ESSA ESTÓRIA É
BASEADA EM PESSOAS E EM FATOS REAIS. O AVISO SERVE PARA QUE VOCÊ SE CONVENÇA,
DE UMA VEZ POR TODAS, DE QUE AS PROPAGANDAS SÃO MESMO VERDADEIRAS E QUE EFETUE
A COMPRA DESEJADA PARA QUE ELAS- TANTO AS INSERÇÕES COMERCIAIS QUANTO AS RIFAS-
ACABEM O QUANTO ANTES.
A OBRA É ABERTA; OU
SEJA, PERMITE MUDANÇAS NO ROTEIRO A PARTIR DA ACEITAÇÃO DO PÚBLICO. MUDE O
FINAL DESSA TRAMA. MUDE O DESTINO DO PERSONAGEM PRINCIPAL.
CENA 1
Clara
está num cenário todo em azul-claro, num pufe verde medonho.
-E aí,
galera? Hoje, o nosso programa é ao vivo e vamos receber um dos maiores astros
da nova geração. Com vocês: Guilherme Capim Santo.
O
sonoplasta maluco decide colocar sons de aplausos, aplausos, aplausos enquanto
o vilão entra.
-Olá,
Clara. Oi, pessoal- diz, sorridente.
-Fica à
vontade. Faça de conta que foi convidado.
Ba dum
tss!
-Mas eu
fui convidado.
-Brincaderinha.
Ah, imagina se alguém aqui paga jabá pra aparecer.
O pessoal
do estúdio procura disfarçar o constrangimento.
-Pode
perguntar, então.
-Capim
Santo, como é ser o campeão de downloads no iTunes neste mês?
-Vê só, é
uma surpresa muito grande. Se eu disser que não esperava esse sucesso todinho,
eu estaria mentindo, mas não pensei que ia ser tão rápido.
-E a quê
você atribui esse sucesso todo?
-Ao meu
talento, ao meu carisma e à admiração que a galera sente por mim. Você acredita
que o pessoal deixou de comparecer à SuperCon Hero pra me prestigiar no teatro
da Universidade?
-Posso
bem avaliar. Afinal, você é um fenômeno de popularidade. Neymar, por exemplo,
está pedindo uma consultoria ao seu hair
stylist para ficar com esse cabelo de Zé Carioca, que tem feito um estrago
nos salões de todo o Brasil.
-Salões e
açougues. Meu cabelo é uma galinha depenada com estilo.
-E ditar
moda é só mais uma prova dessa fama que você está experimentando. Conta
pra gente o sucesso que você tem feito com o sertanejo universitário.
-Rock
universitário! Não me rebaixe!
-Tanto
faz, é tudo música mesmo!
-Não me
comprometa. Bom, é um estilo que eu procuro criar raiz na UFPE, um lugar que
até estudante de Letras é erudito. E tem sido bacana a aceitação. Claro que vai
demorar cinco ou seis meses para eu levar o kikito pra casa, mas dá pra
aguentar.
-Você
quis dizer "Grammy", não?
-Esse aí.
Sem contar que depois que o meu disco chegar às...
-Só um
minutinho, Guilherme. Chegou uma informação aqui no meu ponto- coloca a mão na
orelha e outra na cintura porque o movimento é sexy- Não acredito! Mentira!
Tudo bem- sai do pufe- Vamos embora!
-Mas pra
onde?
-Alô!
2014 não vai chegar enquanto não acontecer o evento mais badalado deste ano: o
casamento do Manjericão!
-Espera
aí! Você tá me dizendo que eu tô sendo trocado na minha primeira aparição em
rede nacional por causa do Leonardo Manjericão?
-Tô. Mas
eu não vou discutir isso com você. Em meia hora, o carro da emissora vai me
levar até a capela. Se quiser uma carona para descer no Terminal do Xambá... -
sai do estúdio.
-Sempre
esse verme descabelado!- bufa!
CENA 2
Danila
aparece na igreja com uma roupa que... Misericórdia... Mas calma: em vez de
tentar agarrar alguém, ela vai se confessar.
-A
sua bênção, seu padre.
