13/02/2013

AINDA É CEDO/ CAPÍTULO 15: AÍ EU DISSE “QUEM TEM MEDO É VOCÊ”


-Fala alguma coisa, Milena, eu tô nervoso. O que foi? Tá com dúvida? Tá com medo?
-Tô, mas de coisa muito mais grave. Você é que deve ter ficado com medo, pra falar disso quando seu irmão não tivesse perto da gente.
-Eu não quero que ele pense mal de você.
-E de você? Ele pode? Porque é o que tá parecendo. Você se comporta como se tivesse devendo alguma coisa a ele.
-Não é nada disso.
-Pedro, já que é pra contar a verdade, eu vou falar porque não quero machucar nenhum dos dois. Você só tá insistindo nessa ideia de namoro porque eu não dei o “chega pra lá” antes. Eu gosto muito do Fabrício, desde a primeira vez que eu vi naquele carro. Só que eu não tô namorando ele porque ele não vai ter coragem de me pedir se não tiver certo de que vai voltar a andar.
-Mas isso é só uma questão de tempo. O Fabrício tem que ter paciência.
-Paciência? Aquele lá?
-Bem que eu tava desconfiado de que tinha alguma coisa prendendo vocês dois. Mas uma coisa eu não posso negar, Milena. Apesar de tudo isso, eu não consigo esquecer que tô apaixonado por você.
-Mas vai dar um jeito. Eu não vou ficar no fogo cruzado, mesmo que eu tenha achado lindo aquele pedido de namoro, e a sua declaração também. Eu não tô fazendo de tudo pra vocês pararem de brigar e começarem tudo de novo por minha culpa, Pedro.
-Milena, escuta só...
-Não! Eu não vou escutar mais nada. Se você me respeita, esquece o que a gente acabou de conversar. Apaga da tua mente.
-O que vocês tanto conversam aí, hein?- grita Fabrício.
-Sobre você. Sua recuperação- responde Pedro, um pouco nervoso.
-Vamos pegar o Fabrício e voltar pra casa.
-Mas já, Milena?
-Eu quero ir embora.
-Só porque eu falei a verdade, você quer ir embora pra casa?
-Não. Eu quero levar o Fabrício pra mansão e de lá eu volto. Só pra ele não estranhar nada. O que a gente conversou aqui, morreu.
-Pra você, só se for.
-Pra você também, Pedro. Principalmente pra você- após alterar o tom de voz, Viviana se levanta e vai até Fabrício, deixando Pedro chateado com sua nova recusa.

*****

Ludmila vai ao local do acidente e continua com suas investigações sobre os segredos que envolvem a família Faria. Ela encontra a mesma moça que não conseguiu dar informações quando o pai de Viviana foi procurá-la.
-Dá licença. Eu tô procurando informações sobre uma moça.
-Pode falar. Ela é do ramo?
-Não, acho que não. Mas é que ela estava aqui quando houve um acidente, não sei se você soube. Foi um acidente de carro, ela socorreu o motorista. O nome dela é...
-Viviana?
-É Milena.
-Calma aí, é Viviana mesmo. Não foi a moça que foi na ambulância com o cara? Saiu no jornal que ele era de uma família cheia da grana. Ele morreu?
-Não, tá bem. Se recuperando.
-Sei. Foi a Vivi.
-Espera, tá havendo um engano. Essa moça se apresentou como Milena.
-Pois quando ela veio parar no ponto, o nome era outro.
-Ponto?
-Aqui não é colégio de freiras, não, filha...
-Mas, espera... A Milena... Quer dizer, essa Viviana trabalhava no ponto?
-Ela chegou faz uns dias, parece que veio de outra cidade. Não arrumou cliente nenhum, e no primeiro dia do trampo... Ela foi parar no hospital pra socorrer o cara e não voltou mais. Quer dizer, só ontem pra dormir e trocar de roupa. Mas o cara pra quem a gente trabalha não quer saber de dar mordomia. Ou ela pega no pesado ou não volta mais.
-Só pode ser um engano. Olha, eu vou te mostrar uma foto da moça que eu tô procurando, certo?- Ludmila exibe uma imagem de Viviana ao lado de Pedro e Fabrício, registrada na praia às escondidas.
-Olha só, ela trocou de ponto e não avisou nada. Ah, bandida... Pode escrever, é a mesma moça. E esse cara da cadeira é aquele que tava no carro.
-Milena, Milena, você não devia ter mentido. Você acaba de afundar o nome da família Faria na lama. Vagabunda.

