: Estava me procurando?

MATHEUS: Sim. Boa tarde, Márcia.

MÁRCIA: (olha Matheus de cima a baixo) Muito boa... (passa a língua sobre o lábio superior)

MATHEUS: O que você descobriu quando fez a pesquisa sobre sexualidade?

MÁRCIA: Muitos acreditam que as pessoas com deficiência têm uma redução dos seus desejos (abaixa-se, para depois aparecer subitamente atrás de Matheus)... Mas é mentira!

MATHEUS: (expressa surpresa) Ah, é? Isso tem base em quê?

MÁRCIA: Na Lei Brasileira de Inclusão, que diz que a deficiência não afeta a capacidade de decidir.

MATHEUS: Interessante...

MÁRCIA: Vai ficar mais ainda! (abaixa-se novamente)

Matheus procura a pesquisadora, mas não a vê.

MATHEUS: Ela já foi? Que pena! Queria perguntar quais são os direitos relacionados à sexualidade.

Enquanto Matheus está ainda à procura de Márcia, ela surge sentada sobre a bancada, surpreendendo o apresentador depois de dizer algumas palavras.

MÁRCIA: Respeito a todos os corpos, e acesso a educação sobre o tema. Conversar sobre isso faz com que “o sinal não seja avançado”...

A explicação é interrompida quando Márcia sente um cheiro incomum no estúdio.

MATHEUS: O que foi?

MÁRCIA: (aproxima-se do rosto de Matheus) Cheiro de homem! O que você está usando, querido?

Receoso, Matheus coloca sobre a bancada um desodorante corporal Natura Homem Cor.agio. Um zoom mostra o produto com a inscrição “vendido pela Bunitinha Cosméticos”.

Terminado o zoom, Márcia está atrás do âncora, em pé.

MATHEUS: Você tá muito romântica hoje, hein?

MÁRCIA: Se o amor é crime, eu sou traficante!

(fundo musical original: “Meu homem (Nobody does it better)” – “tentei me esconder do seu olhar, do seu amor ”)

Márcia, então, puxa Matheus para a parte de trás da bancada, como se fosse beijá-lo. Os dois ficam quatro segundos sem aparecer para o público.


Cena 15 (estúdio da emissora)

Tentando recuperar-se, Matheus submerge da parte traseira da bancada com a gravata na boca, a camisa desabotoada e uma das mangas esticadas até o pulso.

MATHEUS: Antes de encerrar o jornal, vamos à previsão do tempo. Isabel Kovalick, como está o clima em Pernambuco?

BEL: Boa tarde, Matheus. Boa tarde a todos. O clima aqui está quente, mas lá fora não.

MATHEUS: (recompõe-se aos poucos) Muito frio?

BEL: Demais! (passa a mostrar um gráfico projetado para os espectadores) Calor só vai ter no Sertão, onde a temperatura vai chegar aos trinta e cinco graus.

Imediatamente, Matheus e visto abanando-se com a própria camisa. A imagem passa a ter um filtro amarelo, indicando o calor.

MATHEUS: E no Agreste?

BEL: A temperatura no Agreste é mais baixa, e a velocidade dos ventos é de cem quilômetros por hora.

Um vento forte toma conta do estúdio. Matheus parece agarrar a algo para não voar. Desesperado, pergunta:

MATHEUS: E na Zona da Mata?

BEL: Muito frio, com temperatura de vinte e um graus até o começo da madrugada. Temos algumas nuvens e muitas pancadas de chuva.

Subitamente, um rolo de macarrão atinge a cabeça de Matheus, que cai ao chão. A câmera permanece estática, e vê-se a mão trêmula do âncora tentando levantar. Quando ele se põe de pé novamente, questiona com enfraquecimento:

MATHEUS: Como está o Litoral?

BEL: Litoral? Pior do que todos!

MATHEUS: (apavorado) Mais chuva?

BEL: Não, pode ficar tranquilo.

Matheus enxuga a testa, demonstrando alívio.

BEL: Mas a Apac percebeu que tem raios chegando.

Bel fica assustada quando um clarão invade o estúdio, acompanhado de uma trovoada. Neste momento, Matheus está completamente cinza, soprando fumaça.

BEL: Bem... O “Jornal Sensorial” fica por aqui. Voltaremos amanhã, depois que a ambulância chegar. Boa tarde.

As luzes são desligadas e os créditos finais são exibidos. Bel organiza uma série de papéis sem nada sinalizar.

(fundo musical original: “Mr. Funk Samba”)

(fundo musical alternativo: “[News] Music for news programs 40 (1478902)”)

Editora-chefe

Iaci Guedes

Editoras

Demylli Vitória

Irene Vitória

Produtora

Mariane Vitória

Editora de imagens

Mikaelly Cristina

Câmeras

Renan Gustavo

Richard Cauan

Coordenadora

Carla Fernanda

Editora-chefe de arte

Anne Karoline

Arte

Ana Paula Sena

Videografismo

Tereza Silva

Sonoplasta

Josenete Melo

Diretor de imagens

Pyerre Rogério

Produtora de tecnologia

Silvana Tenorio

Supervisor de imagens

Alex Lucena

Chefe de reportagem

Rafaella Briane

Gerente de jornalismo

Ian Lemos

Diretora de jornalismo

Alexsandra Rocha

Realização

TV Leão do Norte

© 2025

www.tvleaodonorte.com.br


28/08/2025

ATRAÍDOS PELO SILÊNCIO | CENAS 10, 11 E 12

 Cena 10 (corredor da escola entre a cantina e o banheiro)

Natália está sobre um banco sem encosto, simulando uma cadeira de rodas. A câmera faz uma espécie de zigue-zague com os alunos – ora aproximando-se deles, ora afastando-se. Pedro vem na direção contrária da moça, caminhando com ar de seriedade. Ambos olham para a filmadora.

NATÁLIA: C-A-P-A-C-I-T-I-S-M-O.

PEDRO: “A deficiência sempre vai estar acima de quem a pessoa é”.

NATÁLIA: “Uma pessoa com deficiência nunca será superior a quem é normal”.

PEDRO: “Os lugares estão prontos, a pessoa com deficiência é quem não consegue se locomover”.

NATÁLIA: “Se você não tem um corpo bonito e forte, você não é normal”.

PEDRO: “Eu sempre vou perguntar pra outras pessoas, deficientes não são capazes de responder”.

NATÁLIA: “Essas pessoas tinham que ter uma sala de aula só pra elas”.

PEDRO: “Eu consigo fazer tudo sozinho, elas não”.

Finalmente Pedro fica face a face com Natália. Ele parece olhar-lhe com desprezo. Surpreendentemente, ele abaixa-se para ficar à altura dela.

NATÁLIA: Mude de ideia.

A tela escurece e a voz de Pedro é ouvida.

PEDRO: Siga uma nova rotina: acrescente uma dose de respeito a cada dia.

LETREIRO: Erem Amaury de Medeiros.


Cena 11 (Rua 5 de Novembro) 

(fundo musical original: “Meu cofrinho de amor” – introdução / “volta, meu bem, meu amor, minha vida; estou te esperando/ volta depressa, que o meu coração está quase parando”)

A cena começa com a câmera posicionada de maneira torta, filmando a Rua 5 de Novembro. Filma-se Alex pedalando para a direção norte, e depois as imagens acompanham a expressão de aflição que o rapaz faz, temendo não chegar a tempo de encontrar Bel novamente.


Cena 12 (estúdio da emissora – painel dos pirulitos)

MATHEUS: Em novembro vai acontecer o Enem. Surdos podem fazer a prova, Carolina?

A tela se divide ao meio.

CAROLINA: Podem, sim, Matheus. Em 2023, trinta e oito mil pessoas pediram atendimento especializado pra fazer a prova.

MATHEUS: Por que, Carolina?

CAROLINA: Porque estas pessoas declararam ter algum tipo de deficiência.

MATHEUS: Os surdos terão acesso a quais recursos?

CAROLINA: O primeiro é um intérprete de Libras e o segundo é a leitura labial.

MATHEUS: Não se esqueceu de nada, Carolina?

CAROLINA: Ah, verdade. Também tem a videoprova em Libras: o edital e as opções de resposta são interpretadas nesta língua.

MATHEUS: Sabe quais são os dias da prova?

CAROLINA: 9 e 16 de Novembro.

MATHEUS: E qual o valor da inscrição?

CAROLINA: (faz cara de dúvida antes de retrucar) Acabou o prazo, macho!

MATHEUS: Vou fazer no ano que vem.

CAROLINA: Pra qual curso?

MATHEUS: Engenharia, a gente ganha mais. Obrigado, Carolina.


27/08/2025

ATRAÍDOS PELO SILÊNCIO | CENAS 7, 8 E 9

 Cena 7 (estúdio da emissora – painel “quem ama, cuida”)

MATHEUS: Começa hoje uma propaganda idealizada por alunos de uma escola pernambucana. Laura Padrão traz os detalhes pra gente.

A tela se divide ao meio.

LAURA: Boa tarde pra todos que estão nos assistindo. Os alunos são da Escola de Referência em Ensino Médio Amaury de Medeiros, localizada em Afogados.

MATHEUS: E qual é o tema do projeto?

LAURA: Deficiência física é o tema do vídeo, Matheus. O objetivo é evitar o preconceito contra as pessoas que possuem deficiência motora.

MATHEUS: Quais são os alunos?

LAURA: Os nomes dos alunos são Pedro e Natália. A gravação aconteceu dentro da escola.

MATHEUS: Muito bom! Quando vamos ver isso?

LAURA: Não vai demorar. É hoje, na hora do intervalo comercial do nosso jornal. Não desliga a TV.

MATHEUS: Tô ansioso já! Obrigado, Laura. Boa tarde.

LAURA: (com irritação, mas sem olhar para a câmera) Se a tarde fosse boa, eu estaria na Praia do Buraco da Velha... (arrepende-se do que diz) Próxima notícia, por favor.


Cena 8 (estúdio da emissora – porta do Charles Chaplin)

Matheus percebe o constrangimento e coça a nuca rapidamente, mas prossegue com o programa.

MATHEUS: 788.647 pernambucanos declararam ter algum tipo de deficiência no último censo. Quem vai falar sobre isso é a Vera Niz.

VERA: É isso mesmo, Matheus. O Nordeste é a região com maior porcentagem de pessoas com deficiência. Pernambuco está empatado com o estado do Ceará, na terceira posição.

MATHEUS: Os primeiros, quais são?

VERA: O primeiro é Alagoas e o segundo é o Piauí.

MATHEUS: Por que o Nordeste tem o maior número?

VERA: Algumas razões: o envelhecimento da população, a desigualdade econômica e o acesso limitado aos serviços básicos.

MATHEUS: Tem uma lista das cidades de Pernambuco divulgada pelo IBGE?

VERA: Sim, Matheus. Recife é a cidade de Pernambuco com mais pessoas com deficiência. Depois vem Jaboatão dos Guararapes, Caruaru, Paulista e Olinda.

MATHEUS: Tem quantos em Recife?

VERA: 122.861 pessoas, muita gente!

A tela se divide ao meio.

MATHEUS: Verdade. Muito obrigado, Vera.

A tela volta a exibir somente Matheus.


Cena 9 (estúdio da emissora – painel “love”)

MATHEUS: Você sabe como uma pessoa com deficiência visual pode aproveitar as belezas de Pernambuco? Explica pra gente, Helena Henning.

A tela se divide ao meio.

HELENA: Verdade, Matheus. O Governo de Pernambuco criou um projeto chamado “Paisagens sonoras”.

MATHEUS: Como funciona?

HELENA: Através da audiodescrição, as pessoas com deficiência visual têm acesso a nove lugares de Pernambuco. Alguns desses lugares são o Litoral, o Sertão e a Zona da Mata.

MATHEUS: Precisa agendar, Helena?

HELENA: Não precisa, Matheus. É só entrar no site: www.paisagenssonoras.com.br e descobrir as belezas do nosso estado.

MATHEUS: Agora que você falou, eu reparei: a cada dia você está mais bonita, hein?

(fundo musical original: “Na paz do seu sorriso” – “e a beleza é nada/ se for comparada/ com tudo que eu vejo em você”)

Helena é vista de perto, sorridente e passando o dorso de sua mão esquerda sob o queixo.

