21/11/2014

MENTES/ CAPÍTULO 26: LA LUZ A LA MEDIA BOCA



Voltando ao hospital pela manhã, Marisa tenta contato novamente com Plínio. Noêmia atende ao chamado.
-Residência da Família Reinchenbach?
-Noêmia, é a Marisa outra vez.
-Ah, sim, Dona Marisa. Eu vou chamá-lo agora mesmo. Só um minuto.
-Eu espero, Noêmia. Obrigada.
A governanta sobe até o quarto de Plínio, que está com uma feição confusa.
-Doutor Plínio... O que o senhor tem?
-Não sei... Eu acho que tinha que ter feito alguma coisa relacionada ao instituto, mas não lembro do quê.
-Será que não é algum relatório pra revisar?
-Eu não sei, Helena, não sei.
-Doutor, Helena é o nome de sua primeira esposa. Eu sou Noêmia.
-Ah, claro. Claro. Que cabeça a minha... Então, é... Noêmia... Por que veio até aqui?
-A mãe da Giovanna, a Dona Marisa, está tentando falar com o senhor desde ontem.
-Certo, me dá aqui.
-Com licença, senhor.
-Tem toda. Alô?
-Plínio, eu preciso falar com você, é urgente.
-O que houve, Marisa? Algum problema com a Giovanna?
-Plínio, nós precisamos que você venha o mais rápido possível pra Maceió. Você tem algum compromisso marcado pra depois do trabalho?
-Não, eu venho pra casa. Posso fazer a minha mala e ir pra lá. Vocês estão em Maceió?
-É. Viemos pra cá depois... Depois que tudo aquilo aconteceu com a Giovanna.
-Só precisam me dizer onde estão. Marisa, o que é que está acontecendo? Pode me adiantar pelo telefone?
-Eu acho que é melhor você sentar. O assunto é mais sério do que você imagina.
-Fala de uma vez, o que foi?
-Como eu posso te dizer isso... O bebê sobreviveu à queda que a Giovanna sofreu naquele dia.
-Bebê? A que se refere?
-A Giovanna não perdeu o filho que esperava do Bruno. Ela mentiu pro seu filho deixá-la em paz.
-Como isso é possível? Vocês nos fizeram acreditar na morte dessa criança, sem pensar no sofrimento que tivemos por causa dessa mentira!
-Entenda que eu tinha que compreender as razões que levaram a minha filha a esse ato extremo.
-Entender? Você quer que eu entenda? E por que resolveram, as duas, me revelar a verdade só agora?
-Porque o bebê nasceu com uma grave doença. E só você ou o Bruno pode salvar a vida dele!

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-Isso só pode ser mentira... Esse menino não pode ser seu filho!
-Mas você não disse a todos que seu filho tinha morrido naquela queda que... O que está acontecendo?
-Eu tive que mentir. Eu não quis que o Bruno voltasse a se aproximar de nós depois do que ele fez. Por isso que eu menti, delegado. Pra não deixar que ele voltasse a tocar na gente.
-Só pode ser um pesadelo...
-Pesadelo? Do que você está falando?
-Que você levou essa gravidez adiante! Que esse bebê conseguiu vir ao mundo!
-Valentina, do jeito que você fala, parece até que não queria que ela tivesse esse filho!
-Não queria mesmo!- grita, desesperada- Será que vocês não entendem? Esse garoto é a continuação do maldito do Bruno, do miserável, do assassino, que está solto por aí!
-Disso eu sei. Mas acontece que o meu filho não tem culpa dos problemas que o Bruno se meteu.
-Seria melhor que esse moleque não tivesse nascido.
-Como é que você se atreve a falar desse jeito do meu filho, sua louca?
-Pra que você quis ter esse filho, hein? Pra levar consigo um pedaço do seu marido? Você não imagina o quanto eu vibrei, o quanto eu fiquei feliz quando o vi naquele desespero porque ele havia deixado de ser pai. Agora, você me aparece com o único motivo que pode dar um sopro de esperança àquele cretino pra ele continuar fazendo tudo que tiver vontade? Esse fedelho não podia ter nascido! Era melhor que ele tivesse morrido, que o próprio Bruno o tivesse matado!
-Cala essa boca!- Giovanna dá uma bofetada em Valentina, completamente insana- Nunca mais volte a falar assim do meu filho! Some daqui, antes que eu faça uma besteira! Sai daqui!
-Giovanna, não adianta! Ela enlouqueceu por causa desse ódio do Bruno.
-Você conseguiu ter uma parte daquele infeliz contigo. Já a Virna foi poupada dessa família perfeita que vocês têm. Ele não só desprezou a minha irmã como acabou com a vida dela!
-“Família perfeita”? Você é completamente louca! Desde a lua de mel que nós não tivemos um segundo de paz por causa da sua irmã, por causa do Abílio, de todas essas tragédias!
-Você ainda ama aquele homem. Talvez, por causa dessa criança, com mais paixão que antes.
-O que você entende de amor? Você acabou de desejar a morte de um inocente e me vem falar de amor? Não era só ele que devia ser preso numa camisa de força, sua doente! Some daqui! Anda!
-Valentina, sai daqui! Não tem mais nada pra fazer aqui.
-Vocês dois vão me pagar! Pelo seu desprezo, e pela bofetada! Eu juro que vão me pagar!- retira-se do hospital.
-Por favor, eu peço desculpas por ela.
-Olha, você vai me desculpar, mas a sua mulher precisa ser avaliada urgentemente por um psiquiatra! Porque transferir o ódio do Bruno pro meu filho é muito grave. É caso de internação!

