-Felipe, abaixa essa arma! Deixa de brincadeira!
-Ainda não se tocasse, não, né, Fred? Isso daqui não é
brincadeira!
-Felipe, por favor! Olha o que tu tá fazendo, meu
irmão...
-Qual é, André? Vai defender o professor agora? Vai virar
puxa-saco, que nem Xande faz? Eu disse que tu ia se arrepender, que tu ia se
arrepender das vezes que tu disse que eu não era homem.
-Deixa disso e guarda esse revólver, cara!
-Agora diz que vai sair da sala- levanta-se da cadeira,
deixando os outros ainda mais apavorados- Diz que vai sair!
-Você não... Você não vai botar a vida de todo mundo que
tá aqui em perigo. Seu problema é comigo.
-Com você, eu não tenho nada. Mas uma coisa eu vou te
dizer, que é pra tu não esquecer nunca mais: quem manda aqui nesse lixo sou eu.
E não tem Amparo, Lavínia, Gabriel, presidente da república que dê ordem pra
mim, não. Se quiser sair, saia! Ninguém quer você aqui! Mas se ficar, pode
ficar certo: vai ter que me aguentar.
-Sai daqui, Fred!- Vivi fica desesperada- É capaz dele
disparar mesmo. Sai daqui!
Fred sai correndo e se tranca na sala dos professores.
Felipe, por sua vez, chega ao centro da sala, sob os olhares amedrontados de
todos e mostra que não tem nenhum projétil na arma.
-Onde é que você conseguiu isso?
-Em casa, André. Mas isso é o de menos. O negócio é o
seguinte: o que aconteceu aqui, morre aqui. Porque quem abrir a boca pra contar
o que aconteceu, eu boto bala aqui dentro, entendeu?
Xande sai completamente esbaforido da sala de Amparo, que
misteriosamente está sem dar notícias há vários capítulos, mas deixa a sala
aberta para promover a já citada "barriga". Nessa hora, Gabriel chega
esbaforido à escola.
-O Fred já tá em aula?
-Já...
-O que é que você tem? Sua irmã piorou?
-Não, foi outra coisa.
-Você tá indo pra sala, Xande?
-Tô, sim. Vamos- ambos vão até a sala 04.
Com a incômoda sensação de ser seguido, Fred anda
apressadamente, olhando para trás diversas vezes. Ele paga a passagem de ônibus
e o cobrador percebe o seu nervosismo.
-Tá tudo bem?
-Tá.
-Mas você tá se tremendo.
-Não é nada, daqui a pouco passa. Obrigado- ele senta
numa cadeira isolada, olha para a janela e chora de maneira que nenhum passageiro
possa vê-lo.
-Eu disse que tu ia se arrepender, que tu ia se
arrepender das vezes que tu disse que eu não era homem. Mas uma coisa eu vou te
dizer, que é pra tu não esquecer nunca mais: quem manda aqui nesse lixo sou eu.
E não tem Amparo, Lavínia, Gabriel, presidente da república que dê ordem pra
mim, não. Se quiser sair, saia! Ninguém quer você aqui! Mas se ficar, pode
ficar certo: vai ter que me aguentar- as palavras de Felipe ecoam na mente do
futuro docente, que procura se conter na frente das pessoas, sem conseguir
segurar algumas lágrimas.
Além do esforço inútil de Fred, há também Xande e Gabriel,
que entram na sala, e que veem os alunos sem acreditar nos momentos
aterrorizantes que viveram.
-Cadê o professor de vocês?- ao serem questionados pelo
jornalista, os estudantes não sabem o que responder.
-Fred encerrou a aula mais cedo?- Xande, sem desconfiar
de nada, indaga.
-Ele disse que ia pegar um negócio na sala de Amparo e
não voltou até agora- Felipe mente.
-Não, na sala de Amparo ele não tá. Vim de lá agorinha.
-Disse que foi te procurar. Que você tava demorando muito
pra voltar com o apagador.
-Pois é... Perdi a noção do tempo mesmo- declara Xande,
ainda aéreo com o que leu e ouviu.
-Eu vou procurar Fred.
-Professor Fred?- fala Tenório, o velho guarda da escola-
Ele saiu correndo pouco antes do senhor chegar.
-Pra onde ele foi?
-Isso, eu não sei. Mas ele saiu bem apressado mesmo.
-Eu vou mandar uma mensagem no Zap pra ele. Isso tá muito
estranho- Gabriel promete averiguar a situação.
Fred desce do ônibus e prossegue até um dos prédios da universidade.
Sobe alguns degraus, enfrenta um longo corredor e, ao não ver ninguém, senta à porta
de uma das salas e chora, abalado com a experiência que acabou de passar no
estágio curricular supervisionado. Depois de um tempo, já não se importa mais o
que os transeuntes estão achando de seu desespero, tampouco da falta de empenho
em oferecer-lhe alguma ajuda. Só quer chorar.
As mensagens de Gabriel via WhatsApp chegavam a todo
momento, mas Fred não o atendia. Precisava de coragem para explicar o que
aconteceu, mas não encontrava. Via as notificações, mas não prestava atenção ao
remetente. Por enquanto, nada era capaz de acalmá-lo. Só uma pessoa, prestes a
chegar naquele local.
Chegou o fim do turno matutino. Gabriel ficou por horas
na sala dos professores, esperando alguma notícia de Fred, mas em vão. Ao ouvir
o sino tocar, sai do recinto e vai em direção à Vivi.
-Espera. Eu queria falar com você.
-Já sei. Vai me perguntar se Fred deu as caras de novo.
Não.
-O que aconteceu pra ele sumir assim? Já faz mais de
horas que eu tento falar com ele e nada.
-Bom, eu sei. Mas eu quero que você faça uma coisa em
troca.
-Que coisa?
-Você tá de carro?
-Olha, eu não quero me meter em confusão...
-Relaxa, Gabriel. Eu só quero que você me leve ao
hospital onde Rayane tá internada.
-E por que você não vai com o irmão dela?
-Se você não percebeu, o clima tá meio pesado desde o dia
que ela passou mal.
-Isso tem a ver com o sumiço de Fred, por acaso?
-Também. O culpado é o mesmo.
-Felipe.
-Bom, eu posso te contar quando chegar lá?
-Claro. Eu vou pegar meu notebook na sala dos
professores. Você me espera.
-Tá certo.
Júlia chega à sala cheia de pastas e um notebook moderno.
Encontra Fred desgostoso com tudo.
-Frederico? Tá fazendo o quê aqui?
-Eu precisava falar com a senhora.
-Hoje é terça-feira. Minha aula com você é na quinta.
Aliás, é orientação do plano de aula.
-É urgente.
-Me ajuda com isso daqui, por favor- Fred é solícito,
como sempre- Senta aqui. Desculpe se eu não te der muita atenção, mas é que
agora eu tenho uma reunião com o núcleo...
-Eu menti pra você, Júlia.
-Sobre o quê?
-Sobre a minha estada na escola.
-Você não começou a dar aula ainda?
-Não. Eu não estou sendo supervisionado por nenhum
professor.
-E então... O que você está fazendo na escola, afinal de
contas?
-Eu tô dando aula no lugar de uma professora.
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