Quando a música para, as imagens voltam ao ponto no qual Helena foi filmada inicialmente. Ela lança um olhar sedutor enquanto comunica-se com o âncora.

HELENA: Meu bem, você ainda não viu nada!

MATHEUS: Bom trabalho pra você, Helena. Depois do intervalo, a previsão do tempo para o estado.

(fundo musical: “[News] Music for news programs 40 (1478902)”)

Exibe-se a transição do estúdio para um painel em Led com uma propaganda do salão de beleza de Danilo Alves, que trabalhava como ator nos curtas-metragens anteriores (“No lugar do outro” e “Mãos proibidas”). O horário marca: 14:15.

PAINEL: Danilo Alves Spa dos Cabelos/ ife/ (81) 99712-7897.


26/08/2025

ATRAÍDOS PELO SILÊNCIO | CENAS 4, 5 E 6

 Cena 4 (sala de aula)

O céu é filmado e a câmera desce até a porta da sala 01. Alex chega diante da entrada e fica reticente em ingressar. Após alguns segundos de indecisão, ele toma coragem e entra no local. Ao sentar-se, vê que no quadro há uma frase dita pelo pedagogo Paulo Freire: “Me movo como educador porque, primeiro, me movo como gente”. Acima dela, a data corrente: 04/03/2022.

As mãos de Dinho são vistas quando ele está a caminho de onde o estudante novato está. O professor de Libras está portando uma caneta hidrográfica preta. O ex-namorado de Bel está com o rosto abaixado, levantando-o quando o educador chega, já estranhando o nervosismo do aluno. Temendo o que o profissional dirá, o protagonista masculino desata a falar.

ALEX: Você deve ser o professor, né? Vê só, cara: eu sou uma negação nesse assunto, sabe? E até um tempo atrás eu não via importância nenhuma. Eu pensava: “aprender pra quê?”. Mas aí a minha ex, que é surda...

Sobre a imagem ouve-se o ruído de uma freada de automóvel, no exato momento em que Dinho exclama:

DINHO: Para! Não pode falar Português!

ALEX: (com decepção, continua usando a linguagem oral, olhando para o chão) Ele também é... Cara, vou te falar que esse negócio é muito complicado! Pra você ter uma ideia...

DINHO: (faz de maneira veloz) Qual é o teu nome?

ALEX: (repete o sinal de “seu nome”) Pô, eu tô ligado que eu tô falando mais que a boca, mas não precisa me cortar... (é surpreendido quando o professor põe a mão em seu bolso e grita) O que é isso? Tem uma nota de duzentos aqui!

Dinho retira a identidade do estudante e aponta para a foto de Alex.

ALEX: (aponta para si) Eu?

DINHO: (balança a cabeça afirmativamente e olha para a carteira antes de soletrar o nome do aluno) A-L-E-X (aponta para o estudante, que tenta fazer a datilologia do próprio nome).

ALEX: A...L... Como é o resto?

(fundo musical original: “Só vale com você” – parte instrumental que antecede a primeira interpretação do refrão)

Desanimado, Dinho joga a identidade para o alto. Subliminarmente, a data do quadro muda para 16/09/2022, indicando que o tempo vai passar enquanto Alex é ensinado.

Através de uma mescla de tomadas, o público pode ver Alex treinando alguns dos sinais que Dinho interpreta em sala de aula. A cada vez que o professor for focalizado, a data muda no quadro: para 02/03/2023, 23/06/2023 e 15/12/2023. E sempre que Alex for visto treinando com o professor, um livro é acrescentado à sua carteira.

Uma imagem das folhas das árvores, embaladas pelo vento, surge para fazer a transição para a cena seguinte.


Cena 5 (sala de estar / bicicletário)

Chegamos à data de 29 de agosto de 2025. Alex (agora de camisa preta) senta-se numa poltrona e liga a TV, sintonizada numa emissora chamada Leão do Norte. O estudante presta atenção quando o locutor anuncia:

LOCUTOR: Assista agora: “Jornal Sensorial”... Na TV Leão do Norte.

De maneira que parece compreender a vinheta como um sinal, Alex balança a cabeça afirmativamente e sai da sala de estar.

(fundo musical original: “Contra o tempo” – “corro contra o tempo pra te ver/ eu vivo louco por querer você/ morro de saudade, a culpa é sua”)

Correndo pelo pátio, Alex vai à grade na qual sua bicicleta está amarrada, desprende-a e deixa o local.

Obs.: para dar o aspecto de rapidez, a corrida de Alex é filmada em dois ângulos – atrás do rapaz e do seu lado esquerdo – mesclando as imagens captadas na edição do filme.


Cena 6 (estúdio da emissora – escalada)

O telejornal apresentado por Matheus começa com uma vinheta de patrocínio.

LOCUTOR: Potencialize a sua autoestima com itens de beleza indispensáveis. Bunitinha Cosméticos oferece: “Jornal Sensorial”.

Matheus é flagrado cochilando, trajando uma bermuda, calçando um chinelo Havaianas e com as pernas sobre a bancada do noticioso. Ele acorda e começa a conduzir o programa.

MATHEUS: Boa tarde. Veja as notícias de hoje.

A partir daí, a maioria das jornalistas aparece por meio de links ao vivo.

LAURA: Alunos da Erem Amaury de Medeiros fazem campanha contra o preconceito.

HELENA: As belezas do estado podem ser aproveitadas por quem tem deficiência visual.

ZÉLIA: A situação das pessoas com deficiência no mercado de trabalho.

CAROLINA: Surdos querem ingressar na universidade através do Enem.

VERA: Mais de setecentas mil pessoas são deficientes em Pernambuco.

Matheus dorme novamente, agora de boca aberta e com o rosto sobre a mão fechada, cujo braço está apoiado na bancada.

(fundo musical original: “Escalada” – “e continua longa a escalada”)

Ele volta a despertar quando quase despenca no chão.

MATHEUS: Também tem a previsão do tempo. O “Jornal Sensorial” começa agora.

(fundo musical original: “Cheia de manias” – introdução)

(fundo musical alternativo: “[News] Music for news programs 40 (1478902)” – introdução)

A vinheta do noticioso exibe tomadas do bairro de Afogados durante a tarde, com um filtro alaranjado, e ao final o seu logo: as letras J e S em Sign Writing.

25/08/2025

ATRAÍDOS PELO SILÊNCIO | CENAS 1, 2 E 3

 Cena 1 (área externa do shopping)

No meio da tarde, o trânsito está intenso na Rua São Miguel. Bel (vestida de azul) contempla as vitrines do shopping enquanto Alex (trajando uma camisa amarela), do lado de fora, caminha em direção à faixa de pedestres dando máxima atenção ao que vem escrevendo no celular. A jornalista sai do centro de compras e dirige-se ao ponto de ônibus, do qual o rapaz chega perto.

Distraído, o futuro namorado de Bel não vê que, ao pisar no asfalto, vem rapidamente um coletivo da cor amarela. Porém, ele acaba sendo salvo pela moça e ambos caem na calçada. Os dois, ainda assustados, passam a se olhar – como se ainda não tivessem entendido o que acabou de acontecer.

(fundo musical original: “Sonhos” – “uma mudança muito estranha: mais pureza, mais carinho, mais calma, mais alegria no meu jeito de me dar”)

Obs.: primeiro, o filme mostra a reação de Bel; depois, o rosto de Alex.

A música é interrompida subitamente quando o personagem recebe uma bofetada. Automaticamente, ele pergunta, irritado:

ALEX: Tá doida, miséria?

BEL: (repreende o moço rapidamente, comunicando-se em Libras) O ônibus quase bateu em você, presta atenção!

ALEX: É o quê?

BEL: Ah, não (fecha os olhos e balança a cabeça negativamente)... Outro ouvinte!

A partir deste ponto, vê-se o rosto do homem, mas sua voz pode ser ouvida por meio da locução.

NARRADOR: Uma coisa todos os romances têm em comum: acontecem sem avisar, igual o motorista do Vila Dois Carneiros acelerando perto do Viaduto Capitão Temudo!


Cena 2 (interior do shopping)

(fundo musical: “A happy moment”)

A locução continua, mas os personagens caminham lentamente pelo shopping. Enquanto Bel conversa tranquilamente usando a sua língua materna, Alex passa a vê-la de forma apaixonada. O momento serve para exibir os logos da Secretaria de Educação, da Gre Recife Sul e da Erem Amaury de Medeiros.

ALEX: Você já nasceu sem ouvir?

BEL: Não, perdi a audição na idade adulta.

ALEX: (finge que entende a língua utilizada pela moça) Ah, tá.

A música de fundo para. Enquanto a narração acontece, o público vê Bel contemplando as vitrines do shopping e apontando para Alex os itens que lhe interessam.

NARRADOR: Esta é a Bel, uma das dez milhões de pessoas surdas que existem no Brasil. A surdez dela é neurossensorial, que tem tratamento. Existem outros dois tipos. O primeiro é o condutivo, que pode ser revertido através de terapias e intervenções cirúrgicas. E o segundo é a surdez mista, que tem características dos outros tipos.

Obs.: enquanto Alex narra, são projetados sobre o casal os tipos de surdez existentes: neurossensorial, condutiva e mista.

Numa transição rápida, o casal aparece sentado diante de uma mesa do restaurante.

ALEX: Modéstia à parte, mas eu me acho muito inteligente.

BEL: Um ignorante em matéria de sinais, mas eu gosto mesmo assim.

ALEX: Desculpa, eu não parei de falar de mim hora nenhuma. Queria saber mais sobre você, mesmo sem entender.

BEL: Quer ser meu namorado?

ALEX: Hum... Eu tô sacando o que você quer...

(fundo musical original: “Só vale com você” – “com você eu vejo o dia nascendo; tudo, tudo mesmo a esperar por nós/ vai dizer que não sabe o que eu digo porque ainda é criança no amor?”)

(fundo musical alternativo: “A happy moment”)

Bel toma a iniciativa e coloca a sua mão direita sobre a esquerda de Alex, fazendo com que o estudante abra um sorriso.

Em câmera lenta, vê-se o casal recém formado rindo no meio das árvores que embelezam o estacionamento. A câmera afasta-se dos dois é o título do filme aparece inscrito na parede cinza.


Cena 3 (casa lotérica)

Agora, as cores das roupas de Alex e Bel estão invertidas – sutilmente demonstrando que eles não entram em acordo quase nunca.

NARRADOR: Apesar de a Libras ser reconhecida como uma das formas oficiais de comunicação, e de a dificuldade para ouvir ser a terceira maior causa de deficiência no país, eu nunca fui bom de perceber o mundo ao meu redor... Pelo menos, não o mundo que me interessava.

O casal está na frente de uma loja do shopping que fica ao lado da casa lotérica. Alex, empolgado, caminha um pouco à frente da namorada, enquanto Bel demonstra impaciência.

ALEX: A bandeira da conta da luz veio vermelha nesse mês. Mas eu descobri como economizar a energia elétrica lá de casa sem fazer “macaco”. A gente só precisa calcular a raiz quadrada de B² - 4 a.c! E se X equivale a cem quilowatts, o valor de Y é igual a...

BEL: Para! Você não percebeu o que tá acontecendo? A gente não se entende.

ALEX: Hã?

BEL: A gente não tá falando a mesma língua, entendeu?

ALEX: Ih... Pela cara tá rolando uma D.R...

BEL: Tá, sim! Olha quanto tempo estamos juntos! Você não conseguiu aprender nada comigo! Nem se esforça!

Alex dá um lento bocejo (mesmo sem compreender o que Bel diz, deixa o seu jeito entediado evidente).

BEL: Se eu te perguntar o que é que eu faço da vida, duvido que você saiba!

ALEX: Bel, tá muito acelerada! Vai com calma!

BEL: (passa a sinalizar vagarosamente) Não tá dando certo... Acho melhor a gente terminar.

Alex coloca as mãos sobre a cabeça e roda olhando para Bel. Ela o olha na esperança de que ele tenha entendido o fim da relação e peça desculpas, mas ele dispara:

ALEX: Tô na mesma, continuo sem entender.

Bel revira os olhos, segura Alex pelos ombros, vira o corpo do rapaz para que ele fique de costas e dá-lhe um chute no traseiro.

