Cena 2
Bruno está sentado numa cadeira da segunda fila, lendo um livro em Braille, e interrompe a sua leitura quando ouve a porta do auditório sendo tocada. O rapaz se levanta, passa a ser guiado pelas cadeiras da primeira fila que são manuseadas por ele, e abre a porta.
BRUNO: Só um minuto. (de frente para Fábio) Quem é?
FÁBIO: (segura as mãos de Bruno e realiza a datilologia do seu nome) Fábio. Tudo bem?
BRUNO: Oi, Fábio. Tudo bem. Entra.
FÁBIO: Com licença (entra e conduz Bruno até uma cadeira, para depois ele mesmo sentar-se em frente ao rapaz cego) A gente pode conversar?
BRUNO: Pode.
FÁBIO: Como está a sua família?
BRUNO: Está bem, e a sua?
FÁBIO: Todos estão bem, graças a Deus. Com quem você mora?
BRUNO: Com os meus filhos e a minha esposa.
FÁBIO: Ainda trabalha na mesma empresa?
BRUNO: Não, agora eu estou em outra. Muito melhor.
FÁBIO: Que bom. Você pode falar um pouco sobre a sua limitação visual?
LOCUTOR: Existem dois tipos de deficiência visual: a baixa visão / acuidade e a cegueira, também conhecida como amaurose.
BRUNO: Eu sou cego desde que eu tinha cinco anos.
LOCUTOR: A cegueira é a perda total de visão, sem percepção de luz e forma.
Seja por fatores físicos, seja por razões neurológicas, ela pode ser manifestada na pessoa desde o nascimento ou adquirida ao longo da vida.
FÁBIO: Por que você não vê?
BRUNO: Minha cegueira é por causa da diabetes.
LOCUTOR: A diabetes é uma das causas de cegueira adquirida porque pode causar retinopatia - uma lesão não-inflamatória na retina.
O Ministério da Saúde informa que 7,4% dos brasileiros convivem com a diabetes.
FÁBIO: Entendi. Você sente muita dificuldade para se locomover pelos lugares?
LOCUTOR: A Lei 10.098/2000 foi criada para promover a acessibilidade de todos que possuem alguma deficiência.
Com ela, são garantidas a adaptação de espaços públicos e privados (implantando escadas, passagens de pedestres e rampas) e a construção de edifícios projetados para o uso coletivo.
BRUNO: Meu tato, por causa da ausência de visão, é mais aguçado.
LOCUTOR: A criança que possui deficiência visual tende a se apegar primeiro às pessoas e não aos objetos.
Por isso, é necessário lhe estimular a tocar e a ouvir, pois estas atividades ajudam a lhe acalmar.
O processo de abstração dos objetos requer paciência dos educadores, uma vez que a criança pode levar um longo tempo pesquisando cada item.
BRUNO: Quando eu saio, sou acompanhado por um cão-guia.
FÁBIO: Como as pessoas te tratam depois de saber que você tem cegueira?
BRUNO: Às vezes, as pessoas preferem não chegar perto porque eu sou diferente.
LOCUTOR: De acordo com o Censo de 2010, o Brasil tem 6 milhões de pessoas com baixa visão e 506 mil cegos .
FÁBIO: De que jeito era a sua vida antes de perder a visão?
BRUNO: Minha infância era boa, eu tinha vários amigos. Mas, depois que eu fiquei doente e perdi a visão, muitos dos meus amigos se afastaram de mim.
LOCUTOR: Ainda segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 25% das pessoas que possuem deficiência visual não podem ser consideradas alfabetizadas.
BRUNO: Depois que eu me entendi como uma pessoa sem visão, a comunidade cega me abraçou e me acolheu. Após um tempo, eu comecei a ler em Braille.
LOCUTOR: O sistema de leitura e escrita Braille foi criado em 1824, chegando rapidamente ao Brasil, mas só oficializado no nosso país em 1962.
Segundo a Lei do Direito Autoral, de 1998, a reprodução de obras literárias, artísticas e científicas em Braille é livre, uma vez que elas não são usadas para fins comerciais.
BRUNO: Também aprendi a falar Libras, para me comunicar com meus amigos surdos.
FÁBIO: Bruno, foi muito bom conversar com você. (o jornalista e o entrevistado levantam-se das cadeiras) Obrigado por me receber.
BRUNO: Eu sou quem te agradeço. Pode voltar quando você quiser.
Fábio e Bruno apertam as mãos e o jornalista abre a porta e deixa o jovem cego no auditório.
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