Na
fila do ônibus, José Fernando pensa que está indo para a faculdade sozinho, mas
Montserrat está lhe seguindo.
MONTSERRAT:
Três anos. Três anos dando o melhor de mim, sendo carinhosa, fazendo dívidas no
cartão de crédito para agradar a este homem... E ele me fazendo passar esta
vergonha no débito... – passa a pensar em voz alta- Como eu fui burra!
SABRINA:
Não faças propaganda, amiga.
MONTSERRAT:
Sabrina? O que estás fazendo aqui?
SABRINA:
Tomar o ônibus. Tenho que descer na Ceasa e comprar uma cabeça de peru para
fazer a sopa. E tu?
MONTSERRAT:
Estou seguindo José Fernando.
SABRINA:
No Instagram?
MONTSERRAT:
Não! Li uma mensagem na qual ele marcou um encontro com Alejandra.
SABRINA:
Deve ser uma colega de faculdade...
MONTSERRAT:
É a sua ex.
SABRINA:
A quem estou tentando enganar, não é mesmo? Mas o que tu vais fazer?
MONTSERRAT:
Não sei. Mas quero conferir com meus próprios olhos. Por isso, eu estou seguindo
José Fernando. Pelo que estou vendo desta fila, não vou conseguir entrar no
mesmo ônibus que ele.
SABRINA:
Tudo é uma questão de estatística, Montserrat.
MONTSERRAT:
Como assim?
SABRINA:
Estás vendo teu namorado daqui?
MONTSERRAT:
Sim, é o primeiro da fila.
SABRINA:
Ótimo. É só tu esperares José Fernando entrar e depois invadir o ônibus.
MONTSERRAT:
Além de tudo, eu ainda vou ficar em pé?
SABRINA:
Montserrat, aprendas comigo: transporte público comprova que dois corpos não
podem ocupar o mesmo espaço, mas duzentos cabem. Corpo de pobre é maleável, por
isto que usamos tantas roupas da grife SM.
MONTSERRAT:
SM?
SABRINA:
Segunda Mão.
MONTSERRAT:
E se ele me vir?
SABRINA:
Ninguém é capaz de se reconhecer no ônibus. A vida de alguém abaixo da linha de
pobreza não é um videoclipe. Eu vou contigo.
MONTSERRAT:
Mas... E tuas compras?
SABRINA:
Podem esperar. Estarei lá para dar-te apoio moral. O financeiro eu não dou
porque teu nome está sujo na praça.
Nenhum comentário:
Postar um comentário