-Sem
pecado, concedida.
Ela
estranha a voz do sacerdote, mas continua.
-Eu
tenho muitos pecados na bagagem, mas tem um que me acompanha desde que eu virei
a figurinista do primeiro clipe do Leonardo Manjericão: a luxúria. A coisa tá
tão séria que eu ia trocar meu nome no Facebook. Ia botar “Gladys do Cabuçu”.
Eu me apaixonei perdidamente pelo apresentador do programa que cobria os
bastidores do clipe. Depois de tanto fugir de mim, ele ainda tentou se
aproximar, mas eu resisti. Só que agora renovaram meu contrato para fazer esse
novo filme e eu não sei como escapar da tentação.
-O
banheiro está liberado, irmã!
-O
quê?- grita Danila, ao perceber que o padre estava chegando.
-Já
conseguiu desentupir o banheiro? Posso usar?- questiona a freira que estava no
confessionário.
-Pode
vir, Madre- avisa o padre.
-Minha
filha, eu estava numa prisão de ventre tão grande que estava me retorcendo no
confessionário. Acabei escutando tudo.
-Já
que ele não estava aqui, melhor. É mais fácil conversar de mulher pra mulher...
-Não!
De mulher... Para irmã...
-Tá
certo. O que a senhora acha que eu devo fazer?
-É
necessário frear todas as tentações carnais, Gladys do Cabuçu fake. E eu tenho a solução para isso.
-Matar
o Matheus?
-Não,
convertê-lo à extrema e puríssima santidade. Se você quiser ficar com esse
“aborrescente”, trate de segurá-lo pelo lado espiritual.
-Acontece,
minha irmã, que meu lado espiritual tá mais ou menos o seguinte... É, como é
que eu posso explicar pra senhora... A senhora já viu uma garrafa de Veja?
-Já.
-E
de Pinho Sol?
-Também.
-É
por aí, irmã. Se usar os dois ao mesmo tempo, o meu lado espiritual vai continuar
sujo.
-Querida,
você precisa ser uma pessoa OLX, desapegada do material.
-E
que material, aquele homem... Eu preciso esquecer que sou completamente
apaixonada por ele. Como é que eu faço?
-Cala
a boca e me escuta! O que você pensa de passar as férias num spa espiritual?
-Isso
existe?
-Claro.
Não existe melhor lugar para esquecermos as provações a que o planeta nos
impõe. Deixe-me mostrar uma fotografia local. Apesar de não estar lá, você deve
se sentir lá: bem-vinda à sua nova colônia de férias!
-Tá
de onde com a minha cara, não tá, não... Quer dizer, tá de onda com a minha
cara, não tá, não?
-Em
absoluto. Faça um teste. Divirta-se o quanto puder na festa do casamento que o
padre vai celebrar hoje. Verá o quanto as pessoas são vazias, capazes de
liberar a própria honra por um gole de Coca-cola, coreografias de baixo calão,
músicas que veneram o pâncreas da mulher...
-Vou
pensar no seu caso. Eu nunca me vi no convento. Aliás... - vira-se para o
público- Alguém já me viu fazendo algo santo?
-Pense
bem, fidelíssima garota sensual. E eu tenho que pensar em não conversar tanto,
com licença... – corre para o banheiro.
CENA 3
No
altar, estão Matheus e Manjericão, este com o cabelo que chamamos
carinhosamente de “capivara desenxabida” envolto num gel. O jovem pega um pente
gigante é dá uma primeira passada para deitá-lo. O cabelo levanta, com um ruído
estranho. Dá uma segunda passada, e novamente os fios ficam em pé.
-Como
é que eu faço aqui, Thiago?- o amigo pede ajuda.
-O
cabelo de Manjericão? Só na base da marreta. Nem que seja “You Planeta”.
-Gente,
eu tô tão nervoso...
-Calma,
rapaz. Eu sei que é normal isso. Afinal, você tá casando pela primeira vez.
-Primeira
e única, né, Matheus? Mas não é por isso, não. Aluguei esse smoking e tem coisas em mim coçando.
-Onde
você pegou a roupa?