*****

Ricardo está à mesa de jantar quando percebe diversas chamadas perdidas de Cora em seu celular. Neste momento, Cristina decide interromper a refeição do marido.
-Finalmente em casa, querido! Soube da última? O Fabrício foi à praia com o irmão e aquela moça.
-Bom pra ele.
-E pra todos nós, que estamos nos reerguendo depois dessas tragédias.
-Fale isso por você, Cora.
-Do que foi que você me chamou?
-Fale isso por você agora. É, agora, porque só agora que você vai pôr a cabeça no lugar e perceber que a recuperação do Fabrício é algo insano.
-Insano? Eu vejo o progresso que meu filho consegue fazer.
-Progresso esse que, para mim, é insuficiente. Chega a ser nulo o esforço que a Milena e o Pedro fazem.
-Antes nulo deles do que o que é feito por você.
-Se você vai jogar na minha cara que eu não cuido do Fabrício como deveria, eu vou embora.
-Isso é uma constatação sua, Ricardo. Deve ser a culpa batendo, por perceber que não está mais tão próximo do seu filho caçula como antes.
-O que quer que eu faça? Que eu ponha um sorriso de orelha a orelha fingindo que está tudo bem dentro da minha casa?
-Pelo menos durante a festa que eu vou realizar, sim.
-Acredito, sinceramente, que seja dinheiro jogado no lixo. Afinal, Cristina, você está comemorando um progresso que não existe.
-Talvez porque ele seja igual ao nosso casamento: cada dia mais eu me convenço de que ele não existe- Ricardo se levanta da mesa e esquece o celular nela. Cora vai atrás do marido até a porta da casa- Vai se esquecer de tudo o que eu falei? Mas como? Indo se encontrar com alguma amante?
-Talvez eu devesse. Quem sabe assim o nosso casamento teria mais um pouco de emoção, e eu fosse menos infeliz?
-Você me conhece bem, Ricardo, e sabe que eu sou capaz de qualquer coisa. Uma única traição descoberta, e eu mato. Tanto ela quanto você.
-Doente. É isso que você é, Cristina. Apenas isso- abre a porta e vai embora.

*****

Fabrício e Pedro estão no quarto, fazendo novos exercícios.
-Você ouviu a briga?
-Começou a ser rotina já.
-Acho que é por minha culpa.
-Não, a culpa é só do nosso pai. Ele tem que aceitar e acreditar na sua recuperação. Não agir como uma criança.
-Pedro, você sabe o que a Milena teve hoje na praia? Ela tava tão animada, de repente mudou de figura. E parece que foi tudo depois de conversar contigo.
-Fabrício, só a Milena pode falar o que houve.
-Eu tô perguntando pra você.
-Mas é um direito dela de falar ou não. Fica tranquilo que é bobagem. Ela gosta muito de você.
-Não acredito.
-Tô falando na boa.
-Isso é sério mesmo?
-Não vai demorar muito. Vocês dois vão ficar juntos.
-Eu queria te agradecer, cara.
-Pelo quê, Fabrício?
-Por tudo. Eu sei que esses exercícios, essa coisa de ficar me acompanhando é por causa da aposta com a mamãe, mas... Eu vejo que eu fui estúpido contigo, desde o começo. E o amor da dona Cristina por mim é tanto que... Ela não se importa por eu ser adotado.
-Nem nunca foi assim.
-Vamos ficar na paz, cara?
-Sempre, irmão.
-Eu também quero te contar um segredo.
-Qual?
-Sabe essa festa que a mãe tá armando?
-U-hum. O que tem?
-Eu vou aproveitar e pedir a Milena em namoro.
-Namoro?- Pedro fica surpreso.
-Tenho certeza que ela vai aceitar. Não é boa a ideia?
-É. Massa- o estudante tenta conter o constrangimento.

*****

-Não, Cristina. Você não pode ligar pra ele. Isso é se rebaixar perante aquele cafajeste. Não, não posso mais aguentar. Eu tenho que saber onde ele está- a mãe de Fabrício e Pedro pega o telefone fixo e disca para o marido. Mas o celular dele toca sobre a mesa. Ao percebê-lo, recolhe-o e decide vasculhar as notificações- Uma ligação perdida da casa de Cristina... E quinze ligações não atendidas de Lauveríssimo. Quem é Lauveríssimo?