(fundo musical original: “Lembranças” – “e hoje, o silêncio que ficou/ eu sinto a tristeza que restou/ há sempre um vazio em minha vida/ quando relembro nossa despedida”)

Ela sai bastante irritada, e num primeiro momento a câmera mostra a moça passando no meio dos transeuntes. Entretanto, quando a câmera mostra Alex atônito com o que acaba de acontecer, o equipamento aproxima-se dele reduzindo a velocidade. Em outra tomada, também em câmera lenta, é possível ver Bel indo em direção à saída do shopping. O jovem falante fica decepcionado por entender o que está acontecendo.

A tela é tomada por uma transição de fade out.


01/05/2025

TRÊS ESTAÇÕES | ERROS DE GRAVAÇÃO (VÍDEO)

 


TRÊS ESTAÇÕES | LONGA-METRAGEM (VÍDEO)

 


TRÊS ESTAÇÕES | TEASER (VÍDEO)

 


TRÊS ESTAÇÕES | QUARTO EPISÓDIO | PRIMAVERA (VÍDEO)


 

TRÊS ESTAÇÕES | TERCEIRO EPISÓDIO | INVERNO (VÍDEO)

 


TRÊS ESTAÇÕES | SEGUNDO EPISÓDIO | OUTONO (VÍDEO)

 


TRÊS ESTAÇÕES | PRIMEIRO EPISÓDIO | VERÃO (VÍDEO)

 


30/04/2025

TRÊS ESTAÇÕES | QUARTO EPISÓDIO | PRIMAVERA



 Cena 1 (quarto de Leandro)

Com a roupa do dia anterior, Leandro checa a caixa de entrada do seu e-mail, e lê em voz alta a mensagem mais recente, enviada pelo catarinense que lhe propôs uma entrevista de emprego (fato citado no episódio anterior).

RICARDO (NARRADO POR LEANDRO): Bom dia, Leandro. Aqui é Ricardo Teodósio, gerente da HidroSC Ltda., sediada em Florianópolis. Conversamos há alguns dias através do WhatsApp, e ficamos de realizar uma entrevista por intermédio do Google Meet, em data a ser discutida.

Devido ao Congresso Internacional de Hidrotécnicos Sul-americanos, que será realizado nos próximos dias no Recife Plaza Hotel, estarei em sua cidade ainda hoje para representar a empresa. Uma vez que eu serei o palestrante da apresentação agendada às 20h, estarei com tempo livre por volta das 14h. Se for conveniente para você, podemos realizar a entrevista pessoalmente no saguão do hotel neste horário. O que você acha?

Já deixei o seu nome na recepção para que você tenha acesso ao saguão. Por favor, confirme sua presença ainda nesta manhã.

Atenciosamente,

Ricardo Teodósio

HIDROSC LTDA.

Em dúvida sobre ir à entrevista presencial ou a apresentar o trabalho na escola, Leandro gesticula para si mesmo.

LEANDRO: Hoje?

(fundo musical: “Uma carta (DJ Maya remix)” – segundos finais)

O engenheiro fecha a tampa do notebook, desabotoa a camisa e levanta-se da cama.


Cena 2 (estacionamento)

(fundo musical: “Sopra em nós (Remix)” – “sopra em nós, sopra em nós/ somos Teus filhos, ó Pai! Estamos reunidos em Teu nome”)

Arthur está com a cabeça baixa, e quando a levanta demonstra cansaço. Ele olha para um outdoor, onde está escrito “EM BREVE, UMA NOVA UNIDADE  PERTO DE VOCÊ – MAYRA MODA INFANTIL”. Depois de lê-lo, o ex-amante de Karla coça o cabelo e vira o rosto.

(música incidental: “Psychic mistery, disturbing air, wind, cold: L (1036484)”)

Mas ele é surpreendido quando a inscrição dá lugar a uma pergunta, escrita com a datilologia:

DEUS: Você me ama?

Arthur coça os olhos, descrente com o que lê.

DEUS: É com você mesmo que eu estou falando, Arthur. Perguntei se você me ama.

ARTHUR: Quem é você?

DEUS: Quem te amou primeiro.

ARTHUR: Claro... Claro que eu Te amo.

DEUS: Mesmo sem saber como eu sou?

ARTHUR: Eu não preciso Te ver pra Te amar.

DEUS: Mas parece não amar quem está vendo.

ARTHUR: Sendo sincero, não acho que eles gostem de mim.

DEUS: Por quê?

ARTHUR: Hanniery e Leandro não querem me entender.

DEUS: Entender não é aceitar o que te destrói por dentro.

ARTHUR: Não é assim...

DEUS: A caminhada é difícil. Você já pisou onde não deveria. Mas eles estão esperando por você.

ARTHUR: Não fala comigo como se eu precisasse ser resgatado...

DEUS: Todo mundo é resgatado, Arthur. Sobretudo do perigo que não vê.

ARTHUR: Verdade? E qual é o meu perigo?

DEUS: O amor que você tem dentro de si.

ARTHUR: Amar é perigoso?

DEUS: Frio desse jeito, que não consegue Me reconhecer, é.

ARTHUR: Como é que eu faço pra amar do jeito certo?

DEUS: Abra os olhos, para Me ver. Nós somos muito diferentes, Arthur. Mas as Minhas mãos sempre tocaram as suas, mesmo quando você não sentia nada. Nada do que você fez impediu que Eu te amasse. Vai se impedir de amar quem também te ama?

Arthur levanta, assustado, e afasta-se do outdoor. Ele, porém, aproxima-se acidentalmente de outra placa, que diz:

(fundo musical: “Só Jesus me guia (Amor perfeito)” – “o meu amor por Deus não é perfeito/ perfeito é o amor Dele por mim”)

(obs.: os versos tocam em loop até o fim da cena)

DEUS: Não se esqueça, Arthur: um amor igual ao Meu você não encontra. Nem consegue fugir dele.

Arthur fica ainda mais chocado, com a câmera girando em seu entorno, e sai do estacionamento correndo. A mensagem devolve à propaganda do outdoor o seu lugar quando o trigêmeo deixa o local. Volta a ser escrito: “Matrículas abertas para o segundo semestre de 2024. Curso de Libras Fernanda Santos”.


Cena 3 (quarto de Leandro)


Cena 4 (estação metroviária)

Um metrô abre suas portas e pessoas desembarcam numa estação.

(música incidental: “A sad melody of electric piano, boss and guitar (1393894)”)

Do alto de uma plataforma que exibe o céu, Leandro vê a chegada do metrô e com seu olhar acompanha o meio de transporte passando debaixo da plataforma e indo a outra estação. O rapaz demonstra dúvida sobre para onde ir, pondo as mãos no pescoço e olhando para o alto.


Cena 5 (terraço)

Hanniery está saindo de casa e destranca o portão.

(fundo musical: “No sangue e no fogo” – introdução em baixa velocidade)

Ao girar a chave, o estudante lamenta pelo fato de ir à escola sozinho, chegando a olhar para o interior da casa. Visivelmente decepcionado, o rapaz prossegue rumo à avaliação de Jonathan.


Cena 6 (biblioteca da escola)

Triste, Hanniery está olhando para baixo, levantando a cabeça quando Jonathan inicia um diálogo.

JONATHAN: E aí? Tudo certo, Hanniery? 

HANNIERY: É. Fiz o melhor que pude.

JONATHAN: Leandro e Arthur, estão onde?

HANNIERY: Professor, tudo indica que o trabalho não vai ser em grupo.

JONATHAN: Entendi. O desentendimento entre vocês continua? 

HANNIERY: (balança a cabeça afirmativamente)

JONATHAN: De qualquer maneira, se eles vierem, eu deixei o recado na portaria. 

HANNIERY: Recado? De quê?

JONATHAN: O ar-condicionado da sala 04 quebrou. Como as outras salas estão ocupadas e no auditório tem reunião da Gerência Regional, os alunos vão ter que fazer a apresentação no corredor. Fiz um sorteio pra definir a ordem de entrada e, por sorte, você é o último da fila.

HANNIERY: Quando a gente acredita em Deus, a sorte dá lugar à razão.

JONATHAN: Como assim, Hanniery?

HANNIERY: Tem uma razão pra que eu seja o último. Só Deus explica o motivo.

JONATHAN: Tudo bem. Assim que a sua vez chegar, eu venho te avisar.

HANNIERY: Obrigado, Professor.


Cena 8 (pátio da escola)

Hanniery vai até o pátio para fazer a sua apresentação.

JONATHAN: Acho que já podemos começar.

Surpreendendo Hanniery, à sua direita vem Leandro.

LEANDRO: Perdão pelo atraso, Jonathan.

Arthur também chega, vindo do lado oposto ao de Leandro.

ARTHUR: Boa tarde, Jonathan. O grupo está completo agora.

Hanniery volta a olhar para Jonathan, levemente aliviado.

JONATHAN: Tudo certo? O pátio é de vocês.

(fundo musical: “Momentos com o Senhor”)

(Obs.: o diálogo entre Waguinho e Thalles Roberto é legendado da mesma forma que os demais diálogos do roteiro. As imagens dos irmãos dividem a tela cada vez que interpretam juntos o mesmo verso)

ARTHUR: Vou chamar pra cantar esse samba abençoado comigo Thalles Roberto.

LEANDRO: É isso aí, Waguinho: na pressão do Espírito Santo!

LEANDRO: “Meu coração sente saudade

ARTHUR: Dos bons momentos com o Senhor:

HANNIERY: Passava às noites acordado

ARTHUR: Cantando louvor,

LEANDRO: Só louvor!

ARTHUR: Canta, Thalles!

HANNIERY: Era tão bom quando eu sentia

ARTHUR: Sua presença me encher.

LEANDRO: Era feliz e não sabia

HANNIERY: Que o Seu amor

ARTHUR: Era o melhor pra mim,

LEANDRO: Era o melhor pra mim,

HANNIERY: Era o melhor pra mim. 

ARTHUR: Eu quero é mais andar Contigo,

LEANDRO: Voltar a ser Seu melhor amigo!

HANNIERY: Viver assim não posso mais!

ARTHUR: Sei que errei. Olhei pra trás;

LEANDRO: Mas hoje me arrependo, meu Senhor.

HANNIERY: Pai, me perdoa! Por favor!

ARTHUR: Arrependido eu estou,

LEANDRO: Preciso do Seu amor!

HANNIERY E LEANDRO: Jesus! Jesus! Jesus! Jesus!

ARTHUR: É o nome!

HANNIERY E LEANDRO: Jesus! Jesus! Jesus! Jesus!

ARTHUR: Thalles Roberto, agora é contigo mesmo! Vem comigo!

LEANDRO: Vamo que vamo, Waguinho! Vamo que vamo cheio do Espírito Santo! 

ARTHUR: Meu coração sente saudade

LEANDRO: Dos meus momentos com o Senhor:

HANNIERY: Passava às noites acordado

ARTHUR: Cantando louvor,

LEANDRO: Só louvor!

HANNIERY: Era tão bom quando eu sentia

ARTHUR: Sua presença me encher.

LEANDRO: Era feliz e não sabia

HANNIERY: Que o Seu amor

ARTHUR: Era o melhor pra mim,

LEANDRO: Era o melhor pra mim,

HANNIERY: Era o melhor pra mim. 

ARTHUR: Eu quero mais andar Contigo,

LEANDRO: Voltar a ser Seu melhor amigo!

HANNIERY: Viver assim não posso mais!

ARTHUR: Sei que errei. Olhei pra trás;

LEANDRO: Mas hoje me arrependo, meu Senhor.

HANNIERY: Pai, me perdoa! Por favor!

ARTHUR: Arrependido eu estou,

LEANDRO: Preciso do Seu amor!

HANNIERY E LEANDRO: Jesus!

ARTHUR: Demorei demais pra voltar,

HANNIERY E LEANDRO: Jesus!

ARTHUR: Mas agora eu só vou Te adorar!

HANNIERY E LEANDRO: Jesus! Jesus!

ARTHUR: Manda brasa!

HANNIERY E ARTHUR: Jesus! Jesus! Jesus! Jesus! Jesus!

LEANDRO: Quero mais viver Contigo toda hora e sempre!

HANNIERY E ARTHUR: Jesus!

LEANDRO: Ao lado Dele, meu amigo sempre!

HANNIERY E ARTHUR: Jesus!

LEANDRO: Ao lado Dele, meu amigo Deus!

HANNIERY E ARTHUR: Jesus!”

ARTHUR: Muito obrigado, Thalles Roberto.