-Numa
loja chique da cidade. Procurei no Google e dei crédito: a “Bacurinha’s
Vintage”.
-Com
um nome desses, a gente entende por que coça...
-Mas
eu também estou nervoso. É o primeiro casamento que eu vou pegando um Barro/
Macaxeira (Várzea) pra chegar à igreja.
-Falando
em Barro, como é que tá a faculdade, Barros?
-Jogando
os meus nervos no lixo, Manjericão. E ainda tem a formatura no próximo ano, mas
a gente fala disso depois.
-Vem
cá, e as madrinhas? E o padre?
-Tem
certeza de que não esqueceu a cueca? Porque tá faltando muita coisa aqui-
Matheus entende o sofrimento do noivo, mas tenta ser piadista. Tenta.
Gabriella
vem da rua e Danila chega com o padre. A sensual adolescente fica do lado de
Thiago, e Matheus estranha que ela não tenha tentado apalpá-lo, como faz todos
os dias. Gabriella fica ao lado do adolescente.
-Desculpem
o atraso. Mas é que pelas novas cotas eclesiásticas, o padre tem que abrir seu
confessionário para aproveitar o tempo em que a noiva atrasa de propósito.
-Tudo
bem, seu padre. Eu também vou tentar aproveitar o tempo enquanto a Mabi não
chega. Vamos jogar “adedonha”, gente?
-O
quê?- Matheus desconhece a palavra.
-“Nome,
lugar, objeto”.
-Ah,
sim. Adedooooonha!- Matheus abre as mãos e Manjericão põe três dedos.
-Letra
M.
-Não,
senhor! N de “nada, nada, nada, nada, eu não estou fazendo nada”- fala
rapidamente.
-M,
porque a regra de 2008 aceita o K no alfabeto português.
-Quem
disse que eu sou português? Eu sou de Jardim São Paulo!
-Mas
não é São Paulo!- retruca o roqueiro.
-Seu
padre, é o seguinte: atropelei o meu gato. Pronto, confessei meu pecado. Agora
será que dá pro senhor me passar uma penitência que não seja aguentar esses
dois tabacudos?- Gabriella fica desesperada.
Clara
chega à igreja e filma tudo.
-Novembro
de 2013. Finalmente encontramos um casamento que é digno de estar nas páginas
humorísticas sobre famosos, como o “Morri de Sunga Branca” e o “Morreu ou tá na
Record?”. Morram de inveja, porque Manjericão é um noivo pra ninguém botar
defeito. Até as defuntas do IML estão querendo casar com...
Um
carro chega e quando a porta traseira é aberta, arremessa Clara para... Não
sei. O câmera sai à procura da apresentadora enquanto Mabi vem com seu vestido
que parece uma cortina da “Narciso Enxovais”. Breno, o advogado e quase tutor
do noivo, a acompanha.
Dentro
da igreja...
-Música
com M.
-“Meu
mel”, do Leonardo!
-Conheço
essa música, não...
-Como
não, Matheus? Tá na trilha sonora!
-Ah,
tudo bem.
-Sua
vez.
-Marcha
Nupcial!- grita Thiago.
-Por
que você deu dica pra ele e não pra mim?
-Não
é dica, é pra tocar porque a Mabi chegou.
Todos
se levantam para acompanhar os passos da noiva. Matheus liga a câmera. O
sonoplasta liga a Marcha Nupcial.
-Olá,
tudo bem? Hoje, numa igreja espetacularrrr, teremos o casamento de Manjericão e
Mabi. O que você tem a dizer sobre isso... Thiago... Gabrieeeel?
-Que
o meu nome não é Thiago Gabriel e eu não vou mentir dentro de uma igreja.
Desliga a câmera. A gente grava o “Furo Decisão” na festa.
-Ah,
tá... Por que o pai da noiva não veio com ela até o altar?
-Porque
ele acha o Manjericão um cretino desocupado que faz rock. E que não vai
sustentar a filha dele.
-Mas
o Manjericão é rico.
-Só
por isso ele está aqui, na última fila. Mas acha tudo isso uma palhaçada do
mesmo jeito.