*****

Os dias se passam e Pedro decide ligar pra Cora.
-Professora?
-Oi, Pedro. Como está?
-Eu tô bem. Mas tô achando sua voz meio triste, o que houve?
-Problemas pessoais, mas não é nada grave.
-Eu quero convidar a senhora pra uma festa. A festa é minha mãe que tá organizando, em homenagem ao meu irmão, que vem se recuperando um pouco.
-Eu não sei, Pedro.
-Faz um esforço, tia Cora.
-Ok. Talvez seja melhor pra dar uma espairecida. Me dá o endereço- Cora anota num caderninho que traz consigo dentro da bolsa- Ok, às nove horas? Estarei lá. Até mais, querido.
-Quem era, filho?
-Minha ex-professora do conservatório. Chamei ela pra festa do Fabrício.
-Você ainda tem contato com aquela gente, Pedro?
-Ah, mãe. É só uma festa. E vai ser aqui dentro de casa, não vou bancar o Beethoven não, tá? Agora deixa eu ir que tenho que chegar cedo na facul hoje. Beijo- Pedro beija a cabeça da mãe e pega seus manuais de Medicina.

*****

Ricardo se encontra num terreno baldio com Ludmila e entrega uma maleta cheia de dinheiro. A moça chega de táxi e pede pro motorista esperar.
-Trouxe o que eu pedi?
-As fotos primeiro.
-Vou te entregar uma pasta com todas as cópias.
-Como é que eu vou saber se essas são as últimas mesmo?
-Porque você está pagando o meu silêncio.
O publicitário abre a maleta, para que Ludmila confira as notas. A garota fecha o objeto e diz:
-Escuta bem: nada de gracinhas. Nenhum homem misterioso atrás de mim, ou assassino de aluguel querendo tomar a grana. Qualquer coisa que aconteça comigo é obra sua a partir de agora. Foi um prazer negociar com o senhor, Ricardo Faria.
A moça entra no táxi, enquanto Ricardo vai em outra direção.
-Salva. A minha família está salva agora.

*****

Finalmente a festa começa. Pedro recebe Cora em sua casa.
-Bem-vinda, tia Cora.
-Obrigada, Pedro. Sua casa é realmente muito bonita.
-Mas vive numa reforma interminável, minha filha. Sabe como é? Mãe que gosta de ostentar e se sente como se fosse do elenco das “Mulheres Ricas”.
-Imagino. Bom, me apresenta sua família, então.
-Claro. Olha só, esses são os meus pais: Cristina e Ricardo.
O ex-casal de amantes empalidece com o reencontro. Cora aperta a mão de Ricardo.
-Prazer.
Bastou a professora falou para que Cristina percebe a troca de olhares entre ela e o seu marido.
-Prazer.
-Você é a...- Cristina busca interromper a conversa entre ambos.
-Cora.
-Seja bem-vinda, querida. Escuta, Pedro, cadê seu irmão?
-Não sei, deve ter ficado com a Milena em algum lugar.
-Sempre essa garota. Vamos procurar os dois.
Enquanto Pedro e Cristina buscam Viviana e Fabrício, Cora e Ricardo discutem.
-O que significa isso? Você veio me perseguir dentro da minha própria casa e usou meu filho pra isso?
-Ficou louco? Eu não fazia ideia de que o Pedro era seu filho.
-Por favor, silêncio- pedia Cristina ao segurar um microfone, sobre o palco com o filho e a amiga dele- Meu filho, Fabrício Faria, gostaria de dizer algumas palavras nessa ocasião tão especial.
-Hoje é um dia muito especial mesmo. E não só por eu ter decidido lutar pra ficar bom, mas também porque eu quero recomeçar do zero e pra isso, dar importância a quem realmente me deu importância: minha família. Só que é mais do que isso. Mais do que uma comemoração, eu quero usar esse espaço pra fazer um pedido muito importante. Milena- segura a mão da moça- quer namorar comigo?
Viviana fica emocionada, mas sua emoção é bloqueada quando percebe a maior parte das pessoas rindo.
-O que está acontecendo?- pergunta Ricardo.
-Por favor, Ricardo. Cora, e você? Se prestar a esse papel ridículo, trazer essa prostituta pra cá- dizia uma mulher da festa.
-Do que ela tá falando, Milena?- estranha Pedro.
-Saiu na internet há quinze minutos. Qualquer um pode ver. Essa moça que seu filho está pedindo em namoro é uma garota de programa- completava a informação outro convidado- Olha bem isso- entrega o celular pra Fabrício.
Na manchete do Diário da Cidade, diz: “Filhos de família tradicional estão conhecendo melhor garota de programa”, com direito à foto de Pedro, Viviana e Fabrício na praia. A moça começa a chorar e Fabrício levanta a cabeça, olhando para a jovem e percebendo que a matéria escrita por Ludmila tem seu resquício de verdade.

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