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Horas depois, Felipe está com uma batina especial para celebrar a quermesse que organizou junto a Bruno. A igreja está lotada. Os fieis aprovam a decoração realizada para a ocasião. Mas antes de começar, fica pensativo em sua casa paroquial.
-Onde está esse rapaz? Tomara que não faça nada de que vá se arrepender depois...

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Na recepção do Hospital Geral, à tarde, uma recepcionista atende a Bruno, vestido com a batina de Felipe.
-Boa tarde.
-Boa tarde. Eu queria visitar um paciente. Um recém-nascido.
-O senhor sabe o nome do paciente?
-Não, mas eu sei o nome da mãe do bebê: Giovanna Reinchenbach.
-Deixe-me conferir, só um segundo. Não, não temos nenhum acompanhante ou interno com esse sobrenome.
-Então, tente “Giovanna Diegues”. É o nome de solteira.
-Claro- digita- Ah, tem um bebê que é filho de Giovanna Diegues, chama-se Henrique. Ele está na enfermaria oncológica do hospital.
-Como eu faço pra vê-lo?
-Pegue o elevador, vá até o terceiro andar e dobre na primeira entrada à direita.
-Ah, muito obrigado.
-Só um segundo.
-O que foi? –assusta-se.
-Não vai me dar a sua bênção, Padre?
-Seja abençoada, minha filha. Suas preces foram ouvidas- sobe até a enfermaria pelo elevador, com cinismo- Sempre soube que o “Brunismo” era uma religião convincente- gaba-se.
Uma enfermeira o recebe, percebendo o olhar terno com o qual se dirige a ela.
-Bom dia, Padre. Posso ajudar?
-Sim, eu estou procurando uma criança...
-Alguém em especial?
-Muito... É o filho de Giovanna Diegues. Disseram na recepção que o nome dele é Henrique.
-Ah, claro. É esse aqui.
-Mas ele é lindo.
-Me desculpe, mas o senhor não se apresentou. É amigo da família?
-Como? Giovanna não anunciou que viria aqui hoje? Sou um dos representantes da Arquidiocese de Alagoas, ela já contribuiu muito com suas obras de caridade. Daí, acabei ficando amigo da família. E fiquei comovido quando soube do problema de saúde do bebê...
-É. Lamentável.
-Eu queria pedir uma coisa, minha filha, se não for incômodo.
-Pode falar, Padre.
-Será que você se importaria em me deixar um pouco com ele, a sós? É que eu senti um desejo enorme em meu coração de rezar por essa alma.
-Claro, Padre. O que mais precisamos no momento é de alguém de fé. Com licença.
-Obrigado- espera a enfermeira sair para colocar Henrique em seus braços. Deixa as lágrimas caírem- Finalmente nos conhecemos, meu filho. Eu não vou demorar, mas eu quero te dizer uma coisa: eu vou fazer de tudo pra te ter perto de mim. Mesmo que nós não sejamos a família que eu sempre quis ter, eu prometo que vou provar a minha inocência. E nunca mais vamos ficar longe um do outro- o bebê para de chorar quando o Bruno o beija e o coloca no berço novamente- Espera por mim. Eu vou te salvar.

