02/11/2013

FURO DECISÃO 2- A FORMATURA/ SEQUÊNCIA DE CENAS 2

CENA 4

-I feel so close to you right now…
E é ao som de Calvin Harris que Matheus agita a festa de casamento de Manjericão. Thiago sobe até onde o amigo está.
-O que você tá fazendo?
-Me divertindo, ora. Que pergunta!
-O Manjericão... – percebe que está falando muito baixo- O Manjericão foi abandonado no altar e você tocando música eletrônica?
-Quem disse que eu sei tocar isso, Thiago? Isso daqui é presente da assessoria de imprensa dele. A pessoa é convidada pra uma festa e finge ser DJ pra atrair fotógrafos. Manjericão mesmo me contou isso.
-Só pode estar de brincadeira comigo. Que raio de dia foi esse?
-Sossega, Thiago! O povo todo tá dançando, faz a mesma coisa que eles.
-O quê? Aproveitar que o noivo não vai jogar fora a comida da “Socorro Festas” e encher a barriga?
-Fica tranquilo, rapaz. Descontrai, descontrai...
-Cuidado, homem-mangaba. Esse negócio de fingir tocar música da trilha de “Sangue Bom” não tá te fazendo bem...

CENA 5

Guilherme Capim Santo entra no salão de festa e encontra Gabriella.
-Quem deixou você entrar aqui?
-Não era um casamento aberto ao público?
-Aberto? Arreganhado até demais. Não sabia que você se dava bem com o Manjericão.
-Eu nem conheço esse cara. Só conheço das rodas de conversa dos universitários.
-Ah, já saquei. Você sabia que ia ter fotógrafo aqui e resolveu sair nas fotos? Fica à vontade, subcelebridade do sertanejo universitário...
-Rock.
-Que seja. Aff, não aguento mais essas músicas novas tocando... Ô, DJ, põe “O bêbado e a equilibrista” aí.
-Da Elis Regina?
-Você conhece?
-O suficiente pra saber que... É música de velho.
-Não é de velho. É um clássico!
-Por isso. Tudo que é clássico, é velho. Não é à toa que “Superfantástico” tem trinta anos!
-Garoto intragável, vou te contar. Como se aquele lixo de rock universitário valesse alguma coisa.
-Se não valesse, não era a música mais baixada do iTunes.
-Qual? A tua?
-Claro. Manjericão está em queda, minha filha. Daqui a pouco, não sobra nem uma folhinha do tempero.
-É, logo se vê que você morre de inveja dele. Eu sei porque eu rezei aquele homem antes do casamento, e o mato do meu quintal murchou!
-Imagina se eu vou ficar de recalque por causa de homem. Poxa, minha filha, eu só vim parar aqui porque eu queria sentir o calor do meu público!
-Agora, no embalo dos movimentos pélvicos!- Matheus lidera uma fila de convidados e faz à capela da música da Ellen Rocche.
-Talvez seja aquele momento em que eu me embriague com Guara Eta... Com licença... –circula pelo salão.

CENA 6

Danila está solitária, com um celular na mão, admirando o bolo de casamento de Mabi e Manjericão. Retira o celular do bolso e tira uma fotografia para pôr no Instagram. Ao enviar, grita por perceber que a Madre Superiora está atrás dela, com um olhar de condenação.
-Hum... Estimulando a gula via internet?
-O que a senhora tá fazendo aqui?
-Eu vim me certificar de que você resistirá às tentações. Onde está o homem que está tentando te conduzir para a BR-232 do mal, ainda que inconscientemente?
-Aquele ali, dançando a música da novela das sete.
-Que depravação!  Em vez de pular com Jota Quest e “Além do Horizonte”, se submete a esse tipo de situação degradante...
-Mas o que eu faço, Madre?
-Venha comigo ao Convento Estância Sacra, minha querida. Livre-se dessa perversão que te cerca, dessa humanidade seminua, desses rapazes que não cantam “devias vir para ver os meus olhos tristonhos”, mas “mete o fio dental e passa o óleo no bumbum”, dessas periguetes que acham boa moda uma peça íntima enfiada no pâncreas, dessas cobras humanas que só sabem ofender no Ask.Fm...
-Não posso, irmã! O meu corpo todo está tomado pela lascívia!
-Lascívia?
-É, não sei o que significa, mas estava no roteiro.
-Falando nisso- Thiago aborda- Vocês estão a fim de mudar um roteiro, o da relação de vocês com a tecnologia?
-Oi?- Danila, que não está entendendo, entende menos ainda.
-Gente, vocês não têm noção disso daqui: uma rifa que custa cinco reais!
-Um roubo, diga-se de passagem...
-Que nada, freira, é barato que só.
-Madre!
-Certo. Olha só, vocês vão concorrer a um MacBook Pro e a um iPad. O sorteio vai feito pela agência W9 e vai me ajudar a me formar. Por favor, gente, me ajuda! A propaganda é verdadeira, não é ficção.
-Tá bom, Thiago, eu vou comprar a rifa. Pena que o dinheiro não seja cenográfico...
-Mas de jeito nenhum. Não vou deixar que você gaste um tostão nisso! Sinto cheiro de pecado.
-Também, andando com Danila do lado... Eu ia dizer que é gripe, mas...
-Você não é aquele menino que usa boné e faz parte de uma turma que está vendendo uma rifa cujo prêmio é uma entrada pra um motel? Uma rifa conhecida como “Morra de Prazer”?
-Eu fui obrigado. Infelizmente, o meu pacote é integral, tenho que me submeter à vendagem desse tipo de coisa...
-Não me engane. Vocês, jovens, são terríveis!
-A senhora vai comprar a rifa da W9?
-Em absoluto. Somente um ser insano seria capaz.
-Ah, produtos da Apple!- Matheus faz uma festa- Eu quero! Deixa eu tirar o dinheiro do smoking.
-Geração perdida... Vamos embora daqui, minha filha!
-Pra onde? Matinê?
-Matheus!- Thiago se assusta com a audácia.
-Eu vou salvá-la do Julio Iglesias de Jardim São Paulo. Anotem bem o que digo.
-Pode falar- Thiago pega uma caneta e anota algo na rifa.
-Eu desviarei essa jovem da rota de perdição. Perdição agora, só nos pratos do programa “Sabor da Gente”. E com licença- afasta Danila da má influência de Matheus.
-Anotado. Agora me dá o telefone, Matheus.
-Deixa que eu anoto. As gatinhas não podem saber, senão dá pane na TIM- pega o talão.
-Meu amigo, a TIM é uma pane, não precisa congestionar sua linha.
-Pronto. Comprei a rifa- Thiago deixa uma lágrima escorrer
-Rapaz, esconde a emoção aí...
-Tô chorando de mau olhado mesmo, mas tô feliz. Gente, toca a música de “Carruagens de fogo” enquanto eu pego o talão- o universitário se aproxima em câmera lenta, ao som de Calvin Harris (ainda!)- Eu não falei “Carruagens de fogo”, sonoplasta?

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