-Forte?
Você me dá a pior notícia da minha vida e vem me falar de força?
-Eric, por favor,
para pra pensar em quantas pessoas passaram por essa situação e lutaram
até conseguirem a cura completa. Ninguém está dizendo que o caso seja
irreversível. E depois, nós não sabemos a gravidade do seu problema.
-Problema esse
que sou eu que vou ter que passar. Porque no fim das contas, sou eu quem vai
ter que enfrentar as consequências. Ninguém vai poder sofrer por mim.
-Acontece que as
pessoas que estão à sua volta vão se sentir inúteis, sabendo que
você não quer se esforçar para ser curado. Eric, ninguém está te
dando um diagnóstico definitivo pra que você desista de tudo. Eu sei que
é uma notícia impactante, mas...
-Não.
À minha volta, não. Escuta bem uma coisa: eu pago o que o senhor me pedir,
mas ninguém pode saber do que o exame disse. Nem a Graziela, nem a Sophia, nem
o meu tio... Ninguém, entendeu bem? Ninguém!
Dr. Gonçalves
fica espantado com o temor e a prepotência que definem o jovem naquele momento
de angústia.
XXXXX
Sophia chega ao
hospital, enquanto Graziela e Téo estão na sala de espera, à procura de
informações sobre o estado de saúde de Eric.
-O que foi que
aconteceu, gente?
-Grazi, você conversa com ela, que eu vou ao
banheiro. Qualquer coisa, você me dá um toque.
-Pode ir, Téo. Eu
falo com ela.
-Por favor, não
me esconde nada. Como é que está o Eric?
-A gente ainda
não sabe bem como ele ficou após o acidente.
-Como é que não?
Vocês chegaram primeiro, devem estar aqui há mais de horas! Com certeza, você
arrastou seu namoradinho para não perder a chance de ficar ao lado do meu.
-Eu... Eu não
entendi esse seu comentário, Sophia. Se ele tem alguma ironia, desculpe, mas eu
acho que não é hora pra isso.
-Não? De qual
planeta você acha que eu vim, Graziela? Até um cego pode ver perfeitamente que
você é apaixonada pelo seu amigo de infância.
-Eu respeito o
meu amigo de infância, só isso. Respeito tanto que estou falando baixo no
hospital, e não dando escândalo como você.
-Simplesmente se
vitimize, querida. É uma tática que sempre funciona. No momento grave, na
hora certa, você me aparece aqui, de prontidão.
-Impressão minha
ou eu estou sentindo um pouco de insegurança da sua parte?
-Insegurança?
Minha? De uma garota sem sal com você? É pra subestimar minha inteligência, não
é? Será que você não se tocou de que foi a mim que ele escolheu?
-Claro que sim. O
Eric e eu somos amigos desde a infância. Desculpe, Sophia. É que essa
estória de acidente me pegou tão de surpresa que... Você me entende. Acabei
esquecendo que ele se contenta com qualquer cachorra que fareja a carteira
dele.
-Olha como
você fala comigo!- avança para cima de Graziela.
-Calma, calma aí-
Téo interfere na briga- O que é? Por que essa briga agora?
-Pergunta pra sua
namorada. Ela deve saber por que nós estamos discutindo. Ou melhor, por quem.
Eu só sei do seguinte: vou chamar meu segurança e ele não vai deixar
você entrar aqui, ouviu?
-Aqui?
Você já viu que lugar é esse? Hospital do Governo, sua
estúpida! Pode chamar quem você quiser, mas eu tenho direito de estar aqui, e
eu quero ver quem é, além do Eric, que vai conseguir me colocar pra fora.
-Com a minha
influência, vai ser muito fácil.
-Vamos ver,
então. Mas tenho certeza de que ninguém vai sair. Claro que não vai! Nem você,
nem eu!
XXXXX
-Como eu vou
ficar calado em relação a isso, Eric? Estamos falando de algo que diz respeito
à sua vida.
-É justamente
por isso que eu não quero que ninguém saiba o que está rolando. Quanto o
senhor quer pra não abrir a boca?
-Ah, por favor,
Eric! Eu sou médico, sou comprometido com a ética da minha profissão. Não vou
chantagear você. Se esse é o seu desejo, eu não digo nada. Mas acho que as
pessoas próximas a você têm o direito de ficar ao seu lado num momento tão
crítico como esse.
-O meu tio Glauco
já tem uma certa idade. Eu não posso chegar pra ele e dizer que eu..
Enfim, eu nem sei o que vou dizer... Nem mesmo o que tenho. A Sophia vai ficar
arrasada... Ninguém pode saber.
-A sua vontade
vai ser respeitada, pode ter certeza.
-Doutor?-
Graziela entra.
-Grazi?
-Dá licença,
é que eu estou esperando lá fora há mais de horas, e
só agora a enfermeira deixou a gente entrar.
-Cadê a
Sophia?- pergunta Eric, causando descontentamento na amiga.
-Ela foi tomar
uma água. Estava muito nervosa.
-Pelo visto,
você também. Parece que andou brigando com alguém.
-É que eu e
a Sophia andamos nos bicando lá fora, mas acho que vai ficar tudo bem.
-O que foi que
houve, Graziela?
-Relaxa, não foi
nada demais. E você, como é que está se sentindo?
