Toni abre um
sorriso, sem graça.
-Você quer me dizer
que ela acordou, é isso?
-Não. Continua do
mesmo jeito.
-Então, como é que
você falou com ela, Juliano?
-Eu escutei a voz
de Lívia, tô te dizendo.
-Cara, isso é
impossível.
-Juro que escutei.
-Deve ter sido
alguém com a voz muito parecida com a dela.
-Dentro do
hospital? Na hora que eu tava falando com você, pelo telefone?
-Tá, e dizendo o
quê?
-Que eu tava
escutando o que ela falava. Ela repetia muito isso.
-Só foi isso? Teve
mais coisa?
-Me falou que a mãe
dela tava errada.
-Em quê?
-Em pensar que ela
tinha dormido com alguém que ela não conhecia, que foi... Que a amiga dela tava
mentindo pra mãe.
-Juliano, isso não
tem lógica nenhuma. Vai ver você ouviu isso da boca de Dona Heloísa, que mora
perto da gente...
-Ouvi dela! Ainda
saí do hospital pra pegar um táxi, e ela me seguiu.
-Pelo amor de
Deus... Quem te seguiu?
-Lívia. Me disse
que foi abusada.
-Juliano, por
favor, você não pode dizer isso pra ninguém.
-Por quê?
-Porque é um absurdo!
Ninguém vai acreditar em você.
-Você não tá acreditando,
não é? Não quer que eu fale pra eu não passar vergonha!
-Não é isso, cara,
mas é que... Me diz por que ela ia te dizer isso. Ela não olhava nem na cara da
gente.
-Porque já tentou
falar com os outros, e eles não escutam. Eu também achei que fosse viagem da
minha cabeça, mas não é!
-Juliano, jure que
não vai mais tocar nesse assunto. Com ninguém.
-Toni, e se ela
tiver falando a verdade?
-Não tem verdade
aí. Você tá imaginando, tá bom? Não comenta isso com ninguém, promete?
-Tá. Não digo pra
ninguém.
-Então... Vamos pra
casa, que eu tô morrendo de fome. Aposto que você também.
-Tá.
-Ficou com raiva do
que eu falei?
-Não. Vamos pra
casa logo.
/////
Chegou a manhã do
dia seguinte. Alguém bate à porta da casa de Heloísa. Destroçada, a mãe de
Lívia abre a porta.
-Bom dia, Dona
Heloísa.
-Bom dia, Karen.
-Eu posso entrar um
minutinho?
-Se não se importa,
pode falar daí mesmo? A casa tá uma bagunça.
-Tudo bem. A
senhora não foi trabalhar hoje?
-A dona da casa
onde eu trabalho tá viajando. E mesmo que tivesse lá, eu não tenho cabeça.
-Eu vim saber
notícias de Lívia e... Pedir desculpa pelo que eu disse no outro dia.
-Imagina, Karen,
você não tem do que se desculpar. Por quê? Por ter me contado a verdade?
-Eu quero que a
senhora entenda que eu não podia mentir. A senhora tinha o direito de saber. Também
acho que Lívia deu um passo errado, isso não tem nada a ver com a personalidade
dela e...
-Por isso mesmo que
eu tenho tanto ódio guardado dentro de mim. A Lívia não é de fazer isso, mas
fez. Só isso explica ela ter me escondido essa gravidez. Bom, sobre ela e o
bebê, até onde eu sei, os dois estão na mesma.
-Era só isso mesmo-
afirma, sem graça- Enfim, eu espero que os dois se recuperem logo.
-Não tenha tanta
esperança.
-É a última que
morre, Dona Heloísa.
-É... Quem sabe?
-Bom, deixa eu ir
embora, que hoje tenho prova na faculdade.
-Obrigada por passar
aqui.
-Quando eu não
puder ir ao hospital, passo aqui pra saber notícias- cumprimenta-lhe com um
beijo- Tchau.
-Tchau, fique com
Deus- Heloísa fecha a porta.
-Tomara que morram.
Os dois.
/////
Na hora do almoço, Patrícia
está com a cabeça distante, enquanto Rafael conversa sobre o hospital.
-Ainda bem que
aquela senhora finalmente teve alta. Imagina o que é passar tanto tempo longe
da... Patrícia, você está me ouvindo?
-O quê?
-Tem alguma coisa
te preocupando, meu amor?
-Não, é que... Bom,
você passa tanto tempo cuidando da saúde dos outros, mas... Rafael, quando foi
que você fez um check-up pela última vez?
-Nossa, faz muito
tempo mesmo! Mas por que a pergunta?
-Por nada. Só acho
que você deveria frear um pouco esse ritmo de trabalho intenso.
-Imagina. Amo o que
eu faço, Patrícia.
-Mas precisa de
saúde pra fazer o que ama. Está se sentindo bem?
-Eu? Nunca estive
tão bem. Quer dizer... Melhor estaria se nosso filho estivesse conosco nesse
almoço. O que houve? Resolveu jogar boliche no shopping de novo?
-Muito pelo
contrário, meu querido. Digamos que ele esteja dando mais uma cartada pra
reconquistar Karen.
-Sinceramente, acha
que ele vai conseguir reatar com ela?
-Confio plenamente
nele. E te aconselho que faça o mesmo, Rafael.
/////
Prestes a sair de
casa, Karen abre a porta do apartamento (carregando várias pastas e um notebook)
e se depara com Danilo.
-Ué, o que você tá
fazendo aqui?
-Eu vim ver como você
tava, depois daquele dia no hospital.
-Horrível. Só de
pensar que Lívia tá daquele jeito, e a gente não pode fazer nada...
-Meu pai tá fazendo
de tudo por ela. Mas a gente tem que esperar ela reagir.
-Não sei. Do jeito que ela tá... Não acham que eles
escapam, nem ela nem o bebê.
-Eu não gosto de te
ver assim. Se eu pudesse fazer alguma coisa pra não te ver triste desse
jeito...
-Obrigada, mas
ninguém pode. Aliás, o inferno na minha vida começou quando eu descobri o que
eu represento pra você...
-O que
representava. Só que mesmo com toda essa raiva, tudo o que você quer agora é
sentir meus braços, saber que eu posso te ajudar, ouvir que eu nunca vou te
deixar sozinha.
-Seria muito bom
mesmo. Mas eu sei que isso não vai acontecer.
-Será que não? Depois
de toda essa insistência que eu faço?
-Danilo, por favor,
para de tornar as coisas mais difíceis. Eu não posso voltar pra você.
-Tudo bem. Mas se
for pra acabar aqui, eu quero uma coisa antes.
-O que você quer?
-Me beija.
-Por que você tá
fazendo isso comigo?
-Me beija, e eu
prometo que saio da sua vida. Nunca mais eu volto, nunca mais eu te procuro, te
ligo,bato na tua porta... Só não me nega isso, por favor. É a única coisa que
eu tô te pedindo, Karen. Por favor.
Julgando-se sem
alternativa, Karen retribui o pedido com um demorado beijo, onde deixou
transparecer ser capaz de qualquer coisa para reatar o romance. Para Danilo, a
batalha estava ganha.
É nesse momento que
Lívia, ao observá-los, entende o motivo que levou a amiga a mentir para
Heloísa.
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