LEANDRO: É “nois”! Aleluia! 

ARTHUR: Que Deus continue te abençoando, meu querido.

LEANDRO: Sejam cheios do Espírito Santo.

ARTHUR: Valeu!


Cena 9 (calçadas)

(fundo musical: “Eu te amo tanto (Frank Nuckless remix)” – “filho, Eu quero tanto/ enxugar teu pranto/ te fazer só meu/ filho, Eu quero ser teu Deus)

Três ramos de flores, plantados em diferentes calçadas, balançam com o vento diante de um clima ensolarado)


Cena 10 (muro)

Os trigêmeos estão sentados juntos ao pôr do sol, novamente na sequência Leandro – Arthur – Hanniery.

HANNIERY: Quem vai falar primeiro?

ARTHUR: Melhor você começar.

LEANDRO: Eu?

HANNIERY: É, achei que o cara de Santa Catarina tinha marcado contigo hoje.

LEANDRO: E ele marcou. No mesmo horário da prova do Jonathan.

ARTHUR: Por que você não foi?

LEANDRO: O Hanniery precisava de mim.

HANNIERY: Imagino como deve ter sido difícil. 

ARTHUR: A chance da tua vida poderia ser essa. 

LEANDRO: “Tudo” é a chance da minha vida, pra quem me conhece. Quase que eu pego o metrô.

HANNIERY: O que rolou?

LEANDRO: Vocês se lembram do Kaio?

ARTHUR: Qual? O crente ou o lutador de jiu-jitsu?

LEANDRO: Os dois. Uma vez ele me aconselhou: “corra atrás do ‘sim’ porque o ‘não’ você já tem”. O jeito é continuar correndo.

HANNIERY: E você, não quer dizer nada?

ARTHUR: Quero. (tira a jaqueta) Finalmente um pouco de vento nesse forno! (joga a jaqueta contra a câmera)

LEANDRO: Sobre o trabalho do Jonathan.

ARTHUR: Ainda não é a hora de dizer. Mas o que aconteceu lá fora foi muito forte. Resumindo: você precisava da gente.

HANNIERY: Será que a nota que a gente vai receber é vermelha?

LEANDRO: Duvido. Jonathan, a julgar pela cara, gostou muito.

ARTHUR: Mais do que as alunas que viram a apresentação no pátio? Elas não tiravam o olho de você!

HANNIERY: Teu bigode anda fazendo sucesso, hein? Daqui a pouco alguém te pede em casamento!

LEANDRO: Tomara! Porque ultimamente só aparece doida episcopal no meu caminho!

(Arthur e Hanniery começam a rir)

ARTHUR: Doida episcopal? O que é isso?

LEANDRO: Aquela que não pode ver um crente que quer dar em cima.

ARTHUR: Por motivos óbvios, vou ficar solteiro por um bom tempo.

HANNIERY: Ótimo. É o tempo pra ensaiar uma nova apresentação.

LEANDRO: Nem terminamos uma e você já quer outra? Me ajude!

HANNIERY: Depois de hoje, tô inspirado!

ARTHUR: Qual é a ideia?

HANNIERY: Interpretar “Procure por mim na glória”, com base no clipe original.

ARTHUR: Nós três vamos usar peruca? Ah, eu não vou pagar esse mico!

HANNIERY: (sorridente) Arthur, você corta o cabelo pra disfarçar a calvície. Peruca pra você é lucro!

(Leandro põe a mão na boca e começa a rir)

ARTHUR: Você também não pode falar nada. Teu nome, além de ser incomum, está escrito com H, dois N e Y no final.

HANNIERY: (irritado) Culpa da tua mãe!

(após alguns segundos em silêncio, Arthur e Leandro riem. Hanniery demora a entender a tolice que disse e, ao se dar conta, começa a rir a ponto de chorar)

LETREIRO: “Se não tivéssemos inverno, a primavera não seria tão agradável; se não experimentássemos às vezes o sabor da adversidade, a prosperidade não seria tão bem-vinda.” (Anne Bradstreet)


CRÉDITOS FINAIS

(fundo musical: “Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)” – últimos quinze segundos da música)


Músicas executadas neste episódio

“Uma carta (DJ Maya remix)”

Compositor e intérprete: IZAAC SANTOS


“Sopra em nós (Remix)”

Compositora: IRMÃ ANA PAULA, CMES

Intérpretes: DJ JP DA IMACULADA E IRMÃ ANA PAULA, CMES


“Só Jesus me guia (Amor perfeito)”

Compositores: AGENIR PARREIRA E MARQUINHOS CARDOSO

Intérprete: LEONARDO SULLIVAN


“No sangue e no fogo”

Compositores: FERNANDA BRUM E LIVINGSTHON FARIAS

Intérprete: FERNANDA BRUM


“Te busco”

Compositor: ALEXIS VELEZ

Intérprete: ALEX ZURDO


“Regue fé, esperança, amor”

Compositor: PAULO CESAR BARUK

Intérpretes: IBAB CELEBRAÇÃO, LITO ATALAIA E PAULO CESAR BARUK


“Momentos com o Senhor”

Compositor: THALLES ROBERTO

Intérpretes: WAGUINHO BASTOS E THALLES ROBERTO


“Eu te amo tanto (Frank Nuckless remix)”

Compositor e intérprete: Antônio Lázaro Silva (Irmão Lázaro)


“Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)”

Compositores: GUSTAVO DANIEL ALVES GOMES, ISAAC MEDEIROS CABRAL, HIAGO RAMALHO VIANA E AZMAVETH CARNEIRO DA SILVA

Intérpretes: BIG ASHER, 2METRO, TRINDADE RECORDS, SHISO E LOVE FUNK 


Locações

BIBLIOTECA POPULAR DE AFOGADOS JORNALISTA RONILDO MAIA LEITE

EREM AMAURY DE MEDEIROS

SÃO MIGUEL CENTER – SHOPPING DE AFOGADOS


Agradecimento especial

GERALDA REIS


Este produto audiovisual é independente e baseado nas ementas dos cursos de Libras Básico I (Erem Amaury de Medeiros – Gre Recife Sul) e Intermediário (Instituto Federal do Mato Grosso do Sul).

Os sinais descritos nesta obra de ficção estão sujeitos a alterações devido às variações geográficas.


© 2024


23/04/2025

TRÊS ESTAÇÕES | TERCEIRO EPISÓDIO | INVERNO



 Cena 1 (sala de estar)

HANNIERY: Isso é jeito de falar comigo?

LEANDRO: Eu não aguento mais você me pressionando. Toda vez que eu volto pra casa é uma pergunta...

HANNIERY: Você está se pressionando. Ou eu não tenho mais o direito de me preocupar contigo?

LEANDRO: Hanniery...

HANNIERY: Olha como você tá. Não é por pouca coisa.

LEANDRO: Certo... (anda em círculos) Eu tive um problema pessoal com o dono da empresa. E eu percebi que ele falou mal de mim depois que eu saí de lá. 

HANNIERY: Foi assédio moral, Leandro?

LEANDRO: O Vitor tem muita influência no meio. A empresa dele é a maior do país. Toda vez que alguém lê meu currículo e descobre que eu trabalhei lá, eu sou descartado. Não importa o quão maravilhoso eu seja.

HANNIERY: Você tinha que processar esse cara! Ele não pode te prejudicar profissionalmente!

LEANDRO: Essa batalha já tá perdida, Hanniery. O que eu posso fazer é sobreviver à guerra. Por isso que eu prefiro esconder.

HANNIERY: Quanto tempo você pretendia ficar sem me revelar a verdade?

LEANDRO: Não sei. Mas acredita, não é por falta de confiança. Mas é porque tem coisas que só Deus poderia me entender. Você não.

HANNIERY: Do que você tem medo, Leandro?

LEANDRO: Se eu abrisse meu coração, o meu medo seria de machucar você. Mas você é o cara que eu mais admiro no mundo, e eu não quero perder teu respeito. É melhor parar por aqui. (deixa a sala de estar)

Arthur observa Hanniery lamentando pela falta de confiança de Leandro.


Cena 2 (cozinha)

(fundo musical: “Regue fé, esperança, amor” – “tratar e conversar no mesmo patamar; ouvir e respeitar, já que diz que se importa; ter sensibilidade no olhar. O amor é a chave que abre a porta”)

Hanniery picota algumas verduras no tabuleiro, e depois as mistura num pote. 

(obs.: não é obrigatório aparecer o rosto do personagem)

Após acender uma das bocas do fogão, faz-se uma transição, com o intuito de mostrar que anoitece.


Cena 3 (sala de jantar)

Hanniery e Leandro estão sentados, diante da mesa.

LEANDRO: A gente não pode servir o jantar?

HANNIERY: Vão jantar os três.

LEANDRO: Onde ele está?

HANNIERY: A nova identidade ficou pronta. Ele foi buscar.

LEANDRO: Esse arroz que você fez parece uma delícia.

HANNIERY: Você que me ensinou a receita.

LEANDRO: (ri discretamente) O representante de uma empresa sediada em Santa Catarina entrou em contato comigo.

HANNIERY: Que ótimo! Mas a conversa vai ser à distância?

LEANDRO: Não, ele vem a Recife por conta de um congresso na próxima quinta-feira. Ora por mim, tá bem?

HANNIERY: Vai dar certo. Se você for, eu vou sentir saudades... E inveja, porque Santa Catarina não pode ser mais quente do que aqui!

LEANDRO: A gente nunca vai se separar, Hanniery. Você nunca vai estar sozinho. 

ARTHUR: (chega sem que os rapazes percebam) Não vai ficar mesmo. Chegou quem faltava.

Hanniery olha para Arthur com um sorriso leve, enquanto Leandro muda a expressão facial.


(Abertura)


Cena 4 (sala de jantar)

Os três irmãos estão jantando, cada um com um prato de arroz e um copo d’água ao lado direito de cada rapaz. Arthur alimenta-se normalmente, enquanto Hanniery usa o garfo para levar o alimento à boca e percebe que Leandro não está comendo nada.

HANNIERY: Você não tocou na comida, Leandro...

LEANDRO: Sem fome. Tô com dor de cabeça. Você tem algum remédio?

HANNIERY: Sim, na quarta gaveta da estante. Pode pegar.

LEANDRO: (levanta-se) Obrigado, Hanniery. (anda devagar)

HANNIERY: Gostou do arroz?

ARTHUR: Uma delícia! Só faltou um limão.

HANNIERY: Não sabia que você usava limão na comida. 

ARTHUR: E não uso. Mas mais ácido que o Leandro não dá pra ser.

LEANDRO: Falando mal de mim, Arthur? E nas minhas costas?

ARTHUR: Se quiser, eu falo na frente também. Quer?

HANNIERY: Esqueceram que é a hora do jantar?

LEANDRO: Calma, Hanniery; é que eu fiquei curioso. Qual é a tua queixa, Arthur?

ARTHUR: Você não percebeu que todo jantar é igual, com você fazendo a expressão de quem não quer estar aqui?

LEANDRO: O jantar é maravilhoso, talvez eu somente não queira estar com você.

HANNIERY: Leandro!

ARTHUR: Tudo bem, Hanniery. A gente sabe que ele é recalcado mesmo.

LEANDRO: Ah, você tem propriedade pra falar do assunto, não é?

ARTHUR: Não, eu não culpo a minha família pelos meus problemas. Nem problemas eu tenho.

LEANDRO: Você cria.

ARTHUR: Sério? Agora eu sou o culpado de você não ter dado certo na vida? Teu diploma é só um quadro pendurado na parede aberto a visitações, mas a culpa é minha?

HANNIERY: Arthur, chega!

ARTHUR: Engenharia não é a sua área. Você deveria ser ator dramático!

LEANDRO: Também pensei nisso. Quem sabe você não me ajuda a conseguir um emprego na Fox?

(Arthur fica apavorado)

HANNIERY: Do que vocês estão falando?

LEANDRO: Conta pra ele, Arthur. O nome “Fox” não significa alguma coisa pra você?

HANNIERY: Estúdio de cinema? “Raposa” em inglês?

ARTHUR: Você não vai colocar o Hanniery contra mim!

(Hanniery puxa o braço de Arthur)

HANNIERY: Tem mais alguma coisa que você não me contou, Arthur?

LEANDRO: Ele traiu a Karla com uma garota de programa.

