11/05/2013

A CRUZ E A ESPADA/ CAPÍTULO 2



-Forte? Você me dá a pior notícia da minha vida e vem me falar de força?
-Eric, por favor, para pra pensar em quantas pessoas passaram por essa situação e lutaram até conseguirem a cura completa. Ninguém está dizendo que o caso seja irreversível. E depois, nós não sabemos a gravidade do seu problema.
-Problema esse que sou eu que vou ter que passar. Porque no fim das contas, sou eu quem vai ter que enfrentar as consequências. Ninguém vai poder sofrer por mim.
-Acontece que as pessoas que estão à  sua volta vão se sentir inúteis, sabendo que você não quer se esforçar para ser curado. Eric, ninguém está te dando um diagnóstico definitivo pra que você desista de tudo. Eu sei que é uma notícia impactante, mas...
-Não. À minha volta, não. Escuta bem uma coisa: eu pago o que o senhor me pedir, mas ninguém pode saber do que o exame disse. Nem a Graziela, nem a Sophia, nem o meu tio... Ninguém, entendeu bem? Ninguém!
Dr. Gonçalves fica espantado com o temor e a prepotência que definem o jovem naquele momento de angústia.

XXXXX

Sophia chega ao hospital, enquanto Graziela e Téo estão na sala de espera, à procura de informações sobre o estado de saúde de Eric.
-O que foi que aconteceu, gente?
-Grazi, você conversa com ela, que eu vou ao banheiro. Qualquer coisa, você me dá um toque.
-Pode ir, Téo. Eu falo com ela.
-Por favor, não me esconde nada. Como é que está o Eric?
-A gente ainda não sabe bem como ele ficou após o acidente.
-Como é que não? Vocês chegaram primeiro, devem estar aqui há mais de horas! Com certeza, você arrastou seu namoradinho para não perder a chance de ficar ao lado do meu.
-Eu... Eu não entendi esse seu comentário, Sophia. Se ele tem alguma ironia, desculpe, mas eu acho que não é  hora pra isso.
-Não? De qual planeta você acha que eu vim, Graziela? Até um cego pode ver perfeitamente que você é apaixonada pelo seu amigo de infância.
-Eu respeito o meu amigo de infância, só isso. Respeito tanto que estou falando baixo no hospital, e não dando escândalo como você.
-Simplesmente se vitimize, querida. É uma tática que sempre funciona. No momento grave, na hora certa, você me aparece aqui, de prontidão.
-Impressão minha ou eu estou sentindo um pouco de insegurança da sua parte?
-Insegurança? Minha? De uma garota sem sal com você? É pra subestimar minha inteligência, não é? Será que você não se tocou de que foi a mim que ele escolheu?
-Claro que sim. O Eric e eu somos amigos desde a infância. Desculpe, Sophia. É que essa estória de acidente me pegou tão de surpresa que... Você me entende. Acabei esquecendo que ele se contenta com qualquer cachorra que fareja a carteira dele.
-Olha como você fala comigo!- avança para cima de Graziela.
-Calma, calma aí- Téo interfere na briga- O que é? Por que essa briga agora?
-Pergunta pra sua namorada. Ela deve saber por que nós estamos discutindo. Ou melhor, por quem. Eu só sei do seguinte: vou chamar meu segurança e ele não vai deixar você entrar aqui, ouviu?
-Aqui? Você já viu que lugar é  esse? Hospital do Governo, sua estúpida! Pode chamar quem você quiser, mas eu tenho direito de estar aqui, e eu quero ver quem é, além do Eric, que vai conseguir me colocar pra fora.
-Com a minha influência, vai ser muito fácil.
-Vamos ver, então. Mas tenho certeza de que ninguém vai sair. Claro que não vai! Nem você, nem eu!

