05/06/2017

VIDA LOUCA/ CAPÍTULO 2: TUDO COMO NA PRIMEIRA VEZ



Perto do horário em que o filho Fábio largaria, o empresário Caio Marinho Vasconcelos vai à casa da namorada do rapaz, sabendo que a adolescente não está em sua residência. A empregada abre a porta ao escutá-lo tocar a campainha.
-Bom dia. Em que posso ser útil?
-Eu tenho que falar com Ariane, agora!
-Pode deixar, Cleusa- Ariane vem da cozinha- Eu atendo esse senhor.
-Com licença- a doméstica deixa a sala de estar, esquecendo-se de fechar a porta.
-Quer beber alguma coisa, Caio?
-Como é que você conseguiu se manter sob as aparências ontem à noite?
-Era o dia em que Fábio pediu Gabriela em namoro. Nunca que eu ia imaginar que aquele rapaz era seu filho.
-Meu coração quase saiu pela boca quando entendi quem era você, quando pude te reconhecer...
-Dezoito anos já se passaram.
-Pra mim, é como se tudo tivesse acontecido ontem.
-Caio, você sabe muito bem por que não fomos adiante na nossa relação.
-Sei, sim. Mas não posso agir como se fôssemos dois estranhos.
-O que quer que eu faça? Que eu grite aos quatro ventos que nós dois já tivemos um relacionamento? Isso já faz tanto tempo que nem vale mais a pena lembrar!
-Só que eu não esqueci, Ariane. Todo dia eu lembro e lamento que eu joguei o que a gente tinha fora.
-Agora as coisas são diferentes, Caio. Você é casado e tem um filho, formou uma família, seguiu com a sua vida.
-E você, seguiu com a sua?
-Olha só, eu não vou admitir que você interfira na minha vida pessoal desse jeito!
-Qual é o problema? Um dia eu já fiz parte dela.
-Tem noção do que está acontecendo nessa sala? Eu estou falando do passado com o pai do namorado da minha filha...
-Comigo, Ariane. Com o Caio que um dia você amou.
Saindo de um apartamento que ajudou a decorar, a mãe de Fábio, Alice, passa em seu carro na porta da escola do filho. Ele está saindo com o melhor amigo e a namorada, surpreendendo-se com a presença da esposa de Caio.
-Tá fazendo o quê aqui, Mãe?
-Eu tinha visitado uma cliente aqui perto e resolvi passar pra dar uma carona a vocês, já que também estou indo pra casa.
-Ih, Dona Alice, não vai dar. O professor de Física passou um trabalhou sobre óptica geométrica, e a gente combinou de fazer lá em casa- explica Gabriela.
-Mas bem que a senhora podia levar a gente do mesmo jeito, né?- sugere Fábio.
-Claro que posso, meu anjo. Entrem aí.
Quando Eduardo abre a porta traseira do veículo, repara que esqueceu o caderno na sala.
-Gente, “peraí” um minutinho, que eu vou buscar um negócio na sala e já volto.
-Vê se não demora lá dentro mandando “pala” pras meninas, hein, Edu?
-Deixa do teu “queijo”, Fábio... – o comentário de Eduardo o constrange diante de Alice- Foi mal aí, Dona Alice.
-Tudo bem, Eduardo. Eu nunca vou entender esses “elogios masculinos” mesmo.
-Já venho.
Eduardo corre de volta à sala de aula, quase vazia, mas encontra Bete e Diego, junto a alguns rapazes de outras turmas, usando cigarros ao fundo da sala, de luz apagada e com a porta entreaberta. O irmão de Gabriela religa o interruptor e se assusta com o grupo, descobrindo dessa forma que estes faziam uso de substâncias entorpecentes. Diego se mostra irritado.
-Tá fazendo o quê aqui, rapaz?
-Relaxa que eu não vi nada, vim só pegar meu caderno.
-Melhor mesmo pra você- avisa, em tom de ameaça. Quando Eduardo deixa a escola e entra no carro, o rapaz pergunta à namorada- E se ele entregar a gente pro diretor?
-Que entregue. Ele expulsa a gente do colégio, e todo mundo fica sabendo o que rola aqui dentro. Acha mesmo que vão querer um escândalo por causa de fofoca?
-Não dá pra vacilar, não, Bete. Esqueceu que você é bolsista?
-Esqueci, não, gato. Mas esse aí é peixe pequeno. Não vai fazer nada que prejudique a gente.
O filho mais velho de Ariane entra no carro sem comentar o que presenciou dentro da escola, e os demais não reparam. À medida que o carro se aproxima da residência de Ariane, cresce a tensão entre a anfitriã e o convidado indigesto.
-Se você não tem mais nada pra fazer aqui, pode sair.
-Não é possível que você vai me tratar como se eu não fosse ninguém, como se essa situação não fosse estranha.
-Claro que é. Meu coração quase pulou pela boca quando vi de quem Fábio era filho. Achei que fosse mentira, mas não. Vi que você estava tão surpreso quanto eu.
-Me diz, Ariane: o que é que a gente faz com isso?
-Eu prometi pra mim mesma que eu não tocaria nesse assunto com ninguém. Eu não quero e nem vou resgatar o nosso passado. Foi doloroso demais pra mim, e eu não vou revivê-lo, Caio!
-Essa reação sua... Quer dizer o quê? Alguma coisa por mim está viva em você, é isso?
-Caio, você refez a sua vida com outra mulher, construiu uma família com ela...
-Com a qual não estou feliz. Ariane, você não tem ideia de como eu me arrependo, do quanto que eu penso como tudo ia ser diferente se a gente tivesse ficado juntos.
-Mas não estamos, Caio! O que você quer? Que eu admita um sentimento por você que eu não vivo mais? Eu refiz a minha vida.
-E conseguiu ser feliz longe de mim?
-O que passou não me importa mais.
-Mas a mim sim! Porque não há um só dia em que eu não sinta arrependimento por ter perdido você.
Gabriela chega à própria residência e toca a campainha, mas sua mãe e o pai de Fábio não ouvem. Ela, então, lembra-se da cópia da chave que carrega consigo.
-Caio... Se existe algum assunto que a gente precise tratar, são sobre os nossos filhos. “Nós” não existe mais, entendeu?
-Como eu fiz mal a você, Ariane...
-Você nem imagina o quanto. Eu me vi destruída quando estava com você, com medo de te perder o tempo todo e acabando comigo mesma- Ariane não segura as lágrimas- Agora você vem falar do passado que nós dois, juntos, não realizamos?
O marido de Alice se aproxima e enxuga o rosto da dona de casa.
-Não. Não é justo eu falar do que poderíamos ser. Mesmo assim, eu não deixo, nem um só dia, de me perguntar o que podemos ser ainda- Caio a surpreende com um beijo.
-O que significa isso?- Alice grita, na companhia de Gabriela, Eduardo e Fábio, incrédulos com a atitude do empresário.

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