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Bruno caminha pela rua, ainda abalado em ver seu filho tão frágil por causa da doença, até que passa num bar e encontra Valentina, de costas, com duas garrafas de cerveja. Sem hesitar, o arqueólogo entra no recinto, para o espanto de todos que olham primeiramente para a vestimenta do rapaz.
-O que você vai querer?- pergunta o garçom.
-A companhia dela, é mais interessante que qualquer bebida.
-Você?- vira-se, apavorada.
-O que foi? O porre está tão grande que não me reconhece mais?
-Onde é que você estava? A polícia está atrás de você, todos estão te procurando! Eu vou chamar a polícia agora!
-Pra quê? Pra investigar o Vaticano? A polícia não está interessada em procurar o cara que é acusado de matar a secretária, o funcionário de confiança. Tem muitas prioridades além de mim. Já você... Será que esse ódio todo não esconde outra coisa?
-Que outro motivo eu tenho pra te destruir, infeliz?
-Talvez você imagine que eu tivesse tido alguma coisa com a mosca-morta da sua irmã- Valentina tenta bater no rapaz, mas é impedida por ele, que percebe o quanto ela está alcoolizada- Contenha-se! Ou será que você queria estar no lugar dela?
-Eu não sei do que está falando.
-Sabe, sim! Confessa que cada vez que você me via, alimentava as fantasias de que eu pudesse ter tido alguma coisa com sua irmã.
-Se não teve, não tem do que ter medo.
-Mas fantasia. E você morre de ódio porque só pela suspeita, enquanto você continua com seu casamento apático, imagina as noites que possa ter tido comigo. Uma oportunidade que, segundo a sua cabeça oca, só poderia ter acontecido com a sua irmã. Afinal, ela me amava em silêncio, nós éramos próximos no trabalho e...
-Chega. Eu não quero ouvir mais nada.
-Tem razão. Você não quer ouvir. Quer ter a mim. Na sua cama, dando aquilo que nem o delegado nem qualquer outro homem são capazes de dar. Se eu sou aquele que te vicia, talvez eu seja o seu remédio. A cura.
-Com essa roupa, é provável que você venha a me oferecer a cura. Está pronto pra isso.
-Pronto eu vou estar quando nós dois estivermos sozinhos.
-Ah, que coisa cafona.
-Se você não quer ter aquilo que pode ter levado sua irmã à morte, problema seu.
-E por que você se envolveria comigo?
-E por que não? Você é uma mulher linda, inteligente, determinada. E tem justamente aquilo que atrai um homem.
-O quê?
-Teimosia. Essa sua insistência em me desafiar é algo que chamaria a atenção de qualquer um.
-Menos você.
-Será que não?
-Você tem a sua mulher.
-Que me deixou depois que o meu filho morreu. Isso não significa nada?

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Bruno e Valentina chegam ao hotel onde ela está hospedada. O rapaz entra no quarto tirando a roupa e, em seguida, arranca a roupa da dona de casa com violência.
-O que é isso? Vai devagar!
-Você já está esperando tempo demais pra que eu desacelere, não acha?- afasta-se da moça, ainda ébria.
-O que foi?
-Fala o meu nome. No meu ouvido.
-Bruno... Bruno... - os dois deitam na cama.
-Isso. Eu quero ver você falando com raiva, com ódio.
-Eu não consigo. Com ódio, eu não consigo.
-Consegue. Se você soubesse o quanto o ódio excita, não se separava de mim. E é isso que eu não vou permitir: que você se separe de mim. Nunca mais- fala pausadamente, enquanto a beija, levando-lhe ao prazer.
-Não me deixa, Bruno. Eu preciso de você...
-É?
-Eu sempre quis você.
-Eu sabia que sim... – ao passo que leva sua boca à dela, Bruno consegue fazer com Valentina se entregue totalmente a ele, ainda que ela esteja bêbada. Risos aos ouvidos podem ser escutados, muitos sussurros que representam a satisfação de dois inimigos que se dão uma trégua...
Mas Bruno se assusta. Levanta-se da cama ao ter uma sensação estranha.
-Por que você parou? Não me deixa sozinha aqui... Não me deixa- diz Valentina, com os olhos fechados, desfalecendo aos poucos- Fica aqui, por favor.
O arqueólogo fica atordoado com o que vê: primeiramente, uma mancha de sangue escorrendo por suas pernas. Depois, o sangramento que também ocorre em Valentina, agora completamente desacordada.
-O que é isso? Essa mulher... Não pode ser- pega as roupas, mas as larga rapidamente e vai ao banheiro, onde toma uma ducha para tirar a mancha de si- Não pode ser...

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