Nuelle, ou
melhor, Juliane (a felina da saúde pública) continua sem se bulir, mas não
imagina o incentivo que receberá de Nieta, que cochicha.
-Sobre nesse
cano senão pode começar a se acostumar com seu filho pedindo esmola no metrô.
Anda, Nuelle. Vai!
Não deu outra: a
música recomeçou e Juliane começou a interpretar magistralmente a sua
personagem; requebrou ainda de roupão e pediu para que Nieta desse espaço à sua
performance. Quando aquela vestimenta branca foi abaixo, colega... Foi uma
sensação de euforia coletiva inigualável. Estamos para ver algo parecido até
hoje.
A apresentação
da Jujuba foi um sucesso (sim, agora imitamos a “Malhação”), mas nada que
prendesse a atenção de Peter, pelo menos não de forma fora do comum.
-Olha só, não
tira o olho dela, hein? Não vai dizer que ela te lembra a Juliane?- comenta
Lívio.
-Sem chance,
Lívio. Até porque se ela aparecesse desse jeito, eu nem sei o que ia fazer.
Sinceramente.
-Tinha mais é
que ficar feliz. A mulher se matava de trabalhar, teve um filho, hoje rala
entre uma Upa e uma escola técnica e... Desculpa te falar a verdade assim na
cara... Com um visual daqueles que eu vi na televisão. Tinha mais é que exibir
por aí, como se fosse uma medalha, um troféu mesmo. Uma coisa só sua.
-Por isso mesmo.
Já que eu não tenho beleza, gosto da exclusividade que a beleza da minha mulher
tem.
-Rochedo.
-Finalmente tua
conversa mole acabou.
-E depois desse
show de sensualidade, vamos seguir com os clássicos da música romântica que
leva o público às lembranças do amor- diz Nieta, depois de beber um Dry Martini por causa do nervosismo sofrido
com a desinibida Nuelle- DJ, por favor...
E começa a
alegrar a plateia, mas não pela música do Chico Buarque (que é belíssima, por
sinal), e sim por já estar acima do tom em tão pouco tempo. Como esta é uma novela
musical, vamos transcrever gentilmente o que ela cantou.
-Se acaso me quiseres
Sou dessas mulheres
Que só dizem sim
Por uma coisa à toa
Uma noitada boa
Um cinema, um botequim
Sou dessas mulheres
Que só dizem sim
Por uma coisa à toa
Uma noitada boa
Um cinema, um botequim
E se tiveres renda,
Aceito uma prenda,
Qualquer coisa assim
Como uma pedra falsa,
Um sonho de valsa
Ou um corte de cetim
Aceito uma prenda,
Qualquer coisa assim
Como uma pedra falsa,
Um sonho de valsa
Ou um corte de cetim
E eu te farei as vontades,
Direi meias verdades
Sempre à meia luz
E te farei, vaidoso, supor
Que és o maior e que me possuis
Direi meias verdades
Sempre à meia luz
E te farei, vaidoso, supor
Que és o maior e que me possuis
Mas na manhã seguinte
Não conta até vinte,
Te afasta de mim
Pois já não vales nada
És página virada,
Descartada do meu folhetim.
Não conta até vinte,
Te afasta de mim
Pois já não vales nada
És página virada,
Descartada do meu folhetim.
Agora sim, estamos convencidos
de que escrevemos uma novela! Fim!
*****
Não dissemos para você sair.
Fique. Acontece que Juliane não pode se borrar no palco para não estragar o
teatrinho, e por conta disso, resolveu aliviar-se. Mas quando chega ao
banheiro, vê uma situação deplorável, parecendo aqueles públicos que brotam no
centro da cidade.
-De uma clínica particular a
uma pocilga dessas. Cara, eu devo estar pagando todos os meus pecados com juros
do Hiper Card e correção monetária.
Decide ir a outro. Como o
movimento da casa está fraco, entra no banheiro masculino, mas não sem antes
certificar-se de que tinha muita gente nele. Visto o contrário, decidiu entrar.
Estava ela em sua “cabine exclusiva”, ainda pronta com o figurino da Nuelle,
quando ouve um barulho de uma porta abrindo. É Lívio, que disca um número no
celular e fala bem baixinho.
-Sou eu, Lívio. Escuta...
Escuta que eu não posso dizer alto agora. Tô numa casa de shows. Eu falei com
um amigo meu. É, o Peter, que fazia banda comigo quando eu era mais novo, tá
ligado? Pronto, eu convenci o Peter a fazer dupla comigo. É só questão de tempo
pra eu compor as músicas e mandar pra você, OK? Pronto. A gente se fala. Até
mais.
Neste momento, Juliane se
levanta. Lívio vai abrir a porta, quando percebe que sua carteira ficou perto
da privada. Ao voltar para buscá-la, vê por baixo do box ao lado: os saltos
altos que a ex-fisioterapeuta estava usando. Mas ele pensou:
-Bom, eu não tenho nada a ver
com as esquisitices dos outros, né? Fazer o quê...
*****
Ao chegar à sua casa, Peter dá
um beijo em Juliane, no sofá.
-Você bebeu, Peter?
-Um pouco. Eu não te contei.
Reencontrei o Lívio, que formou uma banda comigo há um tempo. A gente foi
conversar numa casa de shows.
-Ah, a banda cover. Lembro que
você deve ter falado alguma coisa.
-Ele me viu no ônibus e contou
que tá seguindo com a carreira dele de cantor, mas quer colocar a banda pra
tocar de novo.
-Sim, mas eu pensei que fosse
um trio.
-Pois é, tinha o Itallo, mas
ele tomou jeito na vida.
-Como você.
-É por isso que eu decidi
voltar pra banda.
-Homens de dúvida?
-Homens-incógnita.
-Peter... Você sabe cantar?
-Lógico, Juliane, Não ia parar
numa banda se não soubesse.
-Tá, eu sei que você quer dar
uma vida melhor pra mim e pro meu filho, só que se você ficar como cobrador,
vai ter como se sustentar por um tempo.
-E depois? Vou aguentar um
inferno de PE-15 até que o bebê cresça e leve a gente pro asilo? Prefiro ir pro
Retiro dos Artistas.
-Tudo tá muito rápido. Você
viu esse cara sei lá quando. Nem música ele fez.
-E nem vai fazer. Eu que
escrevia tudo. O Lívio disse que não tem cabeça pra isso. E é verdade mesmo,
desde aqueles tempos. Eu vou começar a escrever e a gente grava.
-Meu amor, não confia nesse
cara! Ele tá querendo te enganar, ele tá querendo manipular você! Ele vai
mandar você escrever pra ficar com a fama e a autoria das músicas sozinho.
Tenho certeza que ele vai dar um jeito de fazendo sucesso nas suas costas. E
quando você se tocar, ninguém vai escutar sua reclamação. Se afasta desse cara,
que ele é perigoso demais!
-Você sabe de muita coisa
sobre o Lívio que em tantos anos eu não percebi. Como é que você descobriu? Me
seguiu? Foi até a casa dele? Escutou alguma conversa estranha dele?
Ouviu atrás da porta, por
acaso?
Juliane não tem mais o que
dizer neste capítulo, mas nós sim...
Quase todas as alternativas
acima, Peter!
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