-Queridos
fieis, estamos aqui reunidos para celebrar a união desses dois jovens: a Maria
Beatriz Gutierrez e o Leonardo Mantoanelli Jensen Ribeiro Castro Oliveira.
Logicamente, santificarei esta união por meio de apelidos. Não quero ficar
afônico.
-Beleza-
Manjericão não se contém de tanta felicidade.
-É
de livre e espontânea vontade que os noivos estão aqui presentes?
-Sim.
-Talvez...
– justifica Mabi.
-Se
existe alguém que tenha algum motivo que possa impedir a união desses dois
jovens... Que fale agora ou se cale para sempre.
-Eu!
Todos
olham para a última fileira, de onde geralmente sai a pessoa que tenta vetar os
casórios tradicionalmente impedidos. Mas nada.
-Quem
falou isso?- pergunta Gabriella.
-Eu,
Thiago- vai para o centro da igreja- Eles não poderão se casar antes que eu
faça a propaganda da rifa que estou vendendo. Por cinco reais, vocês concorrem
a um MacBook e um iPad, tudo da Apple, uma empresa que eu não sei dizer se ela
se chama “épol” ou “ápol”. Não é mentira! Todo mundo deve estar pensando que só
porque esse casamento é de ficção que a rifa também é. Não é, bando de besta!
Tô divulgando no Google Plus, que eu chamo de “Mais”, no Facebook, no Twitter,
no Blogger e no Orkut. Ajude um formando. Uma propaganda da Agência W9.
Continuando...
-Leonardo
Manjericão, você aceita Mabi como sua legítima esposa e promete amá-la e
respeitá-la na saúde e da doença, na riqueza e na pobreza, na alegria e na
tristeza, no “Chevrolet Hall” ou no Teatro da UFPE até que a morte os separe?
-É
pra já!
-Mabi,
aceita Leonardo Manjericão como seu legítimo esposo, desconsiderando todos os
outros que você possa vir a ter ao longo de sua juventude?
-Pega
um adesivo e vai, Mabi!- Matheus começa a palhaçada de novo, constrangendo os
padrinhos.
-Vai,
Mabi! Vai, Mabi! Vai, Mabi!- os convidados e o próprio Manjericão engrossam o coro.
Mabi se vira para o rapaz.
-Você,
melhor do que ninguém, sabe o quanto eu te amo e quantos sacrifícios eu faria
pra ficar do seu lado. Mas eu vou ter que mandar você de volta pra esteira.
-Não
faz isso comigo... Hoje é meu aniversário, dia de todos os santos...
-Eu
não posso... Eu não posso... – e sai correndo em câmera lenta da igreja. A
Marcha Nupcial dá lugar a “Fim de Tarde”, do Fat Family.
-Hoje
eu sinto tanto não ter você, e nem o tempo fez eu te esquecer. Pra quê chorar,
se você não vem? Não vem?- Ela sai vestida de noiva pela cidade, e percebe que
os outdoors têm o rosto dos padrinhos, dublando a música com uma cara de
condenação desgraçada.
-Perdi
você! Não tente entender. Ainda te amo! Perdi você! Não tente entender. Ainda
te amo! Perdi você sem razão, sem querer!- joga o buquê para o alto, que cai
acidentalmente na mão de uma senhora mendiga que luta até hoje para sustentar
seus vinte e nove filhos.
-Todo
fim de tarde é sempre assim e uma saudade vai nascendo em mim. Eu já nem sei
mais porque te amei... Eu te amei!- As propagandas de ônibus também trazem os
rostos de Thiago, Matheus, Gabriella e Danila, os quais atemorizam mais a
fujona.
-Perdi
você! Não tente entender. Ainda te amo! Perdi você! Não tente entender. Ainda
te amo! Perdi você sem razão, sem querer!- Mabi, coitada... Coitada nada! Mabi
cai no chão e rasga o vestido de noiva, e agora parece que usa um espartilho
que lembra vagamente uma periguete dos anos 1830.
A
música pula para o final. A quase nubente entra em um momento de reflexão:
pensa o que vai fazer dentro do Terminal de Xambá.
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