HANNIERY: Isso é mentira, Leandro. O Arthur... Ele nunca faria isso.

LEANDRO: Fez. Eles se conheceram num site, onde ela vende os “serviços".

ARTHUR: Não cai nessa, Hanniery, por favor!

LEANDRO: Tá duvidando? Eu encaminhei pro meu celular as conversas dos dois.

(música incidental: “Strictly sadness stringed instrument orchestra (1092497)”)

Um flashback, em sépia, revela a conversa que Fox e Arthur tiveram, reexibindo o momento em que o diálogo foi lido por Leandro.

LEANDRO: Até o site está aqui, olha. (entrega o celular a Hanniery)

(Arthur vira o rosto para Leandro, com ódio por ser exposto. Hanniery começa a ler)

HANNIERY: Www.topotudotodotempo.com.br?

ARTHUR: Você não tinha o direito de mexer no meu celular!

LEANDRO: Por que não? Eu perdi meu emprego por sua causa, qual o problema de eu ler suas conversas no WhatsApp?

HANNIERY: Espera! O Arthur não pode ser culpado disso, nem ele nem eu conhecemos o seu ex-patrão. 

LEANDRO: Mas ele conhece a ex-esposa do Vitor. Por que você acha que nós nunca vimos a Karla?


Cena 5 (sala de jantar)

(música incidental: “A 60-second dark cinematic sue designed for horror/ suspense trailers and promos (1317535)”)

A câmera percorre os olhares dos trigêmeos: Hanniery assustado, Leandro enfurecido e Arthur calmo.

(obs.: os pratos e copos já não mais aparecem, como se os trigêmeos tivessem levantado da mesa)

HANNIERY: Essas coisas que você tá dizendo... São porque você tá com raiva do Arthur.

LEANDRO: O Vitor descobriu o caso que a Karla tinha com esse imbecil e me demitiu, porque achou que eu sabia de tudo.

ARTHUR: A Karla era a esposa do Vitor? Mundo pequeno esse, hein?

LEANDRO: Arthur não saiu de casa porque estava apaixonado. Foi porque no divórcio a Karla ficou com um apartamento em Casa Amarela. Sabe quanto custa? Um milhão de reais! Era lá onde ele morava.

HANNIERY: Por que você não me contou nada?

LEANDRO: Porque quando ele voltou pra casa, eu achei que ele estava arrependido. Mas não. Ele traiu a Karla com outra mulher, e continuou com ela depois de ter voltado pra nossa casa.

ARTHUR: Agora entendi: a estratégia é de colocar a culpa do que te aconteceu em mim.

LEANDRO: É sua culpa!

ARTHUR: Isso já tem mais de um ano, Leandro; por que você não conseguiu um emprego?

LEANDRO: Ninguém quer me contratar depois que o Vitor me prejudicou!

ARTHUR: A verdade é que você não arranja emprego porque não quer! Ou melhor: porque você é incompetente!

HANNIERY: Arthur, para com isso, pelo amor de Deus!

ARTHUR: (vira-se para Hanniery) Já tô cansado desse cara querer ser a régua moral do mundo e não cuidar da própria vida! (volta o rosto para Leandro) Quer que eu soletre o que você é? I-N-C-O-M-P...

Leandro interrompe a provocação esbofeteando Arthur. Ele bate com o rosto na parede, deixando Hanniery em choque. O ex-amante de Karla desencosta da parede, tempo no qual Hanniery fica à frente de Leandro. O engenheiro arrepende-se instantes depois.

(música incidental: “Switch, surprise, explosion and other sound effects”)

LEANDRO: Não era pra eu ter feito isso... Desculpa, eu...

ARTHUR: Tudo bem. Você tá no seu direito. Mas eu não vou sentir dor sozinho, não...

(Hanniery coloca a mão esquerda sobre o peitoral de Arthur, impedindo que ele avance)

HANNIERY: Você não vai tocar no Leandro!

ARTHUR: Hanniery, você vai concordar com ele?

HANNIERY: E o que você quer? Que eu fique ao seu lado depois de tudo que soube?

ARTHUR: Claro... Os dois unidos, como sempre... Eu não vou te perdoar por isso, Leandro. (olha para Hanniery) A você também não.

(Arthur retira-se da mesa, mas pega o seu copo já vazio e joga contra a parede, visando atingir Leandro)

(música incidental: “Quiet fear/ japanese horror atmosphere 8-piano”)

ARTHUR: Imbecil!

HANNIERY: Meu Deus, pra onde ele vai?

LEANDRO: Por mim, Hanniery, que vá pro inferno! (deixa Hanniery sozinho na sala de jantar)


Cena 6 (quarto de Hanniery/ quarto de Leandro)

(fundo musical: “Sopra em nós (Remix)” – parte final)

Subitamente, o fornecimento de energia elétrica é suspenso: primeiro, as luzes começam a piscar; depois, apagam-se as luzes do roteador e do quarto de Hanniery para, por fim, as hélices do ventilador pararem de girar. O gêmeo logo exclama, diante da escuridão: 

HANNIERY: Não acredito... Que sacanagem! (sinaliza olhando para a lâmpada)

Leandro está sentado sobre a própria cama, irritado e olhando para baixo. Ele repara quando o irmão entra em seus aposentos.

HANNIERY: Eu vim pegar uma vela.

LEANDRO: (volta a olhar para baixo enquanto comenta) Tudo bem.

Hanniery encontra a vela, mas coloca o objeto debaixo de um dos braços para perguntar:

HANNIERY: Sério mesmo que você não tá nem um pouco preocupado?

LEANDRO: Eu preciso estar preocupado?

Hanniery irrita-se e deixa o quarto de Leandro, que demonstra descontentamento.


Cena 7 (rua/ estacionamento/ quarto de Hanniery/ quarto de Leandro)

(fundo musical: “Livre” – introdução)

A rua está sob baixa iluminação, e nela passa um ônibus da linha Vila Dois Carneiros. A cena passa a ser num estacionamento, no qual Arthur abrigou-se após sair da casa dos irmãos.

ARTHUR: “Um dia, você vai achar que a vida é muito mais que o aconchego do lar. Sem mágoas, sem rancor, sem despedida, sem hesitar se o rumo vais tomar. À sua frente, um vasto horizonte já traz o lar ficando mais distante. E então você dirá: ‘livre! Enfim, senhor de mim; sem destino, sem lei, sem Deus. Livre! Enfim, senhor de mim; sem limite, sem norte. O mundo é meu, o mundo é meu, o mundo é meu!’.

Hanniery surge chorando em frente à vela que acendeu.

ARTHUR: Você vai desfrutar cada segundo, provar das mil delícias desse mundo tão como se o amanhã não existisse; tão como se a sorte, enfim, sorrisse. Suas noites serão longas e repletas de amigos e amores de ocasião. E então você dirá: ‘livre! Enfim, senhor de mim; sem destino, sem lei, sem Deus. Livre! Enfim, senhor de mim; sem limite, sem norte. O mundo é meu, o mundo é meu, o mundo é meu!’.

Leandro também chora, sozinho em seu quarto.

ARTHUR: Porém, de vez em quando, você vai lembrar dos bons conselhos de seu Pai que, sob chuva, sol ou tempestade; nas vilas, nas montanhas, nas cidades, nos becos, nas esquinas, nas tavernas teu nome irá chamar com voz tão terna. E quando te encontrar vai te abraçar, e sorrir de um jeito tão amável que você não vai mais resistir! E então você dirá: ‘livre, enfim! Agora, sim, no calor do abraço de (amanhece rapidamente e Arthur assusta-se, olhando para o alto) Deus! Livre, enfim! Agora, sim! Livre, enfim, do mundo! O amor venceu! Livre, enfim! Agora, sim, no calor do abraço de Deus! Livre, enfim! Agora, sim! Livre, enfim, do mundo! O amor venceu! O amor venceu! O amor venceu! O amor venceu!’”.

A câmera mostra Arthur de frente a um outdoor, sentado na calçada do estacionamento. 


Cena 8 (quarto de Hanniery)

(fundo musical: “Livre” – parte final)

A vela apaga-se ao amanhecer e aos últimos segundos de “Livre”. Hanniery é visto sobre a cama, deitado com a barriga para cima, com o seu celular encostado à cabeceira do móvel. Vê-se o aparelho auditivo em sua orelha direita. Por meio deste, ele ouve o telefone móvel. Ele muda o olhar, acreditando que irá receber notícias do irmão desaparecido.

HANNIERY: Arthur!

Apressadamente, o rapaz pega o celular e o desbloqueia, mas vê que há uma mensagem de áudio enviada por Jonathan. O estudante aciona o play.

JONATHAN: Bom dia, Hanniery. Tudo bem? Eu queria te pedir desculpas. A correria foi tanta nos últimos dias que eu nem me lembrei de mandar mensagem pra te perguntar: seus irmãos e você estão precisando de alguma ajuda? Assim que você acessar esse áudio, me responde, por favor. Abraços, meu querido.

O rapaz solta o celular e olha para cima, desesperado por não ter notícias do irmão e não saber o que responder a Jonathan.


Créditos finais

(fundo musical: “Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’) – “nasci pra isso, eu quero Te adorar/ minha vida eu coloco em Teu altar/ menos de mim/ mais de Ti”)


Músicas executadas neste episódio

“Regue fé, esperança, amor”

Compositor: PAULO CESAR BARUK

Intérpretes: IBAB CELEBRAÇÃO, LITO ATALAIA E PAULO CESAR BARUK


“No sangue e no fogo”

Compositores: FERNANDA BRUM E LIVINGSTHON FARIAS

Intérprete: FERNANDA BRUM


“Te busco”

Compositor: ALEXIS VELEZ

Intérprete: ALEX ZURDO


“Sopra em nós (Remix)”

Compositora: IRMÃ ANA PAULA, CMES

Intérpretes: DJ JP DA IMACULADA E IRMÃ ANA PAULA, CMES


“Livre”

Compositor: CLÊNIO ABREU

Intérpretes: CORAL UNIVERSITÁRIO DO UNASP – EC, VITRINE UNASP E BRUNNO RAMON


“Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)”

Compositores: GUSTAVO DANIEL ALVES GOMES, ISAAC MEDEIROS CABRAL, HIAGO RAMALHO VIANA E AZMAVETH CARNEIRO DA SILVA

Intérpretes: BIG ASHER, 2METRO, TRINDADE RECORDS, SHISO E LOVE FUNK 


locação

SÃO MIGUEL CENTER – SHOPPING DE AFOGADOS


Agradecimento especial

GERALDA REIS


Este produto audiovisual é independente e baseado nas ementas dos cursos de Libras Básico I (Erem Amaury de Medeiros – Gre Recife Sul) e Intermediário (Instituto Federal do Mato Grosso do Sul).

Os sinais descritos nesta obra de ficção estão sujeitos a alterações devido às variações geográficas.


© 2024


16/04/2025

TRÊS ESTAÇÕES | SEGUNDO EPISÓDIO | OUTONO


 Cena 1 (terraço)

LEANDRO: (levanta-se) Sinceramente, eu prefiro não tocar neste assunto.

HANNIERY: Mas eu quero que você me incomode com seus problemas. Se eu não puder te ajudar, compartilha comigo.

LEANDRO: O meu estresse é o de sempre. Não tenho novidades.

HANNIERY: E como o Arthur entra nessa história?

LEANDRO: As coisas estão difíceis. Bem que ele poderia procurar um emprego, pra ajudar nas despesas.

HANNIERY: O Arthur vai procurar, quando ele resolver o problema da documentação...

LEANDRO: Ah, Hanniery! Desde que ele morava aqui a gente já discutia esse assunto. A posição dele é muito confortável: você ganha dinheiro dos serviços de edição que você faz pra casa de festas. Eu recebo do meu seguro-desemprego, e por tempo limitado... Procurar emprego pra quê?

HANNIERY: Leandro, eu entendo você. Mas não vai te custar nada dar um voto de confiança ao Arthur.

LEANDRO: Pode ser... Não tem razão pra negar: eu sou uma pessoa difícil. Mas OK. Prometo que eu vou fazer um esforço pelo teu irmão.

HANNIERY: Nosso irmão.

LEANDRO: Que seja. (volta ao interior da casa)


Cena 2 (sala)

(fundo musical: “Regue fé, esperança, amor” – “quem ama não julga, quem ama não condena, quem ama não desiste, quem ama se empenha”)

O tempo está fechando, mas o vento agita as folhas pertencentes a árvores plantadas em frente a um muro. Hanniery reúne os irmãos na sala.

