-Vamos conversar seriamente sobre paçoca. Que história é
essa de usar a linguagem de um vendedor de paçoca como exemplo do que não se
deve fazer na carta, Fred?
-Foi a ideia que me veio à cabeça, cara.
-Pois é. Mas acabou que você se tornou um meme. Olha só- enquanto
Gabriel procura o celular, André e Bernardo estão jogando uma partida de
dominó- Olha só: graças a você, o termo "paçoca" está nos trending
topics mundiais.
-Não acho que uma coisa tão sem importância vá virar um
meme.
-Paçoca!- Bernardo grita propositalmente ao ganhar a
partida.
-Vou dar na cara dele!
-Não vai dar na cara de ninguém, se controle. Agora você precisa
passar por uma limpeza de imagem.
-Como assim?
-Tente evitar essas comparações esdrúxulas e
politicamente incorretas.
-Mas não existe ninguém mais politicamente correto do que
eu. Sou boca-virgem até para evitar o contágio de sapinho.
-Como diria a Tiffany das Branquelas: me poupe! Ou será a
Brittany? Não sei, sou de humanas!
Um bom mocinho de novela tem que ser extremamente ingênuo
para que o vilão possa pôr o seu plano em prática. No caso do que você está
lendo, nem precisa ser o mocinho: basta ser qualquer pessoa vulnerável para que
ele ataque, visando ao malefício do protagonista. Nem é esse o caso, pra ser
muito sincero... Enfim...
Finalmente, Felipe inventa de armar contra alguém que não
seja Fred- ainda que o propósito seja de afastá-lo da pocilga... Nossa mãe, fui
bem agressivo... Desculpe. A vítima da vez é André, aquele ser humano que só
aparece em cenas de conversa paralela. Obviamente, a função desse personagem
não seria somente essa. Usemos, então, a distração que tal criatura tem para
usar a favor do pior aluno da turma.
André, envolvido numa partida de dominó com Bernardo,
deixou o celular em cima da carteira, e a sala estava vazia por causa do
intervalo. Estava, leu bem? Porque Felipe dará o ar da desgraça! Os poucos
ávidos por esse texto presumirão que o aparelho será roubado. Não exatamente. A
única coisa que muda é o cartão de memória, colocado discretamente no menor dos
bolsos do antagonista. Logo depois, certifica-se de que o telefone não está
desligado, a fim de não levantar suspeitas.
Hoje é sexta-feira ainda. Que trama devagar.
Está na hora da Educação Física, e alguma coisa tem que
acontecer para que André sinta falta do cartão de memória. Bom, ocorre que a
professora nova, a que substitui Eleonora, chama a atenção. Recorda-se de
Eleonora? Foi mencionada na primeira passagem dessa estória, mas agora é
irrelevante.
Que enchimento de linguiça!
Para evitar barriga nessa novela paraguaia, a nova
docente põe a galera pra pular ao som de "Physical". O rapaz resolve
tirar o celular do bolso e ao mexer, encontra o mesmo com apenas imagens do
armazenamento interno.
-CADÊ MEU CARTÃO DE MEMÓRIA? QUEM PEGOU?
-Como assim? Teu cartão sumiu?- Felipe pretende faturar o
Troféu Imprensa de Melhor Ator/ Falsiane do ano.
-Eu vou bater lá na sala de Amparo! Pegaram do meu
celular!
-Mas também, cara, tu "deixa" em todo lugar-
admite Bernardo.
-Quem foi que pegou, hein? Eu quero saber quem foi!
-Vão tanto dizer.
-Será que não foi o professor novo? Sei lá, né? Ninguém
nunca viu esse cara por aqui... – Felipe causa intriga.
-Aquela toupeira? Não, foi alguém da sala. Só pode ter
sido.
-Vamos rezar pra que o coração do ladrão seja tocado e
ele devolva esse cartão de memória.
-Mulher, a gente não tá no jardim I, não!- constata
Rayane.
-É porque ela fala desse jeito, mas nem imagina que ele
quer tirar fotos dela pra postar no Spotted- Xande revela a cabecinha podre de
André.
Chegou a hora de largar. Gabriel resolve sair mais cedo
da escola, enquanto Fred Chegou fica lá, martelando a cabeça com o tal plano de
aula.
-Obrigado pela ajuda do relatório.
-Que nada, Fred. Agora, me deixa ir.
-Vai pro jornal a essa hora?
