Sozinho, Juliano
está fazendo um lanche nas areias da praia, que fica perto do prédio em
construção onde trabalha com Cícero. Quer dizer, não totalmente sozinho. De longe,
ele é vigiado pelo pai e pelo irmão, que conversam sobre as afirmações que ele
fez após escutar Lívia.
-Você quer que eu
fale com ele?
-Tenta sondar um
pouco, mas só se ele insistir muito nessa estória.
-Você não acredita em
nada do que ele disse?
-Painho, nem tem
como. Lívia era metida, achava que era mais que todo mundo... Aí vem pedir
ajuda logo pra Juliano, que ela ignorava? E ainda mais do jeito que tá?
-Toni, não foi só
isso que ele falou. Ele disse que aquela menina foi estuprada, isso é muito
sério...
-Eu sei, eu sei, e é
por isso que eu tô te pedindo pra ficar de olhar em Juliano. Isso de ficar
escutando voz não é normal, de dar atenção pra alguém que não consegue nem
abrir os olhos.
-Vou avisar à sua mãe...
-Não. Por favor,
não conta nada pra Mainha. Ela pode se preocupar à toa.
-E você não tá preocupado
com seu irmão, Toni?
-Tô.
-Mas afinal de
contas, você tem medo de quê?
-A gente não sabe
quem é o pai do filho da Lívia, como que ela ficou grávida, quem deu esse
remédio pra ela tomar, onde ela conseguiu. Se Juliano for atrás dessa estória,
ele pode se dar mal.
-Olha, no trabalho,
eu posso ficar de olho nele... Mas a verdade é que ele se dá melhor com você.
Juliano sempre foi muito fechado, e a gente nunca tentou contrariar isso. Se
ele insistir, só você que pode pôr um freio no teu irmão. Faz ele desistir de
inventar isso aos poucos. Juliano não é de mentir, e não vai fazer isso agora.
/////
Ainda bastante
abatida, Heloísa está voltando da venda, sem coragem de encarar os vizinhos.
Encontra um carro da Polícia Civil na porta de sua residência.
-Bom dia?
-Bom dia. Eu estou
procurando Heloísa dos Santos Figueira. Me disseram que ela mora nessa casa,
mas ninguém atende.
-Sou eu. Fui comprar
umas coisas na esquina. Quem é o senhor?
-Muito prazer. Eu
sou Salviano Paranhos, delegado.
-Prazer... O que o
senhor quer comigo?
-Eu recebi uma
denúncia feita pelo doutor Rafael Duarte Tosak, que está cuidando de sua filha,
Lívia. Ele disse que sua filha está internada em estado grave por conta de uma
hemorragia.
-Pois é. Em coma.
Mas por que o senhor veio aqui?
-Como a senhora
deve saber, aborto é proibido por lei. Estamos tentando averiguar o que levou sua
filha a querer tirar o bebê.
-Acho que foi medo.
Eu sempre fui muito amiga, muito conselheira de Lívia e... Ela sabia que eu não
ia perdoar se me aparecesse aqui grávida. Ainda mais porque ela não sabe nem
que é o pai.
-Pelo visto, a senhora
também não faz ideia.
-Pois é. E não foi
da boca dela que eu ouvi a verdade.
-E de quem foi,
então?
-De uma amiga de
Lívia, uma moça chamada Karen. Assim que eu soube da gravidez, coloquei ela
contra a parede, e ela me contou que minha filha... Enfim, o senhor entende.
-Mas tem uma coisa que
interessa pra polícia: quem foi que forneceu o LMD, o abortivo que colocou sua
filha entre a vida e a morte?
-Não sei, não,
senhor. Se quiser mais informação, só mesmo perguntando à menina que eu lhe
falei, a Karen.
-Tem como a senhora
me dar o endereço dessa moça?
/////
Rafael e Patrícia
assistem à televisão na sala, até que Danilo chega, radiante.
-Podem pedir
champanhe. Hoje é noite de comemoração.
-O que foi que
houve, filho?
-Resolvi dar um
jeito na minha vida, Pai. No próximo semestre, eu volto pro meu curso.
-Que maravilha, meu
filho... E essa atitude, tem algum motivo especial?- Patrícia pergunta, ansiosa
demasiadamente.
-Tem: a Karen. Nós
dois voltamos.
-Fico feliz por
isso, meu filho. Muito feliz por você.
-Viu só? Agora não
tem mais motivo pro senhor não confiar em mim. Eu mudei, Dr. Rafael. E vou
retribuir tudo de bom que você fez a vida toda, Pai.
Emocionado, Rafael
dá um abraço no jovem. O plano de estabilidade montado por Patrícia dá certo...
/////
Só que Lívia
continua sem entender o porquê de estar vivendo uma experiência de quase morte.
Tampouco que Karen tenha protegido Danilo descaradamente. Mas ao olhar seu
corpo, esperando que ele reaja de alguma forma, a consciência da estudante de Jornalismo
traz à tona uma conversa que teve com sua ex-amiga no dia em que Toni a
socorreu.
-Agora que você tá
mais calma... Pensou no que pode fazer?
-Continuo sem
saber, Karen. Tô me sentindo sozinha, perdida.
-Não é pra menos, Lívia,
mas...
-Mas o quê?
-Eu acho melhor
você contar a verdade pro Danilo.
-Isso não!
-Ele tem o direito
de saber, é pai dessa criança...
-Não! Eu não queria
ter nada dele, nada que me lembre o rosto daquele monstro, daquele desgraçado,
nojento...
-Mas tem, Lívia. Já
pensou se essa criança nasce? Toda vez que você bater o olho nela, é o
cafajeste do Danilo que vai estar vendo.
-Como é que eu
faço, então, Karen?
-Lívia... Eu sei
que o que eu vou te falar é difícil, pode até nem me perdoar por te dizer isso,
mas...
-Fala, Karen! Pelo
amor de Deus!
-Se você não quer
contar pro Danilo que você tá grávida, e não vai dizer dessa gravidez pra Dona
Heloísa, eu só vejo uma saída.
-Que saída?
-Tira esse bebê.
Tira esse bebê, Lívia, e você enterra essa estória do Danilo de uma vez por
todas.
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