HANNIERY: Eu vou trocar de roupa, irei à biblioteca; mas antes a gente tem que fazer a estratégia.

ARTHUR: Estratégia de quê?

HANNIERY: Da apresentação do trabalho de Jonathan.

LEANDRO: Ah, o trabalho da música. Como é que vai ser?

HANNIERY: Eu pensei naquela música de Diante do Trono.

LEANDRO: “Preciso de Ti”?

HANNIERY: Não, “Relance”. Aquela música que gravaram no ano retrasado.

LEANDRO: Como é que era mesmo?

HANNIERY E LEANDRO: “Dia e noite, sem cessar; nossa voz subirá. Digno é o Cordeiro, digno é o Cordeiro”.

Enquanto o editor e o engenheiro sinalizam o refrão da canção, Arthur observa tudo sem se mexer.

LEANDRO: Mas eu estava com outra na cabeça: “Caminhando estou”.

HANNIERY: (empolgado) Essa também é boa!

HANNIERY E LEANDRO: “Eu vou viver restituição, eu vou viver restituição na terra que mana leite e mel. Eu vou pra Canaã”.

Arthur continua imóvel, como se não entendesse a alegria de Leandro e Hanniery. 

HANNIERY: E você, Arthur? Que sugestão você dá?

ARTHUR: Ah, toca o pagode do Waguinho e tá tudo certo.

HANNIERY: Perfeito! Vai ser essa!

LEANDRO: Mas... Hanniery, essa música é muito...

ARTHUR: Melhor. Chama a atenção do professor e desbanca os outros grupos.

HANNIERY: Depois você decide qual é o sinal que você vai usar pra se apresentar. Até hoje eu não sei se o teu sinal é... Esse... Ou esse! (Hanniery faz três diferentes configurações para a palavra “irmão” – que, unida à letra A, forma o sinal de “Arthur”)

ARTHUR: Sim, eu sou um pouco instável. Mudo de ideia a todo instante.

Leandro olha para Arthur com insegurança em relação às atitudes do irmão.


Cena 3 (quarto de Arthur) 

Arthur abre a cortina do seu quarto e vê o celular acendendo sobre a cama. Ele pega o aparelho e, sorridente, começa a digitar. Sem perceber, Leandro abre uma brecha da cortina e o observa por alguns segundos, fechando o tecido depois.

Quando Arthur termina de digitar, ele deixa o quarto abrindo a cortina novamente, mas sai pelo lado contrário ao que ele entrou. Declama uma música, animado com o que leu.

ARTHUR: “Você me dá sorte, meu amor. Você me dá sorte, meu amor. Você me dá sorte na vida”...

(música incidental: “Quiet tension/ fear suspense with a sense of tempo (1083431)”

Passados alguns segundos de sua saída, Leandro entra no quarto e pega o celular do irmão. Olha para trás, temendo ser visto, mas desbloqueia a tela deslizando o indicador em formato de L. Ele começa a ler a última mensagem de texto, que diz:

FOX: Te espero hoje, às 22h, pra você fazer o que mais entende. Vou até fechar o chat pra ninguém me chamar. Se faltar, vai ter que marcar hora. O link você já sabe. Beijos.

(obs.: a mensagem aparece na tela em formato de legenda, mas com as letras totalmente invertidas, com a finalidade de manter mistério sobre o teor da mensagem – que deixa Leandro furioso)

LEANDRO: Safado!

Leandro seleciona as mensagens e as encaminha para o seu próprio celular. Em seguida, ele apaga as suas próprias conversas recentes com Arthur.

(obs.: em nenhum momento o aparelho celular precisa aparecer, os personagens manuseiam-no no ar, fazendo os habituais movimentos de digitação)

O engenheiro também sai do quarto, devolvendo o celular à cama.


Cena 4 (biblioteca)

(fundo musical: “Eu te amo tanto (Frank Nuckless remix)” – introdução)

Enciclopédias da Língua Brasileira de Sinais são folheadas por Hanniery, que passa a treinar para a apresentação de Jonathan)


Cena 5 (shopping)

Leandro submete-se a uma nova entrevista, desta vez conduzida por uma moça chamada Flávia.

FLÁVIA: Obrigada por ter aceitado me encontrar aqui no shopping.

LEANDRO: Imagina, quem tem que agradecer sou eu.

FLÁVIA: A empreiteira ainda não acabou a reforma, por isso eu tive que vir. Mas você poderia ter enviado o currículo por e-mail, nós daríamos um feedback...

LEANDRO: Preferi arriscar presencialmente. Tudo bem que hoje em dia é tudo digital, mas nem tudo precisa ser impessoal.

FLÁVIA: Claro que não. Deixa eu ler aqui. Deixa eu ler aqui... Nossa! Que incrível! Pós-graduação na área de Geotecnia?

LEANDRO: Aham.

FLÁVIA: Maravilha... E nas experiências profissionais... Você exerceu a função de engenheiro responsável pelo anexo do Cais do Sertão.

LEANDRO: Até os turistas comentam daquela estrutura quando passam na frente do museu.

FLÁVIA: Aqui diz também... V Engenharia... Ai, meu Deus...

LEANDRO: Algum problema, Flávia?

FLÁVIA: Bom, Leandro... Seu currículo é invejável. Acontece que o nosso quadro de funcionários está completo. Em todo caso, nós já temos o seu e-mail e vamos te contactar se algum cargo ficar vago.

LEANDRO: Ninguém vai me ligar.

FLÁVIA: Claro que vamos. Por que eu mentiria?

LEANDRO: Flávia, se tem uma coisa que surdo entende é de expressão facial. E a sua mudou quando falou da empresa.

FLÁVIA: Leandro, por favor...

LEANDRO: Alguém daquele lugar falou mal de mim. E eu quero que você me diga o porquê.


(abertura)


Cena 6 (shopping)

Dá-se prosseguimento à cena anterior.

FLÁVIA: Melhor a gente não tocar neste assunto, Leandro...

LEANDRO: Pelo amor de Deus, Flávia, você quer evitar o quê? Tá na cara que você está constrangida.

FLÁVIA: Desculpa, eu deveria ter sido mais discreta.

LEANDRO: Não precisa se desculpar. Só me conta qual é o problema comigo. Toda vez que descobrem que eu trabalhei na V Engenharia me evitam. Parece que meu currículo é excelente, mas...

FLÁVIA: Quando descobrem que você trabalhou na maior empresa do ramo no país, te vetam.

LEANDRO: É... Você sabe a razão disso?

FLÁVIA: Não é ético dizer o que eu vou contar aqui, mas... Leandro, você quer um conselho?

LEANDRO: Conselho? Sobre o quê?

FLÁVIA: Tira essa experiência do seu currículo. Enquanto você se vincular à V Engenharia, você vai ser boicotado.

LEANDRO: Então eu tenho razão? O Vitor falou mal de mim?

FLÁVIA: Muito. Olha, eu não sei qual é o problema que ele tem com você, mas ele sugeriu que você não fosse contratado por nenhuma concorrente.

LEANDRO: Vocês aceitaram isso? Sem questionar?

FLÁVIA: A nossa empresa é relativamente nova, Leandro. Eu mesma cheguei há menos de seis meses. Por mais que sejamos competitivos, ninguém quer se comprometer com a líder do segmento.

LEANDRO: Flávia... (leva a mão à boca) Será que, se eu te contar o que aconteceu, qual a razão da minha briga com o Vitor...

FLÁVIA: A causa não importa, o que não queremos é enfrentar a consequência. Sei que vai parecer que você está muito aquém da sua capacidade, mas o melhor é você fingir que nunca pôs os pés lá.

(música incidental: “A somewhat creepy and sad atmosphere music box”)

LEANDRO: Ele me deu escolha?

FLÁVIA: Leandro, eu sinto muito.

LEANDRO: De qualquer jeito, Flávia, obrigado pela sua sinceridade. E não precisa ficar preocupada, o que a gente conversou fica aqui.


Cena 7 (área de serviço)

(fundo musical: “No sangue e no fogo” – “ziguezagueando, levado pelo vento, envolto em Shekinah eu vou. Eu vou”)

Aparecem árvores cujas folhas estão ventiladas e iluminadas pelo sol. Hanniery e Arthur estendem lençóis nos varais.

ARTHUR: Acabamos.

HANNIERY: Quando é que a nova identidade vai ficar pronta?

ARTHUR: Daqui a dez dias.

HANNIERY: A gente pode bater um papo?

ARTHUR: Sobre o trabalho que o professor mandou que a gente fizesse? Já tô treinando um pouquinho.

HANNIERY: Esse assunto também é urgente, mas eu queria conversar sobre você.

ARTHUR: O que foi que eu fiz?

HANNIERY: Nada. Precisava ter feito alguma coisa?

ARTHUR: Não, é que eu... Esquece.

HANNIERY: Arthur, eu tava me lembrando da história da tua ex. Você teve notícias?

ARTHUR: Graças a Deus, não. 

HANNIERY: Como é que você a conheceu?

ARTHUR: A Karla?

HANNIERY: É.

ARTHUR: Aonde você quer chegar com esse assunto?

HANNIERY: Arthur, querendo ou não, ela foi uma pessoa importante na sua vida. Vocês até dividiam o mesmo teto.

ARTHUR: Pior decisão da minha vida.

HANNIERY: E eu sinto que depois dela você se afastou.

ARTHUR: Pronto, tava demorando pra dizer que eu me afastei da igreja.

HANNIERY: Da igreja, do curso, da família e da noção.

ARTHUR: Tudo bem, eu vou te contar. Você sempre foi muito sincero comigo. Era bom que ninguém soubesse de nada.

HANNIERY: Por que vocês se escondiam?

ARTHUR: A nossa relação começou quando ela tava... Como é que eu posso dizer? Quando ela tava “presa”.

HANNIERY: Karla esteve na cadeia?

ARTHUR: Acho que eu não expliquei bem. Ela tava num relacionamento.

HANNIERY: Me dá um tempo pra entender... Você era amante de mulher casada?

ARTHUR: Era.

HANNIERY: E você me diz isso assim, com essa calma toda?

ARTHUR: Cara, eu não acordei um dia dizendo “ia ser bom eu ser o ‘urso’ de uma mulher”. Aconteceu.

HANNIERY: Agora entendi por que tanto mistério. Quem mais sabe disso?

ARTHUR: Ninguém, Hanniery.

HANNIERY: A essa altura, o ex-marido dela descobriu a verdade. Por isso que eles terminaram o casamento.

ARTHUR: Duvido que ele saiba.

HANNIERY: Claro que ele sabe, ele não iria acabar com o casamento se não desconfiasse de alguma coisa. 

ARTHUR: De que jeito? Quem tem romance em segredo procura ser discreto. Se amante não tem lar, pra que eu vou dar meu endereço?

HANNIERY: Cara, olha o livramento que você recebeu. Esse homem poderia ter te matado!

ARTHUR: Menos, Hanniery. Corno só anda armado com os dois chifres.

HANNIERY: Quando foi que você se transformou nesse homem sem responsabilidade? 

ARTHUR: Eu me apaixonei. E a gente não raciocina quando está apaixonado; começa a fazer o que o coração manda, mesmo ele sendo...

HANNIERY: Enganoso. Porque ele só vai te falar o que você quer que ele sinalize.

ARTHUR: Já aprendi a lição. Ela não era pra mim... Deixa eu ir agora, eu preciso tomar um banho. 

(fundo musical: “Eu vou vencer” – introdução)

Hanniery vê o irmão sair da área de serviço sem acreditar na revelação que Arthur acaba de fazer. A imagem vai escurecendo até dar lugar a um pôr-do-sol.


Cena 8 (banco da praça de alimentação)

(fundo musical: “Eu vou vencer”)

Leandro está sobre um banco, triste diante do resultado da entrevista. 