-Disse que ia mergulhar no trabalho. Saber como anda a
escola depois do escândalo não é minha única pauta. Tenho que cobrir uma manifestação
no centro.
-Boa sorte, então.
-Valeu. A gente se fala pelo Zap.
-Bom fim de semana, boy- aperta a mão do amigo.
-Pra você também.
Gabriel vai à reportagem que o espera segundos antes de
ver o sinal tocar. Felipe é o primeiro a sair da sala, mas Vivi corre atrás
dele e o puxa, colocando-o no corredor.
-O que é que te deu?
-Você engravidou Rayane?
-Nossa! A Rocam tá trabalhando menos do que você.
-É verdade que Rayane tá buchuda ou não é?
-E se tiver? Afinal de contas, eu sou o namorado dela,
não sou?
-Não acredito... Você não devia ter feito isso.
-Olha, não fica achando que eu pedi um bebê pra ela, não,
tá legal?
-Vem cá: já passou pela sua cabeça que existe camisinha?
Anticoncepcional? DIU?
-Não. Faltei à aula de Biologia. Me julgue.
-Espero que você tenha noção de que você acabou com o
futuro de Rayane! Aliás, a sua especialidade é destruir tudo que tem à sua
volta. Como o cartão de memória de André.
-Do que você tá falando, sua demente?
-Eu sei que você passou na sala na hora do intervalo e
pegou o celular que aquele besta deixou na banca. Eu vi.
-E por que acha que eu fiz isso?
-Pra ninguém saber que André foi o único que conseguiu
filmar a briga todinha tua com a Professora Lavínia. Pensa que eu não vi?
-Vai fazer o quê,
Victória? Contar pra Amparo? Encher o mundo? Desculpa, eu acho que eu tô
fazendo as perguntas erradas. Você vai me entregar porque eu roubei o celular
de André ou porque a Rayane tá grávida?
-Para de fazer rodeio. O que você quer dizer?
-Só você mesmo pra achar que eu não saquei que tu "é"
contra meu namoro com Rayane?
-A favor é que eu não sou.
-Vai ver é recalque.
-Por favor, meu filho... Eu não sou daquelas que usam
essa palavra todo tempo sem saber o significado.
-Frustração por não conseguir realizar os desejos. Sim,
Victória. Você é recalcada.
-E o que eu tanto quero que não consegui ter ainda?
-Posso perguntar pra Ray. Acho que o namorado dela
talvez.
-Você é ridículo.
-Todo mundo pode acreditar nessa conversa de melhores
amigas, mas eu sei que você é a fim de mim, sim, e que caiu do cavalo quando me
viu querendo Rayane, e não você. Agora eu entendo por que você dá tanta força
pra ela se mandar pra Suíça: você quer tentar alguma coisa comigo, mais uma
vez.
-Cala a boca. Você não tem noção do que tá dizendo.
-Aposto que tô. Tá se tremendo na
minha frente, gaguejando, toda nervosa... Tô mais do que certo.
-E se fosse verdade... O que é que tu "ia"
fazer? Largar dela e ficar comigo? Felipe, você acha que eu vou ser tão cara de
pau e pedir pra você largar dela, ainda mais agora?
-O que tem agora, Vivi? A gravidez?
Basta eu falar tudo que ela quiser ouvir, e esse bebê some.
-Tá querendo dizer o quê, Felipe?
-Não vou jogar minha liberdade fora
por causa de um feto. A gente pode ter ficado estranho um com o outro, mas
depois eu faço a cabeça dela.
-Pra quê?
-Pra que mais seria? Pra ela se livrar
desse moleque.
-Ah, e você acha que ela vai querer
abortar? Isso é desumano, Felipe.
-Desumano é você minar o namoro da tua
melhor amiga. Eu vou fazer um favor pra Rayane. Mas ela vai ficar comigo, e vai
desistir dessa papagaiada de ir pra Suíça. Agora, isso não impede a gente de...
-Eu não sou estepe de ninguém.
-Que pena. Quem sabe sendo a segunda
opção, você consiga alguém que goste de você um pouquinho? Não é por nada, não,
mas... Não é porque eu gosto de Rayane que eu virei santo. A gente pode se
divertir. Quando você quiser.
Felipe tenta beijar Vivi, mas fica
apavorado com um grito dado por Rayane, que põe a mão na barriga após flagrar o
namorado e melhor amiga em um flerte.
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