XXXXX

-Como eu vou ficar calado em relação a isso, Eric? Estamos falando de algo que diz respeito à sua vida.
-É justamente por isso que eu não quero que ninguém saiba o que está rolando. Quanto o senhor quer pra não  abrir a boca?
-Ah, por favor, Eric! Eu sou médico, sou comprometido com a ética da minha profissão. Não vou chantagear você. Se esse é o seu desejo, eu não digo nada. Mas acho que as pessoas próximas a você têm o direito de ficar ao seu lado num momento tão crítico como esse.
-O meu tio Glauco já tem uma certa idade. Eu não posso chegar pra ele e dizer que eu.. Enfim, eu nem sei o que vou dizer... Nem mesmo o que tenho. A Sophia vai ficar arrasada... Ninguém pode saber.
-A sua vontade vai ser respeitada, pode ter certeza.
-Doutor?- Graziela entra.
-Grazi?
-Dá licença, é que eu estou esperando lá fora há mais de horas, e só agora a enfermeira deixou a gente entrar.
-Cadê a Sophia?- pergunta Eric, causando descontentamento na amiga.
-Ela foi tomar uma água. Estava muito nervosa.
-Pelo visto, você também. Parece que andou brigando com alguém.
-É que eu e a Sophia andamos nos bicando lá  fora, mas acho que vai ficar tudo bem.
-O que foi que houve, Graziela?
-Relaxa, não foi nada demais. E você, como é  que está se sentindo?
-Vivo- suspira, olhando para a cara do médico- Felizmente... Foi só um susto... Ainda estou sem acreditar no que me aconteceu hoje.
-Eu quase morri quando o cara que te atropelou contou pelo telefone do seu acidente. Pensei que ia te perder- põe a mão no rosto dele, quando Téo entra no quarto. Enciumado, ele deixa o local sem que a namorada perceba. Eric o vê e tenta se desvencilhar da jovem.
-Perdeu nada. Só foi mesmo uns arranhões. Já estou me sentindo melhor. Você sabe se a Sophia avisou pro meu tio que eu estou aqui?
-Não, ela não me disse nada.
-Doutor, eu... Estou de alta, não é?
-Daqui a pouco, eu vou assinar. Antes, eu vou enviar seu exame pra um colega daqui do hospital.
-Precisa disso mesmo? Ele já não vai ter alta?
-Questões de praxe, não há nada pra se preocupar. Bom, eu tenho que ir até a minha sala, se vocês me dão licença...
-Valeu, doutor. Depois eu falo com o senhor.
-Agora que o médico não está aqui, eu queria te perguntar uma coisa.
-Fala, Grazi.
-O que é que vocês dois estão escondendo? O que foi que ele falou na hora em que eu não estava aqui?
-Nada. Só perguntou se eu estava bem.
-Eric, por favor. Tem alguma coisa em você  que não quer que ninguém saiba. Eu te conheço. Basta olhar pra sua cara e dizer que o médico te disse alguma coisa a mais. O que foi?
-Você está viajando. Eu... Eu não tenho nada além da ferida no pé. Perdi a consciência, apaguei no meio da rua, mas foi só isso. Um susto, Graziela.
-Tem certeza disso?
-Já estou perdendo a paciência. Só quero esquecer que o dia de hoje existiu.
-Vou avisar o Téo de que daqui a pouco, todo mundo vai pra casa. Já falou com seu tio?
-Coitado, ele nem sabe de nada. Ainda não liguei.
-Então, eu vou lá fora tentar falar com ele.
-Ótimo. Avisa pra Sophia que eu já estou bem.
-Tudo bem, eu aviso- sai da enfermaria. Com cuidado para não fazer barulho, Eric se levanta da cama e vai até a porta. Vendo que Graziela não está por perto, procura o consultório do médico.

XXXXX

Graziela está na portaria do hospital, tentando ligar para Glauco, o tio de Eric. Logo atrás, vem Sophia para recomeçar a discussão que haviam tido antes que soubessem o estado de saúde do jovem. Subitamente, antes que possa se aproximar, Téo segura violentamente o braço da namorada.
-O que é isso?
-Eu quero falar com você.
-Sim, mas precisa dessa agressividade toda? Téo, você está me machucando!
-Eu quero saber que cena foi aquela que você  fez na enfermaria, passando a mão no rosto dele. Até quando você  acha que vou ficar calado, vendo você se insinuar pro Eric?
-Pra começar, solta o meu braço, que eu não dei permissão pra você me tratar desse jeito. E depois, eu não me insinuei pra ninguém. Para de falar comigo como se eu fosse uma... Como se eu não estivesse namorando você.
-Algumas vezes, você acha facilidade pra se esquecer desse detalhe.
-Cuidado com o que fala.  Porque se eu sentar a mão em você, eu não vou aceitar revide pela forma que você  vem me tratando desde hoje cedo.
-Graziela, deixa de bancar a idiota. Se decide de uma vez, porque eu já estou perdendo a paciência contigo.
-Paciência quem perdeu fui eu, em ter que aguentar seu ciúme como se você fosse o frágil da relação, como se estivesse sendo traído, como se eu me envolvesse com qualquer um.
-Se fosse assim, eu estaria bem tranquilo.
-Como é a história? 
-Não é de hoje que o Eric trava uma disputa comigo pelo teu amor. Seria muito mais fácil se eu te perdesse pra um desconhecido. Porque além de eu ter que brigar com o meu melhor amigo por sua culpa, ele ainda não se tocou de que o seu coração é dele.
-Sendo assim, por que você insiste nisso tudo ainda?
-Porque eu amo você. “Só por isso”. E porque eu venho durante esses anos todos, desde quando a gente era criança, tentando provar que se o Eric não te nota, eu sou o contrário. Só que eu estou cansado, Graziela. Eu não aguento mais ser um refúgio sempre que você cruzar com a Sophia, ou se decepcionar com o Eric.
-Isso é uma ameaça?                                                     
-Não, é um pedido. Eu quero que você se decida: ou você luta por ele ou fica comigo.

XXXXX

Eric entra na sala do médico e vasculha os exames. Encontra o seu e reluta para abri-lo. Quando o faz, acaba se decepcionando com a confirmação do que já havia lhe sido dito.
-Ele estava certo. Eu vou morrer. Acabou tudo.
O médico abre a porta. 
-Eric? Eu tinha acabado de assinar sua alta, mas o que você...
-Li o exame... Pensei que... Que o senhor estava errado, mas... Só fiz confirmar. Minha vida acabou, doutor. O que vai ser de mim agora?

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