LEANDRO: “Sei que a vida não é fácil, é difícil o dia a dia... Muitas pedras e espinhos espalhados no caminho, intensas agonias! Mas eu sei que desse jeito é a vida de quem sonha; tem os altos e os baixos, tem as vaias e os aplausos; você perde, você ganha. Só se vale o que se tem nesse mundo de aparências: se você tiver sucesso tem amigos ao seu lado, tem nome em evidência. Mas se algo der errado – e é coisa que acontece – os amigos vão embora, e quem mais te admirava hoje já nem te conhece. Eu vou vencer, essa porta um dia vai ter que se abrir! Eu vou vencer, qualquer hora essa muralha vai cair! Eu vou vencer, nem que o mundo se levante eu vou lutar até o fim! Eu vou vencer, pela fé a sorte vai sorrir pra mim! Eu vou vencer, os meus inimigos vão ter que engolir! Eu vou vencer, Deus não fez a minha vida pra perder! Em ‘o’ nome de Jesus eu vou vencer!

Rapidamente, a praça de alimentação sai de cena e vê-se um fim de tarde, com o céu formando nuvens laranjas, e com fios de poste próximos à câmera. Volta-se, então, a Leandro.

LEANDRO: Só se vale o que se tem nesse mundo de aparência: se você tiver sucesso tem amigos ao seu lado, tem um nome em evidência. Mas se algo der errado – que é coisa que acontece – os amigos vão embora, e quem mais te admirava hoje já nem te conhece. Eu vou vencer, essa porta um dia vai ter que se abrir! Eu vou vencer, qualquer hora essa muralha vai cair! Eu vou vencer, nem que o mundo se levante eu vou lutar até o fim! Eu vou vencer, pela fé a sorte vai sorrir pra mim! Eu vou vencer, os meus inimigos vão ter que engolir! Eu vou vencer, Deus não fez a minha vida pra perder! Em ‘o’ nome de Jesus eu vou vencer! Eu vou vencer!”

Leandro abaixa a cabeça, e a câmera mostra que o banco no qual ele está fica em frente a um mural, cuja área tem grafitada as asas de um anjo.


Cena 9 (rua)

(fundo musical: “Só Jesus me guia (Amor perfeito)” – “e pensava estar sozinho, em solidão, Sua força emanava das alturas me estendendo a Sua mão”)

Apenas uma transição de cenas – sem a necessidade de legenda – que mostra nuvens carregadas movendo-se lentamente sobre um imóvel. 


Cena 10 (sala de estar)

Hanniery está vasculhando alguns papeis na gaveta do rack, em busca da fatura de energia elétrica.

HANNIERY: Onde eu coloquei essa conta, meu Deus? Ainda mais que a bandeira é verde!

No momento em que está mexendo os papeis, o estudante que um envelope debaixo das contas.

HANNIERY: Será que o Leandro pagou quando foi à última entrevista? Deve ter guardado aqui. (abre o envelope e encontra o currículo, que passa a ser lido)

Leandro volta pra casa e vê o irmão lendo o conteúdo do documento.

LEANDRO: O que você tá fazendo?

HANNIERY: (põe o papel debaixo do braço para comunicar-se em Libras) Procurando a conta da luz.

LEANDRO: (toma o currículo de Hanniery e também põe o papel debaixo do braço) Esqueceu? Eu paguei na sexta-feira. Guardei a fatura no meu quarto.

HANNIERY: Leandro, o que é isso?

Arthur passa ao lado da varanda, mas fica às escondidas para saber o que Leandro e Hanniery conversam.

LEANDRO: Meu currículo.

HANNIERY: Tô falando do que tá escrito. Ou melhor, do que você não escreveu.

LEANDRO: Hanniery, eu faço muitos cursos pra ampliar meu nível de conhecimento. Normal que eu esqueça um ou outro na hora de digitar.

HANNIERY: Muito diferente de omitir o teu último local de trabalho.

LEANDRO: A V Engenharia? Nem reparei.

HANNIERY: A última vez que você entregou uma cópia do currículo foi há quinze dias. Tempo suficiente pra retirar a empresa da lista de experiências profissionais.

LEANDRO: Por que eu faria isso? Eu seria o único prejudicado.

HANNIERY: Você fez, é uma certeza. Me explica o motivo.

LEANDRO: Você passou no concurso público da polícia? Não! Tá me interrogando por quê?

(fundo musical: “Muito obrigado (Júlio César Michueri remix)” – parte final)

Hanniery encara o engenheiro civil em silêncio. Arthur continua espiando os dois, sem nada entender.


CRÉDITOS FINAIS

(fundo musical: “Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)” – “Deus, já procurei isso em tantos lugares/ e vi que são falsas felicidades/ eu me perdi, mas eu sei que faz parte/ hoje eu só quero esse amor de verdade”)


Músicas executadas neste episódio

“Regue fé, esperança, amor”

Compositor: PAULO CESAR BARUK

Intérpretes: IBAB CELEBRAÇÃO, LITO ATALAIA E PAULO CESAR BARUK


“Eu te amo tanto (Frank Nuckless remix)”

Compositor e intérprete: ANTÔNIO LÁZARO SILVA (IRMÃO LÁZARO)


“Te busco”

Compositor: ALEXIS VELEZ

Intérprete: ALEX ZURDO


“No sangue e no fogo”

Compositores: FERNANDA BRUM E LIVINGSTHON FARIAS

Intérprete: FERNANDA BRUM


“Eu vou vencer”

Compositor: SÉRGIO MENDES DE SOUZA JÚNIOR

Intérprete: GERSON RUFINO


“Só Jesus me guia (Amor perfeito)”

Compositores: AGENIR PARREIRA E MARQUINHOS CARDOSO

Intérprete: LEONARDO SULLIVAN


“Muito obrigado (Júlio César Michueri remix)”

Compositor e intérprete: KIM 


“Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)”

Compositores: GUSTAVO DANIEL ALVES GOMES, ISAAC MEDEIROS CABRAL, HIAGO RAMALHO VIANA E AZMAVETH CARNEIRO DA SILVA

Intérpretes: BIG ASHER, 2METRO, TRINDADE RECORDS, SHISO E LOVE FUNK 


Citações musicais

“Relance (Digno é o Cordeiro)”

Compositores: ANA PAULA VALADÃO, ETHAN Parker E PAZ AGUAYO PARKER


“Caminhando estou”

Compositores: DAVI SACER E LUIZ ARCANJO 


“Sorte”

Compositores: CELSO FONSECA E RONALDO BASTOS


locações

BIBLIOTECA POPULAR DE AFOGADOS JORNALISTA RONILDO MAIA LEITE

SÃO MIGUEL CENTER – SHOPPING DE AFOGADOS


Agradecimento especial

GERALDA REIS


Este produto audiovisual é independente e baseado nas ementas dos cursos de Libras Básico I (Erem Amaury de Medeiros – Gre Recife Sul) e Intermediário (Instituto Federal do Mato Grosso do Sul).

Os sinais descritos nesta obra de ficção estão sujeitos a alterações devido às variações geográficas.


© 2024


09/04/2025

TRÊS ESTAÇÕES | PRIMEIRO EPISÓDIO | VERÃO

 Cena 1 (quarto de Hanniery/ banheiro/ rua)

Em silêncio, o vento balança as folhas das árvores pela manhã. Na sequência, Hanniery está dormindo virado para a parede. Ele gira o corpo na direção contrária e abre os olhos lentamente, vendo que o relógio indica que faltam quinze minutos para as sete da manhã. Desatento, o rapaz volta a dormir na posição em que estava. Subitamente, ao perceber que atrasar-se-ia para a aula, ele levanta-se desesperado, a ponto de mal conseguir livrar-se do lençol que o cobre.

(fundo musical: “Conclusões (Soul)”)

Com a introdução da música tocando, os primeiros sete segundos mostram uma sequência de imagens indicando a rotina de Hanniery a caminho do curso:

a água do chuveiro caindo;

Hanniery ensaboando o cabelo, puxando os fios para cima;

os dentes do estudante sendo escovados, com a câmera bastante próxima ao rosto do jovem;

a implantação, em sua orelha direita, de um aparelho;

a mão de Hanniery, sinalizando que deseja que um ônibus para o embarque do estudante.

Antes que Hanniery passe seu trajeto a pé fazendo a tradução da música para o português sinalizado, mais duas imagens completam a introdução: o ônibus da linha “Cavaleiro" passando em frente à Escola Municipal Santa Luzia, e os veículos passando em frente a um posto de gasolina.

HANNIERY: “Eu tenho a vida em minhas mãos, posso fazer dela o que quiser, posso brincar de amar alguém. Quem sabe até posso me enganar? Posso tirar minhas conclusões e resolver tudo que quiser; mas, se eu não tenho Jesus, num segundo o que eu tenho eu posso perder. ‘Jesus’: jamais esqueça esse nome! ‘Jesus’, nome mais doce que o mel. ‘Jesus’: somente por esse nome (‘Jesus’) se pode chegar ao céu. ‘Jesus’: jamais esqueça esse nome! ‘Jesus’, nome mais doce que o mel. ‘Jesus’: somente por esse nome (‘Jesus’) se pode chegar ao céu. Não importa que venham me censurar e dizer o que a vida tem pra me dar: são frases de efeito pra me enganar. O certo e o errado eu sei separar. Me interessa falar que Deus é amor, e dizer ‘aleluia, glória ao Senhor’. Jesus é meu rei, meu amigo e meu salvador. Jamais esqueça esse nome, nome mais doce que o mel! Somente por esse nome se pode chegar ao céu.

Ouve-se um piano tocando enquanto veículos passam em frente ao Terminal Integrado de Largo da Paz.

HANNIERY: Não importa que venham me censurar e dizer o que a vida tem pra me dar: são frases de efeito pra me enganar. O certo e o errado eu sei separar. Me interessa falar que Deus é amor, e dizer ‘aleluia, glória ao Senhor’. Jesus é meu rei, meu amigo e meu salvador. Jamais esqueça esse nome! ‘Jesus’, nome mais doce que o mel. ‘Jesus’: somente por esse nome (‘Jesus’) se pode chegar ao céu. ‘Jesus’: jamais esqueça esse nome! ‘Jesus’, nome mais doce que o mel. ‘Jesus’: somente por esse nome (‘Jesus’) se pode chegar ao céu.”

A câmera gira acompanhando o rosto de Hanniery, que tenta vocalizar a música que ouve pelo implante. Por fim, a Avenida Sul é vista do alto.


Cena 2 (empreiteira)

Leandro tem o seu rosto focalizado, olhando para baixo, e levanta-se assim que a secretária avisa:

SECRETÁRIA: Leandro Tavares, a Dra. Saldanha autorizou a sua entrada. 

Leandro agradece à secretária sorrindo discretamente, e sai da poltrona.

(Obs.: a câmera deve estar estática)

O engenheiro civil já aparece no escritório de Saldanha, submetendo-se a uma entrevista de emprego.

SALDANHA: Doutorado em Hidrotecnia na Universidade de Oxford? Leandro, eu confesso que não cheguei a ler o seu currículo na íntegra, a minha equipe que teve acesso a ele. Mas ela ficou muito impressionada.

LEANDRO: Obrigado.

SALDANHA: Aqui diz que, além do Inglês, você entende um pouco da Língua Brasileira de Sinais. Se for melhor pra você, podemos conversar neste idioma.

LEANDRO: Fique à vontade. Consigo entender o português porque leio os lábios dos meus interlocutores. Sou surdo oralizado.

SALDANHA: Sei lá, não acho que eu ia conseguir viver sem um dos sentidos.

LEANDRO: Tudo bem, a gente apura os outros. Meus irmãos também não sabiam como lidar com a surdez, principalmente porque estamos inseridos num mundo ouvinte.

SALDANHA: Você mora com eles?

LEANDRO: Com um deles, o Hanniery. Já o outro, Arthur... Tomou outro rumo na vida.


Cena 3 (apartamento de Karla)

(música incidental: “Horror suspense dark atmosphere (856618)”)

Vê-se um gaveteiro rosa ao fundo de um balde preto (a câmera vai descendo até mostrar o balde). Karla (sem mostrar o rosto) começa a jogar no interior do utensílio doméstico algumas peças de roupa pertencentes a Arthur. Ela usa uma garrafa de álcool 70° e derrama o líquido sobre os tecidos. Por último, ela risca o fósforo e joga o palito sobre as peças úmidas.


Cena 4 (empreiteira)

Saldanha e Leandro dão prosseguimento à conversa.

SALDANHA: Então, Leandro, aproveitando que você está aqui, eu queria que você me dissesse: qual é o seu objetivo em associar-se à nossa marca?