-Vivo- suspira,
olhando para a cara do médico- Felizmente... Foi só um susto... Ainda
estou sem acreditar no que me aconteceu hoje.
-Eu quase morri
quando o cara que te atropelou contou pelo telefone do seu acidente. Pensei que
ia te perder- põe a mão no rosto dele, quando Téo entra no quarto.
Enciumado, ele deixa o local sem que a namorada perceba. Eric o vê e tenta se
desvencilhar da jovem.
-Perdeu nada.
Só foi mesmo uns arranhões. Já estou me sentindo melhor. Você sabe
se a Sophia avisou pro meu tio que eu estou aqui?
-Não, ela não me
disse nada.
-Doutor, eu...
Estou de alta, não é?
-Daqui a pouco,
eu vou assinar. Antes, eu vou enviar seu exame pra um colega daqui do hospital.
-Precisa disso
mesmo? Ele já não vai ter alta?
-Questões de
praxe, não há nada pra se preocupar. Bom, eu tenho que ir até a minha sala, se
vocês me dão licença...
-Valeu, doutor.
Depois eu falo com o senhor.
-Agora que o
médico não está aqui, eu queria te perguntar uma coisa.
-Fala, Grazi.
-O que é que
vocês dois estão escondendo? O que foi que ele falou na hora em que eu não
estava aqui?
-Nada.
Só perguntou se eu estava bem.
-Eric, por favor.
Tem alguma coisa em você que não quer que ninguém saiba. Eu te conheço.
Basta olhar pra sua cara e dizer que o médico te disse alguma coisa a mais. O
que foi?
-Você está viajando.
Eu... Eu não tenho nada além da ferida no pé. Perdi a consciência, apaguei no
meio da rua, mas foi só isso. Um susto, Graziela.
-Tem certeza
disso?
-Já estou
perdendo a paciência. Só quero esquecer que o dia de hoje existiu.
-Vou avisar o Téo
de que daqui a pouco, todo mundo vai pra casa. Já falou com seu tio?
-Coitado, ele nem
sabe de nada. Ainda não liguei.
-Então, eu vou
lá fora tentar falar com ele.
-Ótimo. Avisa pra
Sophia que eu já estou bem.
-Tudo bem, eu aviso- sai da enfermaria. Com cuidado para não fazer
barulho, Eric se levanta da cama e vai até a porta. Vendo que Graziela não está
por perto, procura o consultório do médico.
XXXXX
Graziela
está na portaria do hospital, tentando ligar para Glauco, o tio de Eric. Logo atrás, vem Sophia
para recomeçar a discussão que haviam tido antes que soubessem o estado de
saúde do jovem. Subitamente, antes que possa se aproximar, Téo segura
violentamente o braço da namorada.
-O que é isso?
-Eu quero falar
com você.
-Sim, mas precisa
dessa agressividade toda? Téo, você está me machucando!
-Eu quero saber
que cena foi aquela que você fez na enfermaria, passando a mão no rosto
dele. Até quando você acha que vou ficar calado, vendo você se
insinuar pro Eric?
-Pra começar,
solta o meu braço, que eu não dei permissão pra você me tratar desse jeito. E
depois, eu não me insinuei pra ninguém. Para de falar comigo como se eu fosse
uma... Como se eu não estivesse namorando você.
-Algumas vezes, você acha
facilidade pra se esquecer desse detalhe.
-Cuidado com o
que fala. Porque se eu sentar a mão em você, eu não vou aceitar revide
pela forma que você vem me tratando desde hoje cedo.
-Graziela, deixa
de bancar a idiota. Se decide de uma vez, porque eu já estou perdendo a
paciência contigo.
-Paciência quem
perdeu fui eu, em ter que aguentar seu ciúme como se você fosse o frágil
da relação, como se estivesse sendo traído, como se eu me envolvesse com
qualquer um.
-Se fosse assim,
eu estaria bem tranquilo.
-Como é a
história?
-Não é de hoje
que o Eric trava uma disputa comigo pelo teu amor. Seria muito mais fácil se eu
te perdesse pra um desconhecido. Porque além de eu ter que brigar com o meu
melhor amigo por sua culpa, ele ainda não se tocou de que o seu coração é dele.
-Sendo assim, por
que você insiste nisso tudo ainda?
-Porque eu amo
você. “Só por isso”. E porque eu venho durante esses anos todos, desde
quando a gente era criança, tentando provar que se o Eric não te nota, eu sou o
contrário. Só que eu estou cansado, Graziela. Eu não aguento mais ser um
refúgio sempre que você cruzar com a Sophia, ou se decepcionar com o Eric.
-Isso é uma
ameaça?
-Não, é um
pedido. Eu quero que você se decida: ou você luta por ele ou fica
comigo.
XXXXX
Eric entra na
sala do médico e vasculha os
exames. Encontra o seu e reluta para abri-lo. Quando o faz, acaba se
decepcionando com a confirmação do que já havia lhe sido dito.
-Ele estava
certo. Eu vou morrer. Acabou tudo.
O médico abre a
porta.
-Eric? Eu tinha acabado
de assinar sua alta, mas o que
você...
-Li o exame...
Pensei que... Que o senhor estava errado, mas... Só fiz confirmar. Minha
vida acabou, doutor. O que vai ser de mim agora?
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