10/10/2016

WERNECK CAKE: CAPÍTULO 13: O JALECO VELHO E CHUPETA, JOGADOS NA SALA

   -Cadê o que vocês vão me dizer?
-Olha, filho...
-Não me enrola, Pai...
-Peraí, menino. Tá me interrompendo, eu vou falar como?
-Deixa que eu explico- propõe-se Juliane.
-Tu explica?- assusta-se Arnaldo.
-É, ela explica. Fala, Juliane.
-O negócio é o seguinte: eu quero até pedir desculpa pro seu pai. É que eu me descontrolei.
-Por quê?- ambos perguntam surpresos. Principalmente o papai canalha.
-Peter, eu cheguei aqui, desesperada. Queria saber se você estava aqui. Quando não te vi, perguntei ao seu Arnaldo se ele tinha alguma ideia do seu paradeiro. Mas ele disse que se a gente brigou, e não tinha dado notícias até agora, não era ele que ia dizer onde você tava. Aí eu fiquei p da vida e parti pra cima dele.
-Foi isso mesmo, Pai?
-O que você acha? Que ela me bateu porque viu uma muriçoca na minha cara e percebeu que não comprei SBT?
-É SBP, meu filho...
-Isso, Juliane. Ela perdeu a cabeça, mas tudo bem.
-Pai, isso não tem nada a ver com ela. Não tá se vendo que uma mulher dessa não faz isso por uma besteira?
-Então, é por quê? Olha, Peter, ela me contou a versão dela e eu dei crédito a você. Agora, se resolva aí com essa menina, que eu não tenho nada a ver com isso. A bronca é de vocês.
-Pede desculpa pra ele. Vai, anda.
-Eu mesmo não.
-Pede ou sai. Minha paciência já se esgotou. Quando eu penso que não vou mais ter susto por tua causa, tu vem e me apronta uma dessa. Fala. Ou nesse caso- abre a porta- nem precisa voltar.
Juliane olha pro rosto de Arnaldo, e demonstra ódio ao falar, mas não deixa Peter notar isso.
-Desculpa, seu Arnaldo. Eu fiquei descontrolada com tudo o que aconteceu, só foi isso. O senhor me perdoa?
-É... Claro. Claro, minha filha. E... Desculpe ter falado com você com ignorância. Não vai acontecer de novo... - impressiona-se Arnaldo com a capacidade cênica da mulher.
-Não vai mesmo- interrompe Peter- Agora, passa. Passa, que eu quero falar com você no corredor. Olha, Pai, eu acho que eu vou demorar, mas eu vou te contar tudo em detalhes.
-Não quer que eu vá com você, não, filho?
-Não precisa. Vou resolver isso sozinho. Não foi o senhor mesmo que me deu esse conselho? E então? Vem, Juliane.
Ela sai do apartamento com medo, pensando que ele tivesse escutado alguma coisa, ou mesmo que tivesse discutido com Inácio quando o irmão fora expulso do prédio. Mas sentiu algo pior do que o medo: o nojo de pedir desculpas pela reação intempestiva que teve. Nem é preciso dizer que Arnaldo também gelou.
No corredor, Juliane vai direto ao ponto.
-Pra você não falar na frente do seu pai, só pode ser o que eu tô pensando. Vai logo com isso, me dá um fora.
-Vai pra casa do teu irmão e pega teu menino. Você vai ficar aqui com ele.
-Como é que é?
-Você vai morar comigo.
-Não dá, eu não posso. Não faz muitas horas que você se irritou comigo por eu ter te escondido o meu filho.
-Peguei o ônibus num trânsito infernal, sem saber pra onde ia. Sabe o que foi que fiz? Desci pra falar com Santiago. Lembrei que hoje era o dia de folga dele. Contei a tua história. Sabe o que foi que ele falou? “Aquele material todo já tem filho? Leva, que tá na promoção. Mulher gostosa tem que aproveitar, porque depois só restam duas pra tu admirar: tua mãe antes de tu nascer e tua filha antes de tu morrer”.
-Realmente, o Santiago é como um irmão pra você...
-Pois é. Pena que não é. Ele me aconselhou a ir atrás, como da vez que eu entrei na clínica a pulso.
-Mas como é que eu vou vir pra cá com Bernardo? E teu pai?
-Painho tá tranquilo, eu peço a ele pra ele ajudar a gente a criar teu menino. Nunca peço nada, nem ele é de me negar nada. Não é possível que agora eu vá ter essa surpresa. Já basta a de hoje mais cedo.
-Peter, tem certeza que é isso mesmo? Você me quer aqui, com você?
-Eu te queria hoje de manhã, agora de noite e pra sempre. Agora para de me enrolar e me dá um beijo, vai.
E o clima romântico num corredor tão vazio e esquisito que mais parece a Bat Caverna, os dois trocam aquela beijoca (o vocabulário foi velho pra caramba, mas a gente não quer citar “Aquele beijo”, por não estarmos aqui a fazer propaganda gratuita de novela). Logo eles tratam de dar as mãos e descer as escadas, na esperança de terminar a nossa narrativa com um final feliz. Ainda vai render isso daqui, nem se acanhe.

*****

O caso é que Peter destranca a porta. Seu Arnaldo está dormindo no sofá. Assusta-se ao ver o filho segurando uma mala e Juliane, o Bernardo.
-Juliane, segue o corredor e entra na segunda porta da direita. Daqui a pouco eu levo as coisas lá.
-Peter, o que houve? Quem é esse menino? Filho dela?
-É, Pai. O próprio.
-Pra onde esses dois vão? Já são mais de onze horas da noite, eles vão pra onde, numa hora dessas?
-Não vão pra canto nenhum. Eles vão parar aqui.
-Meu filho, você trouxe Juliane e o filho dela pra morar aqui?
-Trouxe. Por quê? O senhor tem algum problema com Juliane pra não querer ela aqui?
Seu Arnaldo tenta arranjar uma desculpa. Mas ele só consegue no capítulo 14.

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