LEANDRO: Meu objetivo? (sorri)

(música incidental: “Cartoon sound that causes funny laughter (877048)”)

(obs.: nesse momento, Leandro deve abrir mão da língua oral para comunicar-se em Libras)

LETREIRO: Os verdadeiros objetivos de Leandro:

LEANDRO: (olhando para a câmera) Primeiro: comer. Segundo: pagar as contas. Terceiro: comer. Quarto: sair do aluguel. Quinto: comer. Sexto: comprar roupas novas. Sétimo: comer. Oitavo: deixar a fila do desemprego. Nono... Eu falei em comer?

A trama volta para a realidade.

LEANDRO: O setor, felizmente, não para de crescer. Acontece que expandir uma empresa mantendo-a aliada à contemporaneidade é, muitas vezes, entendido como um sinônimo de desfazer-se do passado.

SALDANHA: Você não acha que seja realmente isso?

LEANDRO: Não precisa ser. O passado precisa ser aprimorado, para mostrar que aprendemos alguma coisa com ele. E tudo que uma marca quer é criar tradições.

SALDANHA: Tem toda razão. Agora, a minha equipe levantou uma dúvida e eu gostaria de saná-la.

LEANDRO: Pode dizer, Saldanha.

SALDANHA: Por que desassociar-se da V Engenharia pra trabalhar na principal concorrente?

LEANDRO: (passa a sorrir menos, de maneira gradual) É... A necessidade de respirar novos ares, me lançar ao que desafia a minha capacidade profissional.

SALDANHA: Isto explica você ter tido uma posição de destaque na empresa, mas ficado apenas dezoito meses nela?

LEANDRO: (reticente) Sim, explica.

SALDANHA: Desculpe estranhar, é que normalmente funcionários de lá costumam ter uma experiência longa. Isso é tudo, Leandro. Como esta é a primeira fase da nossa seletiva, te ligaremos caso você seja um dos que se encaixam no nosso perfil. Boa tarde.

LEANDRO: Pra você também, Saldanha.


Cena 5 (escola)

Hanniery está prestes a deixar a sala após o término da aula, quando Jonathan surpreende-lhe.

JONATHAN: (o professor comunica-se oralmente) Hanniery, será que a gente pode conversar um minutinho?

HANNIERY: (consente com a cabeça)

A cena migra de posição para mostrar Hanniery sentando-se diante da presença de Jonathan na biblioteca.

JONATHAN: É o seguinte: daqui a três semanas vocês têm que apresentar o trabalho da disciplina, aquele em que vocês interpretarão uma música.

HANNIERY: Sim, eu sei. Os meus irmãos estão ensaiando comigo.

JONATHAN: O problema é esse: seus irmãos. O que está acontecendo pra eles faltarem tanto? 

HANNIERY: Leandro não veio porque foi a uma entrevista.

JONATHAN: Mas e o Arthur?

HANNIERY: Professor, eu não sei explicar. Arthur começou a namorar uma mulher e saiu de casa há um tempo. Você acredita que até hoje eu não conheço a moça?

JONATHAN: Bom, eu confesso que estou preocupado. O semestre vai ser encerrado no próximo dia 30, e eles não vêm justificando as ausências.

HANNIERY: Relaxe. Na hora que eu chegar em casa, conversar com o Leandro. E ajudo o Arthur, às vezes ele tem dificuldade de compreensão.

JONATHAN: Faz isso o quanto antes. Qualquer dúvida que vocês precisem tirar, a gente conversa pelo WhatsApp. Deixa eu ir agora, que daqui a pouco começa uma daquelas formações que a secretaria de educação oferece: palestra com o Professor Paulo Portela.

HANNIERY: Boa aula. (aperta a mão de Jonathan)

Assim que o professor sai, a expressão de satisfação dá lugar a de apreensão.


(Abertura)


Cena 6 (sala de estar)

(fundo musical: “Muito obrigado (Júlio César Michueri remix)” – “de repente tudo teve um sentido com Tua chegada ao meu coração”)

Uma transição de cenas mostra as plantas sendo iluminadas pelo sol. Em seguida, Hanniery está lendo um livro no sofá da sala de estar quando vê Leandro pendurar seu molho no chaveiro. 

HANNIERY: Leandro, como foi a entrevista de emprego?

LEANDRO: Igual às outras. Não me deram esperança de nada.

HANNIERY: Você não perde nada se tiver fé. Uma hora você vai ter a resposta que tanto quer receber.

LEANDRO: (senta-se no sofá) O problema não é a resposta, é o silêncio antes de recebê-la. (a campainha da casa é acionada e Hanniery levanta-se) O que foi?

HANNIERY: Tem alguém nos chamando lá fora. (Leandro segue Hanniery até a entrada do terraço)


Cena 7 (terraço)

Os dois que estavam na sala encontram Arthur do outro lado da grade.

HANNIERY: Arthur?

Leandro observa a ação da janela, ficando longe de Hanniery. 

ARTHUR: (com expressão chorosa) Hanniery, eu não tenho mais um lugar pra ficar. Posso voltar pra casa?

(fundo musical: “Uma carta (DJ Maya remix)” – “pode viajar o mundo, mas sei que vai voltar pro mesmo lugar”)

Hanniery consente com um leve sorriso, mas Leandro fecha a janela, visivelmente incomodado.


Cena 8 (sala de estar)

Agora os trigêmeos estão sentados no sofá,  com Arthur ao meio, Leandro à esquerda e Hanniery à direita. O recém-chegado bebe um copo d’água transparente.

ARTHUR: Obrigado. (entrega o copo a Leandro, que segura o objeto sem nada dizer)

HANNIERY: Tá mais calmo?

ARTHUR: Acho que sim.

HANNIERY: Agora conta: o que aconteceu?

ARTHUR: Minha namorada... Quer dizer, minha ex-namorada, surtou!

LEANDRO: Vocês terminaram? Por quê?

ARTHUR: Ela cismou que eu tô de caso com outra mulher.

LEANDRO: E não está?

ARTHUR: Lógico que não, Leandro; que absurdo!

HANNIERY: Mas por que ela achou que você fosse infiel?

ARTHUR: Um dia, a gente tinha ido à praia e eu encontrei a Cynthia, aquela menina da época do curso. Dei um beijo no rosto e pronto, de lá pra cá a Karla fez da minha vida um inferno! Sabem o que ela fez? Queimou meus documentos e minhas roupas!

HANNIERY: Meu Deus... Mas você desistiu dela?

ARTHUR: Hanniery, ela que desistiu de mim. Também não volto pra ela nem morto!

LEANDRO: O mistério continua. O namoro de vocês terminou e a gente não conheceu essa Karla.

HANNIERY: Talvez seja temporário. Ela vai pensar melhor. Só que você vai ter que se esforçar.

ARTHUR: Quem tá errada é ela, não sou eu! Imagina se eu vou rastejar por quem não me quer, ela não me achou no lixo!

HANNIERY: Já tentou fazer uma apresentação musical pra ela?

LEANDRO: Hanniery, eu não sei se você percebeu, mas ele não sabe cantar... Nenhum dos três.

HANNIERY: Faz em Libras. Funcionou com a minha ex.

ARTHUR: Se ex fosse uma coisa boa, não seria ex. Seria atual.

HANNIERY: Cara, tem que ter um jeito. Imagina vocês reconciliados, abraçados depois que você declamar a letra de “Lado a lado” da Cristina Mel.

(música incidental: “Funny lazy donkey (Hilarious song) (937200)”)

Leandro olha para o irmão absolutamente incrédulo.

HANNIERY: Apresenta Fernanda Brum pra ela, mostra que você é intenso...

Arthur olha para Leandro, também sem acreditar nas palavras de Hanniery. 

LEANDRO: Não olhem pra mim. A única coisa que eu sei de Romantismo é que ela é uma escola literária.

ARTHUR: Mas, se eu estiver incomodando, eu posso dormir na casa de um amigo.

HANNIERY: Teu amigo é Jesus, e depois a gente. Você pode ficar aqui o tempo que quiser.

LEANDRO: E os teus documentos, que a louca queimou?

ARTHUR: Vou agendar pra tirar a segunda via da identidade. Leandro, você pode me levar?

LEANDRO: Vendi o carro.

ARTHUR: O quê? Por que você fez isso?

LEANDRO: Nunca vi desempregado pagar IPVA. (levanta-se e sai segurando o copo)

HANNIERY: Fica tranquilo. Você pode usar meu cartão de passagem depois que fizer o agendamento. 

ARTHUR: Obrigado, Hanniery. Ah, eu também vou precisar das tuas roupas emprestadas.

HANNIERY: Meu guarda-roupa tá aberto, pode pegar as camisas que você quiser.

ARTHUR: Camisetas. Você acha que eu vou cobrir meus braços dentro desse forno que é Pernambuco? Deus me defenda!

Hanniery ri da piada feita por Arthur.


Cena 9 (externa)

(fundo musical: “Sopra em nós (Remix)” – “ó vento impetuoso, vem neste lugar, fortalece o que é fraco com teu poder”)

Nenhum personagem aparece nesta cena, apenas é mostrado o vento veranil sobre as folhas das árvores.

LETREIRO: Dias depois...


Cena 10 (terraço)

Hanniery está sentado numa das cadeiras do terraço, sentindo um pouco de vento com os olhos fechados. Leandro também sai para o terraço, e Hanniery abre os olhos.

LEANDRO: Quatro horas e esse calor não passa...

HANNIERY: Tá quente demais. Daqui a pouco eu vou parar de usar margarina.

LEANDRO: Muito cara?

HANNIERY: Porque pode fritar o ovo no asfalto!

LEANDRO: Pensei que você estivesse estudando lá dentro. 

HANNIERY: Eu tava, mas desliguei o ventilador por causa da conta de luz. Fiquei na entrada.

LEANDRO: Cadê o Arthur?

HANNIERY: Conseguiu agendar pra hoje de tarde. Vai ser atendido às cinco horas.

LEANDRO: Que bom pra ele. Hoje ele teve um pretexto pra levantar mais tarde.

HANNIERY: (o semblante fica sério) Por que esse comentário?

LEANDRO: Por nada, é que eu já me acostumei. Arthur nunca gostou de acordar cedo.

HANNIERY: Não tô me referindo a isso. Você acha que eu não reparei?

(passa a mão na parte de trás da cabeça) LEANDRO: Hanniery, eu não estou entendendo.

HANNIERY: Alguma coisa tem incomodado você desde que o Arthur voltou pra casa. Quer me contar o que tá acontecendo?

(fundo musical: “Regue fé, esperança, amor” – parte final)

Leandro encara Hanniery com seriedade, sentindo-se tenso.


Créditos finais

(fundo musical: “Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)” – “Espírito, espírito que desce como fogo/ como em Pentecostes, Deus, faça algo novo/ presença poderosa eu sinto dentro do meu corpo/ ó majestade santa, eu me prostro, cubro meu rosto”)


Músicas executadas neste episódio

“Conclusões (Soul)”

Compositor e intérprete: Sergio Lopes


“Te busco”

Compositor: Alexis Velez

Intérprete: Alex Zurdo


“Muito obrigado (Júlio César Michueri remix)”

Compositor e intérprete: Kim


“Uma carta (DJ Maya remix)”

Compositor e intérprete: Izaac Santos


“Sopra em nós (Remix)”

Compositora: Irmã Ana Paula, CMES

Intérpretes: DJ JP da Imaculada e Irmã Ana Paula, CMES


“Regue fé, esperança, amor”

Compositor: Paulo Cesar Baruk

Intérpretes: Ibab Celebração, Lito Atalaia e Paulo Cesar Baruk


“Atos 2 (citação musical: ‘Eu navegarei’)”

Compositores: Gustavo Daniel Alves Gomes, Isaac Medeiros Cabral, Hiago Ramalho Viana e Azmaveth Carneiro da Silva

Intérpretes: Big Asher, 2Metro, Trindade Records, Shiso e Love Funk


Locações

Biblioteca Popular de Afogados Jornalista Ronildo Maia Leite

Erem Amaury de Medeiros


Este produto audiovisual é independente e baseado nas ementas dos cursos de Libras Básico I (Erem Amaury de Medeiros – Gre Recife Sul) e Intermediário (Instituto Federal do Mato Grosso do Sul).

Os sinais descritos nesta obra de ficção estão sujeitos a alterações devido às variações geográficas.


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